HERÓIS escrita por Felipe Arruda


Capítulo 8
A Dança das Sombras




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Kayo viu a hora em que o último andar começou a explodir. Primeiro foram às janelas que se partiram em milhares de pedaços. Em seguida a parede começou a rachar de forma inacreditável. Ele estava parado próximo à calçada olhando para o alto de boca aberta.

As rachaduras nas paredes ganharam mais força e ficaram maiores. O prédio estava simplesmente rachando, como a casca de um ovo quando o partem ao meio. De repente uma estranha labareda começou a iluminar o último andar o que foi o start para o caos.

As pessoas saiam correndo de um lado para o outro, os vidros continuavam se partindo, o fogo parecia tomar uma dimensão assustadora e o prédio parecia estar sendo arrancado do chão.

— Meu Deus – disse ele num sussurro. As pessoas paravam seus carros na rua para ver o que acontecia com o prédio. Alguns pedestres começaram a filmar com seus celulares o prédio se partindo ao meio.

Kayo olhou para alto e viu uma figura humana caiando do último andar. Ele cerrou os olhos, mas não conseguiu distinguir quem era, sabia apenas que era um corpo humano em total queda livre. Num impulso, Kayo se teletransportou para o alto e agarrou o corpo antes dele chegar ao chão. Quando Kayo se teletransportou para o chão de novo, ele e o corpo rolaram pelo asfalto do estacionamento da clínica ao mesmo tempo.

Ele viu Ian sentar atordoado no asfalto. Seu rosto estava pálido e ele tremia.

— O que aconteceu? – Perguntou Kayo se levantando e dando a mão para Ian se levantar também.

O rapaz encarou o último andar do prédio.

— É a Jaqueline – disse ele. O prédio havia desgrudado alguns centímetros do chão quando de repente um silêncio assustador tomou conta do ambiente. Ian olhou para Kayo. – Ágata está no corredor do último andar – disse ele. – Eu não posso mais me teletransportar...

Kayo fez um sinal positivo com a cabeça e em questão de segundos, virou uma estranha fumaça azul.

○○○

As pessoas corriam de um lado para outro gritando e chamando por ajuda. Richard estava parado na frente da clínica e encarava o prédio flutuando de boca aberta. O terceiro andar explodiu o que fez as pessoas que corriam de um lado para o outro se jogarem no chão protegendo a cabeça dos destroços que caiam na rua.

Um grande estilhaço da janela caiu sobre um carro quase ferindo uma mulher. Ele encarou aquilo preocupado.

— Minha esposa – gritava um senhor de idade sentado no meio fio. Ele tentava levantar, mas as pessoas ao redor dele não deixavam – minha esposa está lá dentro – ele gritava desesperado.

Richard ouviu a sirene de uma ambulância se aproximando ao longe. O corpo de bombeiros também estava se aproximando, num impulso ele começou a correr em direção à entrada da clínica, tendo de desviar das pessoas que corriam na direção oposta a ele.

O teto da recepção estava desabando aos poucos. Havia poeira do cimento do teto que despedaçava por todos os cantos e canos de água estourados por todos os lados. Richard se concentrou em meio ao caos e conseguiu ouvir uma voz fraca pedindo por ajuda.

Ele correu até o final da recepção onde encontrou uma senhorinha embaixo de alguns canos de água que havia caído do segundo andar. Ela estava encharcada e não conseguia andar. Richard tirou os canos com cuidado e a agarrou pela cintura a ajudando a ficar em pé.

— A senhora consegue andar? – ele perguntou. A senhorinha fez que sim com a cabeça, mas a perna esquerda dela sangrava. Os dois começaram a andar em direção a porta de saída quando o teto desabou trancando parcialmente a passagem. – Merda – disse ele. A senhorinha se desequilibrou e os dois caíram de bunda no chão.

O cheiro de gás era insuportável e como se Richard já esperasse por aquilo, o segundo andar se rompeu em chamas depois de uma explosão. Ele viu o momento em que uma onda de fogo vinha em direção aos dois e instintivamente abraçou a senhora, tentando cobrir o máximo possível do corpo dela.

Ela gemeu de dor quando uma parte de sua perna esquerda, exposta por conta do vestido, foi atingida pelo fogo. Richard sentiu seu pescoço, costas, braços e pernas virarem carne viva.

Quando a onde flamejante passou, ele se colocou de pé no mesmo instante que o corpo de bombeiro entrou no prédio, abrindo caminho entre os destroços do teto e liberando a passagem que havia sido bloqueada.

— Aqui! – Gritou Richard. – Aqui!

Um homem alto e negro usando a roupa do corpo de bombeiros foi rapidamente até onde os dois estavam e pegou a senhora no colo correndo rapidamente em direção à saída. Richard foi logo atrás com o coração acelerado. Outra explosão chegou aos seus ouvidos em algum dos andares acima dele.

Já na rua, o caos era iminente. Richard viu a senhora sendo levada para uma ambulância no mesmo instante que o senhor sentado na calçada os alcançou segurando à mão da senhorinha que parecia bem diante as circunstancias.

Outro homem do corpo de bombeiros veio correndo em direção a Richard, mas quando ele chegou perto do garoto se assustou ao ver que ele não tinha um arranhão se quer.

— Como...? – Perguntou o homem intrigado.

Richard o encarou sério e em seguida desviou os olhos para o outro lado da rua onde viu Ágata e Kayo. Rapidamente ele se colocou a andar em direção aos dois.

— Estou bem – disse ele para o bombeiro e em seguida o deixou parado completamente embasbacado.

○○○

Ágata abriu os olhos e se deparou com um prédio parcialmente destruído. A noite de inauguração havia sido um desastre. Pessoas corriam de um lado para o outro, havia fogo e reportes tentavam captar o máximo daquela loucura.

— Bem a tempo – disse Kayo ao lado de Ágata. Ele olhou para ela. – Ian me avisou que você estava no segundo andar. Eu fui lá te buscar.

Ágata sentiu uma dor forte na perna. Uma Pop branca parou do outro lado da rua e Fernando desceu dela aflito.

— Vim o mais rápido possível – disse ele se aproximando de Ágata, Kayo e Richard, parado ao lado deles, preso num silêncio angustiante. – Estão todos bem? – Perguntou Fernando. – Onde está Ian? E Cintia, cadê?

— Ela morreu – disse Ian se aproximando. Ele tinha sangue na testa, nos braços e mancava quando andava. Ele encarou Fernando com uma expressão sombria. – Você não viu na câmera?

Fernando fez que não com a cabeça.

— Na sala onde vocês estavam não havia câmera – disse ele. – Tinha uma no corredor onde estava Ágata, mas ela logo parou de funcionar.

Ágata se encolheu.

— O que aconteceu com a Cintia? – Perguntou Richard de forma ríspida. Ele e Ian trocaram um olhar de rivalidade.

— Tamires acabou com ela – disse ele. – Na minha frente... – ele desviou o olhar para o caos na clínica.

— E então? – Perguntou Kayo. – E quanto a Tamires e aos outros?

— Tamires, Eric e Zacarias morreram no incêndio – disse Ian. – Eric chegou e colocou fogo em tudo – ele estava distante – eu fui arremessado pela janela por Jaqueline, se não fosse por você, eu teria virado panqueca uma hora dessas...

— Eu matei Jaqueline – disse Ágata bruscamente. – Ela estava flutuando e destruindo tudo então eu dei um tiro nela. – Ela encarava o chão até que ela levantou o olhar e encarou Ian.

— Então isso tudo acabou? – Perguntou Fernando.

— Sim – disse Ian se virando e encarando o prédio rachado, o fogo e as pessoas ao redor daquela cena. – Acabou tudo. – Zacarias havia morrido e sua mais nova clínica também. Não havia mais motivo para vingança. Sua família estava destruída e seu irmão e a garota que ele mais havia amado na vida também estavam mortos.

Mauro apareceu aflito e assim que viu Ágata a agarrou num abraço caloroso, num instante os dois estavam presos num beijo avassalador. Quando Mauro voltou a encarar Ágata ele parecia prestes a ter um ataque.

— Você precisa me explicar o que está acontecendo – disse ele.

Ágata sorriu, mas ela também parecia prestes a desabar.

— Se você me der uma carona para casa – disse ela. – Eu posso te contar tudo no caminho. – Ele assentiu com a cabeça e pegou em sua mão. Ela engoliu em seco e lançou um olhar para os outros. – A gente resolve o resto mais tarde – disse ela. – É hora dos heróis irem para casa...

Mauro encarou Ian atordoado.

— Você não estava morto? – Perguntou ele.

— Acredite – disse Ian – eu preferiria estar. – Ágata pegou Mauro pelo braço e o puxou para o carro do homem estacionado do outro lado da rua.

Fernando encarou o prédio e riu.

— A gente devia fazer isso mais vezes – disse ele. Os outros três encararam o garoto com espanto. – Sabe, esse lance de ser herói é bem legal. – Kayo soltou um risinho.

— Eu já vou indo – disse Kayo – vejo vocês por aí – todos assentiram e em questão de segundos Kayo deixou apenas um rastro estranho de fumaça azul.

— Eu também já vou indo – disse Fernando caminhando em direção a sua moto – se alguém precisar – ele olhou para Richard e Ian – já sabem onde me encontrar – ele fez um aceno com a mão e Ian respondeu da mesma forma.

Richard permaneceu no mesmo lugar encarando Ian de forma estranha.

— Eu descobri algo – disse Ian quando percebeu que Richard não falaria nada. – Quando eu tentei salvar Zacarias do incêndio – mentiu ele – ele me falou algo sobre a sua família Richard.

O ruivo o olhou de outra forma.

— O que quer dizer com isso? – Ele perguntou.

Ian engoliu a saliva e se lembrou de algo que havia descoberto quando entrou na mente de Otávio para ter algumas informações.

— Sua família mora em Santa Rosa no Rio grande do sul – disse ele. – Sua mãe ainda é viva, eu acho... – ele desviou o olhar por um instante e em seguida voltou a encarar Richard. – Ema Fitz.

Richard parecia atordoado.

— Você não brincaria com isso – disse ele.

Ian fez que não com a cabeça.

— Eu sei que você buscava saber sobre a sua família antes de conhecer Eliza – disse ele. – Agora que isso tudo chegou ao fim, acho que seria bom você saber sobre o seu paradeiro, seu passado. – Richard assentiu. Em seguida ele passou por Ian sem dizer mais nada, deixando o rapaz parado no meio da calçada.

No final daquela noite, Ian entrou no apartamento de Cintia onde estava hospedado e procurou por Richard. Como já esperava, não havia rastro do rapaz.

Ele então abriu a garrafa de Red Label recém-comprada e ligou a TV da sala. Todos os noticiários estavam falando da clínica que havia explodido, a repórter atualizava a toda hora o numero de vítimas e vez ou outra alguém aparecia dando uma entrevista sobre como foi estar dentro do prédio na hora da explosão.

Ian desligou a TV farto com toda aquela baboseira e quando se deu conta já havia bebido metade da garrafa. Ele encostou a cabeça no sofá se sentindo tonto e enjoado e se permitiu fechar os olhos por alguns segundos na tentativa de dormir um pouco.

Ele já estava quase pegando no sono quando ouviu um barulho na porta. Lentamente ele levantou o corpo e encarou a silhueta de uma pessoa que se aproximava. A sala estava escura, alguém tinha apagado as luzes.

— Richard – perguntou ele confuso.

— Não. – Respondeu uma voz conhecida. A silhueta ganhou forma. Lentamente ele focalizou o rosto da sombra e levantou rapidamente assustado.

— Cintia? – Perguntou ele. – Mas como?

Cintia estava parada na frente dele, parecendo que um caminhão pesando duas toneladas havia passado por cima dela. No outro canto da sala Eric apareceu no mesmo estado. Jaqueline estava parada atrás dele, todos pareciam assustadores.

Ian olhou para os três sem entender como aquilo estava acontecendo. Quando uma sombra surgiu pela cozinha e se aproximou lentamente.

— Não pode ser – disse ele encarando Tamires. – Você está morta...

Ela andou lentamente até ele. Ian não conseguiu dar um passo se quer, aterrorizado.

— Você tem medo de mim, Ian? – Ela colocou as duas mãos no rosto dele e soltou um sorriso de ironia. – Logo você que nunca teve medo de nada? – Ian não sentia o ar nos pulmões, sua cabeça girava e ele sentia que ia vomitar. – Você me deu um propósito Ian – disse ela saboreando cada palavra – e eu não tinha um antes.

— Você está morta – disse ele tentando se livrar dela, mas as mãos em seu rosto o impediram dele fazer qualquer movimento.

— Olha pra mim! – Vociferou ela. – Eu pareço morta pra você?! – Uma chama diabólica queimava em seus olhos. – Eu vou te caçar até o final dos meus dias seu verme – disse ela entre dentes. – E no dia que a gente voltar a se encontrar, você vai desejar nunca ter nascido...

Tanto Eric quanto Cintia e Jaqueline se aproximaram lentamente de Ian. Ele sentiu que ia morrer nas mãos daqueles quais havia matado.

— Espere – disse uma voz no canto da sala. Ian sentiu o alivio percorrer o seu corpo. – Não sem mim – foi então que Tamires abriu passagem e ele pode ver o rosto daquela garota que ele pensou que nunca mais veria na vida.

— Eliza... – sussurrou ele.

Ian acordou no susto. Olhou ao redor e viu a luz da manhã entrar pela janela da sala. Ele havia dormido no sofá e seu pescoço doía. A garrafa estava pela metade em pé no chão. Ele encarou a garrafa por alguns segundos a culpando pelos sonhos estranhos daquela noite.

Sonho não— pensou ele analisando a situação melhor – pesadelo. 


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