Moon Creatures escrita por Ana


Capítulo 2
Cap. 2 - O menino dos olhos azuis


Notas iniciais do capítulo

Não costumo fazer capítulos longos *embora esteja trabalhando nisso* então esse pra mim já foi uma conquista.
Boa leitura!



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Uma luz opaca atravessava o vidro da janela na exata direção dos meus olhos, era impressionante como algo tão insignificante podia ser um incômodo horrível, capaz de me acordar todos os dias. Ainda com os olhos inchados me ajeitei nos lençóis brancos, sempre jurava que iria lembrar-me de dormir com os pés na cabeceira, para que o sono se alongasse por mais algumas horas, infelizmente eu parecia fazer questão de esquecer. Não consegui evitar o sorriso que se desenhava em meus lábios finos ao lembrar o quanto Jack iria implicar se descobrisse como isso me irritava, “Nós não precisamos dormir” ou “Por que você insiste em fazer isso todas as noites? Tem noção do quanto você desperdiça essas horas?”, mas tudo ali era tão macio e aconchegante, não tinha como evitar.

Já fazia muito tempo desde que havíamos nos tornado amigos, desde o dia em que, segundo ele, eu “nasci”, embora seja ridículo que alguém nasça com rosto de vinte anos, ainda machucada e confusa naquele lugar que me dava calafrios. Costumava brincar enquanto corria meus dedos pelos seus cabelos brancos, que ele tinha sido meu salvador, ali sem memória, sem saber o que fazer, ele me ajudou, me contou tudo o que sabia sobre mim, sobre nós, as criações da lua.

Seres criados com magia, mas ele mesmo sabia muito pouco, embora tivesse uma necessidade enorme de descobrir. Dizia que eu era diferente dos outros e ele gostava de mim, gostava de me ter por perto. Queria proteger e cuidar, embora tivesse um espírito livre demais para isso, sempre acabava indo embora, mas eu sabia que ia voltar, ele sempre voltava, tinha esses padrões engraçados.

Ele queria descobrir o mundo e eu só queria ficar ali, segura e feliz, e Jack Frost nunca combinou muito com segurança ou estabilidade, ele era dessas criaturas intensas, que fazem a vida valer a pena, e que fazem a nós, meros seres comuns, invejarem a força de vida presente neles. Por isso tinha de me acostumar a vê-lo partir, e por mais que isso me doesse, nunca poderia pedir-lhe para que fosse de outra forma, aquilo era ele, e eu o amava daquele jeito.

A luz não iria me deixar dormir e eu já estava desperta demais para tentar novamente, então lentamente escorreguei pela cama, ainda não totalmente desperta, até um criado onde descansava uma bacia de prata com um pouco de água para me lavar, água gelada ajudava aquele despertar preguiçoso. Fitando pela janela pude ver o dia pálido que me esperava do lado de fora, dia sem nuvens, exceto por um ponto que parecia se mover com o vento, era Frost, voltando pra casa. Não consegui evitar o sorriso e as mãos frenéticas no cabelo, para tentar arrumar a bagunça matinal enquanto corria para a porta.

— Frost?! – uma exclamação muda fugiu para aquele garoto de sorriso travesso, que acabara de descer com o vento e corria na minha direção.

— Elsa... – ele disse como um suspiro enquanto me envolvia e me apertava em um longo abraço – Você não faz ideia do quanto senti sua falta.

— Não mais do que eu – sussurrei em seu ouvido enquanto ele segurava minha cintura com mais força e me girava no ar, me fazendo explodir em gargalhadas.

— Pelo visto você está certa – falou com o velho tom de ironia, acompanhado daquele sorriso que é tão dele, enquanto arqueava uma das sobrancelhas e se afastava para me olhar - Eu não vim correndo descalço e de camisola.

 - Isso só por que você sempre está descalço – ri tentando imitar seu sorriso – e só usa minhas camisolas quando eu não estou olhando.

— Isso mesmo – respondeu com uma risada, me puxando novamente para um abraço – Eu realmente senti sua falta.

— Eu sei, e eu também senti a sua – descolei nossos rostos e dei um estalinho na ponta de seu nariz, que estava sempre um pouco vermelho, como se vivesse numa eterna rinite ou fosse uma das renas do Papai Noel, mas eu achava charmoso, por que não tem nada que Frost não consiga tornar atraente.

Sem desviar o entrelacei sua mão à minha, as palmas frias e a pele desgastada de sempre, ainda podia sentir algo novo, provavelmente um corte feito em mais uma de suas infinitas brincadeiras, e o fui conduzindo para o interior da casa. Uma construção simples na montanha, não muito longe do rio, mas diferente das águas, eu gostava daqui, da neve que nunca desaparecia pela altitude, fazia me sentir segura e tranquila. Gostava do frio, do vento forte, de brincar na neve quando ficava fofa, ali era a minha casa, o lugar onde eu podia ser eu.

— Uau! – disse atravessando o portal - Isso aqui não mudou nada, você ainda deve ter obsessão por limpar coisas, estou certo?

— Não é obsessão – ri enquanto me dirigia ao meu quarto – É só higiene, sabe, você deveria experimentar.

Abrindo o guarda-roupa pude percorrer minhas mãos sobre os vestidos, decidi-me por um simples, de cor creme com poucos bordados, era de corpete colado ao corpo e saia sem muito volume, era um modelo mais adequado para tempos de calor, mas como gostava do frio me dava ao luxo de não me importar com esse tipo de questão. Gostava daquele vestido por realçar minha palidez, me fazia sentir feita de neve, o que era engraçado, por que eu meio que era mesmo.

— Elsa, eu estive pensando... – eu o conhecia o suficiente pra saber que não queria ouvir o resto e que se ouvisse iriamos brigar.

— Pensando? Nossa isso é uma novidade! – arrisquei em tom de brincadeira

Consegui com essa tentativa tosca arrancar um suspiro de cansaço, isso eram noticias ruins, normalmente ele se divertia com as minhas tentativas de fazê-lo rir, abaixei meu rosto e esperei com as mãos tremulas a mesma discussão de sempre.

— Você deveria voltar lá, sabe, ir outra vez ao rio e deixar de ter tanto medo de uma região que você insiste em não deixar.

— Você poderia ter feito sua chegada muito mais feliz se não tivesse insistindo nesse assunto – resmunguei honestamente cansada – outra vez.

— Já fazem o que? Anos? – ele caminhou para perto de mim e envolveu meu rosto com suas mãos, me forçando a olhar nos seus olhos, como se eu fosse uma criança emburrada - É importante, lembra todas as vezes que eu te disse que não sabia por que, mas que você era diferente dos outros, você tem algo especial e eu quero te ajudar a descobrir o que é.

— Eu sou diferente por que você gosta de mim – disse enquanto me livrava de suas mãos – e é só isso, não tem nada em mim que eu queira descobrir, não quero saber nada.

— Por isso também – ele suspirou – Mas você não pode ficar assim, vivendo aqui quase como prisioneira, você tem algo com esse lugar, podia, por favor, me ajudar a cuidar de você?

— E por que eu não posso simplesmente ser assim? Ser diferente? – minha voz já começava a embargar – Se não gosta disso por que não vai embora? Você sempre vai de qualquer jeito...

— Eu vou por que preciso! Que merda! – Quer saber? Eu não sou acorrentado a você e não tenho obrigação de ser, mas quando eu estou aqui é por que quero!  Você que não está aqui por que quer, está aqui por que não consegue sair, está presa!

— Você não precisa, vai por que quer! E só volta por que antes de mim você estava completamente só e eu sou sua única opção – as lágrimas corriam pelo rosto, eu odiava as brigas, era como se tudo de pior de nos estivesse ali, gritando tudo o que ficou engasgado e preso na garganta - Você aponta os problemas dos outros, mas nunca está disposto a pensar sobre os seus!

— Vamos... – replicou com uma voz sumida – Vamos só conversar, ok? Não precisamos disso, eu só falo por que me importo, de verdade.

— Desculpa... – falei colocando as mãos no rosto – Só que é muito difícil pra mim, eu não quero saber, eu estou bem aqui e agora, e isso é um direito meu. E eu entendo que não concorde comigo, mas preciso de não saber, assim como você precisa do contrário.

— Tá tudo bem – Mas é importante, não pra descobrir nada, mas pra que você não se sinta desse jeito. Eu te conheço, sei que você não está e nunca esteve bem com essa história, e o que eu mais quero é te ver feliz.

Por um alguns segundos ficamos assim, em silêncio, apenas ouvindo o respirar um do outro.

— Tudo bem, podemos ir até o rio.


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