Era uma vez Peter e Wendy escrita por Segunda Estrela


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Bom, apesar de o último capítulo não ter tido comentário nenhum, essa é minha última chance. Se for um fracasso eu desisto e mostro essa fanfic pra minha mãe. Acho que ela vai gostar.



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Peter Pan não perdeu tempo nem mesmo para avisar aonde ia, alçou voo e alcançou a borda norte, na praia aonde chegavam todos os outros meninos perdidos. Ali, escondido por entre as árvores, viu sua sombra com uma garota de olhos verdes redondos como moedas de ouro, vestida com uma camisola de flanela branca e pés descalços.

Seu coração estava em uma calmaria estranha enquanto a via descer com delicadeza sobre a Terra. A garota riu para sua sombra, era primeira vez que alguém fazia algo parecido. Com uma reverência, agradeceu à viagem.

Peter franziu as sobrancelhas, seu nariz torcendo-se um pouco. Sem entender o motivo da estranha cortesia, mas de certa forma, curioso. Ela então deu seus primeiros passos pela praia, a areia era tão fina que parecia açúcar e a água tão clara que se podiam ver os peixes e corais até do lado mais fundo. O mar brilhava em lindos tons de verde e azul. Os olhos da garota transbordavam de encanto, por tudo que poderia haver naquela terra estranha.

Peter se viu nela, como na primeira vez que tinha vindo à Terra do Nunca. Não pôde evitar sentir certa raiva pela lembrança. Mas tratou de se recompor e colocar sua melhor máscara de gentileza.

— Bem-vinda Wendy. - Falou ele, um sorriso maroto em seu rosto enquanto atravessava a praia em seu encontro.

Ela, que até um segundo atrás sentia a areia em seus pés, levantou os olhos assustados e surpresos. Não era sempre que via rapazes saindo de florestas para cumprimentos. O garoto tinha um porte ágil, como se fosse capaz de fazer as mais incríveis acrobacias. Seu rosto, de formas bonitas e afiladas, carregava certa infantilidade, mas que era esquecida quando se olhava bem para seus olhos inteligentes e pérfidos. Olhos que faiscavam com malícia e trapaça mesmo naquele dia claro.

Mas mesmo que Wendy se sentisse intimidada por aquele olhar profundo que a examinava, não pareceu notar a maldade dentro dele. E não foi o estranho encanto que Peter colocava em suas presas que impediu Wendy de responder sua pergunta imediatamente. O que impediu Wendy foram suas lembranças, lembranças antigas e quase esquecidas de uma época em que sonhava com um garoto como ele. Um garoto bom, mas triste e ambicioso que morava sozinho em uma terra encantada.

Diante do silêncio de Wendy, Peter alargou seu sorriso de canto, suas sobrancelhas dançavam enquanto acompanhavam suas palavras.

— Eu esqueci de me apresentar? Onde estão meus modos? Eu sou Peter Pan, e bem-vinda a minha ilha.

— Peter Pan? Eu já o vi em meus sonhos? - Disse ela com um sorriso, sem conseguir evitar que as memórias tomassem sua mente.

Pan não sabia o que ela quis dizer com isso, nenhuma garota nunca tinha sonhado com a Terra do Nunca, e definitivamente não tinha sonhado com ele. Mas decidiu desfranzir suas sobrancelhas e ignorar suas desconfianças, se ela achava que o conhecia, era até melhor desse jeito.

— É uma honra Milady. - E ele fez uma reverência dramática.

Ela deu uma bela risada, uma risada que tomava todo seu rosto e parecia fazê-lo reluzir.

— O que é este lugar? - Perguntou ela, dando mais uma vez uma olhada para cada árvore e cada folha.

— Essa é a Terra do Nunca. – Respondeu Peter Pan com certo orgulho.

— Mas como eu vim parar aqui?

— Você me chamou, Wendy. – Sua voz sussurrava o nome da garota, com suavidade leitosa, como se estivesse hipnotizando-a.

Primeiro ela pareceu se divertir com a ideia de tê-lo chamado e ele atendido, mas quando percebeu que não era uma brincadeira, ficou confusa.

— Como poderia tê-lo chamado?

— Você disse que queria ir a um lugar onde não precisasse crescer. Esse é o lugar Wendy, aqui você nunca vai envelhecer e se tornar uma adulta. – Falou ele, esticando os braços, como se estivesse entregando toda a terra para ela. – Pode viver comigo e os outros meninos perdidos para sempre.

— Mas isso é impossível.

Peter deu uma risada seca e apenas uma. Nunca se permitia mais que isso.

— Aqui é a Terra do Nunca, onde nada é impossível. – E ele falava com tanta confiança e fé, que era impossível não acreditar.

Wendy deu mais um sorriso, mostrando todos seus dentes, tão genuinamente doce que Peter sentiu seus olhos escurecerem com algo além de hipocrisia. Ela exibia um sorriso capaz de alegrar o mais triste dos homens e trazer humanidade a pior das feras.

Peter ofereceu sua mão, pronto para guiá-la pelo céu. Ela aceitou devagar, sentindo seus dedos longos entrelaçarem-se. A mão do rapaz era quente e macia. Não sabia explicar a razão, mas aquilo a surpreendeu.

E ali, de mãos dadas, eles voaram pela Terra do Nunca como Peter nunca tinha feito com ninguém. A luz do amanhecer lançava um brilho alaranjado sobre o céu, colorindo as nuvens como se fossem bolas de algodão, em lindos tons de rosa e amarelo. Wendy abraçava o corpo esguio do garoto, enquanto sentia seus cabelos voarem para todas as direções. A sensação de ser abraçada pelo vento em todos os lugares era deliciosa.

No horizonte, o céu beijava o mar e as nuvens refletiam no oceano, tornando tudo uma paisagem contínua digna de um paraíso divino. Em nenhum momento da sua vida tinha se sentido tão livre. No fundo do seu peito crescia um sentimento de liberdade, de poder. Como se realmente pudesse fazer qualquer coisa, ir a qualquer lugar. Finalmente entendeu todos os sentimentos dos garotos que viviam ali, naquela terra maravilhosa onde tudo era possível. O futuro parecia tão encantador e tão cheio de promessas e maravilhas. E tão diferente daquele lugar de incertezas de onde tinha vindo.

Quantos milagres veria se ficasse ali para sempre?

 Wendy olhou para Peter, e viu nele as coisas mais bonitas que o mundo podia lhe presentear. Viu nele um salvador, um herói enviado para resgatá-la daquela vida de tristezas. A luz que batia em seu rosto e cabelos eram como beijos do sol, e ela nunca se sentiu tão feliz. Como se cada pedacinho seu fosse preenchido de sonhos. Como se todos os seus medos fossem apagados para sempre, e dali em diante sua vida seria apenas encantos e aventuras.

— Peter, é maravilhoso - Disse ela com sua voz afetada pela emoção, lágrimas quentes dançando em seus olhos.

Peter Pan virou seu rosto para ela, espantado com sua comoção, mas lembrando-se da primeira vez que tinha voado e entendendo seu espanto. Vincou suas sobrancelhas, parecia concentrado em desvendar qualquer segredo que a garota pudesse tentar esconder dele. Se sentindo verdadeiramente frustrado por não conseguir descobrir nada.

Quando finalmente pousaram, Peter pôde soltar a mão de Wendy, mesmo que ela parecesse disposta a voar o dia todo. Perto de onde estavam, havia um lago azul escuro, tão denso que era impossível tentar ver qualquer coisa através dele.

— Estou morrendo de sede. – Disse Wendy, se aproximando do lago com passos saltitantes.

— Não! – Gritou Peter imediatamente, indo para perto dela e a puxando pelo braço sem delicadeza.

Wendy arregalou os olhos de surpresa, e o rapaz se pôs a explicar em seguida.

— Este lago é encantado. Quem bebe dele perde suas emoções mais preciosas. – Explicou ele, com uma expressão de desagrado em seu rosto.

A garota, agora, além de assustada parecia confusa.

— As emoções mais preciosas? Não seriam as memórias?

— Não. Memórias, você cria outras. Esse destino é pior. Digamos que a coisa que você mais ama fazer, o que te faz mais feliz, é patinar. No momento em que bebe dessa água, você perde qualquer prazer que um dia tenha sentido patinando. – Ele fez uma pausa, e deu uma risada seca. – O hilário é que você ainda pode fazer o que amava antes, mas não vai mais te fazer feliz. É uma forma cruel de punição, não acha?

Wendy não conseguiu entender aquele humor sórdido, então simplesmente olhou para ele com uma expressão de compaixão.

— Isso destrói sua maior fonte de felicidade. Uma mãe, por exemplo, vai esquecer qualquer carinho que teve pelo filho. Assumindo que o filho fosse a pessoa que ela mais amava. – Havia certo deboche na última frase quando ele falava.

— Peter, isso é terrível. – Disse ela, se aproximando e colocando a mão em seu braço.

Os olhos do rapaz faiscaram perigosamente, mas Wendy não pareceu perceber. Se afastando dela, ele olhou para o lago bem de perto. As águas eram muito escuras, escuras demais para saber sua profundidade.

— Também existe uma lenda sobre ele. Dizem que uma vez uma sereia e um humano se apaixonaram. O pai da sereia, quando soube, mandou que dessem dessa água para ele beber. Como vingança, ela pegou o tesouro mais precioso do castelo do pai e enterrou no fundo do lago, onde ele não poderia recuperá-lo. Mas a magia da água também a afetou e ela se esqueceu dos sentimentos pelo humano. Uma tragédia de sentimentos inúteis. – Dizia ele com um sorriso pérfido estampado em seu rosto, de costas para Wendy, ela nem imaginava o desdém que ele fazia do sofrimento. – Muitos pensaram em mergulhar para pegar o tesouro, mas poucos queriam se arriscar.

— Como você sabe tanta coisa?

— Eu sei tudo sobre a Terra do Nunca. – Disse ele, virando-se para encará-la nos olhos.

Naquele momento, sua voz soou como uma ameaça, mas Wendy não sabia por que isso a perturbava tanto. Ele havia sido gentil com ela até agora, ele a havia resgatado quando pediu socorro.

— Eu gostaria de te dar um presente, Peter. – Disse ela, reunindo coragem.

Ele pareceu genuinamente surpreso, ninguém trazia nada para Terra do Nunca, e mesmo que trouxessem, por que ela iria dar para ele?

Wendy deu passos vagarosos na sua direção, como se temesse a reação do rapaz. Ele a examinava com atenção, parecendo desconfiado. Antes que se acovardasse e mudasse de ideia, a garota superou a distância entre os dois e uniu seus lábios em um beijo delicado.

Claro que não durou nem um segundo, pois no momento em que suas bocas se tocaram, Peter se afastou como se ela estivesse em brasa.

A garota se assustou diante do olhar sinistro que brilhava em seus olhos.

— Eu sinto muitíssimo. – Explicou-se ela, genuinamente arrependida.

Peter Pan não a respondeu, virou-se na direção da floresta e pareceu tomar ar para atenuar sua raiva. Os lábios e olhos cerrados em reflexão. Respirou fundo antes de se voltar para a garota. Quando olhou novamente para Wendy, seu rosto era a jocosidade vil de sempre, e quando falou, seu tom tinha o mesmo toque aveludado de antes.

— Não se preocupe, Wendy. – E ele demorou-se no seu nome. – Eu só não estava esperando por isso. Não são muitas as pessoas que conseguem me surpreender. – Disse ele com uma risada convincente.

Ela pareceu se acalmar, e deu um sorriso tímido como resposta.

— Mas nunca mais tente me surpreender de novo. – Dessa vez sua voz atingiu um tom assustadoramente baixo.

Wendy arregalou os olhos e o analisou devagar.

— Venha, o acampamento é do outro lado. - E dizendo isso, ofereceu sua mão para que ela segurasse, em uma tentativa de suavizar seu comportamento de antes.

A menina hesitou, olhando aquela mão como se esperasse alguma surpresa desagradável. Acabou aceitando, e Peter os guiou pelas árvores até onde estavam os outros meninos perdidos.

Houve certa comoção quando entraram na clareira, ainda de mãos dadas. Não que Peter realmente ligasse para o que qualquer um daqueles garotos pensasse. Ele era o rei da Terra do Nunca, e aqueles eram seus súditos, que obedeciam as suas leis.

Soltando Wendy, ele chamou os outros, que vieram correndo, ansiosos por conhecer a bela garota de ares sonhadores, mas sem coragem de fazer qualquer pergunta. Eles simplesmente a rodearam com seus olhos de animais selvagens, cercando-a como se fosse uma presa. Isso começou a perturbá-la, e Peter Pan deu uma risada austera diante da sua expressão assustada.

— Está é a nova mãe de vocês. Mostrem o acampamento para ela, garotos.

E assim ele deixou Wendy ao cuidado daqueles meninos selvagens e brutos, sem olhar para trás. Andou com seus passos decididos para sua pequena cabana na maior árvore do acampamento, sem se incomodar com que fariam com ela. Ou pelo menos não parecia se importar.

— Você sabe por que Pan trouxe você? – Perguntou um garoto de olhos pequenos e nariz pontudo.

— Como assim? – Perguntou ela, confusa.

— Ele nunca trouxe uma garota antes.

— Talvez ele só queira mudar as coisas por aqui.

— As coisas aqui não precisam de mudanças. - Resmungou um outro rapaz franzino de modos afetados.

E Wendy notou o olhar ameaçador que todos eles lhe lançavam. Queria que Peter não tivesse lhe deixado ali sozinha, pelo menos até que os garotos se acostumassem com ela. Mas aos poucos eles foram contando um pouco de suas histórias. Dizendo que eram meninos perdidos, que tinham sido abandonados pelos pais.

Naquela noite, ela comeu algo que eles caçaram. O sabor podia ser melhor, e Wendy pensou que poderia cozinhar na próxima vez para todos. Talvez isso ajudasse os meninos perdidos a gostarem dela. Ela não viu mais Peter Pan aquele dia. Quando foi dormir, os garotos juntaram-se em um bando e a levaram para uma pequena caverna mobiliada por dentro, uma cama e algumas outras coisas. Era só um pouco afastada do resto do acampamento. Ela se perguntava o motivo de Peter não a ter levado pessoalmente. Estava claro que ele tinha feito aquilo para ela.

Apesar de tudo, apesar do medo e incerteza, o dia havia sido maravilhoso, e ela sonhou em como os seguintes também seriam.


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Notas finais do capítulo

Eu adoro brincar com as coisas mágicas e impossíveis que só podem acontecer ali. Tipo lagos encantados ou lugares cheios de histórias mirabolantes. Ainda vou inventar muitos desses ao longo da história, isso é, se eu realmente postar mais alguma coisa dela.



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