Nemuru - Desperta-me escrita por Candle Light


Capítulo 19
Try, maybe 試して、多分


Notas iniciais do capítulo

SAIU
Muita coisa aconteceu esses ultimos poucos dias. O capítulo estava pronto desde sexta mas não deu pra postar no fim de semana. Atrasou, mas chegou.
Boa leitura pessoal!



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O resto da semana passou arrastada como uma lesma. Contei o que acontecera para Marina por mensagem e de início ela pareceu preocupada comigo, me perguntou se eu estava bem. Mas eu logo disse que tinha sido melhor, estava aliviada e ela pareceu feliz. Bem, ela tinha sido outra que me aconselhara a terminar esse relacionamento.

“Nemu, que bom! Fico realmente feliz, isso vai ser bom pra você”, ela disse. Quando nos encontramos na faculdade ela colocou um braço ao redor dos meus ombros num abraço de “mano” e disse:

—’Tô orgulhosa de você garota!

—Só por isso? - eu ri com meu pescoço preso na dobra do seu cotovelo..

—Você acha pouco? Terminar um relacionamento que não te faz bem requer alguma coragem, principalmente se você se importa com a pessoa e ela não fez nada de errado. - ela me soltou com um sorriso no rosto. Hoje usava o cabelo num meio rabo e usava um colete jeans por cima de uma camiseta preta de estampa geek de Stranger Things - Aposto que você foi ótima.

Senti minhas bochechas esquentarem quando lembrei o que tinha dito a ele. Agora me sentia um pouco culpada. Contei para Marina e ela começou a rir.

—Sério mesmo? Você disse isso pra ele? - ela dizia em meio à acessos seguidos de risadas - Genial!

Franzi o cenho mas era difícil me manter séria enquanto ela ria. Acho que  suas risadas eram sempre contagiantes, embora o motivo talvez não fosse assim tão...nobre.

—Não, tadinho - ela finalmente parou de rir - Foi um ótimo tapa na cara metafórico, Nemu. Talvez um pouquinho cruel, mas a vantagem é que você não deixou nenhuma dúvida.

Olhei para o chão enquanto sentia meu rosto corar novamente lembrando do acontecido. Provavelmente o Daniel não iria querer mais olhar na minha cara por algum tempo. Será que estraguei minhas chances de ainda ter alguma amizade com ele? Eu tinha decidido dar a ele algum tempo antes de voltar a falar, já que eu saí daquela forma e dei um “tapa metafórico” tão bem dado segundo Marina.

Continuamos andando até o ponto de ônibus já com outros assuntos, felizmente.O dia estava claro, com sol morno, uma brisa fraca. daqueles dias que você gostava de sair ao sol e sentir ele esquentando a pele. Era por volta de 16 horas, então o ponto estava cheio de alunos e turistas que voltavam do Pão de Açúcar. O ar que vinha da praia tinha um cheiro característico de sal e somente pelo ventinho dava para sentir que a água estava gelada.

Esperei ao lado de Marina o nosso transporte, aproveitando um silêncio confortável. Eu sorria para mim mesma diante daquela calma no fim do dia, escutava o burburinho dos turistas e dos alunos e me sentia leve como à muito tempo não sentia. Marina estava à minha esquerda, olhando para o mesmo lado, de onde viriam os ônibus. O cabelo flutuava de leve atrás dela e eu estava perto o suficiente para sentir o cheiro de seu shampoo e foi impossível não respirar fundo o aroma agradável.

“Nemuru, que raios…?” pensei. Sacudi a cabeça, dando uma distância um pouco maior entre nós. De repente ela virou para mim e disse

—Nemu, é o seu!

—Que? - meu cérebro demorou um segundo a mais para processar o que ela tinha dito. Ele estava ocupado demais me repreendendo e quase perdi o ônibus.  Despedi-me dela com um rápido abraço e subi no meu ônibus, acenando ainda um tchauzinho pela janela para minha amiga ainda no ponto. Encostei minha cabeça na janela e resolvi pensar nas coisas que deveria fazer para a semana seguinte, passando minha agenda na cabeça. Algumas coisas para estudar, alguns trabalhos para adiantar e...ah, droga - pensei. No dia seguinte, sexta-feira, seria a tal festa que a Nicole queria que eu fosse com ela para “comemorar minha liberdade”. Será que ja era hora de eu começar a me arrepender?

Desci do ônibus com o sol já baixo, as luzes se acendendo, mesmo ainda sendo cedo. Nesses meses os dias ficavam mais curtos. Entrei em casa, tudo quieto. Minha mãe só chegaria mais tarde. Cuidei de Gateau que me seguiu até meu quarto e deitou na minha cama para me observar guardar as coisas. Passei pelo espelho e meu reflexo me chamou a atenção. Olhei-me, sentindo que não me agradava mais totalmente a minha imagem. Aquele término fez algo por mim mesmo, pois agora me sentia mais leve e mais corajosa. Se eu tivesse que fazer algo do tipo outra vez acreditava que teria plena capacidade. Me sentia mais forte, e minha figura parecia frágil demais. Meu cabelo longo fazia ondas fofas e minhas roupas tinham um estilo confortável, porém um tanto infantis, talvez. Eu gostava de estampas divertidas, jaquetas jeans e shorts, mas em mim me deixava com uma carinha de 15 anos. Não era como Marina quando se vestia assim. Nela as coisas ficavam divertidas, estilosas. Decidi então, de última hora, mudar minha imagem para se adequar à nova eu.

Peguei minha bolsa e desci à rua outra vez. O salão cabeleireiro que eu ia geralmente ficava ali perto, e eu contava com a sorte de ela não ter a agenda cheia.

—Nemuru! Surpresa te ver por aqui sem marcar hora! - Marília era uma mulher divertida, na casa dos seus 40 e poucos anos, mas sua mente era jovem e sempre conversava muito comigo quando eu aparecia lá. Ela era alta, de pele morena e fabulosos cabelos cacheados volumosos. - Vai cortar?

—Oi Marília! Vou sim, quero mudar meu visual. Quero um corte mais forte, diferente.

— Curto?

Pensei por um segundo. Poderia me deixar com uma cara mais infantil...mas por outro lado eu tinha usado cabelo longo quase a vida toda.

—Pode ser. Me surpreenda! - eu disse, chutando o balde. Eu queria uma novidade, e cabelos crescem de novo.

Ao final do corte eu estava com um cabelo bem repicado, um pouco acima dos ombros e mais curto atrás, com movimento e certo volume.

—E aí? -ela perguntou ao final - Está bom assim?

—Adorei! - respondi, virando a cabeça e sentindo a leveza depois do peso diminuído.

Me despedi de Marília e voltei para casa me sentindo melhor. Incrível como uma renovação nos deixa de bom humor. Queria ver a cara da Nicole quando visse meu cabelo no dia seguinte. E a cara da Marina. Será que ela gostaria disso?

 

******

 

Minha mãe estava de pé quando acordei no dia seguinte, e a primeira coisa que fez ao olhar para mim de manhã foi uma cara muito surpresa.

—Nemu, seu cabelo…

—Não gostou? Eu queria uma mudança mais radical. - falei, meio sem graça com a cara que ela fez.

—Filha, eu adorei! Caiu muito bem em você. Bem que eu te falava que você precisava de uma mudança. Faz anos que você não mudava seu corte. Isso tem alguma coisa a ver com aquele seu “ amigo”?

—Mãe! - rolei os olhos - Claro que não. Eu nem sei se ele é mais meu amigo depois do fora que eu dei nele. Estou esperando as coisas esfriarem.

Ela me olhou com uma expressão de compaixão.

—Tudo bem Nemu. Essas coisas acontecem. Você ainda é muito jovem, vai passar por esse tipo de coisa muitas vezes ainda. Mas se você quiser ainda manter a amizade dele eu acho melhor procurá-lo. Depois de algum tempo, lógico. Se foi você que deu o fora ele deve estar magoado.

“E como”, pensei. Não tinha contado para a minha mãe sobre a nossa relação esquisita, mas agora era desnecessário. Ela geralmente não insistia para que eu falasse as coisas se eu não quisesse, o que era muito bom. Mas eu sabia o quanto ela também era curiosa.

—Senta aí - ela disse indicando a mesa - Fiz ovos mexidos para nós.

Tomei meu café e conversamos sobre mais algumas coisas não relacionadas até eu ir para minha aula. Eu gostava quando conversávamos assim, até porque era bastante raro. Eu pouco a via e agora com aulas integrais menos ainda.

Esqueci de avisá-la da festa”, lembrei. Eu mandaria uma mensagem assim que chegasse à faculdade.

 

****

 

O dia de aulas passou-se rápido e sem nada de muito interessante. Conversei com Jéssica, que parecia ter simpatizado comigo realmente. Ela ficou me contando fofocas da faculdade mas eu conhecia realmente poucas pessoas e era engraçado como ela tentava me fazer lembrar dos fulanos. Não encontrei com Marina, não sabia se ela tinha vindo para aula pois não estava visualizando minhas mensagens e ao final do dia já estava voltando para casa. Nicole já havia começado a falar comigo sobre a festa.

“Nemu, não esquece a festa hoje, pelo amor de Deus eu estou contando com você”

“Não esqueci. Aliás acho que você vai gostar do meu novo cabelo. Ou me bater haha”

“Quero veeer! Cortou só pra festa?”

“Claro que não. Olha a minha cara de quem vai cortar cabelo pra ir numa festa”

Conversamos até próximo do meu ponto e então saltei. A festa começava só as 22 horas, então eu ainda tinha bastante tempo, mas Nicole queria que eu fosse para a casa dela umas 20 horas. Então na verdade eu tinha pouco menos de duas horas. O relógio marcava 18:25.

Depois de cumprir minha rotina diária fui procurar algo para vestir. O que seria difícil, pois minhas roupas não eram, num geral, “de festa”. Nicole para variar, não tinha escolhido um lugar perto. ela escolheu uma festa alternativa na Lapa, ou seja, teríamos que pegar um ônibus e torcer para não ter muito trânsito. A vantagem de ser uma festa alternativa era que eu não precisaria me arrumar demais. Qualquer coisa estaria bom, então optei por um short preto com uma blusa sem mangas tipo batinha, botei umas pulseiras hipster e um all star de meio cano.  

—Nemu, tá pronta? - Nic tinha me ligado assim que eu estava terminando de enfiar as coisas numa bolsa e pegando minha doleira para não ser roubada.

—Tô’. Já vou pra sua casa. Deixa a porta aberta.

Como nós vivíamos indo uma na casa da outra isso de deixar a porta aberta era muito comum, e assim não precisávamos parar o que estávamos fazendo para atender a porta.

Quando entrei em seu quarto ela estava fazendo a maquiagem de forma impecável como sempre fazia mas parou para falar comigo e a cara que fez ao olhar meu cabelo foi parecida com a cara da minha mãe - bastante surpresa. Boquiaberta, ela largou o rímel e foi até mim, passando a mão no meu cabelo.

—Cadê o resto?! Nemu, nunca te vi com o cabelo tão curto!

—Mas que tal?

—Ficou ótimo, sua piriguete! Agora sim vão cair em cima de você na festa. Tá uma gata! Arrasou!

Pelas próximas quase duas horas ficamos conversando, tomando Ice e Catuaba e Nicole me falou tudo sobre seus novos crushes (no plural), sem saber qual pegar ou se pegava os dois, mas tinha medo de dar treta porque eram amigos.

—Nicole - falei, fazendo ela ficar quieta por um instante e olhei no fundo dos seus olhos - Quantas pessoas você já pegou só da faculdade?

Era uma pergunta sincera, até porque eu não conseguia manter uma ordem.

—Hmmm - ela pensou e começou a contar nos dedos - Pô, nem foram muitos. Foram só 10.

— “Só 10” - eu ri - Em menos de três meses.

Ela deu de ombros.

—Tenho que aproveitar né? O dia que eu arranjar namorado minha farra acaba. Mas olha aqui: agora o foco é você. Aproveita essa noite amiga. Se joga, se diverte.

Suspirei, rolando os olhos.

—Nic, você sabe que comigo não funciona assim. Eu me sinto desconfortável fazendo isso.

—Não ‘tô falando só disso, é pra você dançar até se acabar. Mas sobre isso, talvez você só tenha pego gente que beijava mal.

Pensei por um instante. Não foram muitas pessoas, então eu podia analisá-las individualmente. Sim, o primeiro beijo foi uma bosta mas tiveram pelo menos dois que não beijavam mal. Eu só não senti nada mesmo. E diante disso, Nicole não teve mais argumentos. Ela apenas disse que era uma sucessão de tentativas e erros.

****

 

A Lapa é um dos bairros cariocas mais boêmios. Boa parte das festas e bares baratos e badalados ficavam por lá, muitos em velhos sobrados reformados para este fim. Existem ruas que ficam intransitáveis de carro pela quantidade de casas noturnas e por conseguinte de gente que fica do lado de fora nas filas, bebendo ou só na rua mesmo. A festa onde estávamos indo não era num sobrado, mas num prédio baixo. A frente do lugar estava repleta de pessoas bebendo coisas baratas para não ter que pagar os altos preços cobrados por drinks e cervejas dentro dessas casas noturnas. A fila felizmente não estava grande, mas a massa de pessoas espalhadas assustava e dava a impressão de ser muito maior.

Engoli em seco. Esperava não me arrepender dessa decisão, como geralmente acontecia. Esperava pelo menos encontrar um lugar lá dentro onde tivesse espaço para  respirar.

Mas talvez eu tenha falado cedo demais. Entramos e o lugar estava muito cheio e para chegarmos na pista tivemos que atravessar um mar de gente esbarrando em nós e nos apertando. A música alta bombardeava meus ouvidos e minha cabeça, anulando meus sentidos.

Nicole me guiou para o andar de cima, onde felizmente tinha um pouco menos de gente e espaço suficiente para dançar. Agradeci internamente por ter bebido o suficiente para estar “alegre” e então me soltar mais para me divertir no meio daquele povo que me jogava de um lado para outro. As músicas eram legais e eu pulava com Nicole, até que o andar começo a encher e eu fui separada de minha amiga. Quase caí quando um cara esbarrou na minha lateral, mas ele me pegou antes que eu levasse mais gente pro chão comigo. Me puxou pela mão e com um sorriso “de príncipe” beijou meus dedos e perguntou:

—Posso saber seu nome?

—Nemuru. - respondi, olhando em volta ao mesmo tempo procurando Nicole.

—Que exótico. -ele continuou - Você me daria a honra de beijar você?

Meu olhar voltou imediatamente para ele. Olhei-o de cima a baixo, analisando, pensando na proposta. Geralmente eu diria não, mas...sei lá. Pensei que eu estava ali para me divertir, minha mente ainda meio alcoolizada...acabei que beijei o cara. Senti a barba dele no meu rosto, as mãos grandes nas minhas costas e mais nada. Eu me senti usada e usando. Meus pensamentos não paravam, minha mente não ficou em branco. Não achei realmente bom, mas sim desconfortável porque no fundo eu estava fazendo sem vontade, sem tesão. Eu me movia por instinto, e após apenas alguns segundos eu não suportei mais e me afastei. Ele me olhou sem entender muita coisa e antes de sair eu disse, dando-lhe um tapinha no ombro:

—Valeu.

E adentrei a multidão de novo para reencontrar minha amiga, pensando em não fazer aquilo de novo. Eu acabava por sempre insistir na mesma coisa, acreditando que seria diferente. Eu ainda não me entendia. Por quê eu não conseguia tirar prazer naquilo? Ou será que talvez todo mundo fosse assim? Mas... não era possível, senão ninguém fazia.

Encontrei um canto com menos gente para respirar e poder olhar para o espaço com um ângulo maior. A multidão pulava à minha frente, mas ali tinha um delicioso vento do ar condicionado que me atingia no rosto. Recostei por um momento numa balaustrada de metal, notando pela primeira vez que tinham pessoas ali ao meu lado. “Ops” pensei ao constatar que estava perto demais de pessoas se beijando. Eram duas garotas e pareciam bem animadas, nem ligando para mim. Ambas mais altas que eu de cabelos longos, uma cheia de trancinhas, a outra com cabelo escuro e tatuagens no braço. Dei alguma distância e voltei a olhar a multidão, mas por alguma razão, elas fisgaram minha atenção. Observei como elas agiam e como cada parte delas se comportava. Esse tipo de cena era uma coisa que eu nunca havia desenhado, e achei interessante. Também me lembrou a Marina.“Ela faz esse tipo de coisa, né?”  pensei “ Será se….Não, que loucura”, me repreendi e percebi que estava encarando demais. Desviei os olhos, sentindo ficar vemelha e percebi que tinha um outro cara me observando. Nosso olhos se encontraram e isso pareceu suficiente para ele se aproximar.

—Quer entrar no meio é? - ele disse.

—Quê? - eu respondi, indignada - Claro que não!

—Parecia, ‘tava encarando elas.

Olhei para ele com uma cara bastante indignada. Eu nunca entraria no meio de duas pessoas assim, falta de respeito. Além do mais, eu não beijaria uma garota. Eu acho.

—Eu gostaria, sabe. Seria bem legal - continuei tentando ignorar e com uma cara bastante infeliz - Mas elas parecem muito ocupadas ali. Quem sabe se a gente se ocupar aqui?

Cruzei meus braços e olhei para o outro lado, recusando, e esperando que minha linguagem corporal o fizesse ir embora. Sem muito efeito já que o álcool parecia ter deixado as percepções dele um tanto dormentes. Ele continuou insistindo comigo por algum tempo e eu ja estava me irritando, quando um braço surgiu nos ombros dele.

—Opaaaaa, vem cá colega. Acho que você já ta passando muita vergonha. A mina não te quer. Vai procurar outro lugar, vai. - ela empurrou o cara para a pista e voltou-se para mim  com um sorriso divertido - Parece que o meu destino é te salvar de caras chatos hein!?

Sorri-lhe de volta nem acreditando que ela estava ali também. Quais as chances?

—Oi Marina! - eu disse, sorrindo um pouco encabulada por ela sempre me ajudar dessa forma, mas definitivamente feliz por vê-la.

 


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