A Lenda de Yuan escrita por Seok


Capítulo 10
Conexões


Notas iniciais do capítulo

Por favor, comentem =( A falta de comentários é extremamente desanimadora, porque eu realmente me empenho bastante em tentar tornar cada capítulo único.

E, a propósito, desculpem se eu não cumpri as exigências esperadas. É que fica realmente muito difícil tornar emocionante sem uma animação, já que estamos acostumados com as trilhas sonoras e tudo mais.
No mais, espero que gostem ainda assim.



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E, como previsto, o Avatar iniciou sua jornada espiritual. Para Yuan, a visão do mundo dos espíritos era ainda mais fascinante do que todas as coisas que já vira. Um universo completamente novo, desvendado apenas pelos mais corajosos. Estavam rodeados por flores roxas, que brilhavam com a luz do céu, que era de um azul intenso e vívido. O garoto pôde ver os espíritos dançando pelos ares, leves como plumas. Além do jardim em que estava, colinas azuis, que mais pareciam feitas de gelo, se estendiam até onde sua visão lhe permitia ver. Para Yuan, que viu um pássaro vermelho voar pelos céus, eles pareciam ser feitos de jóias preciosas. Nunca imaginara antes que os espíritos eram tão exuberantes em seu mundo natural. E, quando sem querer tropeçou em uma das flores que adornavam o chão, ela se desmanchou em brilhos e deu origem à uma borboleta púrpura, pura como jade, que o rodeou e partiu para os céus.

Olhou, então, para Jinora, os olhos verdes reluzindo admiração como os de um bebê; adoráveis, por assim dizer. A mestra do ar sorriu, tomada por uma memória antiga, vinda de sua mocidade, onde lembrou-se da primeira vez que visitara o mundo espiritual. E agora estava ali, de novo, com sua velha amiga, com um rosto diferente. No momento em que Jinora vislumbrou o brilho nos olhos do mais novo, teve a plena convicção de que sua amiga ainda estava ali. São os mesmos olhos dela, pensou. Viu-o, então, mais do que como amigo. Adotou-o silenciosamente como irmão, pois era assim que via Korra.

— Jinora, para onde vamos? — disse Yuan, olhando ao redor.

A mais velha, então, viu-se trazida de volta à realidade. Respondeu, bondosamente:

— Vamos perguntar aos espíritos. Mas, veja, você precisa tomar cuidado. Muitos espíritos irão ajudá-lo, mas muitos também tentarão enganá-lo.

Embora confuso quanto à veracidade da informação, Yuan consentiu. Jinora fechou os olhos e respirou profundamente. Concentrou-se unicamente na sensação de respirar.

Por um instante, nada aconteceu. Entretanto, passados alguns momentos, um espírito parecido com um coelho verde-água apareceu por entre as árvores. Suas asas eram suas orelhas, e Jinora o reconheceu imediatamente: era Pé-Peludo, um espírito que a Mestra do Ar amava tanto quanto seu bisão. Ainda que Jinora fosse refém da idade, isso em nada pareceu interferir sua amizade com o espírito, pois quando ele se aproximou o suficiente, ela o abraçou. Era um pouco maior do que ela, seus pelos macios acariciavam o rosto da idosa.

No momento em que bateu os olhos em Pé-Peludo, Yuan pôde reconhecê-lo. Não sabia como e nem porquê, simplesmente sabia que o conhecia. Instintivamente, disse:

— Pé-Peludo!

Jinora o lançou um olhar curioso, até que finalmente ligou os pontos. Bondosamente, ela o respondeu:

— Isso mesmo. — começou. — Você o conheceu em uma vida passada. E é por isso que você o reconhece agora.

Ainda que tentasse esconder, Yuan ficou confuso. Ele abriu a boca para falar, mas tornou a fechá-la.

— No mundo espiritual, você, como o Avatar, está conectado à toda energia espiritual. Por isso você pôde reconhecer Pé-Peludo. Você é mais poderoso aqui, Yuan.

— Não sinto como se fosse.

— Veja, Yuan… você precisará seguir sozinho. Pé-Peludo não pode carregar nós dois.

E, então, como se entendesse os sentimentos de Jinora, o espírito a acariciou com o rosto peludo, como uma despedida e, após isso, seguiu para o lado de Yuan. Assumiu uma posição semelhante à de um cavalo, para que o Avatar pudesse montar. O moreno olhou curiosamente para Jinora, que assentiu. Finalmente, o mais novo montou no espírito, que não perdeu tempo em içar o corpo nos  ares. Jinora acenou, do chão, até perder Yuan de vista.

O Avatar, agora, estava sozinho no mundo espiritual. E nunca esteve tão fascinado. As montanhas azuis, que pareciam alpes de neve, pareciam ser feitas de cristais. O vento soprava seu rosto, e ele se sentiu infinito. Não sabia o que isso significava, simplesmente sentiu como se pudesse fazer qualquer coisa... Estava completamente livre, pela primeira vez. Seu coração estava exultante. Como se olhasse para uma pintura, Yuan admirava a paisagem, que mudava conforme ele aprofundava-se no mundo espiritual. Mesmo que não soubesse, sua energia influenciava para a beleza do local: o sol brilhava intensamente nos céus, irradiando vida e beleza para todos os lugares que conseguia alcançar.

No entanto, nem tudo são flores. Quando finalmente cruzou os alpes, viu a escuridão. E ela era assustadora. O Avatar sentiu todo seu corpo arrepiar-se, e Pé-Peludo soltou um guincho. Algo horrível espreitava das sombras. Começaram a perder altitude; o espírito que estava montado teve sua cor verde-água transmutada para um tom azul, e ele ficou ainda maior. No entanto, sua aparência oscilava. Pé-Peludo lutava contra as trevas, mas era difícil resistir. Elas eram tão sedutoras e o abraçavam silenciosamente. Antes que pudesse perceber, ambos despencaram dos céus.

Yuan soltou um grito por cima do som do vento e caiu em queda livre contra o chão. Abaixo de si, uma mata fechada e diversas árvores. Seu corpo arranhou-se nos galhos duros das árvores que pareciam mortas — o que lhe era estranho, pois árvores mortas não são duras — e colidiu com o chão num baque. ‘’Uff!’’, exclamou. Seu corpo inteiro estava dolorido e arranhado em vários pontos, contudo, Yuan sabia que se não fossem as árvores, provavelmente tudo que teria restado era um patê de Avatar. Então, levantou-se com algumas dificuldades e olhou ao redor.

A escuridão o observava penosamente. Yuan olhava para o nada, sem ser encarado de volta; não por algo que pudesse ver. Existia um som quase inaudível na floresta morta, e não existia luz em lugar algum. Estava perdido, cercado pelas sombras. Alguém o observava. Ou algo. Era difícil deduzir. ‘’Quem está aí?!’’ gritou, sem ser respondido.

Ele, então, recuou até onde lhe era permitido, até que bateu de costas na árvore. Não a tinha visto e sentiu seu corpo pular instintivamente. Estava assustado. Algo o incomodava. Algo sombrio. ‘’Apareça agora mesmo!’’, vociferou Yuan. Novamente, nada o respondeu. A tensão era imensa. O silêncio era ensurdecedor. Cerrou os punhos e deslizou as pernas pela terra, descrevendo um arco com as mãos e projetando chamas em forma de meia-lua, que iluminaram por breves momentos na escuridão até desaparecerem. Finalmente, sentiu algo em seus ombros e arrepiou-se novamente. Uma aranha — ou, o que pelo menos, parecia ser uma aranha — caminhava por ali, deformada, com seu hexoesqueleto brilhando em um tom roxo. O Avatar arregalou os olhos e, em um rápido movimento, a empurrou com as costas da mão.

Ele não esperaria até que algo o surpreendesse. Correu, o mais rápido que suas pernas lhe permitiam. Era como seguir por um corredor infinito. Tudo lhe parecia igual. As árvores mortas eram as mesmas. No entanto, quando cruzou mais um jogo de árvores, viu algo que lhe surpreendeu. Seu corpo ficou estático. Olhando diretamente em seus olhos, um espírito profano cintilava em azul escuro. Tinha a forma de um escorpião, e seu ferrão dançava no ar. A criatura tentou atingir o moreno com um golpe certeiro do ferrão e, apenas quando viu-se a um triz de ser fatiado, Yuan recuperou seus movimentos.

Ele se atirou para a lateral, pisou forte no chão — tão forte que fez com que poeira levantasse — e ergueu uma pilatra de terra pela lateral do que imaginava ser um escorpião. A criatura, então, foi arremessada até uma das árvores e fez um estrondo com a colisão. Mas Yuan sabia que não conseguiria permanecer em um embate contra um espírito em seu próprio mundo. Não enquanto não fosse um Avatar completo. O espírito ficou atordoado por alguns instantes, e era o momento certo para fugir. E foi o que o Avatar fez: ele disparou pelas árvores novamente, e imaginou estar à salvo, até que finalmente ouviu as várias pernas do ser profano a alguns metros atrás, derrubando algumas árvores que ousavam ficar em seu caminho.

E não havia apenas um. Muitas outras formas hediondas estavam mascaradas na escuridão. Mas não era aquilo que parecia incomodar. Yuan sentia como se a escuridão estivesse em um lugar do qual nunca poderia escapar, não importa o quanto corresse: dentro dele mesmo. Nunca havia antes experimentado tal sensação. Seus sentimentos estavam em conflito. O jovem não sabia, contudo, o caos estava tomando maiores proporções no mundo material. E isso influenciava para que as forças das trevas ganhassem cada vez mais força.

Ligados por laços tão antigos quanto o mundo, o bem não pode existir sem o mal; e a luz estava dentro de Yuan… e era de lá que a escuridão tentava emergir. A floresta morta ainda se estendia por vários metros ao seu redor, mas pôde notar quando parou de ser perseguido. Entretanto, ao olhar ao redor para se certificar de sua segurança, foi alvo de uma imagem aterrorizante. Não era um espírito gigante. Não era um igualitário. Não era Amon. Era algo muito pior.

Observando nas sombras, estava sua imagem semelhança. Yuan viu um reflexo de si mesmo, parado. Ele não falava nada, mas causava uma genuína sensação de pânico. Emanava uma força maligna nunca antes sentida. Seu espelho apenas diferenciava-se por uma única questão: os olhos emitiam um brilho vermelho como sangue, contrastando perfeitamente com os seus, que era representado por um clarão branco e imaculado como a luz.

E a imagem tremeluziu e desapareceu.

Ouviu, então, vindo de lugar nenhum e de todos os lugares:

Olhe.

Dentro de você.

O que você vê?

Seja lá o que encontrar, você deve manter.

Você não pode temer…

O que jaz abaixo.

Criou fogo a partir da palma de sua mão, que lhe serviu como uma tocha. Seguiu, então, pelo restante da floresta, até finalmente encontrar uma clareira. Seu peito foi invadido por um misto de felicidade e alívio. Correu o mais rápido que conseguiu até finalmente alcançar a grama verde e a luz. O céu, estranhamente, não estava mais azul como antes o vira. Agora, estava escuro, como se uma tempestade estivesse prestes a se formar.

Yuan sentiu algo tocar em seu ombro. Seu corpo inteiro estremeceu e ele virou-se em um ímpeto, pronto para atacar. As chamas chegaram a surgir entre os dedos fechados e estavam prestes a pulverizar o que quer que estivesse atrás.
Felizmente, conseguiu contê-las a tempo.

A pessoa que o tocou deu uma risada bondosa. Seu rosto evidenciava a idade avançava, e a barba era longa. A barriga cheinha servia para garantir uma certa pureza ao idoso, que trajava vestes do Reino da Terra. O senhor disse:

— Eu sabia que o encontraria.

Yuan levou alguns instantes para entender. Ele piscava os olhos, confuso, até que finalmente percebeu que reconhecia o idoso. Novamente, não sabia como. Simplesmente sentia que sabia quem ele era.

— Eu te conheço — falou, convicto. — Tenho certeza que sim.

— Sim, Yuan, você me conhece. Eu sou o tio Iroh.

— Iroh…

— Fomos bons amigos em suas vidas passadas. Eu senti que você estava aqui, já que o céu não costuma ficar assim…

— Não é minha culpa!

Iroh o olhou por alguns instantes, compreensivo. As marcas de idade em seu rosto eram as de quem vivia sorrindo, e naquele momento não foi diferente.

— No mundo espiritual, tudo que você sente acaba se tornando realidade. Principalmente para o Avatar, porque você liga os dois mundos. Apenas você pode manter o equilíbrio entre os espíritos e os humanos…

— Eu… não sei o que senti. Iroh, eu vi… eu vi… eu não sei o que era, mas… estou com tanto medo…

E o céu se tornou cada vez mais escuro. Iroh levantou seus olhos dourados para as nuvens negras que agora se faziam presentes, e colocou uma das mãos nos ombros de Yuan quando desceu seus olhos pacíficos para o rapaz.

— O que quer que tenha visto, deixe na floresta. Você está seguro aqui. Muitas vezes, vemos coisas que não queremos ou não sabemos explicar. Mas se você deixar que a luz tome conta, chegará a um lugar muito melhor.

Yuan prestou atenção nas palavras de Iroh. Elas eram reconfortantes, a medida em que eram extraordinárias. Fechou os olhos e respirou fundo. Concentrou-se na sensação do toque de Iroh. Lembrou do beijo que dera em Fang, e em como ficara feliz quando sentiu seus lábios pela primeira vez. Nos céus, as nuvens obscuras retrocederam e o sol ganhou seu lugar novamente.

— Iroh… o mundo espiritual não deveria estar completamente em paz? Por que isso aconteceu?

— Os espíritos estavam em pleno equilíbrio, mas o sentimento dos humanos podem romper esse véu. Algo de muito sério deve estar acontecendo lá fora, algo que provoca medo e dor. E os espíritos sentem isso. Essa floresta da qual você acabou de sair, antes estava completamente viva…

— Mas todo mundo sabe das histórias de Korra. Ela salvou o mundo de cair em escuridão, então por quê?

— A luz não existe sem as trevas. Quando Unalaq destruiu o espírito da luz, ela emergiu de dentro do espírito das trevas. Algumas coisas podem acelerar o processo… como o desequilíbrio.

Yuan agarrou sua camisa, bem em cima do coração. Arregalou os olhos sem querer e acabou por recuar. Iroh ainda o olhava pacientemente.

— Então… a escuridão vai emergir… de mim?

— Não sei, Yuan. Mas você é o Avatar. Sei que conseguirá manter seu próprio equilíbrio, se quiser manter o do mundo.

Dessa vez, Yuan não contestou. Ele sabia que conseguiria. Ou, pelo menos, sabia que precisava conseguir. Não queria imaginar o que aconteceria se o espírito Avatar fosse corrompido pela escuridão.

— Se você olhar para a luz, é isso que você encontrará. — alertou Iroh. — Mas, se você olhar para a escuridão… também é só isso que você verá.

— Eu escolho a luz. Eu não vou falhar, Iroh. Eu sou o Avatar.

Pela primeira vez, pronunciou tais palavras em alto e bom som. Estava convicto do que deveria fazer. Pareceu finalmente perceber o quão importante era aceitar desempenhar sua função. Poucos momentos antes, sentira a escuridão na pele. E entendeu que não ansiava o mesmo para sua família, para os seus amigos e para o seu amado. Compreendeu que a vida era extremamente importante. Assim que fora revelado como Avatar, Yuan, a princípio, recusou todos os ideais que diziam respeito ao seu novo título. Empatia, porém, é a capacidade de entender a dor alheia. O mundo estava revelando seus males; manifestos de segregação, ódio, e preconceito — ora, não eram tais os ideias de Amon, a quem nunca sequer conheceu, mas já tanto detestava? Decidiu que resistiria.

Iroh o olhava com certo orgulho. Via muito do sobrinho no garoto do Reino da Terra. Após um breve momento de silêncio, Yuan perguntou:

— Como posso chegar à Árvore do Tempo?

— Existe um amigo seu que pode lhe ajudar, venha comigo.

 

                                                                    

Era um deslumbrante pássaro-dragão dourado. As asas refletiam a luz do sol, intensas e surpreendentemente grandes. Sua crina reluzia como ouro, e os olhos vermelhos eram impetuosos. Antes montado por Avatar Korra, o espírito reconheceu Yuan no momento em que sentiu a energia de Raava dentro do rapaz. Abriu espaço para que o Avatar montasse, e de lá, ele acenou para Iroh. As asas agitaram e arremessaram o pássaro-dragão em um voo pelos céus, sua cauda serpenteando e dançando no ar. E, assim, seguiram para a Árvore do Tempo.

 

                                           [...]

Quando as colinas terminaram, Yuan pôde ver uma árvore grande no centro de um campo circular. Ela não possuía folhas, mas emanava mais vitalidade do que qualquer coisa que Yuan já vira. Também foi capaz de ver duas fontes etéreas de luz subindo em direção aos céus. Um dos jorros de luz era azul, enquanto o outro, ostentava uma luz amarela — e ambos cintilavam ardentemente. Os portais espirituais, pensou Yuan.

Os pelos do espírito híbrido estabilizavam-se conforme ele perdia altitude. Aos poucos, os ventos paravam de balançar os cabelos castanhos de Yuan, até que finalmente o pássaro-dragão parou de dançar pelos ares e enroscou-se no chão. O Avatar desceu bem perto da Árvore do Tempo, mas o céu era completamente diferente do restante do Mundo Espiritual. Era laranja, puxado para o rosado, a representação da completa harmonia. Muitos anos antes, quando Vaatu estava sob seu cárcere, os céus eram obscuros por sua mera presença. Haviam espíritos bondosos que voavam alegremente ao redor da árvore, e outros brincavam no chão.

Yuan desceu das costas do velho amigo, que bateu suas asas de volta para o céu. Quando viu-se diante da grande árvore, Yuan não soube o que deveria fazer. Estava confuso. Não havia nenhum espírito que parecesse antigo ou poderoso. Todos eram, na verdade, muito bobos ou infantis, e até fofos. Decidiu, então, entrar no oco da Árvore do Tempo. Ele sentiu-se de pernas cruzadas e uniu as mãos. Sentia que era o que deveria fazer.

Várias imagens azuladas surgiram na parte interna, entre as raízes e videiras. Yuan viu cenas das quais se recordava, e outras que jamais havia presenciado. Mas ele sabia, de alguma forma, que já estava ali antes. O garoto fechou seus olhos e tentou acalmar seus pensamentos. Concentrou-se na energia estranha que sentia. As vigas da árvore ligavam o mundo espiritual ao mundo material. Yuan estava conectado à todas as energias simultaneamente, e ele pôde sentir quando ela o abraçou lentamente.

Mentalizou, então, o espírito que lhe fora mencionado. Queria que ele aparecesse. E, ainda que não soubesse, ser o Avatar lhe dava privilégios; ele era capaz de alterar a realidade do Mundo Espiritual, principalmente no lar de Yen Hao. Os olhos do Avatar estavam fechados, mas ele sentia tudo ao seu redor. Pensou em como enfrentaria as dificuldades e em como amava Fang. Pensou em como queria proteger o mundo, para que ninguém sofresse como ele sofreu na floresta morta.

E, então, um espiral de luz apareceu diante dele. Todos os espíritos que antes brincavam foram atraídos pela energia de Raava, que se tornava cada vez mais prazerosa e poderosa. Yuan abriu os olhos repentinamente, e a luz invadiu seus olhos. Não pôde olhar diretamente para o que quer que estivesse adiante.

— Espírito Yen Hao, é você?

Nada. Não houve resposta. Ao menos, não resposta física. Yuan pôde ouvir a resposta vindo de dentro dele, como se ecoasse em sua cabeça. ‘’Avatar…’’

Presumiu, então, que talvez fosse melhor ficar de olhos fechados, e assim permaneceu. Na posição da flor de lótus, a flor que representa um espírito imaculado, Yuan concentrou-se na voz em sua mente. Teve uma sensação calorosa, como receber o abraço de alguém querido. Era aconchegante, como uma lareira nos dias de neve. Sussurrou:

— Preciso de sua ajuda, poderoso espírito.

E a voz, novamente, ecoou em sua cabeça. Era como ouvi-la de longe, mas, ao mesmo tempo, de perto. Ela vinha de todos os lugares e de lugar nenhum. Soava como um eco profundo em sua mente, mas não o deixava confuso. ‘’Raava… é bom revê-la.’’

Yuan estava completamente alheio ao nome do espírito que carregava dentro de si. Então, concentrou-se na voz e fez mais um pedido:

— Por favor, poderoso espírito, o mundo está em perigo… Eu preciso de sua ajuda para lembrar da minha vida, do meu passado…

O eco estava cada vez mais próximo, mais forte, assim como o brilho que podia perceber, mesmo com os olhos fechados. A luz era tão forte que seria capaz de extinguir qualquer escuridão. ‘’Avatar… não sinto mais a sua imensa sabedoria... ‘’

— Ela foi tirada de mim. — sussurrou Yuan. — Não sei como. Por isso preciso de sua ajuda, hmm… senhor. Não sou capaz de contatar minhas vidas passadas.

Fez-se silêncio por alguns momentos.

‘’Abra seus olhos…’’

— Eu… não consigo. A luz é muito forte.

‘’Não tenha medo do desconhecido. Abra seus olhos. Estenda seus horizontes, Avatar… e poderá ver a verdade escondida nas sombras através da poderosa luz.’’

— Eu tenho medo — disse Yuan. — É muito difícil...

Então, acrescentou:

''Sua conexão sempre esteve dentro de você... Suas vidas passadas estão entrelaçadas ao espírito de Wan. Você só precisa acreditar, pois isso é algo que ninguém pode te tirar. Olhe para o seu interior. Não tenha medo.''

O garoto teve um rápido vislumbre de tudo que acontecera até o momento. Lembrou-se do beijo com Fang, e da vez que perdera o controle. Lembrou-se dos amigos, das risadas. De tudo de bom que estava o aguardando. Então, ele reuniu o máximo de coragem e disse:

— Não tenho medo.

Seus olhos brilharam.

Yuan abriu seus olhos lentamente. Foi difícil, no começo, pois ela fazia com que seus olhos ardessem. Ele colocou a palma da mão na frente e, aos poucos, tentou olhar. Abriu um dedo. Mas por que era tão difícil? Talvez a dor fosse tanta que houvesse adormecido antes que a consciência despertasse; e tomava-lhe todos os membros, silenciava-lhe o coração, deixando um oco verídico em seu peito, que jamais pressentira antes. Não sabia se estava acordado, ou em um limbo. Não parecia mais estar dentro d’A Árvore do Tempo. Mas pôde abrir os olhos e ver a luz.

Viu, dentro dela uma imagem rápida de Avatar Korra. Seus olhos emitiam um brilho branco, poderoso. E, depois, um homem adulto com uma seta de Nômade do Ar também possuía seus olhos brilhantes, tal como sua seta. Avatar Aang. Inúmeras imagens passaram, como flashs, diante de seus olhos. Era o desejado. Sem um coração enfurecido, Yuan percebia claramente a si mesmo.  Mais do que a própria mente, o coração se infecta no decorrer da vida e exala fumos e sombras que distorcem ou cobrem todo o discernimento.

Era mais perspicaz do que havia se mostrado, menos consternado e menos cúmplice – diferente de como havia atuado –; também possuía uma intolerância maior às injustiças do mundo. E, então, viu-se, em um lugar celeste, não havia chão, mas de alguma forma ainda estava sentado. Diante dele, uma enorme fileira com diversas pessoas ancestrais. Estavam organizadas em uma fileira, e todas ostentavam olhos brilhantes. Isso não era tudo; o reflexo de Raava se formava no peito de cada um deles, como se ela brilhasse dentro de seus seres. E o mesmo aconteceu com Yuan. Ainda estava longe de controlar o Estado Avatar, mas pôde reconhecer os rostos além do de Korra, como se um elo fosse estabelecido com cada um deles. Laços foram retirados da escuridão. Memórias que agora estavam limpas e fluidas como um riacho que segue seu curso. O espírito concedera parte de sua força para que Raava voltasse a ser o que um dia foi. Ainda que não soubesse muito de seu passado, sabia que contaria com a experiência de vidas que sequer conhecia. Contactá-las não seria fácil — impossível, talvez? — mas apenas o tempo diria se a conexão estava, finalmente, reerguida; ou, quem sabe, aquilo era apenas ilusão de um garoto sonhador.

Yuan precisaria de toda a sabedoria para enfrentar o que estava por vir. Sua jornada fora concluída, e assim como previsto, ele cresceu como homem, e também como Avatar.

Agora, o mundo finalmente podia clamar: O Avatar voltou.


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