There Is a Smile of Love escrita por The Deserters


Capítulo 15
Burdens


Notas iniciais do capítulo

Olá, queridos leitores!
Feliz ano novo!



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[Renly’s POV]

03 de janeiro de 2016

18:20. King’s Landing.

 

Talvez não seja um exagero presumir que cada alma humana pressinta, em seu âmago, a dor gélida e o eco paralisante que sinalizem sua derrocada. Tal como cada império a ruir de forma violenta, o urro de irresignação se perde ao encontrar o brilho ceifeiro de seu inquisidor.

Cada dúvida e cada questionamento marcado pelo como, o porquê e quando são imediatamente substituídos pelo apagar de luzes no ato teatral e pelo silêncio sombrio dos querubins. A canção dos anjos se resguarda perante o uivo de dor da vítima e o de prazer e puro deleite daquele que a abate.

O jovem Baratheon sentia o suor frio impregnar a palma de suas mãos, enquanto o arrepio na nuca e a ânsia de vômito roubavam-lhe os restos de sua compostura. O turbilhão de emoções em seu corpo e os pensamentos confusos quase que lhe destituíam do equilíbrio de suas pernas, porém se forçou a continuar o passo, acelerando o ritmo em uma tentativa vã de fugir de seus algozes. O mal-estar persistia a cada grito e brado aos portões do capitólio que sediava o Conselho de King’s Landing.

Era certo que o desenrolar peculiar das votações reunira uma multidão curiosa, junto à vasta extensão gradeada do prédio, nos dias anteriores – desde membros da imprensa a cidadãos alegadamente preocupados com o destino de seu país, todos se reuniam, no mínimo, organizadamente a espera de notícias.

No entanto, algo violara o acordo tácito entre a segurança do capitólio e a turba. O movimento antes bisbilhoteiro e inofensivo transformava-se num pandemônio de manifestantes efusivos e radicais, proferindo ameaças e xingamentos vis.

Renly se encontrava na pior hipótese vivenciada em qualquer um de seus pesadelos, podia até sentir o gosto amargo na boca e lembrava dos tremores que o acompanhavam todas as vezes ao acordar de um desses desafortunados sonhos. Agora, porém, não poderia contar com o calor de braços quentes a tranquiliza-lo, nem o roçar de cachos caramelos e dos lábios firmes em seu ombro, pois eram eles mesmos o motivo de seu atual estado de angústia.

À primeira vista, não entendera a grande comoção e nem a quê se direcionava, mas em poucos segundos, ao observar os dizeres em cartazes e as expressões chulas cantadas em uma ode ao ódio e à perversão do preconceito, Renly sentira suas entranhas se contorcerem em temor. Com a ajuda do Conselheiro Stark e dos poucos seguranças que o acompanhavam, o Baratheon conseguira sair do carro e avançar a confusão e, agora, se encontravam prestes a entrar na sala principal da Assembleia.

As palavras grafadas em vermelho ainda marcavam sua mente e o asco na cara das pessoas ao vê-lo, ainda o debilitavam, mas sabia que teria que recobrar as forças para enfrentar a continuação do pesadelo e talvez a pior rodada de infortúnios de sua vida até então.

“Você está bem? Tem certeza que quer entrar lá desse jeito?”, arguira Ned Stark, o semblante severo era marcado pela tensão na mandíbula deste, as mãos dele se contraíam, cerrando-se com força. E, ainda assim, Renly conseguia atestar cada gota de preocupação no verde desbotado dos olhos do nortenho.

“Não”, o rapaz soltara hesitante, a língua lhe era áspera demais para produzir qualquer som que não fosse o instável vibrar que ofereceu, então limpara a garganta com um pigarro e tentara mais uma vez. “Não tenho certeza de muita coisa agora, Sr. Stark. Além do fato de que aos olhos do povo sou uma péssima desculpa de ser humano apenas pelo fato de amar outro homem”.

“Sabe que não é apenas pelas suas preferências”, Ned suspirara. “O contexto do escândalo piora em muito algo que mentes fechadas já não conseguem assimilar. Sabemos que a informação vazou desta forma para dar a entender que você se utiliza dos dois herdeiros da família Tyrell em razão do apoio político e financeiro que eles oferecem, além de que a fotografia e os recortes feitos pelos jornais estão retratando o seu acordo com a Srta. Tyrell não como algo mútuo, mas como um caso de infidelidade com o próprio irmão dela. Toda a sua moral está em jogo aqui”.

“Eu sei e jurava que estaria preparado para a eventualidade desse momento, mas a verdade é que nunca se está verdadeiramente preparado para algo como isso”, o rapaz falara exausto e desabara no sofá na antessala em que se encontravam.

O Baratheon passara as mãos nervosas pelos cabelos revoltos, então afrouxara a gravata e retirara o lenço dourado do bolso do paletó risca-giz, limpando o rosto. O emblema de sua linhagem nobre gravado no tecido se escurecia em contato com o suor e Renly teve a sensação incômoda de que caminhava cada vez mais próximo para o seu crepúsculo. Direcionava-se gradativamente a um horizonte lúgubre.

“Sr. Stark, as ordens e medidas preventivas que solicitou já foram executadas. A multidão ainda se aglomera na área cercada, porém, a polícia já fora acionada para dar o suporte necessário, assim como as vias de acesso alternativas já foram liberadas para eventuais saídas emergenciais”. A interrupção viera da chefe de segurança de Renly e o fato de ela ter se direcionado para Ned ao invés dele, o fez erguer as sobrancelhas em questionamento.

A loira era extremamente alta e de uma beleza nórdica autêntica. Ela enrubescera com o gesto e ajeitara o terninho cinza que realçava seu porte imperial. Brienne de Tarth era uma mulher incomumente cativante, apesar de sua seriedade. Renly a admirava e até a considerava como uma amiga querida, o que dificultava ainda mais o fato de o Baratheon não saber como lidar com a queda que esta nutria em favor dele.

“Já quanto aos representantes da imprensa já foram orientados a procurarem o seu gabinete de relações públicas em substituição ao Sr. Tyrell, ao passo que este foi instruído a redigir sua carta de renúncia da função de porta-voz nos assuntos políticos atinentes ao Sr. Baratheon e à Srta. Tyrell”, ela continuara hesitante.

A menção a Loras chamara a atenção do rapaz e a vontade de ir ao seu encontro se chocara contra seu peito. A ficha caíra lentamente e o jovem conselheiro empalmava o rosto, a barba pinicando sua pele, os pensamentos perdidos nas implicações de toda a situação para o seu amado.

“Brienne”, ele falara sem jeito e a mulher o observara atenta, porém desconcertada ao som de seu primeiro nome nos lábios do homem que não podia ajudar, mas admirar em toda glória angustiada de um amor não correspondido. “Preciso que desloque alguns agentes para o meu apartamento para guardarem o Sr. e a Srta. Tyrell. Diga a eles que podem se hospedar em qualquer hotel, enquanto as coisas se amenizam. Margaery saberá como prosseguir em relação aos demais detalhes”.

O semblante estoico de Brienne cedera em leve desconforto, mas relatara as informações que sabia que iriam decepcioná-lo. “Eu tomei a liberdade de checar a hipótese da medida, Senhor. Todavia, ambos os herdeiros se recusam a deixar o apartamento. Devo ainda relatar que o Sr. Tyrell parecia insistente que o senhor checasse o telefone, já a Srta. pediu justamente o contrário. Ela foi bem incisiva de que deveria lembra-lo das contingências que planejaram”.

Renly assentiu e xingara baixinho, amaldiçoando a teimosia dos dois. Pusera-se a resgatar o celular no bolso da calça, quando Brienne fizera menção a mais uma interrupção, esta mais desajeitada que a primeira.

“Se me permite opinar, Senhor. Acho que não é o melhor momento para...conversar com o Sr. Tyrell”, ela dissera acanhada, porém firme, sustentando seu olhar e a rebeldia que se manifestara nos orbes amadeirados do Baratheon.

Apenas quando sentira um aperto em seu ombro que Renly cedera e voltara-se para o patriarca Stark que se mantinha em um poderoso silêncio. “Ponderando, sempre ponderando. Para um lobo, ele é bem comedido”, Renly pensara, todos os elementos ao seu redor o irritavam, a angústia se retorcia em seu estômago para, então, moldar o calor da raiva.

De encontro ao rosto endurecido do Baratheon, Ned sorrira tristonho. “Já demoramos demais, a sessão deve começar nos próximos 5 minutos, sob pena desse desonrado vencer às custas de nossos sacrifícios. Os Tyrells são engenhosos, eles ficarão bem por enquanto”.

Renly suspirara, soltando o ar quente que consumia seu interior. Nesse momento, enquanto adentravam as portas absurdamente luxuosas para câmera do Conselho, desejara ser um dragão indomável, um descendente dos selvagens Targaryens e não um cervo a ser entregue numa bandeja para caçadores homofóbicos, moralistas e corruptos. O pensamento o fizera rir de deboche. “Vamos ver quantas piadas originais eles conseguem fazer, aposto uma garrafa de Dalmore 62 que passarão metade da sessão ‘confundindo’ Bambi e Baratheon”.

 

[Sansa’s POV]

3 de janeiro de 2016

22:57. Winterfell Manor.

 

“Margaery”, sussurrara a ruiva ainda sonolenta. Levantara o rosto do apoio improvisado de seus braços sobre a mesa de mogno do pai, enquanto saboreava os resquícios do sonho que se fragmentava tão fugazmente quanto a fumaça emanada da xícara de café à sua frente.

Notara Robb ao seu lado, apoiado à mesa, bebericando goles longos do mesmo líquido âmbar fumegante, enquanto lia os relatórios do pai. A capa do fichário indicava que o mais velho estava analisando as declarações das contas dos Conselheiros Umber e Karstark. Sansa vasculhara o cômodo na busca por Jon e se decepcionara por não encontrar nenhum vestígio dele no escritório.

“Durante seus sonhos com a princesinha dos Tyrells, ele foi chamado para estação. Aparentemente mais uma pista sobre a condição do Delegado-Chefe”, o irmão lhe relatara clinicamente sem parar a leitura, passava as páginas, fiscalizando-as atentamente.

Sansa bufara com as manias do ruivo e tomou para si a xícara que comportava o elixir para os seus problemas mais eminentes – o cansaço e a embriaguez do sono ainda latejavam em sua mente e corpo. Após queimar a língua algumas vezes com a bebida escaldante, o badalar característico do relógio de coluna, no canto direito do cômodo, chamara a sua atenção. O marcar das onze horas a alertara e procurara pelo celular no bolso do casaco. “Droga”, exclamara ao constatar que o aparelho descarregara.

“Você por acaso tem notícias da capital? Eu sei que não dormi o suficiente para sair o resultado, mas...como passamos o dia revirando documentos, não pude acompanhar....”, Sansa arguira o irmão, pensativa, enquanto vasculhava as caixas e afastava as pilhas de documentos da mesa em busca frenética pelo carregador.

No entanto, a ação fora interrompida perante a ausência de resposta de Robb. Virara-se em direção do irmão, que a observava estático. Ele dera um pigarro desconfortável e desviara o olhar.

“Bom, eu...acho melhor te mostrar”, ele disse, ligou a televisão, trocando os canais rapidamente para as transmissões de notícias.

 

“Com enorme choque, Westeros se vê mais uma vez transtornada com escândalos...

...O mais novo Conselheiro da Capital, Renly Baratheon, irmão do falecido Primeiro Ministro...embora tenha disparado como candidato favorito à substituição ao cargo, principalmente por todo o seu suposto histórico exemplar na administração pública, teve a candidatura suspensa quando suscitada a cláusula de moralidade e decoro parlamentar...as manifestações populares eclodiram por todo o país em alegação de incompatibilidade com as condutas particulares do Conselheiro e a representação no cargo a que foi colocado...apesar da distinção entre o Estado laico e a crença religiosa aos Sete, notamos que o regimento interno do Conselho ainda prevê cláusulas para a permanência do cargo e dentre elas a condução da vida moral idônea e ilibada, requisito este que se demonstra maculado dada à infidelidade e aos possíveis casos de propina e de sodomia perpetrados pelo jovem Baratheon em sua relação aos herdeiros da fortuna Tyrell...mais uma vez as suspeitas de nepotismo alarmam a população para a política de Westeros...”

 

Sansa desligara a televisão.

“Que porra é essa?”, a nortenha exclamara, sentindo os tremores em seu corpo.

“Baelish. Ele se aproveitou do fato de que o Conselho tem um regimento interno de condutas tão antigo quanto o Grande Septo de Baelor, as normas ainda estão vigentes, nunca foram revogadas e são coerentes com a leitura restritamente gramatical da Constituição. Foi uma jogada espetacularmente filha da puta, mas está valendo”, Robb dera de ombros.

“Você quer dizer que ser gay é motivo suficiente para suspender alguém de suas funções no Conselho, mas comprovada corrupção não?”, a ruiva cuspira as palavras com nojo e as ondas de raiva traziam lágrimas de frustração aos seus olhos. “Droga! Que porra de país é esse que regras são mudadas ou resgatadas por mera conveniência?”, ela dissera entredentes.

“Sansa, eu sei que é um absurdo, mas agora o que cabe são recursos à Suprema Corte e, infelizmente, os ministros atuais são todos leais aos Lannisters e, por consequência ao Baelish, com exceção de muitos poucos que ainda respeitam Olenna, mas isso é uma questão de tempo. Creio que Renly já tenha perdido esta luta”, o rapaz dissera calmamente, mas Sansa pode notar o descontentamento em sua postura. Robb odiava este lado da vida que levava, como advogado sabia que a justiça nem sempre estava à disposição pelas vias convencionais e reguladas pelo Direito.

“Agora, temos que nos concentrar em deter os Boltons ou aquele seu discurso de mais cedo era da boca pra fora?”, ele completara com um olhar penetrante.

“Cala a boca”, retrucara irritada. “Achou algo de útil nos registros ou nos relatórios?”

“Até agora não vi nenhuma movimentação ou declaração irregular. Jon deixou anotações sobre os dados dos Boltons. Propriedades, linha de sucessão de bens e ligações comerciais todos ali naquele bloco de notas”, ele apontara para o caderno gasto que se encontrava na mesinha de centro. Sansa apanhara o objeto e começara a folheá-lo, até que Robb a surpreendera com as seguintes palavras: “Se você puder checar determinados dados com a sua namoradinha, seria útil. Sei que está doida pra ligar pra ela”.

“Eu já disse pra calar a boca. Porque está fazendo questão em agir como um babaca?”, ela retribuíra olhando diretamente em seus olhos, desafiando-o a fugir novamente.

O ruivo travara. Talvez o cansaço o irritasse tanto quanto o fazia com Sansa, mas não era desculpa para o comportamento impertinente e desrespeitoso dele. Eram mais fortes unidos, Robb sabia disso e insistia nessas atitudes imaturas.

“Poderia ser com você”, ele dissera com os olhos opacos, os braços cruzados e a postura tensa.

“O quê?”

“Poderia ser você no lugar do Loras, sendo exposta na mídia e às ameaças que refletem do envolvimento dele com os Baratheons. Poderiam ser pessoas em levantes querendo te machucar por você ser diferente, não por você ser alguma criminosa, mas por ser quem você é. Poderia ser você sofrendo ali e eu não sei se suportaria esse peso imposto pela Tyrell em você”, Robb confessara aflito. “Eu não poderia te proteger de algo como isso”.

“Você nunca poderá me proteger de tudo, Robb”, retrucara firme. “Sempre haverá uma ameaça ou dor e sofrimento. Neste exato momento, eu estou em agonia e meu corpo inteiro queima por dentro preocupada com aqueles dois e...Margaery, eu que não poderia suportar a ideia dela se machucar, estando eu aqui, tão longe e impotente”. As lágrimas caíam, salgando seu rosto. A ruiva levantara a mão para limpá-las e, em seguida, fitou o irmão. “Todos nós escolhemos nossos pesos. Não seria imposição, se eu tivesse escolhido e eu escolho este peso por mais mil vezes se for necessário”.

Sansa deixara o ruivo boquiaberto e se direcionara para as escadas, as lágrimas nublavam sua visão e o aperto no coração se intensificava. Em seu quarto, a nortenha angustiada facilmente localizara o carregador e o conectara ao celular e à respectiva tomada. O aparelho ligava, enquanto os soluços eram engolidos em fúria. “Para de chorar! Para de chorar! Para de chorar”, era o mantra que se repetia até acalmar o furacão que movia seus sentimentos.

Digitara o número que conhecia tão bem e esperara a ligação se completar. O receptor no outro lado da linha soara e Sansa sentira a ansiedade e a impulsividade brigarem para manobrar sua mente.

“Alô?”, a voz dissera contida.

Myranda? Eu preciso de outro favor. Você pode vir a Winterfell?”

Ao seu lado, o bloco de anotações de Jon continha em um garrancho complicado, porém legível: Campo de Arqueria Royce e Royce’s Café e Bistrô, propriedade em concessão à família Royce, assinado por Ramsay Bolton, avaliação em 220 mil dragões de ouro.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, pessoal.
Mesmo sem a interação direta entre o nosso casal favorito.
O feedback de vocês é sempre bem-vindo, apreciado e me ajuda a melhor a escrita.
Muito obrigada por acompanharem e por compartilharem seus pensamentos.
Até a próxima!



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