Sangue nas Areias do Foguete escrita por Pierre Ro


Capítulo 21
EXTRA "O que aconteceu aqui, morreu aqui!"


Notas iniciais do capítulo

Oláaa!!

Primeiramente, mil desculpas pela demora! Se vocês não sabiam, então, eu já tinha me planejado para fazer dois capítulos extras. No entanto, acabei me envolvendo com outra história e adiei, adiei e adiei. Mas esses dias decidi me focar e acabar logo com isso.

Enfim, após o último capítulo, achei que seria o caso mostrar para vocês o que aconteceu nas "cenas ocultas". Isto é, nos assassinatos mesmo. Tentei ao máximo censurar as partes mais fortes, mas já aviso que há cenas de violência.

Quanto mais, é isso. Vejo vocês lá embaixo! Boa leitura! ^^



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EXTRA - “O QUE ACONTECEU AQUI, MORREU AQUI”

A festa já estava a todo o fervor. Todos aparentavam estar bem alterados pelo álcool que foi, sorrateiramente, adulterado.

Hugo Torres corria esbaforido até o meio da pista de dança.

— Ei, pessoal! – Ele gritou, no meio da festa, visivelmente alterado pelo álcool – Miguel falou que está na hora dos fogos! – Anunciou, e causou alvoroço com mais gritos entre os formandos.

— Sim! – Afirmou o biólogo, lá em seu bar – Vamos para a praia soltar! Acabou a bebida!

            Com gritos e gargalhadas, todos fizeram como foi sugerido. Com exceção de Christian Drummond e Isabela Ribeiro, que estavam tão envolvidos um no outro, que preferiram permanecer por lá. E Alice Ferreira.

            Enquanto todos ficavam interessados nos fogos de artifício que seriam lançados no céu, Alice, que não havia se alterado pelo álcool colocado em todas as bebidas – inclusive nos refrigerantes e sucos – escondeu-se no banheiro enquanto não olhavam. E então, permaneceu por lá até estar certa de que estava sozinha no primeiro andar da casa.

            Três minutos depois do silêncio, a jovem abriu a porta devagar.

            Suspirou. Era aquele o momento certo para executar seu plano. Engoliu a saliva, levantou a cabeça e respirou fundo.

            Com passos rápidos, mas cuidadosos, ela subiu os degraus, chegando no segundo andar. Olhou para o seu redor. Só haviam as portas que levavam para os quartos de hóspedes. Determinada, foi até o seu. Estava tudo preparado em uma bolsa preta de couro. Ela apenas abriu a porta e pegou o objeto de tamanho médio.

            Olhou a outra escada, que direcionava ao terceiro e último andar do casarão. Era lá onde conseguiria seu prêmio. Subiu as escadas e logo já estava lá. Com apenas três quartos a sua frente. Antes de qualquer coisa, não deixou de notar os gemidos e risadas calorosos vindos do quarto de Christian.

            Apanhou as chaves que recebeu do próprio Rodrigo e a encaixou no quarto dele, abrindo com facilidade. Acendeu as luzes, finalmente.

            Era a hora de procurar.

            Colocou a bolsa na cama e, rapidamente, abriu o guarda-roupa do governador. Estava à procura de qualquer coisa que pudesse incriminá-lo. Tirou do lugar as roupas de cama, papéis, livros, entre outros objetos.

            No entanto, após dez minutos que estava no quarto, sentiu a presença de Christian Isabela se aproximando. Seu coração disparou. Precisava fazer alguma coisa para não ser vista.

            Imediatamente, pegou sua bolsa e se direcionou para a retaguarda da porta, esperando por eles. Mordeu os lábios. Seu rosto suava de nervoso.

            Não demorou muito e a maçaneta se mexeu. O filho do governador abria a porta. Alice fechou os olhos, tentando se concentrar em uma forma eficiente de se esconder.

            Entre carícias e beijos, Christian e Isabela entraram no recinto. O rapaz trajava apenas a sua cueca, enquanto a moça vestia a calça e um top. Para o alívio da psicóloga, eles estavam tão entretidos que nem perceberam a presença dela.

            Imediatamente, Alice apagou as luzes, deixando-os no escuro no momento em que ambos caíram na cama, rindo e pronunciando sons inteligíveis.  

            Aproveitando-se da baixa luminosidade, Alice saiu sorrateiramente pela porta e a fechou. Respirando aliviada com aquilo.

            Havia falhado em encontrar alguma prova comprometedora no quarto de Rodrigo, mas isso não significava que desistiria de procurar nos outros quartos. Optou por fazer isso no de Beatriz.

            Apanhou suas chaves novamente e, sem perder muito tempo, foi ao quarto do meio, cujo a dona era a filha do governador e trancou a porta.

            Acendeu as luzes e começou a procura. Vasculhou tudo o que podia. Entre uma série de roupas, cosméticos, eletrônicos e papéis, Alice encontrou em uma mala no fundo do armário da jovem, a bolsa de um computador.

            Seus olhos brilharam quando viram aquilo.

            Pegou o objeto e o pôs sobre a cama. Abriu o zíper e retirou, com todo o cuidado, o aparelho de ótima qualidade.

            Alice respirava fundo. Ligou o notebook e logo se viu obrigada a inserir uma senha.

            Praguejou, mas aquilo não havia desanimado a moça. Afinal, ela já esperava por aquilo. E já estava preparada para enfrentar aquele obstáculo.

            Voltou-se para a bolsa que levava consigo e retirou, de lá, o seu próprio computador portátil, deixando este ligado ao lado do aparelho de Beatriz.

            Há algumas semanas, Alice havia conseguido se infiltrar no computador da filha do governador através de um vírus. Nele, ela conseguia acesso de cada caractere digitado. E foi assim que descobriu a senha.

            Rapidamente, a Área de Trabalho foi iniciada. Não precisou de uma busca muito minuciosa para encontrar conversas de Rodrigo com outros políticos, bolando esquemas de corrupção, recibos ilícitos, cadastro em sites de compra e venda de produtos ilegais e até mesmo fotos de pedofilia, que envolviam, não apenas o governador, mas também Christian. Instantaneamente, a jovem passava todas aquelas informações para o seu computador.

            Ao todo, Alice ficou trinta minutos no quarto, quando achou que não tinha mais o que pegar. Guardou tudo dentro de sua bolsa e a escondeu embaixo da cama.

— Ainda não estou satisfeita! – Falou, para si mesma, enquanto se voltava novamente para a sua bolsa – Falta ainda a parte mais importante...

            E então, ela apanhou a sua câmera semiprofissional. Esboçando um sorriso malicioso, Alice posicionou o objeto escondido em cima do armário, onde havia uma brecha, em um ângulo que capturava praticamente todo quarto.

            Eram 00:10, quando Beatriz recebeu a seguinte mensagem em seu celular:

Allieda: Oi, Bia! Acho que temos algumas coisas para conversar. Vem aqui no seu quarto, linda. Quero te ver

♦ ♦ ♦

            Mesmo sem todo mundo lá, Miguel Cordeiro se voluntariou para soltar os fogos. Eram trinta quilos do material, de ótima qualidade.

— Bom saber como é gasto o nosso dinheiro! – Comentou Camila, para Hugo Torres, que estava ao seu lado. Em seguida, ambos gargalharam.

            Eram 23:50 quando foi lançada a primeira rajada de fogos de artifício, que foi motivo de pulos de alegria e gritos dos estudantes, que viam aquilo como algo formidável e incrível.

— Que demais, garotas! Olhem isso! – Falava Taís Pontes, dando um abraço apertado nas amigas Micaela e Débora, que riam feito crianças.

            Não esperaram muito e logo veio uma nova leva de fogos. E, então, em três minutos, tudo já tinha se explodido no ar.

            Animados, os adolescentes gritavam, abraçavam-se e gargalhavam com tudo aquilo. Porém, já tinha acabado e, portanto, deveriam voltar para a casa.

            De repente, observaram não muito distante dali, um grupo de cerca de cinco jovens um pouco mais velhos, também animados e festeiros. Vestidos como eles. Deixaram-lhes se aproximar, para ver o que queriam.

— Olá rapaziada! – Falava um homem de, no máximo, vinte e cinco anos, com a blusa desabotoada, deixando aparecer seu peitoral negro e seus pelos crespos. Ele fedia a álcool – A gente está fazendo uma festinha ali também. Estão todos convidados!

— Opa! – Gritou Fernando – Vamos lá, galera! – Todos berraram de volta, em alegria, e correram para a festa que acontecia não muito distante dali. Cerca de apenas duzentos metros.

— Qual seu nome? – Indagou Miguel para o rapaz, curioso, enquanto caminhavam para lá.

— Ah, sou Marlon Fletwood, cara! Tu conhece a Alice?

— Conheço sim, ela estava aqui ainda pouco. Depois ela vem!

— Ah, sim. Tomara mesmo, né! – Respondeu, rindo bastante, nitidamente embriagado.

— Ei! Notaram alguma coisa? – Perguntou Hugo, para os outros que estavam perto.

— O quê? – Disse a professora Susana.

— Beatriz estava aqui. Mas não está mais.

— É mesmo! – Admirou-se, percebendo a verdade. Olhou para seu relógio. Já eram 00:20.

            No entanto, não tocaram novamente nesse assunto. Eles entraram em um salão que organizava festas todos os sábados. Lá era maior e tinha mais gente. E mais bebida também. Os jovens ficaram lá dançando, conversando e bebendo por um bom tempo.

♦ ♦ ♦

            Com passos largos e trêmulos, Beatriz caminhava dentro de sua casa de praia. Sua cabeça latejava, estava meio tonta devido a bebida. Porém, sabia o que estava fazendo ainda.

            Subiu até o terceiro andar, soltando uns gemidos entre o caminho.

            Abriu a porta do seu quarto.

            A mulher que conversou com ela durante meses anonimamente estava a sua frente, de costas para a jovem, com o rosto virado para a janela. Parecia admirar a luz da lua e das estrelas que refletia no mar.

            Ao ouvir o som da porta se abrindo, Alice virou seu corpo para a jovem.

            Por alguns instantes, reinou apenas o silêncio. A psicóloga fitava sedutoramente a estudante, que ficara chocada com a presença extremamente marcante característica da bela mulher.

            Por um momento, Beatriz esqueceu de tudo aquilo que a mais velha havia feito.

— Bia... – Ela começou a se pronunciar, passando a mão pelos seus braços e virando a cabeça para os lados, falando de um jeito doce, que derreteria o coração de qualquer um – Acho que temos que conversar, não é mesmo?

            A jovem suspirou.

— Diga.

— Primeiramente – Foi se aproximando, deixando a filha do governador cada vez mais tensa e ansiosa – Eu quero pedir perdão. Perdão por não ter contado logo quem eu era. Não fui honesta contigo. Gosto tanto de ti e não queria perder aquele nosso relacionamento...

— Mas... Por quê?                                                                                                  

— Sabe, eu fiquei aqui... Lembrando de tantas coisas que a gente conversou. Você se recorda de tudo?

            Ela engoliu a seco. A voz suave de Alice havia bloqueado todo o pensamento ruim de seu coração. Já não via mais a mulher que tanto odiava. E ela aproveitava isso para chegar mais perto.

— Sim... Tantas coisas...

— Lembro quando você falou, pela primeira vez, que era lésbica. Que não gostava de meninos. Mas que não podia dizer isso, pois seu pai era um preconceituoso babaca, que te mataria se descobrisse.

            Elas riram.

— Lembro. E não era brincadeira.

— Coisa hipócrita. Não pode gostar de outras meninas, porém, pode bater na mulher, pode comprar votos, sonegar impostos, lavar dinheiro, realizar obras superfaturadas, entre outras coisas que ele faz! – Alice pegou nas mãos da garota e a puxou, delicadamente, para a cama, onde ficaram sentadas, com a mais velha acariciando os cabelos da mais jovem enquanto olhando fixamente em seus olhos azuis.

— Sim. Ele faz tudo isso... E você não sabe do pior...

— Imagino. Um homem desse não me surpreenderia se, também, traficasse pessoas para suas próprias maldades.

            Beatriz já estava se sentindo bastante à vontade conversando, que nem notou a verdadeira intenção da outra. Pelo contrário, falava tudo com a maior naturalidade, e rindo.

— E se eu te falasse que ele já fez coisa parecida? – Ela falou.

— É um psicopata, realmente! – Comentou.

— É... Mas por que estamos falando do meu pai? – Beatriz disse, em um momento de ousadia. Segurou nas mãos da mais velha e avançou, querendo dela um beijo e, em seguida, algo ainda mais íntimo.

            O coração de Alice disparou naquele instante e, sem pensar muito, espontaneamente ela recuou.

            De repente, um silêncio perturbador tomou conta daquele recinto.

            Alice fitava a jovem com os olhos arregalados e as mãos trêmulas. Recusar um beijo naquela hora era mostrar que ela realmente não estava interessada em nada com a estudante. E ela percebeu isso.

            Beatriz abaixou a cabeça, quando todos os seus pensamentos negativos vieram novamente. E então, levantou-se da cama novamente. Dessa vez, não parecia a mesma pessoa. Franzia o cenho, cerrava os punhos e mantinha a veia da testa saltada.

— Vadia! Como eu fui acreditar em você? – Esbravejou, expressando toda a raiva que sentia dentro de si.

            Porém, apenas xingá-la não bastava. Olhou para o lado e avistou a cadeira que usava para utilizar seu computador e estudar. Rapidamente, pegou o objeto pelo encosto e, sem pensar muito, avançou contra Alice.

            A mulher ficou paralisada, movendo-se apenas quando percebeu que seria atacada. Mas era tarde.

            Com toda a força que tinha, Beatriz bateu com as rodas da cadeira na cabeça da psicóloga, provocando um ruído alto. A mulher caiu no chão, desacordada, com uma marca roxa no lugar onde foi a pancada. Respingos de sangue também se encontravam ao redor.

— Meu Deus... – Beatriz disse para si mesma, após ver a cena na sua frente. Quando finalmente, reconheceu que havia exagerado. – Eu matei uma pessoa!

            Suas pernas tremiam. E, sem suportar, ajoelhou-se bruscamente. Pôs a mão no rosto e um olhar de desespero se fez em sua face.

            Após alguns minutos, ela respirou fundo e pegou seu celular, enviando uma mensagem para Sabrina e Calista, pedindo que elas fossem até o quarto dela imediatamente.

            Quinze minutos depois, as duas entraram na casa. Sem a menor noção do que estava acontecendo.

            Beatriz avistou as suas amigas enquanto descia as escadas para o primeiro andar e correu até elas.

— Meninas! Eu preciso da ajuda de vocês! É urgente! – Ela implorou, com seus batimentos cardíacos acelerados e as pupilas retraídas, contrastando com o semblante leve e divertido das outras.

— Que foi, miga? Bora curtir a festa! – Sabrina falou, e as duas gargalharam. Fediam a álcool.

— É a Alice... – Ela fez uma pausa, com medo da reação delas após a notícia – Ela está morta no meu quarto.

            Imediatamente, as expressões das duas mudaram. Calista arregalou os olhos e arqueou as sobrancelhas.

— Como assim? Ela desmaiou de tanto beber, foi isso?

— Não, Calista! Eu preciso que vocês me ajudem! Ela está morta mesmo. Eu vi! Tem sangue espalhado no chão e ela está lá... Caída. – Ela dizia, nervosa, enquanto se lembrava de tudo o que fez minutos atrás.

— Bia... – Sabrina disse – Você está me deixando preocupada! Como isso foi acontecer?

            A jovem então respirou fundo e fechou os olhos, não contendo uma lágrima, que caiu do seu olho.

— Eu não queria... Mas acidentalmente, eu acho que a matei.

            Sabrina cerrou os punhos e começou a roer sua unha. Mexendo a cabeça, como em negação a tudo aquilo.

— Você tem certeza que ela está morta, Bia? – Perguntou Calista, aflita.

— Eu não sei. Mas ela não se mexe. Por favor, me ajuda a resolver esse problema, amiga! Por favor!

            As duas olharam entre si, contraindo os músculos. Sabrina, então, suspirou e assentiu.

— Ok. Vamos lá ver!

            As três entraram no quarto. Notaram um som vindo no quarto de Christian, mas nem se importaram, pois estava acompanhado do barulho de rádio que divertia o casal em seu momento íntimo.

            Tudo estava no mesmo lugar de antes. A cadeira jogada no chão, com a sua base ensanguentada. O corpo da jovem jogado, com um ferimento grave na nuca, onde escorria o sangue que sujava o chão.

— Oh, meu Deus! – Sabrina exclamou, pondo a mão no rosto.

— Calma! – Calista tentou tranquiliza-las – O que aconteceu aqui, Bia? Explica para a gente!

            Ela gelou, por uns instantes. Virou-se para a sua amiga e mordeu os lábios, antes de falar qualquer coisa. Não podia contar a verdade.

— Ela tinha me chamado para conversar e começou a falar muitas coisas sobre mim. Ela me ofendeu, ofendeu minha família e meus amigos. Eu estava sob o efeito do álcool. Não me contive e a ataquei com a cadeira.

— Espera... – Calista disse, analisando bem o corpo – Ela não está morta!

            Um alívio enorme percorreu o corpo de Beatriz e Sabrina, então. Ambas puseram a mão sobre o peito e se aproximaram, para se certificar se era verdade.

            Calista se agachou perto do corpo e pôs dois dedos em cima da traqueia da mulher, sentindo os batimentos cardíacos normais dela.

— Gente, ela não morreu. Só está desacordada! – Ela falou, sorrindo surpresa.

— Ok. Mas a gente ainda precisa fazer algo! – Sabrina comentou, observando que ainda tinham um problema.

— Vamos limpar esse sangue, arrumar o quarto e deixa-la deitada sobre a cama, como se nada tivesse acontecido! – Beatriz falou, após pensar bastante a respeito – Não é o melhor dos planos, mas acho que não tem outra coisa para fazer.

            As duas assentiram, e fizeram como o combinado.

            Enquanto Calista e Sabrina se esforçavam para levantar o corpo da irmã de Vinícius e coloca-la na cama, Beatriz foi ao banheiro pegar papel higiênico e pano para limpar a sujeira. Ao voltar, ela mesma secou e estancou o sangue da vítima e secou o chão, deixando, sem querer, que parte do esmalte de sua unha sujasse no papel também. As outras se preocuparam em organizar a bagunça. Como não haviam encontrado uma das rodas da base da cadeira, deixaram-na assim mesmo, pensando que não perceberiam esse fato.

— É, meninas... – A loira falou baixo, após tudo ter sido arrumado como planejou – Acho que é isso. Muito obrigada por tudo! Eu devo uma para vocês. Agora, ela deve acordar e voltar a agir como se nada tivesse acontecido. E nós também. Porque o que aconteceu aqui, morreu aqui. Certo?

            Ambas assentiram, em concordância. E então, elas se abraçaram rapidamente. E seguiram até a festa.

            Lá, preocuparam-se em agir normalmente. Tiraram fotos, beberam, comeram, dançaram e curtiram. Pelo menos, deixaram aparentar isso.

♦ ♦ ♦

            Eram duas horas da manhã, em ponto, quando Alice acordou. Sua cabeça latejava de tanta dor que sentia. Levantou-se devagar, pondo a mão na nuca, no exato local onde foi lhe dada a pancada.

            Ainda meio desnorteada, a mulher observava o quarto em que se encontrava até sua memória voltar. Foi quando percebeu o que havia acontecido. Tinha acabado de ser agredida pela filha do governador. Apesar da dor e do risco de morte que correu, empolgou-se, pois se lembrou da câmera que gravava tudo o que ocorreu naquela noite.

            Apressadamente, ignorou o desconforto e foi até o armário pegar a câmera, para descobrir o que foi capturado.

            Assim que a pegou, parou a gravação, que ainda ocorria, e voltou até o início, esperando pelo momento em que Beatriz fez sua confissão. Observava tudo contente. Com um largo sorriso no rosto. Sentada na cama.

            Atrás da porta do quarto, o olho castanho direito de Camila enxergava Alice de costas, e com seus ouvidos, ouvia suas risadas. A psicóloga parecia estar orgulhosa. Afastou-se, então. Já estava perseguindo a irmã de Vinícius sorrateiramente fazia um tempo. Mas aquela seria a última vez. Pois parte de seu plano seria concluído, finalmente.

            Rapidamente, voltou-se para as escadas e correu em direção a cozinha. Estava prestes a cometer o maior crime de sua vida. Então, precisava ser cautelosa. Lembrou-se do pé-de-cabra que, outro dia, Jorge Rodrigues guardou, na frente de todo mundo.

            Em menos de dois minutos, já estava de volta portando sua arma.

            Nesse meio tempo, Alice desligou a câmera e a apoiou no mesmo lugar de antes, só até ela terminar de guardar o resto de suas coisas na bolsa.

            Assim, armazenou, com cuidado, o computador, onde ficou reservado a maior parte das informações.

            De repente, ouviu a porta se abrir atrás de si.

— Oi, Alice! – Ouviu uma voz conhecida atrás de si. Virou-se imediatamente e avistou Camila Barbosa, a ex-namorada de seu suposto irmão. Ela se aproximava com passos muito lentos e uma expressão serena no rosto. Suas mãos permaneciam para trás, parecendo esconder algo. – O que está fazendo?

            Alice ficou paralisada. Não devia ter demorado tanto ali. Mas já era tarde. Precisava dizer alguma coisa para despistar.

— Oi Camila! Eu estou pegando um remédio que a Bia me pediu. Estou saindo daqui já. E você? O que faz aqui? A festa está tão boa...

            Ela virou a cabeça e levantou um pouco o queixo, esboçando um sorriso leve, enquanto fitava a moça agachada guardando seus pertences.

— Remédio? Que história mal contada. Não vou poder deixar você sair daqui agora... – falou, calmamente, deixando a outra nervosa.

— Ué? Como assim, Camila? Não vai me deixar sair? – Ela disse, tentando mudar de assunto. Mas Camila estava determinada.

— Não antes de eu te matar, sua vadia! – Camila falou, há aproximadamente dois metros de distância. Foi então que revelou o pé-de-cabra em suas mãos.

            Alice gelou. Arregalou os olhos e se jogou para trás, em uma tentativa falha de fuga.

            Em um movimento rápido, Camila jogou o braço direito, que segurava a arma branca, para trás e girou com toda a força que tinha contra a cabeça da outra. A vítima não teve nem como se defender. Caiu desacordada novamente.

            Dessa vez, a pancada foi bem mais grave que a de Beatriz. Alice não tinha chances de sobreviver depois desse golpe. Ela já estava no chão, deitada, com bastante sangue em volta. Sem vida.

            A respiração de Camila estava pesada. Já havia cometido o crime, mas tinha que ter a certeza de que Alice estava morta.

            Com todo o fôlego que restava, repetiu o processo mais duas vezes com a vítima inconsciente e, então, parou.

            Observou a janela. Para a sua felicidade, não havia pessoa alguma por perto. Era aquele o momento.

            Pegou o cadáver pelas axilas e levantou, fazendo bastante esforço para levantá-la até a janela. Finalmente, conseguiu. Mas para isso, sujou bastante a sua roupa de sangue.

            Olhou seu relógio. Eram duas horas e dezoito minutos.

            Respirou fundo e levantou o corpo de Alice novamente. E então, lançou-a do terceiro andar. Alice caiu de cabeça, quebrando seu pescoço. A partir desse instante, muito sangue começou a jorrar daquele lugar.

            Camila sabia disso, e não deixaria assim.

            Primeiramente, olhou ao seu redor. O quarto de Beatriz estava bastante sujo com o líquido escarlate. E então, precisou pegar um pano úmido para a limpeza do local.

            Não demorou muito até tirar todas as manchas e remover suas impressões digitais de todos os lugares possíveis. Era a hora de tratar do corpo.

            Porém, eram duas horas e vinte e três minutos quando olhou pela janela e notou que o cadáver já não estava mais lá.

            Mais a frente, descobriu o porquê. Tomas havia acabado de passar por lá. Mas ao invés de buscar ajuda, viu na morta a oportunidade de fazer alguma coisa ilícita, que Camila já suspeitava o que seria, mas não falou nada.

            Agradeceu em pensamento ao seu colega de classe, por ter facilitado o seu trabalho. Pegou a sua arma do crime e voltou para a janela. Mirou no arbusto mais próximo, e lançou lá, atingindo bem no meio do mato, escondido.

            Fechou a janela, e virou-se para as coisas que Alice guardava.

            Não se conteve. Seu plano havia funcionado. Se tudo desse certo, seria milionária e conquistaria seu maior sonho de conhecer o mundo.

            Gargalhou por um minuto e, então, pegou tudo que viu ser de Alice.

            Rapidamente, retirou-se do recinto, indo em direção ao seu quarto, trocar de roupa. Guardou a outra para jogar fora mais tarde.

            A assassina foi, ainda, no dormitório da vítima, para pegar todos os outros pertences que achou importante. Desde folhas de caderno até pen drives, celulares e tablets. Com exceção da câmera, que passou despercebida.

            E então, voltou à festa, radiante. Como se nada tivesse acontecido.

♦ ♦ ♦

            Após todos voltarem para a casa, foram recebidos por Rodrigo Drummond, que estava irredutível em sua proposta de acabar a viagem ali mesmo, devido a desobediência.

            Todos retraíram para seus devidos quartos após levar a bronca.

            Eram quatro horas da manhã. No entanto, Miguel Cordeiro não havia dormido ainda. Pelo contrário, como estava sóbrio, soube fingir muito bem para os outros que havia ido descansar. Olhou para os rapazes ao seu redor. Ninguém estava acordado.

            Lembrou-se do elemento extra que colocou na bebida deles. Conhecia seus efeitos.

            Levantou-se com cuidado e abriu a porta do cômodo sem fazer barulho.

            Observou todo o segundo andar. Nenhum sinal de alguém acordado. 

            “Se a Alice fugiu, por que ela não me manda mensagens? Ela não fala comigo desde quando avisou que ia chamar Beatriz para o seu quarto” Ele pensava.

            Sorrateiramente, o jovem subiu as escadas, rumo ao terceiro andar.

            Logo abriu a porta do quarto da filha do governador.

            Ergueu as sobrancelhas quando viu tudo em ordem. Pelo que imaginava, Alice teria revirado tudo ali. Todavia, ele deu de ombros para esse fato.

            Vasculhou todo o cômodo por quase dez minutos. Procurando por alguma pista de sua amada, em vão. Já ia desistir, quando finalmente olhou para cima do armário, quando viu uma câmera escondida.

            Era justamente a câmera semiprofissional de Alice.

            Ele engoliu a saliva e apanhou o objeto, confuso. Afinal, por que ela deixaria a câmera ali? Aquilo não fazia sentido para ele.

            Pegou o objeto e viu que restava pouca bateria. Mas mesmo assim resolveu reproduzir o último vídeo gravado, avançando o tempo quando achava necessário.     

            Nada aconteceu nos primeiros quinze minutos de vídeo, mas após isso, a câmera capturou uma desavença entre Alice e Beatriz, sendo que, no fim, a loira agredia a psicóloga, deixando-a desacordada. Após algum tempo, Calista e Sabrina também apareceram para adulterar a cena. Cerca de duas horas depois, Miguel viu a cena de Alice acordando.

            A última imagem o fez suspirar. “Alice está bem, então. Deve ter esquecido a câmera aqui, mas eu vou leva-la. Amanhã vou tentar entrar em contato. E se nada der certo, irei fugir daqui” Ele pensou.

            Rapidamente, saiu do quarto carregando a câmera, levando-a até a sua cama, onde dormiu pelas próximas duas horas.

            Ao acordar novamente, o sol já havia nascido. Apesar de ainda estar com bastante sono, preferiu se levantar para ver, antes de todo mundo, o que acontecera na noite anterior.

            Até encontrar o corpo de Alice Ferreira, morta, nos fundos da casa.

♦ ♦ ♦

            O relógio marcava seis horas da noite.

            Miguel não podia acreditar. Fazia algumas horas que ele descobriu que sua amante havia morrido. Porém, não podia contar a ninguém.

            O jovem estava na praia, sentado na areia, avistando o mar, vestindo apenas seu calção de banho e um óculos de sol. Em sua cabeça, passava todas as memórias boas que vivera com Alice.

            Não conseguia controlar o cair das lágrimas. Afinal, era para isso que havia saído da casa de Rodrigo. Para poder chorar em paz, sem ninguém falar nada a respeito.

            Deixava a brisa refrescar seu rosto, enquanto seu coração pulsava de tristeza pela perda de uma pessoa tão querida.

            E principalmente, pelo desejo de vingança.

            “Alguém fez isso com ela. Esse alguém vai pagar.” Pensava, consigo.

— Por que ainda me pergunto? Obviamente quem fez isso foi o Rodrigo! Foram queimadas todas as provas dos crimes dele! – Ele falava para si – Mas pode ter sido a Beatriz também. Ela tentou matar Alice uma vez, pode ter tentado de novo e conseguido.

            Ele respirou fundo, tentando manter a mente calma e fria.

            Levantou-se do chão e se virou até a casa. Com passos largos e firmes, foi até a sala. Estava acontecendo o interrogatório com todos os suspeitos pela detetive Louise Ferguson.

            Precisava ver novamente os registros da câmera.

            Subiu o segundo andar e logo notou seu quarto fechado. Aproximou-se da porta e girou a maçaneta, sem sucesso. A porta estava trancada por dentro.

            Seu coração disparou e seus olhos se arregalaram. Era lá onde estava a maior prova que tinha contra a família Drummond e alguém estava sozinho com ela. Certamente alguém que usaria isso contra ele mesmo.

            Felizmente, ele sempre andava com a chave. Tirou-a do seu bolso e a pôs na fechadura. Assim, abriu com facilidade.

            Bruscamente, empurrou a porta, e logo viu a cena que mais temia. Hugo, um dos estudantes, estava segurando a câmera de Alice. Imediatamente, trancou a porta de seu quarto, para que ninguém mais entrasse.

            O garoto automaticamente se virou para o estagiário, espantado. Tentou falar alguma coisa, mas apenas gaguejou sons incompreensíveis.

            “Maldito! Matou Alice e está, agora, atrás das provas!” Pensou ele, furioso, enquanto se aproximava do rapaz.

— M-Miguel... – Ele tentava dizer, enquanto recuava – O que você...

            Em um movimento rápido e sem pensar muito, Miguel segurou o braço de Hugo e o puxou para perto de si. Antes que o jovem pudesse gritar por socorro, ele levou sua mão direita sobre sua boca.

            Posicionou sua perna esquerda atrás das duas pernas do rapaz e o empurrou, derrubando-o no chão, mas caindo junto com ele. Hugo estava de costas para Miguel. O mais velho, em um movimento habilidoso de artes marciais, imobilizou o corpo de seu adversário com as pernas, e com seus braços, pressionou seu pescoço.

            A face, normalmente branca, do rapaz de óculos, agora estava avermelhada. Não conseguia pronunciar palavra alguma, mas se debatia na medida do possível. Contudo, Miguel era muito mais forte e ágil que ele. O fluxo de oxigênio que ia para o cérebro foi interrompido, e ele foi perdendo cada vez mais o fôlego e a consciência.

            Por fim, parou de mexer. Estava morto.

            Miguel, quando notou aquilo, permaneceu por alguns segundos pressionando com toda a sua força aquele que acreditava ser o assassino de sua namorada. Enfim, parou.

            Levantou-se e viu o que tinha feito.

            De repente, seu estômago embrulhou. A ficha de ter matado uma pessoa finalmente caiu.

            “E se não foi ele?” Ele pensava, horrorizado “E se eu matei um inocente?”.

— O que foi feito, foi feito. Não posso deixar ele aqui – falava para si mesmo, em um tom baixo.

            Observou as coisas ao seu redor. Viu a cama que estava deitado e fez sua decisão. Puxou o corpo sem vida do rapaz e o colocou embaixo da cama. Cobriu-lhe com uma manta, para que ficasse escondido.

            “Vai ficar aqui até que eu encontre um lugar melhor” ele dizia em seus pensamentos.

            E então, retirou-se do quarto e voltou para a sala, tentando agir naturalmente.

♦ ♦ ♦

            Eram oito horas da noite quando Rodrigo Drummond havia chegado, novamente, em sua casa, com seu carro.

            Estacionou o veículo, onde desceu toda a sua família. Haviam saído para espairecer a mente, mas queriam voltar para ver o que aconteciam em sua casa. Emily aproveitou para cozinhar para seu marido e filhos do coração.

            Antes disso, ela deixou sua bolsa no sofá, onde continha a chave do automóvel.

            Miguel fitava a chegada deles sentado na sala. Naquela hora, os detetives já haviam ido embora. Fez questão de estar em um lugar bem visto por todos, para que ninguém desconfiasse do que executaria naquele momento.

            Passados alguns minutos, as pessoas que estiveram na sala saíram para diversos lugares. Quando finalmente ficou sozinho, aproximou-se da bolsa de Emily e a vasculhou, pegando facilmente sua chave.

            Era o momento.

            Já era noite. Muitos dos estudantes tinham saído para a praia, alguma praça ou orla. Só ficaram Miguel, a família Drummond, Tomas, Micaela, Camila, Fernando e Susana.

             O estagiário subiu até o segundo andar, sem chamar atenção. Passou pela porta dos outros quartos. Em um deles, estava a ex-namorada de Vinícius e monitora de informática, utilizando seu computador enquanto Micaela lia um livro de romance. O segundo quarto estava trancado, observou a fechadura e se espantou ao ver Susana e Fernando se beijando. Todavia, não se importou com isso. No outro quarto, Tomas dormia profundamente. Tinha a ciência de que Beatriz e Christian estavam em seus respectivos quartos.

            Tudo indicava que aquela era a hora certa.

            Foi até o seu quarto e abriu a janela. Observou a sua volta. Nenhum sinal de pessoa alguma. Embaixo da janela, havia uma moita. Voltou-se para o cadáver embaixo da sua cama. Teve sorte que ninguém entrou no quarto durante a última hora, pois o corpo começava a exalar um odor repugnante.

            Ainda enrolado pela manta, o corpo foi jogado pela janela. Mas o impacto contra o chão não ocasionou um barulho forte, pois foi abafado com a mata e a areia sobre o solo.

            Com rapidez, Miguel desceu o segundo andar, passou pela sala e foi até a parte externa da casa.

            O local onde o automóvel de Rodrigo era a poucos metros. Aproveitando-se do fato de ninguém estar o observando, abriu o porta-malas do carro e o deixou assim.

            Em seguida, foi até o corpo de Hugo. Carregando-lhe sobre seus braços, deixou-o no carro e fechou. Depois disso, deixou novamente a chave na bolsa e saiu de casa.

            Sentiu fome. E então, foi comer em uma lanchonete. Ainda pensando no que havia feito.


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Notas finais do capítulo

E aí? O que acharam dessas cenas? Eu acho que as reescrevi umas três vezes, porque não gostava do resultado. Após muitas revisões, acho que essa vez saiu bom. No entanto, se virem algum erro, por favor, podem falar comigo.

Fiquem à vontade para falar de qualquer outra coisa que acharam da fic também. Estou sempre a disposição de ouvir críticas e aprender com os conselhos dos outros.

Também vou postar um outro capítulo extra o quanto antes. Dessa vez, vai ser como um epílogo mesmo. Espero que gostem também!

Então, até lá! o/



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