Belinda girou no ar e caiu de costa no chão, a fazendo perder o fôlego por um momento e ver vários pontos pretos brilhando a sua frente.
—De novo! —A menina falou quando conseguiu respirar novamente, já se colocando de pé e Rabastan a encarou de sobrancelha arqueada.
—A gente tá treinando o dia todo, nem paramos pra comer ainda.
—De novo!
           Rabastan deu de ombros e a atacou novamente.
           Lestrange sentia o gosto de sangue em sua boca, assim como o corpo protestar de tantas vezes que já fora ao chão após ser atingida por um feitiço de Rabastan, mas continuava se erguendo e repetindo a mesma frase "De novo.". Foi assim que passaram o dia todo e início da noite, que era tingida por uma fraca luminescência da lua e mesmo das duas lamparinas a óleo que Vick viera deixar mais cedo.
—Você tem certeza que não quer parar pra comer? —Rabastan perguntou, quando ela foi ao chão novamente. —Eu tô com fome e se você começar a desmaiar de fraqueza, vai ser impossível aprender como matar a Bella.
—De novo, Rabastan. —Falou se erguendo.
           Belinda começou a animar as plantas, galhos e raízes próximas a Rabastan, fazendo o jardim ganhar vida, mas ele se defendia, afastando com habilidade tudo o que se aproximava muito e nada o atingia, fazendo a menina atacar mais forte. E foi daquela forma que Rodolphus os encontrou quando chegou.
—Belinda. —A voz forte e imponente a atingiu em cheio e ela parou, sentindo que ele estava a suas costas.
            Rabastan sorriu e a viu devolver tudo ao seu devido lugar, antes dela se virar de vez pra Rodolphus e seu acompanhante.
           O rapaz que estava com Rodolphus era mais alto que ele quase uma cabeça e devia ter no máximo 24 anos, não mais que isso. O cabelo liso e de madeixas selvagens era de um branco gelo impressionante, assim como os belos olhos lilases e firmes, os traços fortes, longos e bonitos do rosto eram, de uma forma surpreendente, sutis, fazendo a mão da menina coçar pra desenha-lo.
—Dorian. —Ele falou em uma voz grossa e fria, enquanto erguia a mão pálida de dedos longos e finos.
—Belinda. —Disse tão fria e distante quanto o rapaz, mas sem nem mesmo fazer menção de tocar sua mão, o fazendo erguer uma sobrancelha branca.
—Belinda não é o que se possa chamar de sociável, Dorian. —Rabastan disse sorrindo animadamente, parando ao lado da menina e ele mesmo apertando a mão do albino.
—Foi por causa dela que me trouxeram aqui?
—Exato. —Rodolphus parecia muito calmo.
—Ela não parece grande coisa.
—Você também não, mas nem por isso eu o estou descartando de cara. —Ela revidou, o que o fez encara-la seriamente e os dois irmãos rirem.
—Não irrite nossa Ferinha. —Rabastan brincou. —Ela tende a mostrar as garras.
—Provavelmente precisa amolar, não parecem grande coisa, tanto quanto ela.
          Belinda sentiu como se engolisse fogo, mas deu um sorriso de canto, frio e perigoso.
—E você ao que parece só sabe falar meia dúzia de xingamentos, nada além disso. —Deu de ombros.
           Dorian deu um sorriso provocador antes de desaparecer e em seu lugar surgir uma linda e majestosa Águia-Dourada. As inacreditáveis e grandes asas arrendondadas quase negras e lustrosas, sendo o corpo e as plumas menores e marrons bem escuras, a parte de baixo das asas de um castanho-acinzentado admirável, enquanto a cabeça e pescoço eram de um marrom quase dourado.
           Belinda pendeu levemente a cabeça para o lado direito, notando o bico e as garras negras e pernas emplumadas até o dedão dos pés amarelos. Era um animal fantástico. Mais rápido do que ela pensou, o viu abrindo as asas e voando em sua direção, a jogando de costa no chão e enfiando as garras extremamente afiadas, perfurando o pano do casaco e pele, quase até seus ossos dos ombros, o que a fez soltar um uivo de dor e logo ouviu o grasnar de vitória da Águia, que tirou uma das garras de sua pele, fazendo escorrer seu sangue, só pra enfiar novamente e lhe causar mais dor, os olhos continuavam do mesmo lilás firme de antes, mas agora trazendo um divertimento quase cruel.
           Belinda viu os pontos negros dançarem a sua frente, mas antes que pudesse berrar novamente, ouviu o próprio uivo feroz e tentava agarrar a ave com os dentes afiados, mas Dorian já se afastara e sobrevoava alguns metros acima de sua cabeça.
—É um belo lobo. —Rabastan comentou ali perto, com seu irmão, mas a audição aguçada de lobo de Belinda conseguiu captar sem nenhum problema.
—É irônico, na verdade. —Rodolphus falou com um risinho na voz. —A Águia-Dourada geralmente persegue outras aves de rapina, mas em determinados lugares são treinadas para caçar lobos.
—Isso é bem interessante. —Rabastan concordou.
           Belinda somente ficou observando a Águia sobrevoar e tentar investir algumas vezes, mas a menina tentava não deixar nenhuma brecha, se Dorian vinha pela direita, ela o seguia com os dentes, se ele vinha pela esquerda, ela estava pronta para derruba-lo com as patas de unhas afiadas. Eram dois predadores, ganharia o mais inteligente, contudo Dorian a surpreendeu dando um rasante próximo ao chão e pegando sua calça, que estava em uma pilha de roupas que ele deixara há alguns minutos, com as garras e voando para trás de uma árvore, voltando de lá como homem.
          Belinda não pôde evitar e seus olhos lupinos analisaram o tronco de pele pálida e magra, Dorian era cheio de cicatrizes, algumas mais grosseiras e outras sendo somente linhas esbranquiçadas, mostrando o quão antigas eram. Os pulsos dele traziam cicatrizes também, mas pareciam marcas de corrente e ela se perguntou, pela primeira vez desde que ele chegara, quem era Dorian realmente.
—Você se transformou duas vezes até agora. —Dorian disse, enquanto andava até onde estava o resto de suas roupas e Bell o seguiu com os olhos. —Pelo que Rodolphus me informou e eu vi, ambas as vezes você estava com raiva. Contudo vai precisar aprender a controlar isso, ser um animago exige concentração e inteligência, você tem isso? —A ironia escorreu de sua pergunta e ela somente manteve o olhar, o que o fez sorrir de canto. —Você precisa aprender a canalizar esse ódio para controlar as transformações. —Falou vestindo a camisa.
—Como faz pra ela voltar? —Rabastan perguntou exatamente o que Belinda queria saber.
—Essa parte é um pouco mais difícil, vai exigir muita concentração e bastante esforço, sem falar de tempo. —Ele a analisou. —Mas tenho que admitir, garota, é um lobo e tanto.
—Realmente é interessante. —Rodolphus concordou.
—Acho melhor vocês nos deixarem agora. —Dorian falou, enquanto puxava algo de dentro da mochila preta. —Isso aqui vai exigir toda a atenção dela e qualquer som pode atrapalhar.
—Estaremos aguardando para saber os resultados. —Rabastan comentou, parecendo quase feliz.
—Não esperem uma evolução hoje. —Ele quase cuspiu as palavras, se aproximando dela. —Ela é um animago novo. E isso não é algo que se aprende de uma hora para outra.
—Ainda assim, estaremos esperando informações. —Rodolphus alertou, começando a se retirar com o Irmão.
           Dorian bufou e os deixou desaparecer, antes de se virar pra ela, abrindo o pano que estava em suas mãos, era um manto, notou ela.
—Não acho que você vá conseguir voltar sozinha, mas... —Deu de ombros, sem concluir a frase, porém deixando subentendido e foi o que a fez deixá-lo se aproximar e colocar o manto sobre ela, se afastando em seguida e sentando a sua frente.
          Belinda recordou de Draco sentando com ela, no dia em que descobriu ser um animago, porém havia algo mais frio, calculista e ainda assim melancólico, de certo modo, em Dorian, apesar de toda a pose inabalável. Ela conhecia aquilo de alguma forma, pois via isso quase sempre, ao olhar no espelho.
           Foram horas de treino e ainda assim nada aconteceu, Dorian apesar de ríspido, era um bom tutor, sabia ensinar, apesar de todos os xingamentos que vinha junto às informações. Já era começo da madrugada quando ele se colocou de pé.
—Amanhã continuamos. —Ele esfregou o pescoço e pegou a Varinha em seguida.
           Belinda sentiu o vento frio beijar sua pele e estremeceu, puxando a manta ao redor de seu corpo e se erguendo com calma, as pernas estavam cansadas e fracas.
—No inicio essa concentração acaba cansando o corpo. Depois que aprender a controlar, mente e corpo vão trabalhar juntos e você não sentirá todo o peso desse jeito. —Ele informou. —E talvez você pare de explodir dentro das próximas roupas. —Deu de ombros, a vendo franzir o cenho. —Come alguma coisa e depois descansa, a gente vai começar cedo amanhã.
—Vai enfiar as garras nos meus ombros novamente? —A voz estava levemente rouca e ela ainda sentia dor vindo das perfurações provocadas por ele, assim como o sangue que ainda corria, contudo mais lentamente.
—Se for preciso. —Ele deu de ombros e ela bufou. —Não estou aqui para ser seu amiguinho.
—E você acha que eu quero isso? —Ela deu um risinho debochado. —O que eu quero de você, é simplesmente o conhecimento sobre Animagus, fora isso não tenho mais nenhum tipo de interesse.
           Belinda o viu dar um sorriso de canto. Nenhum falou nada até que estavam dentro da Mansão Lestrange e quase entrando na sala, onde se ouvia a baixa conversa de Rodolphus e Rabastan.

—Eu vou fazer você aprender a controlar seu lado animago, nem que eu precise te levar ao extremo de seu próprio corpo e mente, Belinda Lestrange, mas você aprenderá.

 Belinda não respondeu e seguiu para o quarto, sem nem mesmo olhar pra alguém, não por medo, mas cansaço, contudo a frase fria de Dorian a fez sentir os cabelos da nuca e braço arrepiarem.
Lestrange estava exausta, mas se obrigou a tomar banho e comer o que Vick lhe trouxera, logo após entrar no quarto, que ironicamente estava silencioso e ela não ouvia e nem sentia nada observando como normalmente.
            Belinda pensou sobre a frase de Dorian até pegar no sono sem sonhos.