Dimensional Adventure escrita por Projeto Alex


Capítulo 4
Agressão no Beco


Notas iniciais do capítulo

Não há para onde fugir,
Não posso ser livre de fato.
Queimar, trovejar, explodir...
Corroo a mim mesma
Trancando ou deixando sair.



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—Fa- bi! —Salye arregala os enormes orbes escuros ao reconhecer a colega.

A delinqüente leva as mãos a cintura, debochando da menina largada no chão: —Você achou mesmo que eu ia deixa barato o seu atrevimento, sua vadiazinha? —A mulher sorri, fazendo aparecer na bochecha bronzeada uma covinha profunda.

—Salye! —Lucca agarra as barras de ferro, balançando-as vigorosamente. —ALGUÉM! ALGUÉM ABRA AQUI! —O gordinho pede socorro, sem notar o porteiro se escondendo de por detrás de uma das colunas, com um cigarro enganchado da boca. —MAS QUE INFERNO! ABRAM AQUI!

De repente, um cassete de madeira acerta em cheio a grade, no lugar onde se encontravam os dedos do garoto que se não fosse pelos reflexos de Glads, o qual puxou o amigo a tempo, tais dedos teriam sido completamente quebrados.

Do lado de fora, um rapaz de cabelos tingidos de verde encara os garotos trancados, batendo sugestivamente o taco na mão. —Vocês são mesmo barulhentos... Melhor irem se esconder como ratinhos, se não quiserem que sobre pra vocês. —Ele piscou diretamente para Chan.

—Quem é você? —O leal companheiro indaga ao agressor desconhecido, ao perceber a familiaridade que este demostrara com o asiático.

—Isso vocês não tem de saber... —Disse, se aproximando de Fabi, lhe entregando a peça de madeira. Então se voltando novamente para Glads e os outros, levou a mão ao bolso, tirando dele um canivete velho, apontando novamente para o Chan: —...O que vocês tem de saber, é ficar fora do caminho dos outros. —Pronunciou cuspindo as palavras.

—MALDITOS! SE VOCÊS ENCOSTAREM MAIS UM DEDO NELA, EU JURO QUE MATO VOCÊ DOIS! —Lucca berrava furioso, sendo segurado por Glads. Contudo, nada poderia fazer por detrás do alto muro do colégio.

Quanto a Selye, esta permanecia imóvel, ao pé da escadaria, paralisada de medo. Um filete de sangue espesso lhe saia de uma das narinas, contudo não era nisso que preocupava a morena naquele momento. Era evidente que corria um perigo real, mas não só havia se metido nessa encrenca por nada, como seus colegas estavam correndo perigo por culpa dela. Isso é que era o problema.

Fabi se dirigiu então à menina, que mantinha-se estática. Os olhos negros e grandes fixavam na delinqüente, a qual apresentava uma intenção obvia de espancá-la sem dó. Finalmente, a loira, tendo a garota a seus pés, levantou o taco ameaçadoramente: —Eu vou te mostrar quem manda nessa escola, já que não te ensinaram isso ainda... —Rindo de um jeito sinistro.

—CORRE! SELYE! CORRE LOGO! —Os garotos ordenavam aflitos para a amiga.

No instante em que a bandidinha desceu a pancada, as vozes angustiadas de seus companheiros a despertaram, fazendo-a recuar na hora certa e se esquivar do golpe.

Entretanto, algo estava errado. Ao se movimentar, Selye sentiu uma fisgada no pé e este começou a doer bastante.

—Vadiazinha imunda! —A mulher xingava. —Não fique achando que eu já terminei! —Ela prendeu o cabelo com uma piranha¹, se preparando para investir de novo.

—O QUE VOCÊ ESTÁ ESPERANDO SELYE? CORRE LOGO SUA GAROTA BURRA! —Era a torcida de Glads por dentro do prédio, o qual parecia ter nascido antes do politicamente correto².

Escutando os gritos dos meninos, Salye disparou rua acima, apesar do pé dolorido. Ao que parece, a adrenalina e os chamados constantes de seus colegas foram o suficiente para fazê-la se mover, mesmo sabendo que não seria rápida o bastante para escapar dos arruaceiros. O que a confortava, pelo menos, é que os marginais iriam atrás dela e não dos outros.

De fato, os bully³ não ficaram parados. —E aí Fabi, você não vai deixar essa pirralha te dar um perdido, vai? —O cara de cabelo espetado diz para a loira, atiçando-a, ao arrumar o cabelo tingido de verde, deixando a agressora ainda mais louca.

—E quando foi que eu deixei barato quem tirasse uma comigo, ein SEU FANFARRÃO? —Disse deslizando os dedos sensualmente pelo próprio rosto e fechando o punho em seguida, com tamanha força que as articulações estralaram. —Vamos apenas nos divertir um pouco. —Sorriu. —Cadê a moto, Pacco?

—Já está aqui, Boss⁴. —Ele trazia a moto, a qual repousava no canto do muro.

A loira subiu agilmente na máquina, sem ligar para a calçinha aparecendo sob o cós da calça jeans recém comprada. —Vamos pegá-la Perdigueiro⁵! —Aceleraram.

—VOLTEM AQUI! —Lucca imperava, mesmo sem a mínima esperança de ser ouvido. —Merda! —Ele se agarrava as grades mais uma vez.

Eu só posso latir no fim das contas...

Houve uma pancada, seguida de outra. Glads olhou para ver e eis que Chan arrancara um dos bancos da escola no chute! O assento caiu fora do lugar de onde estava anteriormente chumbado à calçada. Os dois pegaram o banco e se prepararam para ir de encontro aos portões.

—Lucca, sai daí! —O alto fala ao seu velho amigo, mas este parecia desmoronado, sem forças para reagir ou mesmo para pensar num plano. Percebendo isto, ele continuou: —A gente vai achar ela, mano. —Reanimando o companheiro, o qual sentia-se diminuto. —LUCCA! ESSE TROÇO PESAH!

Por fim o rapaz se levanta com convicção. Franzindo as sobrancelhas, decidido, se volta para Glads: —Tem razão! Não podemos ficar parados! —Dito isso, ele vai até os colegas e agarra o banco também, fornecendo a força adicional que precisavam. —1... 2... e 3!!!

[...]

Salye correu o máximo que pôde, mas já estava escuro e também por conta do nervosismo, nem sabia direito onde estava, mesmo nascido e tendo sido criada naquela cidade. Escorou-se numa parede, cansada e quase sem fôlego.

O pé começava a inchar. Ela se abaixou e tocou no machucado a fim de examiná-lo. Parecia bem feio.

—Ai não! Como vou explicar isso pros meus pais? —A menina procurava engolir o choro e não se desconcentrar por causa do celular inquieto, vibrando o tempo todo, na sua cintura.

Ela retirou o objeto de seu lugar de descanso e segurou-o afobada, desligando-o. Contudo este mostrava parecer ter vida própria, teimando em ligar sozinho, exibindo o enigmático ícone do tão esperado game, implorando para ser iniciado. —E agora essa!

Por um instante lembrou-se da “viagem” que tivera horas antes, quando despencou chão adentro, flutuando entre as luzes misteriosas. Pensou na atmosfera em que ela mergulhou para emegir no meio daquele ambiente nunca explorado; na paz que sentira ao perceber que estava longe de tudo e de todos... Era como... Não! Ela mesma não existisse mais ali e ao mesmo tempo...

Ela balança o rosto de um lado para o outro, a fim de voltar a si. —NÃÃÃÃÃÃ! —Por que tinha de pensar nisso logo agora? Era nítido que nada daquilo havia acontecido de verdade e que havia mesmo ficado louca. Assim, Salye segura o aparelho a frente do rosto, o qual foi iluminado pela tela: —EU NÃO TEMPO PRA ISSO AGORA, NÃO ENTENDE? EU TENHO QUE SALVAR A MINHA VIDA! —Ela resmunga alto, fazendo bico, perdendo a paciência, de tal jeito, que aqueles que passavam por ela, realmente achavam que tinha uma pessoa maluca ali, brigando com um mero celular.

A morena limpou o nariz com as costas da mão. O sangue seco se desprendia em farelos escuros, aderindo aos pelos finos do braço. Contudo, antes que pudesse relaxar e finalmente suspirar aliviada, um barulho de freio, no começo da rua, a faz alertar os sentidos.

Olhando para trás, a morena pôde ver o clarão do farol neon da maldita motocicleta. —Não acredito! Como me acharam? —A jovem diz, recompondo-se, voltando a se por em fuga, arrastando o pé magoado. Eles, na ânsia de alcançar a garota, haviam derrubado os produtos da mesa dum camelô na calçada.

—VOLTEM AQUI SEUS FÍ DUMA ÉGUA! —O pobre senhorzinho gritava, injuriado com o estrago que os dois marginais fizeram a sua mercadoria.

—OLHA ELA LÁ! ACELERA! —A loira ordenava, agarrada a cintura do motoqueiro. — Chegue mais perto, Pacco! Eu tenho uma surpresinha pra ela!

Por mais rápido que corresse, é claro que não poderia ganhar da moto, ainda mais com a perna daquele jeito. O motoqueiro logo emparelhou com a garota fugitiva. Então, Fabi, com um chute certeiro, a atingiu nas costelas. No impacto, a morena foi lançada no beco, alguns metros adentro, caindo numa poça de lama fedida.

—E É STRIKE⁶! —A delinqüente desce da moto, vibrando ao ver a menina atolada até o queixo. —Aqui porquinha! Aqui! —Ela ria escandalosamente, zombando.

A menina, na lama, sentia o telefone em sua roupa aquecendo de tal modo que estava prestes a incendiar-se, mas era a sua mente que ardia. Ao mesmo tempo, Salye não estava disposta a desistir tão fácil. Ela tinha de dar um jeito de sair dali! Assim, ela se ergueu, pondo-se em retirada.

No entanto, Pacco a interceptou, adiantando-se a ela e bloqueando-lhe o caminho pelo outro lado. —Tsc, tsc, tsc... —Ele acenou com o indicador, descendo da motocicleta e dirigindo-se a garota já tão machucada. —Se você ficar quietinha, talvez acabe mais rápido! —Disse o bandidinho.

O aparelho já vibrava tão alto que dava pra ouvir.

—Agora, que tal “acertarmos” AS NOSSAS CONTAS? —Fabi veio sobre suas costas como uma assombração.

Antes que pudesse se virar, Selye foi atingida pela loira, a qual descia com o taco de madeira nas costas da menina, repetidas vezes, até o celular da garota cair no chão e quicar, indo parar aos pés de Pacco. Mesmo sentindo dores horríveis, a morena se arrastou pelo asfalto esburacado, tentando alcançar o aparelho com a mão fina.

—Boa piada, gata. —O moleque prende a mão da indefesa com a sola da bota. E toma o celular da menina, a qual apenas pode observá-lo se agachar e pegar o objeto. —O que você está querendo fazer, pirralha? Chamar os fracassados por ajuda? Pfh! Eles não vem... não vão te ajudar. Nem aquele seu amigo Edu... como é mesmo que vocês o chamam?...Chan? HAHAHAHA! —Ele gargalha de olhos fechados.

Cala a boca!

—Devolva! —A menina fica inquieta ao ver o rapaz de cabelo espetado balançando o telefone de lá pra cá, o qual continuava vibrando e acendendo a luz, provocando-a. —Devolva!

—Você está tipo, totalmente sozinha. Ninguém vai nos desafiar por causa de uma ninguém como você, imagina aquele bando de mongolóides! —A loira ri estridentemente sem parar de olhar nos orbes escuros da garota caída. —Tive uma idéia, que tal tirar a roupa dela e enviar para os bobalhões, umas fotos bem quentes? Garanto que eles vão achar dahora!

Cala a boca!

—Mas sabe? Eu até gostaria que eles estivessem aqui, pra ver pessoalmente... Nããão... Acho que eu queria mesmo era quebrar alguns dentes deles, só por diversão. —Ela gira o bastão no ar, ameaçadoramente.

Cala a boca!

—O que será que se passou pela sua cabecinha burra pra pensar em se meter com alguém maior do que você? —Pacco pegou uma das longas mechas de cabelo negro dela, alisando-a. —Você está sozinha, e vamos fazer contigo, o que a gente quiser. —Dando a entender algo terrível.

Cala a boca!

—Mas é uma boa idéia, Fabi... —O cara continuou. —Só espancar essa pirralha não é diversão suficiente. Eu iria dar valor furar as tripas de todos os quatr-...

—CALA A BOCA! —Não suportando mais, Salye interrompe os agressores.

Era tudo verdade. Aqueles garotos não eram seus amigos mesmo. Eram apenas colegas, que por coincidência do destino, gostavam da mesma coisa que ela. Por culpa dela, eles poderiam correr o risco de sofrer retaliação daqueles vândalos, apenas por terem pensado em ajudá-la. E eles só tentaram fazer alguma coisa, por causa do pedido de um professor tentando se livrar de uma confusão ainda pior. Na verdade, nem tinham a obrigação de fazer nada, porque no fim das contas, ela não valia muita coisa.

Sim, Salye estava mesmo sozinha.

—É verdade! —A menina começou a se levantar de cabeça baixa, apoiando-se pelos joelhos. —É exatamente como você disse: “eles não vem”. O pessoal não tem motivos pra virem atrás de mim, mas... —A voz dela ecoava ao redor das paredes do beco.

—É MELHOR VOCÊ NÃO SE MEXER! —O rapaz a manda ficar no chão, ainda segurando-lhe o cabelo, porém com força agora. Contudo, ela continuava a se recompor.

Nesse instante, Fabi se lança sobre ela, intencionando dar-lhe uma potente pancada na nuca, mas desta vez Salye reage, se defendendo com o braço e segurando o taco firmemente em seguida.

Os enormes olhos da morena transpareciam através da franja torta, refletindo o luar como sinistros faróis. Um tremor percorreu inteiramente o corpo de sua agressora, a qual cessou a respiração por um segundo.

—...Eu não vou deixar que lixos como vocês AMEACEM ELES!


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Notas finais do capítulo

¹ Piranha: Um tipo de presilha muito popular principalmente entre as adolescentes, que consiste em um utensílio com dentes que se traspassam, prendendo o cabelo.

² politicamente correto: refere-se ao cuidado de tornar a linguagem neutra em termos de discriminação e evitar que possa ser ofensiva para certas pessoas ou grupos sociais.

³ bully: o que pratica bullying; O mesmo que agressor.

⁴ boss: Patrão ou chefe, em inglês.

⁵ Perdigueiro: personagem da série chamada “Game of Thrones”, o qual fazia tudo o que o detestável rei mandava.

⁶ strike: nomenclatura do jogo de boliche, utilizada quando se derruba todos os pinos num jogo de boliche em apenas um jogada.



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