Espíritos da Floresta escrita por Sophia


Capítulo 3
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá, olá. Finalmente voltei, e peço desculpas, tive mil ideias pro meu ship favorito e tive que trabalhar nelas antes que esquecesse, mas não se preocupem, ainda reescrevi algumas coisas dessa fic com a ajuda da linda da May. Enfim, boa leitura!



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Eu deixei o palácio e corri pelas sombras das poucas casas da cidadela que tinham sido construídas no solo até estar oculta pelas árvores, me distanciando o mais rápido possível da minha casa até cruzar o arco da saída oeste, mantendo minha corrida até estar a uma distância de onde nenhum caçador me avistaria das torres, só então olhei para trás, para a muralha de pedra branca coberta por trepadeiras e lodo e o topo Palácio do Amanhecer. Ainda não tinha me acostumado a visão de minha casa banhada pela prateada magia do luar e perdi um ou cinco minutos guardando a imagem daquele lugar em minha mente. Naquela noite, com a morte da pequena Neve, meu coração estava apertado e meus sentimentos confusos.

Jasper tinha me confidenciado que durante as reuniões com meu pai e o conselho todos queriam apontar para os elfos ônix, e que ele achava que era uma questão de tempo até que o assassino fosse encontrado, mas isso fora semanas atrás e nenhum deles foi visto. Desde o desaparecimento da segunda criança eu tinha me acostumado a escapar e passar as noites na floresta porque queria entender o que acontecia lá durante a noite, mais que a teoria que me fora ensinada.

Eu fui ensinada sobre os perigos da floresta quando treinava para ser uma caçadora. Os mais experientes diziam que se você escolhesse o lugar errado para nadar poderia ser afogado por uma das filhas de Cissa; se entrasse na caverna errada poderia estar invadindo o território de uma matilha de lobos gigantes ou a morada de um leprechaun que teria como objetivo de vida tornar a sua um inferno; cuidado com as rosas arroxeadas, seus espinhos causam paralisia; não se aproxime do vulcão adormecido... Jamais cruze a ponte do Riacho de Prata na direção dos Domínios do Luar. Por sorte, nosso treinamento era muito bom e nossa raça bastante prudente.

Mas naquela noite em especial eu senti algo diferente no ar. A natureza chorava a morte de mais um de seus filhos e fazia algo mais. Mesmo a luz da lua parecia mais forte e a floresta mais quieta que o normal. Não obstante, ao invés do luto, aquilo trouxe uma sensação ruim ao meu coração, sensação que eu tentava aplacar tentando fazer com que a beleza da floresta ao meu redor e das torres do Palácio aquecesse meu coração antes que sentimentos ruins o tomassem.

Mesmo com a muralha, eu ainda podia ver as paredes de pedra e as janelas de cristal se erguendo tão alto quanto as centenárias árvores. Um dos anciões tinha me explicado que as paredes, escadas e grandes torres de pedra e madeira das árvores tinham sido construídos para baixo da terra e só depois na direção do céu, o resultado era algo como um palácio se projetando para cima junto aos troncos das árvores. O resultado era mágico. Durante o dia não precisávamos de tochas ou lamparinas porque a luz do sol refletia nos cristais das janelas e do teto e iluminava todos os cantos do palácio. A cidadela, aos pés do palácio, e crescendo em volta das árvores, se ligando por pontes de madeira e corda era como uma extensão da floresta, tão harmonioso que se poderia acreditar que tudo era uma coisa só, uma esplêndida criação da natureza. Observei as lamparinas nas casas nas árvores e o movimento dos guardas cruzando as pontes segurando suas tochas. E tudo banhado pela luz da lua.

O barulho de uma coruja me fez sair de meu estado e suspirar para afastar a sensação que me subiu a espinha junto a um calafrio. Eu tinha aprendido a não gostar do luar, apesar de sua beleza. As lendas diziam que a lua hipnotizara um casal de elfos e ambos se afogaram perto da ponte do Riacho de Prata antes da era de Kaoru, além disso, pelo que eu sabia, era durante o luar que os ônix caçavam.

Contudo, fiz o caminho mais comprido e escuro para evitar qualquer dos caçadores de meu pai sem medo algum. Andar durante a noite já não me fazia hesitar, as árvores com troncos grossos o bastante que cinco dos meus irmãos teriam de se juntar para abraçar eram as mesmas, apenas banhadas pela misteriosa luz. Mais a frente as árvores se tornavam menores, e finalmente os pinheiros que acumulavam neve em seus galhos sinalizavam minha chegada a um dos meus lugares favoritos, o Bosque dos Espíritos.

Arrumei a capa de lã negra de forma que cobrisse meus ombros. A camisa de linho cobria até meus braços, mas era fina, e a couraça não cobria os ombros para não atrapalhar a caça, de forma que só a capa grossa me protegeria do frio daquele lugar e eu me sentia grata por tê-la comigo.

Ir além dos pinheiros era uma experiência única, pois não importava a estação, no Bosque do Espíritos sempre havia neve. A natureza crescia adormecida e mesmo os pequenos animais pareciam prender a respiração ali porque era o lugar aonde as almas de nossos ancestrais descansavam, fazendo com que o único som fosse o sussurro dos ventos. A força que me ligava a natureza era mais forte ali por causa do sangue que fora derramado durante a guerra, e ficava ainda mais forte enquanto eu me aproximava do Riacho de Prata aonde centenas de anos atrás meu povo se dividiu entre elfos da aurora e ônix.

Lá eu aguardava todas as noites, sentada no topo de uma árvore, com o arco preparado para acertar qualquer criatura que ousasse cruzar a ponte sobre o Riacho. Vi lobos caçando, pequenos cervos se aproximando da água para saciar a sede e corujas que me encaravam com seus grandes olhos como se questionassem a minha presença. O frio geralmente não me incomodava, mas naquela noite o vento estranhamente agitava as folhas das árvores e eu tive que usar o capuz para proteger minhas orelhas. Estava tão exausta por conta das cerimônias do dia que me deixei recostar ao tronco de uma árvore e cometi o erro de me deixar dominar pelo cansaço e adormecer. Quando despertei, incomodada com uma filha que caíra em minha testa me sobressaltei ao ver o movimento de um elfo do outro lado da ponte.

Ele tinha cabelos escuros como a noite, mas não eram longos como da maioria da minha tribo. Seu cabelo era cacheado e caia a altura do queixo. Ele vestia uma couraça semelhante a minha e que deixava seus ombros largos expostos, tinha uma aljava nas costas e uma espada na bainha, com toda certeza era um caçador, mas não era da minha tribo. Talvez fosse um dos caçadores da tribo de Zion, ou de Meeran, era difícil saber. Mas ele se aproximou da beira do lago de forma graciosa e ao mesmo tempo terrivelmente ameaçadora, como se fosse um predador se aproximando da presa e então fez uma reverência para a lua. Foi aí que entendi o motivo de não tê-lo reconhecido, ele não era de Zion ou Meeran, era dos Domínios do Luar. Um ônix.

Foi então que ele olhou para o lado, especificamente para o lugar aonde eu me escondia. Não pude ver sua face totalmente, mas seus olhos eram azuis e continham uma mensagem de ameaça que fez um calafrio subir pela minha espinha. Era ele. Só poderia ser ele o assassino.

Puxei uma flecha envenenada e me preparei para atirar contra ele, perdendo um ou dois segundos para fixar meu alvo em seu coração e foi quando as nuvens que cobriam a lua se dispersaram e eu pude ver a face do elfo voltada para mim. Seu rosto era levemente coberto por uma barba da cor de seus cabelos, o queixo era quadrado e ele estava sorrindo de forma arrogante, como se me desafiasse a atirar e a matá-lo. Eu hesitei, tornando seu sorriso ainda maior antes que ele acenasse com a cabeça e me desse as costas, sumindo entre as árvores. E mesmo forçando-me a tentar enxergar mais longe, não consegui avistar o ônix outra vez.

E em um piscar de olhos, o teto sujo da prisão cavernosa estava sobre a minha cabeça novamente. Meu corpo doia por dormir sob as pedras no chão e meus olhos demoraram alguns instantes para diferenciar a realidade do lugar no qual eu verdadeiramente estava das memórias do meu primeiro encontro com Órion. Eu deveria ter atirado nele quando tivera a chance, e não ter deixado aquele olhar me intimidar. Mais uma vez, estava sendo atormentada pela memória de uma de minhas falhas mais miseráveis.

Finalmente recomposta e acostumada com a pouca iluminação do lugar, vislumbrei o elfo de cabelos cinza-azulados sentado a uma mesa, trabalhando com uma faca e um pedaço de madeira do lado de fora da minha cela. Ele ergueu o olhar para mim e depois voltou ao seu trabalho. Meu carcereiro da vez era River, o gêmeo de Zen.

— Elfa idiota. — murmurei, irritada comigo mesma.

O grito de um dos prisioneiros, seguido por sua respiração entrecortada anunciou que eu não era a única vítima da magia daquela masmorra.

— Não há luz para espantar os pesadelos aqui, hehe... Não há luz para espantar os pesadelos aqui, hehe... — Cantarolou o leprechaun. — Nas trevas das masmorras só encontramos a nós mesmos e as memórias que mais nos torturam. Porque a realidade é o pesadelo, a noite é.

Ali, sem noção de sol ou lua, pensar em meus atos se tornou costume e ainda mais o questionamento sobre os arrependimentos da minha alma. Os humanos costumavam dizer que mais importa o caminho do que o final, mas eu supunha que os finais deles seriam mais felizes que o meu. Mesmo que meu caminho tivesse sido pleno e eu poderia arriscar dizer feliz até o momento que descobri a verdade por trás da gentileza de Órion e pude ouvir o vento soprar como um agouro as palavras de minha mãe ao meu ouvido.

Não confie nos ônix, Zora. Não confie neles.

Passos apressados me fizeram despertar dos devaneios e atentar para o elfo surgindo no fim do corredor. Ele caminhava de forma apressada e decidida e sua sombra esguia dançava nas paredes irregulares conforme ele passava pelas tochas. Finalmente pude vislumbrar o longo cabelo cinza-azulado que o elfo possuía. Zen.

— River, aonde está a elfa da aurora? — Questionou ao irmão, em seguida lançando um olhar pelas celas até encontrar os meus olhos e me lançar um olhar de algo como insatisfação. — O momento se aproxima.

River calmamente largou a faca e a madeira que agora parecia tomar a forma de um quadrúpede e se levantou, caminhando até o irmão de sangue e sussurrando-lhe algo. Ambos os elfos me lançaram um olhar de insatisfação, mas era Zen que parecia contrariado com algo dito por River.

— Seu destino foi decidido. — Me disse River. — Pagará ao favorito do rei.

Me impedi de questionar o que raios aquilo significava, mas pelas risadas maliciosas dos outros encarcerados não me pareceu boa coisa.

— Não concordo com isso. — Zen murmurou irritado.

— Não se questiona uma ordem. — Disse uma terceira voz. Era grossa, de forma que foi potencializada pelo eco, também era conhecida e me fez involuntariamente dar alguns passos para trás. — Ordens são dadas para serem cumpridas sem hesitação.

Meu coração parou de bater por um instante enquanto eu absorvia a imagem do elfo à minha frente. Vestido em trajes nobres, uma couraça branca sob o peito, adornada com fios de ouro e calças escuras. Ele tinha conseguido uma nova capa também, que estava enrolada sob seu pescoço de forma a cobrir-lhe a boca e o nariz, mas eu reconheceria aqueles olhos azuis como as águas do Riacho em qualquer lugar, assim como aquela voz.

— Órion. — Murmurei desgostosa.

Por um instante, os olhos dele pareceram se arregalar ao me ver e imaginei que minha situação deveria ser realmente lamentável. Mas a surpresa dele não durou muito e logo a expressão de altivez voltou ao seu rosto. Foi então que um grupo de ônix surgiu do mesmo corredor e todos pararam para observar a mim de forma bastante deselegante. Instantaneamente me senti congelar com os olhares dos elfos.

Órion pigarreou e ordenou que Zen abrisse a minha cela.

— É melhor ouvi-lo. Ele pode parecer bonzinho, mas é apenas um leão coberto com a pele de um veado que matou. — Debochei.

— Vamos, elfa da aurora. — Disse, ignorando minha provocação. — Seu lugar não é mais aqui.

Eu bufei e lhe dei as costas.

— Não caminharei espontaneamente para a minha morte.

— Só deve falar se for solicitado que o faça. — Disse River em tom de aviso.

— Insubordinação gerará futuras punições. — Órion voltou a falar. Pude ouvir seus passos enquanto ele caminhava para dentro da cela. — E não me agrada bater em um ser como você. Então venha logo, não sou um macho paciente.

Não pude entender os cochichos dos ônix, mas não foi difícil concluir que falavam de mim. Foi então que ouvi um barulho como um soco contra uma superfície e quando me virei vi Zen deixando o lugar. Órion abaixou a cabeça, irritado, de forma que seus cabelos escuros cobriram os olhos, e suspirou antes de olhar para trás.

— Nosso líder me presenteou com esta elfa, mas está claro, no entanto, que discorda da situação, Zen. Gostaria de dizer algo?

O elfo interrompeu seu caminhar por um instante e arrancou de seu pulso o bracelete , jogando o objeto aos pés dos outros ônix. Foi River quem apanhou o bracelete e fez menção de seguir o irmão.

— Deixe-o ir. — Órion ordenou. — Leve este nobre grupo de volta ao grande salão e me deixe lidar com a princesa.

River assentiu, guiando o grupo por outro corredor. E só então Órion agarrou meu braço com força, me puxando para fora da cela.

— Não quero ter arrastá-la a força para meus aposentos.

— Não irei com você espontaneamente. — Reafirmei.

Puxei meu braço com força, conseguindo me libertar de seu aperto mais pela surpresa que meu ato causou do que por minha força. Eu jamais o deixaria se aproximar de mim outra vez. Então o encarei altivamente com o que me restara de dignidade.

— Não ouse me tocar, Órion.

Ele me avaliou da cabeça aos pés e aparentemente decidiu que não valia a pena tentar me arrastar daquela forma. E foi aí que tudo ficou escuro.


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Notas finais do capítulo

E por hoje é só! Até o próximo ♥



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