Eyes On Fire escrita por Brê Milk


Capítulo 9
Chapter 8: O não combinado


Notas iniciais do capítulo

But I'm only human
And I bleed when
I fall down
I'm only human
And I crash and I break down
Your words in my head, knives in my heart
You build me up and then
I fall apart
'Cause I'm only human


- Christina Perri (Human)



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Brooke Evern

 

 

 Encarava as ruas vazias com um gorro na cabeça enquanto esperava o sinal abrir para os dois carros na pista, pararem. Sua cabeça estava curiosamente leve, livre de qualquer pensamento, e aquilo a deixava em paz. A bebida achocolatada permanecia intacta em sua mão, e ela já traçava a próxima parada em sua mente. O relógio mal marcara as oito em ponto e ela já estava pronta para um dia sem rumo, ziguezagueando pelas ruas de Portland, coberta por gelo. A caminhada havia sido longa para chegar até ali, mas ela não se importava. Costumava fazer isso antes, em um passado distante, antes do acidente e das clínicas. O sinal ficou vermelho naquele instante em que a lembrança a atingiu, e Brooke sacudiu a cabeça, se apressando a atravessar a rua. Era seu último dia de férias do recesso, e ela decidiu aproveita - ló assim; sozinha consigo mesma e em permanente silêncio. Diferentemente dos dias passados, onde sua mãe não deixara isso acontecer.

Entre o natal e o ano novo, tudo que Brooke conseguiu sentir foi cansaço pela constante batalha de cuidar de Marcy. Sua mãe não estava bem, e parecia que todo o teatro e a falsa esperança de superar a morte de Penny, acabara. Passar o dia todo na cama, e se embriagar de álcool, era tudo que Marcy conseguia fazer. Finalmente estava desmoronando, a fase da negação estava passando, e isso preocupava Brooke. O que viria depois? Ela não sabia. Apenas não podia continuar mantendo as coisas como estavam: ela não podia aguentar o peso de tudo, sozinha. Brooke achava que estava em uma encruzilhada, onde para qualquer lado que se virasse, sempre haveria uma obrigação a ser cumprida. Cuidar da mãe, manter a casa organizada, se virar na loja, fazer os deveres da escola, se manter sã. Parecia existir um abismo entre todas aquelas coisas que precisavam serem feitas por alguém, mas ao mesmo tempo, todas elas pareciam cair junto consigo dentro do abismo. Não sabia se conseguiria continuar vivendo aquilo, não sem antes desmoronar definitivamente.

 Sua mão tocou no vidro da porta giratória, e respirando fundo, ela entrou na livraria. Estava vazia, exceto pela mulher loira atrás do caixa, que aparentava ter quase o dobro de sua idade. A mulher sorriu simpática para ela quando a viu, e Brooke forçou um sorriso para o rosto, observando ela virar as costas e desaparecer pela porta lateral ao lado do caixa.


Brooke Começou a caminhar entre as prateleiras repletas de livros em seguida, lendo os títulos em voz baixinha. Alguns chamaram sua atenção, mas ela continuou circulando pela livraria, relaxada, bebericando o chocolate quente. Não havia chegado nem na segunda prateleira quando um livro a chamou a atenção. Escrito na capa azul, o título "Um conto de duas cidades", se destacava. Brooke procurou pelo nome do autor, e viu que se tratava de
Charles Dickens, frequentemente citado nas aulas de literatura. Ela girou o pequeno livro nas mãos, e olhou a contracapa do mesmo, sem deixar de tomar o chocolate.
Ponderou se levava aquele ou não, e enquanto permanecia na indecisão, recomeçou a circular entre as prateleiras, até acabar se chocando com alguém que não viu que estava parado a sua frente.


O livro de Dickens caiu no chão em um baque sonoro, junto com outro livro bem maior, e o chocolate quente teria caído também se uma mão com longos dedos pálidos não tivesse o segurado a tempo. Quando Brooke percebeu, estava paralizada no meio da livraria, curvada para apanhar o livro no chão, e seus olhos se levantaram para a pessoa a sua frente, também curvada como ela. A primeira coisa que viu, foi um par de olhos pretos como carvão a encarando fixamente. Depois, a boca curvada em um sorriso bonito, a pinta pequena na bochecha direita, próxima ao nariz e o rosto perfeitamente desenhado do rapaz à sua frente. Ele tinha cachos escuros, arrumados em um topete, estava vestido todo de preto, e o movimento em seu maxilar indicava que mastigada chiclete enquanto a observava. O sorriso se alargou, e Brooke sabia que tinha corado.

 

 

— Me desculpa - Os dois falaram ao mesmo tempo. Ele riu, e ela sorriu minimamente enquanto o assistia apanhar os dois livros do chão.

 

— Acho que já podemos ficar em pé corretamente, não? - O rapaz comentou, e Brooke concordou desajeitada.

 

 

Os dois ergueram os troncos, em sincronia, e ficaram de frente um para o outro. Brooke o encarou timidamente, como sempre fazia com um desconhecido, e observou ele analisar o livro que ela escolheu.

 

 

— Um Conto de duas cidades. Escolha interessante - Murmurou a olhando com o mesmo sorriso, que a desconcertou. - Gosta de romance?

 

— Um pouco - Ela encolheu os ombros, arrumando o gorro na cabeça que teimava em escorregar.

 

 

O rapaz alargou o sorriso.

 

 

— E terror? Você gosta? - Perguntou novamente, e sua voz era envolvedora e macia.

 

 

Brooke uniu as sobrancelhas.

 

 

— Por que a pergunta? Você trabalha aqui por acaso?

 

— Trabalho como ajudante. Então estou te oferecendo a minha ajuda, linda - Ele piscou e ela riu sem graça. - Mas responda minha pergunta. Gosta de terror?

 

— Um pouco.

 

— Hum - Ele começou a girar os dois livros na mão, a olhando de um jeito estranho. Misterioso. - É uma pena que eu não. Uma pena mesmo.

 

 

Brooke franziu o cenho, deslocando o peso do corpo de um pé para o outro. Seus olhos desviaram dos intensos do rapaz desconhecido a sua frente, e ela se sentiu pequenina e indefesa enquanto ele continuava a encarar. E não gostou disso.

 

 

— Pode... Pode me devolver as minhas coisas? Eu acho que já vou - Murmurou, desconfortável, mal o encarando.

 

 

Como se comprovasse o que ela já sabia, ele fez um bola de chiclete, e a estourou em seguida. Depois, abriu mais um sorriso, dessa vez um que mostrava a fileira de dentes brancos perfeitamente alinhados. Brooke engoliu em seco.

 

 

— Claro, linda. Aqui estão.

 

 

Ele a estendeu o copo com a bebida quente e os dois livros, que ela não notou serem dois. Brooke pegou as coisas das mãos dele rapidamente, e mesmo que não estivesse o encarando, sabia que ele continuava com o sorriso sinistro no rosto. Mas foi quando a mão dos dois se tocaram, que Brooke se atrapalhou e o gorro em sua cabeça acabou escorregando de vez para o chão. Ela praguejou mentalmente e se abaixou bruscamente equilibrando todos os objetos que tinha nas mãos. Sentiu o olhar queimando em cima de si, mas se ocupou em apanhar o gorro derrubado, percebendo então o livro maior e pesado que tinha nas mãos. Não pegara aquele livro, então só podia ser...

 

 

— Acho que isso aqui deve ser seu...

 

 

Ela se calou. Quando ergueu os olhos para onde o rapaz estava, não o encontrou. Brooke virou a cabeça para diversos ângulos da livraria, mas ele não estava em lugar nenhum. Ela apanhou os livros, o gorro e o chocolate quente, e se levantou lentamente. Andou pelas prateleiras, o procurando, mas ele sumira. Sumira como fumaça se dissipando no ar.
Ainda confusa, e com o ponto de interrogação na expressão, voltou para perto do caixa, onde deu de cara com a mulher loira batendo a porta atrás de si.

 

Brooke foi até ela.

 

 

— Oi - Disse chamando a atenção da outra.

 

— Oi - Respondeu a mulher, sorrindo.

 

 

A morena apoiou os dois livros no balcão do caixa, e empurrou o maior em direção da loira.

 

 

— Desculpa te incomodar, mas é que o seu ajudante derrubou isso e me entregou por enga...

 

— Perdão por te interromper, mas eu não sei do que você está falando.

 

— Como?

 

— Eu não tenho nenhum ajudante. A única pessoa que trabalha aqui sou eu - A mulher respondeu, e a encarou como se ela fosse louca.

 

 

Brooke congelou, piscando os olhos rapidamente. Seu olhar caiu para o livro, e em letras distorcidas, ela leu o título do mesmo.

The Book of Somnium.

O arrepio desceu por sua espinha.

 

 

 

                     ***

 

 

 

— Mãe? Já cheguei.

 

 

 O eco de sua voz repercutiu pela casa silenciosa, mas como já o esperado, não obteve resposta. Parada na sala de estar, Brooke descalçou os tênis, e os empurrou para trás da porta. Deixou as chaves em cima da estante e começou a caminhar em direção às escadas, levando consigo a mochila de pano. O ruído de seus pés em contato com os degraus frios era tudo que quebrava o profundo silêncio em que a casa estava mergulhada, e antes mesmo de chegar ao segundo andar, a apreensão tomou conta de si. Entrou no corredor da esquerda, e caminhou até a primeira porta, a abrindo vagarosamente.

Ela colocou primeiro a cabeça para dentro do quarto, e observou a figura encolhida deitada entre os lençóis e travesseiros, e então colocou o resto do corpo para dentro. Brooke não se incomodou em fechar a porta por conta do ar condicionado ligado, apenas ficou a contemplar sua mãe dormindo enquanto se aproximava da cama. Marcy parecia tão serena e relaxada dormindo, que Brooke se pegou desejando que aquilo fosse assim para sempre. Sem mais surtos, sem mais gritos, sem mais dores. A garota largou a mochila no chão, e se inclinou para frente, tendo o vislumbre de dois objetos. O primeiro, ao qual ela viu que Marcy abraçava contra o peito, se tratava de um porta- retratos com a foto de Penny quando tinha cinco anos. O segundo objeto, caído ao lado de seu corpo adormecido, era uma garrafa vazia de vinho que ela mesma tratara de esconder da mãe.

 Brooke engoliu em seco a decepção, se lembrando de todas as promessas vazias que Marcy fazia quando acordava de ressaca nos dias seguintes de situações como aquelas, e cuidadosamente apanhou a garrafa vazia. Não sabia mais o que fazer. Seus olhos se moveram até o porta - retratos onde uma Penny banguela a fitava sorridente, e sentiu o nó na garganta se formar. Ela respirou fundo, desviando rápido o olhar, e resolveu deixar o porta - retratos aonde estava.

 

 

— Eu também sinto falta dela - Sussurrou, olhando para o rosto tranquilo da mãe.

 

 

Brooke suspirou, e sentindo que não aguentaria mais por muito tempo, puxou os lençóis até os ombros de Marcy, a cobrindo, e se inclinou para dar um leve beijo em sua testa. Ela nem se mexeu. Apanhando a mochila do chão, a morena dedicou um último olhar a mãe antes de virar as costas e deixar o quarto, levando a garrafa vazia consigo. Ela ainda voltou para o primeiro andar, e foi até a cozinha jogar no lixo a garrafa de vinho. Quando entrou no cômodo, o encontrou bagunçando. A pia estava cheia de louça suja, a lata de lixo transbordava de embalagens de congelados e o cheiro de azedo indicava que a caixa de leite em cima da mesa estava possivelmente vencida. Ela levou as mãos à cabeça, e respirou fundo imaginando se poderia haver um pior começo de semana como aquele. Para o sim ou para o não, Brooke se mexeu, começando a organizar tudo.
Jogou a garrafa de vinho vazio e o leite vencido no lixo; apanhou as embalagens e colocou tudo em um grande saco preto, levando para fora depois; e por último, arregaçou as mangas da blusa, pronta para dar um jeito naquela montanha de pratos e copos sujos.


 Uma hora depois, a cozinha estava impecável, e Brooke cansada. Sua barriga roncava insistentemente, mas ela não dava ouvidos. Marcy não acordara em nenhum momento, e quando saiu arrastando a mochila em direção ao quarto, a garota agradeceu por isso. Ela arremessou a mochila para um canto, se jogando na espaçosa cama logo em seguida, com as costas contra o colchão. Os músculos de seu corpo relaxaram a medida que os segundos iam se arrastando, e Brooke aproveitou a sensação.

 

 As aulas tinham voltado naquele dia, e tudo que ela queria era que não tivessem voltado. Não conseguia se concentrar nas palavras de boas vindas após o recesso dos professores, nem nas explicações, nem nos assuntos que Gaz lhe dizia. Não conseguia prestar atenção em nada que não fosse sua mãe. Ou então, nos pensamentos sombrios que rondavam sua cabeça. Mais cedo, quando acordou e se olhou no espelho para se arrumar, a única coisa que passava por sua mente era a garota chamada Anne que fora assassinada. O que era estranho, visto que nem a conhecia, mas não totalmente louco. Fazia sentindo pensar naquilo e se sentir daquela forma, quando a morte acontecera tão perto de si, não? Ela tinha direito de se importar. Mas, tinha tanto direito ao ponto de de sentir conectada ao assassinato como se sentia?

 Brooke bufou em exasperação, cobrindo o rosto com as mãos. Estava ficando louca. Ela rolou a cabeça para o lado, e seus olhos esquadrinharam o quarto organizado. Virou a cabeça para o outro lado, e em cima da escrivaninha, soterrado por papéis da escola, encontrou as páginas amareladas e a capa de couro desgastada do livro que o desconhecido da livraria havia a entregado. Agora parecia ridículo ter levado consigo o estranho livro após a mulher da livraria dizer que ele não fazia parte dos estoques, mas ela não havia pensado assim na hora. Brooke não sabia ao certo o motivo de ter se interessado por ele, ainda mais sendo indicado por um cara mentiroso e que a dava calafrios. Apenas havia se interessado, imaginando que desfrutaria de uma peculiar leitura. Entretanto, não fora bem assim. Quando saiu da livraria, e o abriu, não encontrou nada. O livro não tinha nada escrito, apenas páginas vazias e encardidas pelo tempo. Além, é claro, do título, que depois de uma pesquisa no goole tradutor, descobriu querer dizer "O livro dos sonhos", em latim.
Ela não falava latim, por isso, mesmo que tivesse alguma coisa escrita no livro, ela não entenderia.

 

 Ela voltou a girar a cabeça, querendo deixar o livro para lá, e fitou a porta aberta do banheiro. O criado mudo em sua cabeceira indicava uma hora da tarde, e a única coisa que queria fazer era dormir. Mas não conseguiria tal proeza, não com a insônia que nunca a abandonava. Brooke comprimiu os lábios, e um pensamento lhe ocorreu. Ela voltou a encarar o banheiro com as luzes acesas, e depois de suspirar, levantou da cama, caminhando até lá.
Praticamente se arrastou, e parou de frente para o armário ao lado do espelho, em cima da pia. O abriu e de lá de dentro puxou um vidro de remédios, que já estava acostumada a ingerir, e o destampou antes de engolir três comprimidos brancos. Precisava dormir. Ela abaixou o rosto e ligou a torneira, bebendo um pouco de água. Brooke tossiu depois de engolir, e voltou a guardar o vidro de remédios no armário. Nem se deu ao trabalho de olhar para o espelho ao lado, sabia o que veria: olheiras abaixo dos olhos, lábios secos e seu cabelo bagunçado. Não precisava se odiar ainda mais.


Virando as costas a própria imagem, ela saiu do banheiro e voltou para a cama, onde muito lentamente, se deitou e se cobriu até o nariz. A paz que sentira um dia antes, havia sumido. Todos os sentimentos que queria espantar, estavam de volta. Dor, raiva, tristeza, medo. Ela sentia tudo aquilo e mais um pouco. Tudo era tão latente, que as lágrimas pinicaram por trás de seus olhos, mas ela tentou contê - lás.
Os compridos não demoraram a fazer efeito, e aos poucos, seus olhos e sua cabeça foram pesando, a deixando leve e relaxada. Brooke não queria precisar recorrer sempre aquilo, ainda mais quando precisava manter os olhos em Marcy; mas não podia mais. E então sombras a envolveram, a puxando para um lugar silencioso e pacífico.

 

 

 

...Havia um longo corredor a sua frente, que a conduzia para um lugar desconhecido. Luzes de néon coloridas relampeavam pelas paredes, e havia aquela música eletrônica sendo deixada para trás, como a trilha sonora de fundo de um filme de suspense. Seus pés avançaram pelo corredor, cada vez mais rápidos, como se ela estivesse a procura de alguma coisa que estivesse fugindo de seu alcance; e uma porta ao longe surgiu. Os poros em seu corpo se fecharam, a provocando arrepios, e uma sensação de alerta a tomou por inteiro quando sua cabeça começou a rodar junto com as paredes e tudo em volta. Mas foi trocando os pés urgentemente, como se estivesse bêbada, que ela continuou seguindo em frente até alcançar a porta de madeira, e apoiar a mão na maçaneta, que rodou e se abriu sem o mínimo esforço. Se sentindo tonta, ela deslizou para dentro do que quer que fosse aquele cômodo, e no momento em que seus olhos se levantaram, turvos, porém, nítidos, ela abriu a boca e gritou em uma mistura de medo e pavor.
À sua frente, um par de olhos vermelhos vividos a encarava, e abaixo deles, uma boca manchada de sangue se abria em sua direção, revelando grandes caninos afiados...

 

 

 Aquele sonho não a deixava em paz. Noite após noite sonhava com aquilo, e não importava o que fizesse ou quisesse, a imagem dos olhos e do sangue não saiam de sua cabeça.
Brooke suspirou baixinho, cutucando uma lasca da madeira solta da mesa do refeitório. Levantou os olhos deixando os pensamentos para trás, e olhou ao seu redor. O refeitório estava quase vasinho naquele dia, graças ao sol que resolvera aparecer como um milagre inesperado, e em consequência, o falatório era nulo. A única coisa que podia ouvir, além de seus próprios pensamentos, era o bater de talheres e alguns suspiros pesados. Ficou o tempo todo ali sentada, observando as pessoas comerem; mas ela mesma não comeu nada. Se virasse a cabeça um pouquinho para a direita, teria uma ampla visão das meninas do terceiro ano aos cochichos sobre uma garota do primeiro ano, ao qual fora chifrada pelo namorado com uma das garotas da mesa; se virasse a cabeça para a esquerda, veria os garotos do nono em uma guerrinha de ossos das coxas do frango; se olhasse para a frente, as cozinheiras estariam observando tudo entediadas; mas se tivesse coragem e olhasse par a trás, encontraria a mesa ao fundo vazia, a qual ninguém se atrevia a ocupar.

 

 Durante toda a manhã, Brooke não os viu. Nenhum deles, exceto o moreno com traços indígenas, que só tinha o primeiro período de aula junto com ela. Mas não era ele que Brooke desejava ver. Era Renesmee, e pensar em Renesmee, a dava calafrios depois da última vez que a vira. Quando ela usava seu colar perdido a quilômetros da escola. Porém, a garota não aparecera, nem na semana do retorno às aulas, nem naquela, cujo deveriam entregar o trabalho de álgebra avançada II. Trabalho que nem tinham falado sobre. E aquilo a estava deixando desesperada, assim como também frustrada com o desleixo da Cullen com a nota das duas.
Brooke suspirou outra vez, mais pesadamente, e fitou a tela do celular bloqueado em cima da mesa que a minutos atrás, havia recebido uma mensagem de Gaz com as seguintes palavras:

 

 

"Estou doente e não irei a semana toda. Foi mal"

 

 

 Ela queria tanto o ter na cadeira ao lado naquele momento. Para a animar, para insistir que ela comesse, para reclamar que ela não comia nada, para fazer piadas sobre sua parceira de trabalho, para a fazer rir. Brooke não sabia até aquele instante o quanto Gaz Jullions se tornara importante em sua vida, e o quanto ele fazia falta até nos pequenos detalhes de seu dia - a - dia escolar. Ela nunca soubera o significado de amizade até encontrar Gaz e sua fofura ambulante. E isso a incomodava, pois sabia que não existia doença nenhuma, que era tudo uma desculpa esfarrapada para não a preocupar. Suspeitava que o verdadeiro motivo das faltas de Gaz, eram os pais e a crise que vinham enfrentando no casamento, mas ela preferiu não comentar nada na mensagem que mandou como resposta. Sendo assim, ela voltava a ficar sozinha.

 Ouviu o sinal tocar, anunciando o fim do intervalo. Brooke foi a primeira a levantar, jogando a mochila nas costas e saindo do refeitório à passos rápidos, com a cabeça baixa. Tão rápidos, que quando chegou ao corredor, não desacelerou e acabou batendo de frente com alguém. Alguém sólido, incrivelmente quente e muito alto, que a jogou para trás brutalmente, mas que a segurou pelos cotovelos a impedindo de cair.
Ela arregalou os olhos com o coração começando a acelerar, e depois que levantou a cabeça e viu o rosto da pessoa que trombara consigo, sentiu o coração bater em ritmo frenético, enquanto seus olhos saltavam das orbes.

À sua frente, estava Jacob Black evitando sua vergonhosa queda.

 

 

— Foi mal. Eu não te vi - Disse Jacob a encarando fixamente. Suas mãos deslizaram para os pulsos de Brooke, onde se enroscaram mais firmemente. Ela corou.

 

— S-sem pr-proble-ma - Gaguejou sem se conter. - Eu... Desculpe.

 

 

Brooke pensou ter visto um lampejo negro passar pelos olhos do moreno, mas balançou a cabeça imperceptivelmente e se concentrou na cena que se desenrolava.

 

 

— Não esquenta.

 

— Tá - Ela assentiu com a cabeça, os olhos desceram até as mãos grandes e quentes dele em seus pulsos. - Você... Já pode me soltar.

 

— Ah, claro.

 

 

Muito lentamente, Jacob afastou as mãos de si, a encarando fixamente durante todo o processo, como se esperasse alguma reação de sua parte. Brooke engoliu em seco, dizendo para si mesma que aquilo era estranho demais e que deveria apenas virar as costas e ignorar a vontade que crescia em si de abrir a boca para perguntar.
Então, do nada, Jacob soltou um suspiro que ela reconheceu ser impaciente, e levou a mão até o cabelo, onde o despenteou.

 

 

— Bom, é melhor eu ir. Não quero me atrasar - Murmurou ele, coçando o queixo.

 

 

Ela não expressou nenhuma reação ou resposta. Apenas ficou a fita - ló, com os nervos em combustão. Jacob enrugou a testa, e depois dela abrir a boca e fechar, ele virou as costas muito lentamente, começando a caminhar em frente.
Brooke não conseguiu se segurar mais:

 

 

— Espere! - Gritou fracamente. Viu o moreno parar no mesmo instante, retroceder e voltar a encarar.

 

— Sim? - Jacob perguntou arqueando as sobrancelhas enquanto deslizava as mãos para dentro dos bolsos.

 

 

Ela mordeu os lábios, sentindo a língua travar e a saliva descer espessa pela garganta. Mas se forçou a falar:

 

 

— Bem, Jacob... Somos da mesma turma de espanhol, por isso sei seu nome... - Brooke esclareceu, corando ainda mais. Ela viu ele assentir. - Mas... Eu... Bem... Eu...

 

— Precisa de algo, ou...

 

— ... Renesmee - Ela proferiu o nome como um estalo agudo. E assim que fez isso, notou a rigidez que o rosto do Black tomou, a fazendo vacilar.

 

— Renesmee? Posso saber o que você quer com ela? - Questionou ele, secamente.

 

— Somos parceiras em um trabalho de álgebra avançada II e precisamos entrega - ló depois de amanhã. E c-como ela anda fal-faltando esses dias, eu... Só queria verificar se está tudo bem - Brooke murmurou, desviando os olhos para seus pés. Sentiu que deveria improvisar uma desculpa melhor: - Eu preciso dessa nota, Jacob.

 

 

O silêncio desconfortável entre os dois se estabeleceu, sendo cortado apenas pelos alunos ao redor que iam e vinham apressados com o término do intervalo. Ela também deveria se apressar se não quisesse levar uma advertência da professora de inglês, mas ignorou isso quando a voz forte do Black voltou a se pronunciar:

 

 

— Está bem. Darei seu recado - A resposta dele fez ela levantar a cabeça rapidamente, o encarando surpresa.

 

— Sério?

 

— Sim. E não se preocupe com Renesmee, ela só está com uma virose dessas que pega a gente se tempos em tempos - Jacob disse, e então ele tinha voltado para a postura relaxada que Brooke sempre o via ter. - Você vai ter sua nota no final, e digo a Renesmee que você mandou lembranças, Brooke Evern.

 

 E ele sorriu. Um sorriso revelando a fileira de dentes brancos que tinha, mas que ela não soube definir o significado. Brooke não soube o motivo, mas sentiu certo desconforto ao ouvir Jacob Black falando em voz alto seu nome e sobrenome, de uma maneira tão... debochada. Ele a lançou um último olhar penetrante antes de virar as costas e sair caminhando pelo corredor fervendo de adolescentes agitados, sem a dar chance para agradecer.
Seus olhos só se desgrudaram das costas dele quando ele sumiu pela porta da saída do prédio, a fazendo piscar atordoada.

O que fora aquilo? Se perguntou.

O sinal ainda tocou duas vezes, mas ela não moveu os pés de onde estava. Algo se remexia em sua mente, e algo especulava ideias conspiratórias e segredos também. Por que achou Jacob tão estranho se normalmente ele costumava ser o mais normal e "possivelmente" legal em vista aos outros Cullen? Não sabia dizer.
E por que estava tão... esquisito ao se dirigir a ela? Também não sabia.

Brooke expeliu o ar dos pulmões, passando as mãos pelos cabelos. Seu olhar cruzou o corredor, alternando entre a saída e a secretaria que ficava naquele mesmo prédio. Não sabia se podia acreditar ou confiar em Jacob, e dizendo a si mesma que aquilo era para garantir uma boa nota, e não para sanar sua curiosidade, ela tomou uma decisão.

Matando a aula de inglês, Brooke se dirigiu até a secretaria. Precisava do endereço dos Cullen.

 

 

 

                     ***

 

 

 Ela percebeu que deveria ter optado pela aula de inglês quando, segundo o endereço anotado no pedaço da folha de ofício em suas mãos indicava, a floresta de Forks tomou forma em seu campo de visão.

 

Quem em sã consciência mora no meio de uma floresta?

 

 Brooke se fez aquela pergunta enquanto decidia contornar a mata e seguir caminho pela beira da estrada. Não sabia quem ou o que poderia se esconder lá dentro. E ao ter aquele pensamento, os pêlos dos seus braços se arrepiaram. A imagem que viu do corpo seco e mutilado de Anne Aldetre, que procurou no jornal, veio em sua mente, assim como os inúmeros outros que tiveram o mesmo destino. Brooke balançou a cabeça, tentando espantar aqueles pensamentos, e continuou caminho pela estrada deserta.
O sol ainda se estendia pelo céu claro, o que facilitava sua caminhada sem riscos de queda ou uma futura gripe. Em suas costas, a mochila de pano sacudia a cada passo; em sua cintura, o fino casaco estava amarrado; e no bolso de trás, o celular permanecia desbloqueado, para facilitar o acesso caso algo acontecesse. Sua mãe não ficaria preocupada, pois ela tinha enviado uma mensagem avisando sobre o trabalho na casa de uma "amiga". Seria mais provável Marcy ficar feliz pela filha estar fazendo amigos, antes de preocupada.

 

Olhos vermelhos... Sangue escorrendo.... Caninos afiados... Corpos secos...

 

 Parecia uma agoniante voz sussurrando em sua cabeça, baforando em seu ouvido. Brooke apertou os olhos, encarando a estrada deserta a frente, e cravou as unhas na alça da mochila. Uma sensação de alerta misturada com medo a tomou de salto, e ela diminuiu gradativamente o passo, hesitante. Então do nada ouviu o barulho de vários pássaros alçando vôo em conjunto, e olhou para o céu, os observando voar para longe do coração da floresta. Os ecos dos grasnados repercutiram pela mata até chegar a estrada, em um estrondo. Mau agouro. Um pássaro preto e reluzente passou como um raio por cima da cabeça de Brooke, e ela se abaixou por instinto, colocando ps braços em cima da cabeça. Sua respiração já se encontrava acelerada e entrecortada aquela altura, e só quando a ave sumiu de vista, foi que Brooke voltou a se colocar de pé corretamente. Sua cabeça girou em todas as direções da estrada, enxergando apenas borrões de verdes e cinza do asfalto, e naquele momento, ela teve medo. Fora uma péssima ideia ter ido até ali. Como não pensara nisso antes? Com todos os assassinatos e ataques ocorrendo na cidade? Se um ditado popular tivesse que se encaixar naquela situação, com certeza o famoso "A curiosidade matou o gato" resumiria bem sua situação. O problema? Ela era o gato. E a curiosidade? Essa era a sua pior inimiga.

 

Brooke tocou o celular no bolso de trás da calça, e se sentiu observada. Voltou a girar os olhos pela estrada, mas não encontrou ninguém. Pensou em correr, mas não sabia se suas pernas suportariam o seu peso naquele momento. Estava petrificada de medo e pânico. Ela tomou uma respiração profunda, e foi quando o barulho de galhos sendo quebrados ecoou não muito longe de onde ela estava. Quem poderia ser? O assassino em série? Uma onça pintada perdida na mata?

Ela sabia que estava ficando paranóica. Porém, não se preocupou com aquilo naquele momento, apenas ordenou as pernas à correrem. E ela correu, o mais rápido que conseguia.
Deixou aquele pedaço da estrada para trás, e a cada metro corrido, olhava para o lado e pensava ver algo correndo na mesma velocidade, lá dentro da floresta. Sua cabeça girava repetitivas vezes para trás, mas não avistava ninguém. Se parasse para refletir, Brooke perceberia que estava agindo como uma criança assustada afastada da mãe; mas não sentia que aquilo fosse algo tão bobo assim.

 

Sangue fresco escorrendo... Pilhas de corpos imóveis no chão... Chamas derretendo as peles... Sangue... Sangue... Sangue...

 

 Ela tropeçou numa pedra ao sacudir a cabeça, e se chocou contra o chão em uma queda dolorosa. Brooke não esperou sentir dor alguma ou a ardência no braço ralado; espalmou as mãos no chão e se ergueu em um pulo, puxando a mochila caída e voltando a correr. O pedaço de papel que outrora estivera em suas mãos, se perdera no caminho deixado para trás, e agora ela estava perdida e com muito medo. E sentia que alguém estava a perseguindo. E não sabia o que fazer.
Brooke arfou, sem ar, sem conseguir correr mais. Seu cabelo richoceteou em seu rosto quando virou a cabeça para trás mais uma vez, e em um breve relance, ela viu as folhas das árvores entrelaçadas deixadas para trás sacudirem, sendo desbravadas por alguém. Alguém rápido e que iria a alcançar.

Sentindo as lágrimas brotarem nos olhos, ela se forçou a continuar correndo. E ficou naquilo por mais cinco minutos, até que como por um milagre divino, avistou a casa grande como uma mansão e refletindo como espelhos. Então teve certeza que encontrara a casa dos Cullen, pois não havia nenhuma outra por ali. Mais motivada ainda, Brooke correu até lá, ultrapassando a distância e correndo pelo jardim. Não parou de olhar para trás até alcançar a varanda vitoriana, onde subiu os degraus rapidamente.
Sabia como estava: cabelos em pé, olhos arregalados e assustados, braço ralado, e o rosto pálido como quem viu fantasma. E saiba que estava parecendo uma louca alucinada, ou que nada daquilo tinha sido combinado. Mas não se importou, apenas queria que aquela sensação de perigo sumisse e que seu coração parasse de bater como uma escola de samba.

Sendo assim, Brooke levantou a mão para bater na porta, mas ela foi aberta antes disso. O rosto surpreso de Renesmee surgiu à sua frente, e ela arregalou os olhos assim que viu o estado dela, que não perdeu tempo:

 

— Olá. Sei que não combinamos nada, mas vim fazer o trabalho. Posso entrar?

 

 

A ruiva a encarou começando a empalidecer, e virou a cabeça para trás, para dentro da casa. Brooke acompanhou o olhar, e quando esticou o pescoço para ver melhor, encontrou com vários pares de olhos já a observando. Entre eles, alguns não eram dos Cullen, e eram esses que a olhavam mortalmente.

 


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Notas finais do capítulo

Heyy!
Acho que desde de quando comecei a escrever essa fanfic, nunca atualizei um capítulo em um intervalo de tempo tão curto assim. Menos de duas semanas! Yey!
Mas vamos ao que interessa: O capítulo. Quem esperava hein? Brooke tomando inciativa e se dando mal no final hehe. E esse povo todo aí dentro da mansão, quem aposta nos Volturi? Me contem tudo!
Alerto vocês a ficarem atentas a esse sonho da nossa personagem, e aos demais que virão também. A partir daqui as peças do quebra-cabeça começaram a aparecer. Eu disse isso no capítulo passado, eu sei. Mas não custa relembrar.

Eu também percebi que não dei a devida atenção ao problema da Brooke nas notas finais como eu deveria ter dado, por isso vou aproveitar essa daqui e dar. Então vamos lá: Desde os primeiros capítulos narrados por ela, vocês já devem ter percebido que ela tem um problema além do trauma da morte da irmã e do constante estado depressivo em que ela é descrita. Até aí tudo bem. Porém, há outra coisa que acontece com a Brooke e que também está "escrita nas entrelinhas".
A personagem tem um problema quando se trata da alimentação, e não sei se vocês sabem, mas há um nome para isso quando os sintomas que a Brooke possui aparecem: Bulimia. É uma doença séria, principalmente para os jovens, e em média é tão perigosa quanto a depressão e as drogas. Começa com um mal hábito alimentício, depois vai crescendo até se tornar algo incontrolável.
Bulimia é uma coisa séria gente, e quando escrevo sobre ela ou descrevo Brooke Evern lidando com ela, não quer dizer que eu faça apologia a esse tipo de coisa. Não, eu não acho isso legal, mas também não julgo as pessoas que sofrem com isso. O que quero dizer, é que ao decorrer da fanfiction, o tema será aprofundando e haverá uma grande luta da personagem contra isso.

Ok?

Só isso mesmo. E espero comentários porque eles me deixam muito feliz e me incentivam a continuar cada vez mais!

Um beijo e até o próximo... ❤❤❤



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