Dimensional Adventure escrita por Projeto Alex


Capítulo 3
Mais Uma Sessão de Bullying


Notas iniciais do capítulo

Insanidade, inquietação, loucura.
Desvario, doidice, desmedida bravura?
Estupido, em desatino, alucinado.
Olhos que vêem além do que é esperado.



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As crianças iniciaram o game, todas ao mesmo tempo. Salye era quem parecia mais entusiasmada, se fosse comparar com Glads, o que não era comum, pois geralmente estes dois empatavam quando o assunto era jogos.

A tela principal de Animon se abre, apresentando o logotipo vermelho cintilante, o mesmo ícone que se apresentou no celular da garota, pouco antes. Seu coração tremia e as mãos suadas ameaçavam derrubar o aparelho no gramado.

É agora! Eu não posso ser a única pessoa a ver aquelas coisas. Não posso estar ficando louca. Quando eles verem o que eu ví, eu finalmente vou poder dividir isso com alguém!

Nanisore¹? —Glads pergunta surpreso, levando a mão a cabeça e coçando o cabelo crespo. —Isso é novo pra mim!

Eis que na tela, ao invés dos campos de email e senha para serem preenchidos e assim confirmar a inscrição online, aparecia um botão com a opção “Iniciar Escaneamento de Digitais”.

Ué? É só isso? E aquele lugar pra onde eu fui arrastada?

A morena fica batendo o indicador na tela do celular, desajeitadamente, tão forte que estava quase atravessando o aparelho com o dedo.

—Bem, a interface é bem sofisticada para um simples jogo para celular. —Chan observou, ao pressionar os cinco dedos da mão direita sobre a tela. —Nunca ouvi falar de um game pedir escaneamento de digitais para começar uma gravação.

—Mas você já tacou os dedos aí? —Lucca sacode os ombros de Chan. —Não está percebendo o quanto isso é suspeito? —O gordinho pergunta preocupado, virando-se em seguida para a morena. —Salye, dá pra acreditar nesse cara?

Vamos lá! Será que não vai acontecer nada? Não acredito que estou perdendo meu tempo aqui!

Contudo, tanto a garota quanto Glads, já acabavam de fazer o mesmo, cadastrando suas digitais. —Hum, agora está pedindo pra inserir um nickname²! —A jovem informa ansiosa, sem dar atenção a cautela do colega.

—SALYE!!! —Lucca pende a cabeça para trás, suspirando aborrecido.

A garota ri como se estivesse escondendo alguma coisa. —Desculpa, Lucca. É que eu queria muito saber aonde isso vai dar. Do jeito que o Chan falou, eu fiquei ainda mais interessada. —Ela morde a língua, encabulada.

Já cansado de toda a recém intimidade entre Salye e o asiático, o gordinho mete-se entre os dois, pondo o braço ao redor do pescoço da menina. —Tá bom... E então, como vai se chamar o seu perfil? Você já decidiu, doida? —Disse, referindo-se a Salye, mas olhando sério para Chan, sem sequer disfarçar.

—Eu estava pensando... —A jovem fecha os olhos e coloca o celular junto ao peito. —Acho que seria legal usar nossos nomes de verdade. Seria como se nós mesmos estivéssemos vivendo a aventura, e não apenas personagens inventados por nós. —Ela não conseguia tirar da cabeça que finalmente havia chegado o momento de fugir daquela realidade de forma completa.

Por um segundo, os garotos ali param a fim de observar a cena meiga protagonizada pela menina. Só faltava o refletor iluminando-a sobre o palco e bolhas cor-de-rosa voando ao redor dela. Só que a morena nunca fora meiga de fato, mas quase sempre demonstrara apenas seu lado sério e diga-se de passagem, nada feminina.

—KASPOKSAPOKSAPOSKAPOSKPOAS!!! —Os três rapazes não conseguiram segurar o riso e gargalharam descontroladamente, segurando as barrigas, por quase um minuto inteiro.

—SEUS IDIOTAS! QUAL O PROBLEMA DE VOCÊS??? —Salye esgana Glads, que geralmente recebia as punições por ser o mais escandaloso.

—PA-PARA MENINA, NÃO BATE SÓ EM MIM, ELES TAMBÉM... —O moreno berra, tentando a segurar pelos pulsos.

—Mas faz sentido. —Lucca começa a controlar o riso. —Eu nunca usei meu nome como profille² em um game, vai ser interessante. Vamos os três fazer isso. —Ele aponta o dedo indicador para a testa da menina, que se anima com a decisão final.

—Espera aí eu quero criar o meu próprio profille! —Glads interrompe o amigo. —Vai ser “MorenoPeitoComDanone”. —Ele levanta as mãos esperando receber milhares de aplausos.

—Não. Eu já te falei, essa piada não tem mais graça.

—Qual é Lucca! A Salye fica cantarolando Apple Pen³ 24 horas por dia e você não tem coragem de dizer nada!

Lucca corou desta vez e não teve como responder a provocação do amigo, mas Chan interveio a tempo, por suas próprias razões: —Não vamos comparar uma bizarrice como essa. Diferente de você, a Selye fica fofa quando encasqueta com uma música. —Ele chega no ouvido de Lucca e encostando os lábios, canta imitando a voz da menina: —Pen Pinapple Apple Pen!

O rapaz estremeceu, ficando ainda mais vermelho. —TÁ FICANDO DOIDO, Ô CACETE! Por que você não vai ler seus queridos contos eróticos e me deixa em paz? —Furioso, ele empurra o asiático pra longe.

—Babaca! —O menino de olhos puxados revida. —Você quer aparecer de bonzão mas tem mais revista pornô que o Alexander Forta!

A garota se enrubesce, afinal se havia uma coisa que a deixava desconcertada, era quando os garotos começavam a falar de coisas pervertidas. Já sem paciência de tanto esperar que aconteça algo, visto que ainda havia muitas coisas para descobrir daquele aplicativo, ela não se contém mais, gritando tão alto que quase chama a atenção de toda a escola: —IMBECIS! ESTAMOS PERDENDO TEMPO, AINDA FALTA CRIAR O PERSONAGEM E O INTERVALO ESTÁ QUASE...

Nesse exato momento o sinal toca, anunciando a hora de voltar pra sala, fazendo todos ali soltar um sonoro “Ahhhhhhh”.

Nerds malditos!

Os quatro começam a se dirigir de volta a sala. Mas as suas cabeças estavam longe de qualquer matéria da aula, de tal forma que, antes de deixarem a mesa de pedra, haviam concordado em logar assim que chegassem em casa, desprezando atividades quaisquer atividades que tivessem, mesmo que fosse estudar ou fazer algum outro trabalho da escola.

[...]

A aula se arrastou por horas, a sensação era que daria meia noite mas ela nunca acabaria. Desta vez, não só Selye parecia aérea como também os três garotos. E é claro que seus “queridos colegas” não perderiam a oportunidade de fazer piada com isso, mas hoje, a morena não estava no seu normal. A merda estava para ser lançada no ventilador.

Os alunos cochichavam numa altura em que a garota pudesse ouvir, mas os professor não:

—Viu como os nerds parecem ainda mais avoados? Viu, eu te disse que lerdeza pega!

— Devem ter pego o HIV da esquisitona! —Disse uma voz desagradavelmente familiar.

Infelizmente, naquele momento a menina parecia extremamente mais ansiosa e inquieta que o costume e desta vez. Ficara esperando tanto para mostrar para seus amigo aquilo o que acontecera com ela e agora estava em dúvida se aquela viagem ocorreu mesmo ou se havia ficado louca de vez... Estava indisposta demais para ouvir desaforos calada, como em todos os outros dias de sua vida. Salye mudou. Algo acendeu-se dentro dela, uma vontade de rasgar o mundo com presas e garras.

Localizando a direção das ofensas inacabáveis, a jovem levantou-se subitamente e desferiu apontando o dedo para Fabi, a delinqüente da sala e líder de gangue que adorava importuná-la:

—O QUE VOCÊ TEM COMIGO SUA IDIOTA? ATÉ QUANDO VOCÊ VAI FALAR MERDA COM A FOSSA DESSA SUA BOCA IMUNDA? —Surpreendentemente, Salye revidou, sem se importar com a presença do mestre na sala.

A sala toda ficou em confusão. Todos pararam para assistir o ocorrido. Ninguém se metia com aquela garota Fabi, porque ela era doida, mas doida de verdade! A única da escola que já tinha transado com um monte de caras e que botava medo até nos professores.

—SALYE! —Franco chamou sua atenção batendo na mesa com as palmas das mãos, derrubando até mesmo o livro de cálculo, temendo pela segurança da aluna.

—Não, Salye! —Da sua cadeira a frente da dela, Lucca a puxava ligeiramente pela camisa da farda, para que ela voltasse ao assento. —O que deu em você? —Sussurrava.

—Ferrou! —Chan, Glads e Lex também, já imaginavam o desfecho dessa história como uma reportagem “Garota é Encontrada Morta em Beco”, em letras garrafais na primeira página do jornal de amanhã.

—Vadia desgraçada. —Fabi enlouqueceu com o fato de a menina ter desafiado-a. E ninguém desafiava Fabi Gomes! —Pode esperar que eu vou pegar você, retardada! —A delinquente cuspiu no chão e deu um risinho sinistro, cruzando as pernas longas.

Franco, a fim de desfazer o tumulto, ou de pelo menos a acalmar, dirigiu-se a Salye: —Você está atrapalhando a minha aula, faça o favor de sair da sala!

Sem escolha, a garota pega a enorme mochila e a põe em um dos ombros, ao passo que quase toda a turma a vaia enquanto caminha. Salye segura então uma das mechas da franja mal cortada. Era seu jeito de se desconectar das pessoas ao seu redor.

Ao sair pela porta, porém de cabeça levantada e indiferente aos olhares alheios, passa por sua ex-amiga, a qual costuma sentar próximo a entrada. Esta fala baixinho:

—Garota idiota! —Jesse dispara contra ela, porém sem receber nenhuma resposta da morena, nem sequer um olhar.

Salye retorna para o banco de pedra, debaixo da grande mangueira. Ela retira a mochila calmamente e a põe sobre a mesa.

—KYAAAAAAAAAAHHHHHH!!!! —Ela choraminga alto, como uma criança, esfregando a cabeça toda com as mãos, despenteando-a desesperadamente. —O QUE FOI QUE EU FIZ? —Salye afoga o rosto na bolsa.

Ela limpa a face com a manga da farda e toma o celular. Destravando o aparelho, observa o ícone de Animon. —O que está acontecendo comigo? Eu não sou assim! E agora eu vou morrer! —Tremendo, ela passa o dedo sobre os contatos, parando em cima do número de telefone do pai, cogitando em ligar para ele vir buscá-la. —No que eu estou pensando? Se ele souber que eu atrapalhei a aula, vai ser ele quem vai me matar... Morrer aqui ou morrer em casa! De qualquer jeito eu... VOU ACABAR ENTRANDO NUMA FRIA MALUCA! —Ela chora de novo, com o rosto voltado para baixo.

Por que o jogo não nos levou pra aquele lugar? Eu não aguento mais continuar aqui! Por que eu não posso fugir?

Nisso, o sinal toca novamente, como que anunciando uma execução em praça pública, com direito a forca, guilhotina, fuzilamento e um capuz charmoso para cobrir sua cabeça. De repente, Salye sente um mão quente tocá-la na gola da camisa, agarrando-a, numa presença ameaçadora. Sentiu um calafrio brutal.

Pronto, é agora que eu morro!

—DESCULPA, DESCULPA DESCULPA! —A menina junta as mãos, implorando misericórdia.

—HAHAHAHAHAHAHAHA!

Era Glads quem a puxava pelo pescoço, enquanto Lucca e Chan esgoelavam-se de rir: —Claro que eu desculpo, só não me bata de novo! Hahahaha!

A menina volta a chorar, esfregando os olhos infantilmente, de tão nervosa que ficou por conta da brincadeira dos amigos: —ÔÔÔÔ, vocês estão se divertindo com a minha desgraça! Não riam não, que a situação é séria.

—A culpa é sua. Foi você quem pirou e arrumou briga logo com aquela mulher. —Lucca a censurou. —Mas agora não adianta chorar pelo leite derramado... Não se preocupe, a partir de hoje, nós três vamos te levar até em casa.

A menina pendeu a cabeça para o lado, deixando cair sobre o rosto úmido, uma mecha de cabelo escuro, sem entender nada do que o amigo falara. Então Chan completou: —Foi o Franco quem chamou a gente em particular e pediu isso. Como já está ficando escuro, pode ficar perigoso você ir sozinha. Pra mim ta beleza, porque é caminho pra casa da minha namorada, mesmo.

A menina coloca a mão sobre o peito, dando um suspiro longo e baixo. —Franco... —Salye sorri, agora mais tranqüila. —Obrigado.

—Agora vamos, a escola já está quase vazia e isso pode dar uma treta federal. —Glads fala apontando para o portão semi-aberto com o polegar.

Lucca ajuda a menina a se levantar coloca a mochila dela em si próprio. Salye parece mais leve, calma, e contente, também pudera, não só estava indo pra casa com a companhia despreocupada daqueles garotos, tão parecidos com ela, mas acima de tudo, acabara de por para fora todo aquele sentimento reprimido dentro dela de quando aguentava os bulliyng⁴ dos colegas de sala sem jamais revidar. Agora sentia-se livre finalmente. Salye sentia-se tão bem que começou a andar na frente dos meninos, rodopiando de braços abertos, permitindo que seus longos cabelos negros, dos quais ela tinha tanto orgulho, dançassem ao redor dela, brincando como uma criança.

—Ela é meio doidinha, mas é pegável né, Lucca? —Chan cutuca o rapaz a fim de provocá-lo como sempre, enquanto a menina se aproxima animadamente da saída.

Mas Lucca o repele imediatamente, forçando indiferença: —Não enche o saco. Salye é apenas nossa colega, quase um bichinho de estimação... um cachorro, digamos assim. Nada mais.

Parecia que as coisas tinham acabado bem. Ela estava feliz, e despreocupada. Além disso, os meninos também não pareciam estar chateados com a missão dada por Franco. Isso era apenas uma simples expedição de RPGs.

—SALYE! —Lucca berrou desesperado, tentando alcançar a garota distraída, porém em vão.

No momento em que a jovem passou pelo grande portão da escola, foi puxada bruscamente pelo pulso e jogada ao chão, escadaria abaixo, bolando e parando somente ao se deparar com a calçada. Quanto ao portão, este foi fechado imediatamente, antes que os amigos de Salye tivessem a chance de cruzá-lo. Os garotos correram até a grade a fim de tentar resgatar a amiga, mas uma pessoa rapidamente a tranca com cadeado.

Uma sombra magra e cumprida chuta as costelas da garota para vira-la. A morena ergue-se com dificuldade, apoiando-se com os joelhos. Ela sente seu nariz escorrer e tocando-o, percebe que está sangrando, gotejando em seu rosto, roupa e na calçada também. Levantando a cabeça então, a jovem arregala os olhos cor de ônix, reconhecendo a agressora:

—F-Fabi!

 


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Notas finais do capítulo

¹Nanisore: Expressão japonesa que significa “O que é isso?”

²Nickname/Profille: Apelido. Usado para identificação de usuários na internet, em programas de bate-bapo ou mensagem instantânea e diversos tipos de jogos.

³Apple Pen: Veja essa bosta e tire suas próprias conclusões: https://www.youtube.com/watch?v=77_J-IFOQ4M

⁴Bullying é um termo da língua inglesa que se refere a todas as formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas que são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de intimidar ou agredir outra pessoa.
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Essa semana eu passei quase o dia todo escutando e cantando Pen Pinepple Apple Pen e não consigo tirar essa música da minha cabeça. Sério, preciso de ajuda. Alguém conhece um PPAPA?



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