Entremeios escrita por DrixySB


Capítulo 3
Algo valioso


Notas iniciais do capítulo

Uma conversa significativa entre Daisy e Jemma.



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— Sério, Jemma. Eu li seu horóscopo.

— Ah, lá vem você!

Recostada à cabeceira da cama de Daisy, Jemma revirou os olhos, amofinada.

— Você precisa ouvir o que os astros dizem!

— Ora, poupe-me dessa ladainha, Daisy! Sabe que não acredito nisso.

— Escute!

A outra cruzou os braços, totalmente cética.

— O seu horóscopo diz que o grande amor da sua vida vai lhe devolver algo que você perdeu. Algo valioso— disse, consultando um site de astrologia em seu iPhone.

— O que claramente não vai acontecer. Horóscopo não é ciência e não tem o mínimo de precisão.

— Tá, tá bem... Pode ser uma grande bobagem na maior parte do tempo. Mas às vezes acerta. Antes de adquirir meu poder, meu horóscopo me alertou para o fato de que uma mudança brusca iria acontecer na minha vida. E... Pouco antes de Lincoln aparecer, a previsão dizia que as coisas iriam se agitar no campo afetivo...

— É tudo muito genérico, Daisy. Não acredito que lê mesmo essas coisas.

— Tanto faz – Daisy deu de ombros e se jogou na cama, ao lado de Jemma – e aí? Como estão as coisas.

— Nem eu sei - ela respondeu, após um longo suspiro de frustração.

— Bem... Pelo menos agora você está na Terra, saudável, curada do stress pós-traumático... – a inumana fez uma pausa estratégica antes de prosseguir, espreitando sua amiga com um olhar malicioso – e com dois homens tentando ganhar seu coração.

A bioquímica rolou os olhos.

— Eu não sou um troféu para ser disputada. E, bem... Isso que disse, está longe de ser verdade. Não há ninguém tentando ganhar meu coração.

— Não? – a outra franziu o cenho.

— Não. Há dois homens subestimando a si mesmos. Como se nenhum deles fosse bom o suficiente...

— Pra você? Como se nenhum fosse digno do seu amor? Wow, isso significa que ambos têm você em mais alta conta.

— Pode ser... – ela disse, chateada – eu detesto que as coisas sejam tão inconclusivas em minha vida. Que eu não saiba dar um final a elas...

— Você quer dizer... Na sua história com Will?

— Isso e... O fato de eu nunca ter tido coragem de colocar um final em uma etapa do meu relacionamento com Fitz e, enfim, avançar para a próxima. Eu nunca sei o que fazer...

— O que significa que você já fez sua escolha, certo?

Jemma deu uma risada desprovida de humor.

— Nunca houve escolha, Daisy. Sempre foi ele. Sempre foi Fitz. O que eu vivi com Will no outro planeta... Foi expressamente por conta da situação, das circunstâncias. Eu não poderia ficar com ele nesse mundo. Mas também não parecia certo ficar com Fitz sabendo que havia chances de salvar Will e...

— Você precisava fechar esse capítulo da sua vida.

— Sim, mas... – ela cerrou os olhos com força – As coisas foram acontecendo. E ainda não tive a chance de falar com Will sobre isso…

— Durante todo esse tempo?

— Não. Eu quero que ele se mantenha focado em sua recuperação. Que se adapte novamente à Terra. Que veja um especialista e supere o stress pós-traumático. Ainda precisamos sentar e conversar, mas agora não é o momento para discutir esse assunto específico. Não é hora de perturbá-lo com isso.

Daisy refletiu por um instante.

— Então, talvez Fitz esteja certo quando diz que esse não é o momento ideal para vocês seguirem em frente. Quer dizer, não é justo com Will. Ele precisa de um... Encerramento, sabe?

Jemma suspirou.

— Acho que você está certa...

— Ele nem mesmo comentou algo com você sobre isso?

— Nos falamos pouco... E quase sempre sobre seu progresso em se recuperar. Mas, naquele dia, em que o acompanhei enquanto ele caminhava pela base... Ele mencionou qualquer coisa sobre Fitz antes de entrar no quarto. Disse que não o via há dias e que precisava agradecê-lo melhor por tê-lo salvado... Disse que eu estava certa sobre ele. Que Fitz é uma pessoa extraordinária. E que era bom saber que estávamos novamente juntos. Mas eu não entendi o contexto. Se juntos no mesmo planeta...

— Ou juntos juntos...

— Sim... Mas senti que Will entenderia. Quero dizer, entenderia se soubesse que Fitz e eu… - Jemma interrompeu a si mesma, deixando as palavras no ar.

— Ok! O que aconteceu exatamente entre você e Fitz que eu ainda não entendi…? Digo, depois daquele primeiro beijo entre vocês no laboratório...

A bioquímica ponderou antes de relatar o que houve naquela noite em que tudo mudou entre ela e o engenheiro. Ambos ficaram até tarde, certa noite, estudando meios de abrir novamente o portal e salvar Will Daniels. Avançaram a madrugada e já haviam progredido bastante quando decidiram ir para a sala comunal. Hunter havia trazido um engradado de cerveja e os dois decidiram que não faria mal tomar algo para espairecer depois de tantas horas debruçados sobre pesquisas, teorias, esquemas... Até mesmo levaram algumas páginas de sua extensa pesquisa para a sala, para lerem e avaliarem melhor a situação e as possibilidades. A hora era apropriada, já que estavam sozinhos, sem perturbações, uma vez que os demais dormiam. Mas houve um momento em que desviaram do assunto principal – a razoável quantidade de álcool ingerido começara a fazer efeito em seus organismos – e, então, passaram a relembrar a época da Academia, suas aventuras, sua amizade, sua trajetória até ali, suas conquistas, as mudanças em seu relacionamento... Seu beijo. Um novo beijo ocorreu entre eles e, depois disso, tudo foi muito rápido. Em nenhum momento, algum deles pensou na possibilidade de parar.

— Hmmm... Vocês estavam sob efeito do álcool. É compreensível, Jemma. Nerds get naughty when they’re drunk*— a inumana gracejou.

— Não tem graça, Daisy.

— Sim, eu sei que não... Mas preciso dizer que nunca mais vou conseguir olhar o sofá da sala comunal da mesma forma. Pode ser até que nunca mais volte a me sentar lá.

— Daisy! – o tom de Jemma soou repreensivo dessa vez.

— Tudo bem, eu já parei! Agora, me diga: por que vocês não estão se falando direito? Fitz está arrependido?

— Eu não quero pensar na possibilidade de ele ter se arrependido. Prefiro pensar que... Como ele diz, aquele simplesmente não foi o momento certo. Não era como deveria ter acontecido. Ele acha que fomos imprudentes. E fomos mesmo.

— Sim, pareceram dois colegiais com hormônios à flor da pele, mas isso não vem ao caso.

— Eu só sei que estou me sentindo péssima. Em relação aos dois… - ela jogou a cabeça para trás, o semblante angustiado.

— Huh? Não me diga que sua moral está falando mais alto?

— Não. Não é pela questão moral. Estou mais preocupada com o que eles estão sentindo. Não quero magoar nenhum deles...

— Ah, Jemma… - Daisy lançou um olhar complacente em sua direção - É difícil lidar com isso, não é? Quer dizer, a coexistência deles neste mundo... Não tinha parado pra pensar nisso antes?

— Não. Só me preocupava em salvar quem me salvou no outro planeta. Estava com medo que ele não houvesse sobrevivido. Meus sentimentos não eram importantes naquele momento. Isso poderia ficar pra depois...

— Bem, o fato é que você já tomou uma decisão. Vá em frente.

— Se dependesse só de mim… - ela baixou a cabeça, entristecida.

— Então... Com Will, não há chances de...

— É como eu disse. Ele sempre vai ser uma parte importante da minha vida. Mas o que aconteceu entre nós, se delimita àquele lugar. Ele foi gentil, atencioso, compreensivo...

— E ele é gato. Não finja que não percebeu isso também...

— Vai muito além disso, Daisy – ela fez uma pausa antes de prosseguir – e então, do outro lado está Fitz... Alguém que é simplesmente uma parte fundamental de mim – sua voz pareceu quebrar ao proferir aquela frase.

— O leal, sensível, heróico e maravilhoso Fitz. O genro que todos os pais gostariam de ter. Aposto que os seus já pensaram a respeito disso.

Jemma riu baixinho.

— Meu pai já mencionou algo assim... Brincando, mas com um fundo de verdade.

— Eu sabia – Daisy bateu uma mão na outra - Bem, não dá pra negar. Ele é... Quase um sonho – a inumana completou.

— Não – a bioquímica discordou, sacudindo levemente a cabeça – Na verdade ele é única realidade que eu desejo.

*

Já estava ficando ridículo ele ouvir atrás de portas e paredes. Mas havia de se compreender que ele estava frustrado com a situação. A história toda o envolvia. Mas Jemma pouco falava sobre o tópico na sua frente. Will estava cansado de se sentir apenas um intruso, um desconhecido na base. E farto de ver aquele aspecto melancólico no rosto de Jemma que ela procurava disfarçar quando estava diante dele.

Naquele dia, ele não caminhava pelos corredores do playground por haver perdido o sono. De fato, agora, os pesadelos tornaram-se mais escassos e, nos últimos dias, ele vinha dormindo por dez horas ininterruptas. O que só tornavam seus passeios pela base mais arriscados, visto que ele passava muito tempo na cama, quase não comia e ainda não havia se acostumado totalmente à gravidade da Terra. Will não sabia quando iria se recuperar totalmente, mas estava certo de que iria demorar um tempo. E ele havia prometido à Jemma que ficaria ali durante toda a fase de recuperação. Até mesmo porque não tinha mais para onde ir...

O melhor a se fazer era não tornar sua estadia um fardo para ele e para os outros, portanto, levantou-se determinado a conversar com a bioquímica. Perguntar o que estava acontecendo e como ele poderia ajudá-la no quer que fosse que estivesse acontecendo entre ela e Fitz. Ele não queria ficar entre os dois. Queria apenas respostas e auxiliá-la a buscar uma solução de modo a deixar de sentir que era um obstáculo.

Ele seguiu pelo corredor e ouviu rumores de vozes provindos de uma porta entreaberta. Will seguiu com passos determinantes até lá ao distinguir o timbre de Jemma. Parou na porta ao ouvir a voz de Daisy, dando-se conta de que aquele deveria ser o quarto da inumana. Ela falava qualquer coisa sobre horóscopo e sobre como o grande amor da vida de Jemma iria entregar a ela algo de valioso que havia perdido. Ao ouvir aquela sentença, Will tateou o bolso do casaco, encontrando o colar da bioquímica, o que ela havia perdido na tempestade de areia em Maveth antes de ser salva por Fitz.

“... Eu detesto que as coisas sejam tão inconclusivas em minha vida. Que eu não saiba dar um final a elas…”

“Você quer dizer... Na sua história com Will?”

O astronauta prendeu a respiração ao ouvir seu nome sendo mencionado.

Então ela disse. Com todas as letras.

“Nunca houve escolha, Daisy. Sempre foi ele. Sempre foi Fitz”.

Will cerrou os olhos, sentindo uma profunda pontada em seu peito que ele não conseguiu compreender. Afinal, ele sempre soube. Jemma jamais fez segredo disso, mesmo quando começaram a se envolver física e emocionalmente em Maveth. Nas raras vezes em que ela se permitiu lembrar do engenheiro após perder toda a esperança de voltar, a forma como ela falava sobre ele... Não era necessário dizer com todas as letras. Will sabia que ela o amava acima de todas as coisas. Durante muito tempo, era a lembrança de Fitz que lhe dava forças para seguir em frente com seu plano de retornar para casa. Ele simbolizava sua esperança. E não poderia haver prova de amor maior. Will sabia que o que quer que houvesse acontecido entre eles em outro planeta, era puramente circunstancial. Não aconteceria em um mundo em que Fitz também existisse e estivesse sempre por perto. Ela jamais escolheria ele em detrimento de Fitz. Mas, de certa forma, doera ouvir aquilo sendo dito de maneira tão determinante. Tão definitiva. Ele mesmo se espantou com aquela dor repentina.

Ele não ouviu o restante da conversa. Não era certo. Jemma lhe diria tudo a seu tempo. O astronauta deu meia volta e rumou em direção ao seu quarto com passos suaves e silenciosos. Inalou profundamente, tocando o colar em seu bolso mais uma vez.

Agora ele já tinha uma ideia do que deveria fazer.


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Notas finais do capítulo

* Nerds ficam safadinhos quando bêbados.

Optei por deixar a frase em inglês porque soava melhor. E imaginar na voz da Daisy é ainda mais interessante ;)

No próximo, a conversa é entre Fitz e Will.

E rola participação de Hunter e Bobbi.

Até lá!



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