Era uma vez Peter e Wendy escrita por Segunda Estrela


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Todas essas coisas são mais ou menos o que eu gostaria de acreditar que aconteceram em Once Upon a Time. De todas as partes que eles não explicaram sobre Peter e Wendy. Eu sei, é romântico e bobo, mas espero que gostem mesmo assim.



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Peter Pan esgueirava-se por aquela noite escura, enquanto as poucas estrelas, quase todas cobertas pelas nuvens escuras das tempestades, lançavam um brilho indiferente sobre Londres. As rajadas de vento frio movimentavam as copas das árvores, e as poucas pessoas que passavam pela rua tentavam esticar seus casacos e fazê-los cobrir qualquer cantinho que pudesse ser descoberto pelo frio.

Ele olhava para os londrinos com desinteresse, até certo desprezo. Seus olhos verdes faiscando de malícia, enquanto pensava nas pobres e miseráveis vidas que aqueles homens levavam. Sem nunca saber sobre as maravilhas do mundo, eram existências vazias e sem propósito. Desperdiçariam seu tempo de vida em uma rotina eterna de acordar e dormir. Presos naquele ritual mundano banal, até que finalmente fossem tragados pela terra e esquecidos pelo tempo. Talvez, alguns se agarrassem a esperança de que haviam tido uma vida plena, que haviam feito a diferença para alguém, quando na verdade só estavam fugindo da verdade: O mundo era um caos de pessoas buscando por relevância, gente que nascia e morria todo dia, e eles não iam fazer falta nele.

Peter quase ria ao pensar nisso. Não que aquelas regras valessem para ele, Pan construía sua própria sorte. Tinha sido capaz de decidir seu próprio destino, e por ele faria qualquer coisa.

Não sabia dizer a razão de ter escolhido aquela cidade fria e cinzenta para suas peregrinações pelo mundo mortal, talvez tivesse tido vontade de mudar os ares da Terra do Nunca e os mundos repletos de magia. Viajar e encontrar seus órfãos desesperados normalmente era uma diversão para ele, mesmo naquela noite apática e frígida.

Ele voou por inúmeras casas e sobrados enquanto avaliava tudo com seus olhinhos brilhantes. Nada parecia chamar sua atenção, e ele continuava com desinteresse.

Passou por um parque cheio de flores adormecidas que esperavam pelo sol do dia seguinte. Chegou a sobrevoar um grande lago, rodeado por árvores e uma ponte de longos arcos. Lembrou-se de uma velha lenda que era contada para as crianças da cidade, que ali, na copa daquelas árvores, viviam fadas de uma terra distante e cheia de magia. É claro que Peter Pan sabia melhor, sabia que já fazia muito tempo que elas tinham deixado aquele jardim. Não sabia exatamente explicar como, mas sentia com todos os seus poderes e todo o conhecimento que vinha com eles.

Continuou voando até parar em uma casa modesta, mas de certa forma elegante, que estava com as luzes acesas e vozes agitadas de crianças. Podia dizer que o que o atraiu foi a curiosidade, nada mais que isso. Com seus olhos tremulantes, ostentando sua destreza vil, ele se aproximou da janela, buscando dentro do quarto por nada em específico.

 Viu dois garotos brincando despreocupadamente com espadas, lutando alguma guerra imaginária. Deu um sorriso sarcástico para si mesmo, como se risse de uma piada que só ele entendia. Dando uma olhada melhor, viu uma garota sentada na beira de uma cama. Ela tinha olhos profundamente tristes, cabelos loiros escuros cacheados que caíam sobre seus ombros com delicadeza. O nariz, tão pequeno que não entendeu como conseguia respirar, um pouco arrebitado, mas em uma curva graciosa. A boca era rosada e macia, delineada com doçura. Tudo nela tinha um ar de inocência e graça.

Sem que notasse, Peter Pan esqueceu os meninos e se viu olhando para a jovem com interesse. Seu rosto não mudara sua expressão imparcial, mas ele seguia seus movimentos com cautela. Ela não parecia notar sua presença, nem de seus irmãos, como Peter assumiu que eram. Estava completamente absorta nos seus próprios pensamentos. Aqueles belos lábios franzidos de concentração, a estrutura preocupada.

Então uma senhora de ares elegantes entrou com seu longo vestido deslizando pelo quarto. Ela tinha um toque de gentileza que irritou Peter, quase como se escondesse alguma coisa.

Peter Pan se limitava a examinar a cena. Com aqueles olhos noturnos, mas que brilhavam como estrelas cadentes. Queimando em pura intensidade, como se fossem capaz de incendiar florestas inteiras, como se fossem capaz inflamar a alma dos desesperados e fazê-los queimar. Você os via brilhando no escuro antes de perceber qualquer coisa em seu rosto. Algo além de Peter se exibia em seus olhos, e talvez nem mesmo o próprio garoto entendesse. Almas fracas podiam ser facilmente seduzidas por um olhar como aquele. Eles fascinavam e inspiravam terror. O fogo que se via ali não era superficial, não, ele vinha de dentro, você poderia se queimar se chegasse muito perto.

Ainda assim, não era quando seus olhos estavam em chamas que deviam temê-lo, era quando eles se tornavam frios, como aquelas atormentadas noites de Londres.

— Minha querida, o que tanto lhe perturba? – Perguntou a mulher.

A garota não pareceu disposta a responder, simplesmente cruzou os braços e virou seu rosto. Peter aprovou o singelo ato de rebeldia, mesmo que não soubesse o motivo de seu desagrado.

— Ah, mãe, você ouviu o que ela disse. – E assim ela se levantou, e começou a andar pelo quarto gesticulando com raiva. - Aquela tia insuportável, me dizendo o que uma dama deve ou não fazer. Veja só, me disse que eu já tenho que lutar para ser uma boa esposa, que garotas da minha idade já deviam estar noivas. Que não posso ler meus livros.

A mãe não pareceu se incomodar com suas lamúrias, mantinha seu sorriso distante e profundamente gentil.

Falso, pensava Peter.

Ele não conseguia entender porque aquela mulher não estava dando atenção para o sofrimento da sua filha. Mas mesmo assim, mantinha-se afastado, sua expressão era uma faceta indiferente.

— Wendy, você tem que se tornar adulta. – Respondeu mais uma vez a mãe.

— Wendy. – Sussurrou Peter entre seus lábios, mal os abrindo ao falar.

Aquele nome ecoou na sua mente mais algumas vezes, enquanto se acostumava com a forma que ele soava. Havia uma sonoridade distinta nele e como se moldava em seus lábios, quase como se tivesse sido criado para que Peter o dissesse em voz alta.

Wendy andou vagarosamente até a janela, seu rosto iluminado por apenas a luz da lua. Aquele véu azulado e lânguido, que marcavam os contornos delicados do seu rosto com um brilho frágil, como se acariciassem suas bochechas. Os seus olhos, redondos como moedas refletiam aquele brilho distante das estrelas.

Peter se escondeu nas sombras do telhado, mas sem desviar seu rosto por um segundo que fosse.

— Eu queria poder fugir para um lugar onde nunca precisasse crescer. – Falou ela por entre seus lábios bem traçados e vermelhos como botões de rosa.

Peter sentiu uma batida incômoda no peito, não podia ser mera coincidência. Ela estava chamando por ele, mas nenhuma garota tinha feito isso antes, pelo menos ele nunca tinha dado atenção.

Ele permaneceu ali por um longo tempo, enquanto as luzes se apagavam aos poucos, e eles se deitavam aos poucos. Era como se toda a casa começasse a dormir lentamente, toda a cidade. Até ter certeza de que ninguém estava consciente, ele esperou. Depois se esgueirou pela parede e entrou voando pela janela. Deu uma olhada no quarto, mas seguiu com passos vagarosos para onde a garota dormia.

Seus cachos definidos caíam sobre suas bochechas, os lábios cheios e a expressão serena. Seus longos cílios repousavam em suas maçãs do rosto. E ela descansava profundamente.

Peter franziu as sobrancelhas, seu rosto era um misto de perturbação e dúvida. Ele se aproximou dela devagar, dando atenção a cada detalhe, pensando se poderia realmente levá-la para a Terra do Nunca. Ele se viu perdendo mais tempo olhando-a do que estava planejando, perdido nos seus próprios pensamentos. Com suas sobrancelhas franzidas de desagrado, a boca cerrada em reflexão, ele se viu em completa admiração.

Mas se alguém pudesse vê-lo, diria que parecia contrariado.

Então, como que para acordá-lo de seus devaneios, a jovem remexeu-se na cama. Peter, assustado com o abrupto movimento, voou instantaneamente para trás, derrubando qualquer que fosse o objeto que estava em seu caminho. A garota se levantou assustada e ele partiu pela janela, sem saber se ela o tinha visto ou não.

Não ligou para mais nenhum menino perdido aquela noite, voou para casa o mais rápido que conseguia e não olhou para trás nem mesmo uma vez.

Quando a Terra do Nunca surgiu no horizonte, não soube explicar porque não sentiu a mesma satisfação de sempre ao vê-la. Algo no seu peito formigava e o incomodava incansavelmente. Tentou manter sua calmaria, mas seu humor piorava e nem mesmo as mais incríveis belezas do lugar estavam conseguindo acalmá-lo. Não era ciúme ou saudade, era algo muito mais perverso que crescia em seu âmago.

Passaram-se algumas semanas antes que tomasse uma decisão, a decisão de mandar sua sombra buscá-la. Assim como buscava qualquer outro menino perdido, repetia para si mesmo. No entanto, sem saber a razão, ele não buscou a menina naquela mesma noite, nem na seguinte. Ele olhava para sua Terra cheia de encantos e sofrimentos, e parecia hesitar. Sua sombra visitou a casa de Wendy algumas vezes, mas nunca com convicção para levá-la junto com ele.

Passou-se ainda mais tempo quando finalmente decidiu colocar seu plano em ação. O tempo tinha passado mais devagar no mundo humano, e ele não a tinha visto de novo. Estava sozinho em um clareira quando finalmente mandou que a trouxessem.

Depois se deitou para uma de suas noites de sono mais perturbadas. Perturbadas com imagem da garota chegando à ilha e assustando-se com tudo que via. Ela parecia um fantasma pronto para assombrá-lo. Na manhã seguinte, quando mal rompia a aurora, já estava de pé. Até mesmo os meninos perdidos mais distraídos podiam perceber que algo incomodava Pan. Ele estava muito mais silencioso que o normal, sentado em um canto distante, a postura ranzinza. Nem mesmo tocava sua flauta. Suas sobrancelhas, normalmente arqueadas com desdém, quase se tocavam em uma expressão que poderia ser ao mesmo tempo preocupação e desagrado.

— Estamos esperando por alguém? Não vi sua sombra hoje. - Perguntou Félix, como sempre, o mais atento e dedicado.

Peter Pan não gostava que lhe fizessem perguntas, como se devesse explicações a alguém, mas aquela atitude parecia consideravelmente mais irritante com seu péssimo humor. Um mal-estar incômodo estava tomando conta do seu corpo, e ele não sabia como parar. E não saber tornava tudo pior. A sensação era angustiante, e não era nervosismo ou medo de encontrá-la. Aquele sentimento era um rancor profundo.

— Não é da sua conta. – Foi a única resposta que Félix recebeu.

E Peter continuou em seu silêncio inquieto por mais um tempo, até que pôde sentir um tremor pelo seu corpo, e aquela sensação de onipotência que devia ser reservada apenas aos deuses. Sua sombra tinha chegado à ilha, e estava carregando alguém.


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Notas finais do capítulo

O Jardim por onde ele voa é uma referência a Kensington Gardens, onde originalmente era o lar do Peter Pan em um dos primeiros livros do J.M. Barrie. Eu vou fazer várias referências ao livro original durante a fanfic, espero que notem.
A história já está terminada, eu vou postar o resto se achar que as pessoas gostaram.
Por favor, é muito importante e divertido ouvir a opinião de vocês. Umas melhores partes de escrever uma história é saber o que vão dizer dela. Por favor, me dê só um minutinho do seu tempo para eu saber o que você achou, não importa se são críticas negativas. Elas também são importantes.



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