Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 5
V


Notas iniciais do capítulo

Demorou, mas saiu!
Quero muuuito agradecer todos que acompanham a fic, que em poucas semanas de vida já recebe quase vinte (!!!) leitores! Os comentários de todos são simplesmente maravilhosos de ler, tanto que mesmo em semanas difíceis consigo me animar pra escrever mais um capítulo. Muito obrigada.
Também faço um convite para os fantasminhas se manifestarem. Juro que não mordo!

Espero que tenham uma boa leitura, porque eu definitivamente tive bons momentos escrevendo. ~~ Também agradeço meu irmão, meu beta reader maravilhoso! ~~



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A ponta da flecha rasgou o ar, silenciosa e fatal.

Fora do alvo.

Os dedos de Wanda rapidamente alcançaram outra flecha na aljava em suas costas, enquanto suor escorria de suas têmporas. O vento não batia, o sol não fazia nada além de derretê-la. E ela queria derreter. Finalmente derreter até o fim, como uma vela que se cansa de iluminar o pouco que consegue, por mais que queime, por mais que se consuma.

Wanda lançou uma, duas, cinco flechas. Quase todas errantes; Ou fracas demais, ou fortes o suficiente para irem além do que o pretendido, rasgando folhagens e rebatendo em pedras. Era bom que ela estivesse longe de todos. Que T’challa, sensato rei, mantivesse os exilados  Vingadores distantes dos olhos do resto de seu povo.

E aquele silêncio. Aquele maldito silêncio.

Os dedos dela ardiam, por mais que estivesse com a luva, por mais que tivesse vestido a braçadeira.

Nada mais emitia um único ruído. Nem sua mente, nem as aves.

Lá estava ela, de novo. No fundo do oceano. O mundo terreno cheio de calor e vida, há muitos metros acima da escuridão abissal em que se encontrava. E seus braços não era capazes de nadar para a superfície.

E então, uma maré escarlate.

O som perturbou seus ouvidos e bagunçou com todos os demais sentidos de seu corpo. Parecia ter sido eletrocutada, mas tratava-se apenas do alarme do relógio, apoiado em uma das pedras ao redor do perímetro de treinamento, e a voz de Sam Wilson.

— Ei, Wanda! – Ele repetiu, tão súbito quanto um relâmpago branco. – Wanda.

Ela abaixou o arco e encarou um ponto além da figura dele, além do próprio horizonte. Seu coração parecia ter bombeado gelo, bombeado e se entupido dele, dando-lhe um infarto. Enquanto recriminava-se por ser tão assustadiça e tola, aproximou-se dos objetos que trouxera até ali:

O tal relógio de pulso, simples e barato, barras de cereais e uma garrafa d’água já no fim. Recomendações de Barton. Pegou-a e fingiu um gole mais demorado do que o necessário, contando as batidas do coração.

17:45, horário oficial da Cidade Dourada de Wakanda. Horário em que ela cessaria o treinamento e partiria para seu quarto, até que fosse noite. E na madrugada vagaria sozinha, talvez procurando por algo que jamais seria encontrado.

Era o plano, ou o máximo que tinha de uma agenda. Algo para não se perder no tempo.

O assovio impressionado dele ao menos serviu para despertá-la.

— Você tem tido muito trabalho. Clint conseguiu te deixar viciada nessas coisas?

— Prometi cuidar de Agneta. E malhar os braços.

— Vou te ensinar a atirar com algo de verdade. –  Ele riu. –  Vamos ver o que Barton vai achar disso.

Os lábios dela sorriram, sorriram aquele sorriso que seu corpo anestesiado estava acostumado a dar quando na verdade não queria, quando na verdade aquilo era mais uma resposta física a um impulso social.

Eu estou bem. Eu estou rindo.

Eu estou inteira.

— ... Voltará essa noite. Soubemos agora. E ele quer conversar conosco.

— Desculpe, quem?

— A Pantera Cor de Rosa. T’challa.

— Ah.

— Nos quer no jantar, ás 19h.

— Problemas?

— Difícil dizer. – Deu de ombros. – Nem eu, nem Steve falou diretamente com ele. Um dos serviçais nos encontrou na “Sala de Inteligência” – Sam abriu aspas com os dedos, referindo-se ao imenso escritório disponibilizado por T’challa. Tecnologia de ponta igualmente proporcional ao nível de monitoramento por parte dos wakandanos. Generosos, mas cautelosos também. –  E fez um comunicado oficial. Bem dramático, não?

— Eu diria ameaçador.

— Ah, não seja tão pessimista. Quem aqui não gostou da comida wakandana?

Precisava ir. Steve e Sam contavam com ela para isso, além do fato que sua ausência soaria como um desleixo, uma afronta, contra o rei. T’challa os convocara para um jantar, por intermédio de seus serviçais. O que seria?

Uma missão, uma despedida? Uma reprimenda pelas Dora Milaje, talvez?

O cansaço ousava falar mais alto.

Não queria ir.

Ela observou a última flecha que soltara, partida em duas adiante no chão, devido ao susto e ao seu rubro poder. Deu de ombros, o arco parecendo mais pesado do que realmente era. Então percebeu com uma repentina e gélida epifania, o fato de sempre existirem armas em suas mãos, isto é, quando seus próprios dedos não eram a arma em si.

Magia. Flechas. Não importava. O resultado era sempre vermelho, nunca azul.

Jamais azul.

— Não vai desligar o alarme?

— Sim, eu só... Vou desligar agora. – Wanda afinal desligou o apito insistente do relógio.

O vento soprou suas palavras embora, palavras que nem bem formara no pensamento. O silêncio pedia para que Wanda falasse algo à Sam, ou ao menos murmurasse uma resposta qualquer. Ela tentou. Não estava preparada para a notícia, muito menos para o jantar que seria dali a pouco mais de uma hora. Sam percebeu.

Deu apenas um meio sorriso.

— Certo. Passo pra te chamar.  – Sam virou-se, dando um punhado de passos na direção em que viera. – E não se preocupe com T’challa. Podemos distraí-lo com uma caneta laser vermelha ou algo do tipo. Gatos adoram isso.

*** ***

A voz segura e serena de Steve reverberava por todo o salão, junto com uma breve risada ou outra de Sam e as respostas quietas de T’challa, com sua expressão felina. Também havia o som da colher de prata raspando o prato, vindo direto das mãos da Maximoff. O objetivo daquele caldo era comer da maneira tradicional, fazendo conchas com o pão de grãos e consistente, mas todos eles falharam miseravelmente nisso tanto que nos primeiros quinze minutos fora necessário que trouxessem talheres. A comida desta noite fora preparada com requinte adicional por ser o banquete que o rei dava a seus novos aliados, justamente no dia em que regressara de viagem.

Wanda manteve o molho de vegetais bem temperados um momento a mais na boca antes de engolir. Era a última colherada daquele perfeito equilíbrio entre a suavidade dos legumes, sua textura macia e apetitosa, e a austeridade de especiarias que só seriam encontradas em Wakanda. Ela nem percebeu que fechara os olhos, por um segundo absorta no sabor forte do prato. Uma pena que acabara.

Quando abriu os olhos, a atenção de T’challa estava sobre si, mais exatamente em um ponto acima de sua sobrancelha esquerda. O corte.

Era impossível dizer que o que se passava na mente do monarca.

Ele  endireitou sua postura e chamou um dos homens trajados em vestes de tons terrosos e discretos. Disse algo em sua língua nativa, num tom baixo e firme, e logo um grupo bem sincronizado de serventes adentrou o salão, retirando os pratos dos quatro.

Assim que retiraram-se do ambiente, a iluminação esvaneceu-se tal como o sol do fim do dia.

— Rogers, Wilson, Maximoff... – A mesa quadrada tinha frisos em padrões geométricos, os quais aparentavam ser uma simples, porém elegante, decoração. Dali acenderam-se filetes de luz e então um holograma de projetou-se diante dos quatro, mostrando imagens de mapas e dados que ainda não faziam sentido. – Meses atrás eu me dirigi à vocês como rei e guerreiro, mas naquela época eu também era um homem consumido pela vingança. Hoje, além de aliado, venho à vocês como protetor de meu país. Há algo acontecendo no mundo lá fora. Algo que preocupa a nós todos.

— E eu pensando que ele só queria nos chamar para jantar...

Sam lançou um sorriso irônico à T’challa e depois à Wanda. A sensação acolhedora da comida quente se esvaiu com o engolir em seco da garganta dela. Steve estava petrificado na cadeira, com os lábios ligeiramente entreabertos.

— Perdão, vossa Alteza. Quero dizer, Majestade.

— Por incrível que possa parecer, senhor Rogers... – Ele acenou com a cabeça, com um brilho afiado nos olhos. – Seria muito do meu interesse convidá-los apenas para jantar, tanto que não mencionei a real intenção de chamá-los aqui até agora. Eu odiaria estragar o prazer de um bela refeição com a melhor comida de meu reino.

Apesar do silêncio que se seguiu, a expressão de Sam foi muito mais do que satisfeita.

— E o que está acontecendo que lhe preocupa? – O Capitão apoiou o queixo com uma das mãos, apertando as pálpebras para enxergar as marcações nos hologramas. – São os locais de onde houve as tentativas de invasão nos sistemas de Inteligência de Wakanda?

— Sim. Todas falhas, como bem esperávamos. Não usamos códigos binários ou quaisquer coisas assim conhecidas fora daqui.

A voz de Wanda tremeu ao perguntar:

— Stark?

— Não. Stark, por ter assinado o Tratado de Sokovia, tem sido monitorado. Não poderia tentar encontrá-los usando apenas seus próprios brinquedos e sem a devida autorização de um comitê de cento e dezessete países. E nenhum deles teria toda essa ousadia contra Wakanda.

— Já verificamos alguns destes lugares antes. Aqui, em Florença, não passa de uma instalação abandonada há dois anos da H.I.D.R.A. Haviam dados e restos de equipamento, mas nada significativo. – Os dedos de Sam hesitaram diante de outro ponto no mapa. – Nada no Oregon também. Natasha foi até lá pessoalmente. Reportou documentos antigos de membros da organização e inventários...

— Não é um bom sinal. – Steve completou, a mente perdida em uma lembrança não muito antiga. – Somente máquinas e pó onde visitamos nos últimos meses. Você acha que...?

— Se você se refere à Ultron, Capitão, a minha resposta também é não. Aquele robô era muito mais agressivo e egocêntrico do que o nosso alvo, e suponho que tentaria uma invasão física aqui. Ou em qualquer outro lugar.

— Não que fosse adiantar.

O sorriso do Pantera Negra foi tão elegante e cruel quanto sua alcunha sugeria.

— Não mesmo.

Wanda encarou o globo que girava lentamente à sua frente, com pontos em vermelho piscando e a projeção de satélites circundando o planeta. Viu onde ficava sua casa, Sokovia. Lembrou de seu lar, que era azul e prata. Desviou seus olhos.

— Quem quer que seja, é cuidadoso. Não usa exatamente um padrão nos algoritmos, nem nos horários, nem nos seus alvos primários. Primeiro tentou acessar dados fáceis de cidadãos wakandanos, depois evoluiu para infiltrar instituições estatais. Quando percebeu que estávamos deixando-o seguir de forma controlada, para que pudéssemos recolher mais pistas, a conexão simplesmente cessou.

— Mas se esse alguém foi barrado em todas as tentativas, qual é a preocupação?

— Aparentemente seus fins são exatamente estes: nos manter entretidos no seu jogo. Expõe vocês e meu país. E então esse alguém, essa organização, desaparece.

O suspiro de Steve foi audível do outro lado da mesa.

— Nós não sabemos com quem estamos lidando ainda.

— A riqueza em Wakanda desperta a inveja de nações durante anos. A ameaça sempre esteve à espreita em nossas fronteiras. Sabemos disso. Mas essa falta de objetividade não é comum, não parece certa. Eu suspeito que essa organização esteja tentando aprender como operamos, como nossos sistemas funcionam a partir da represália da Inteligência Nacional.

Os olhos da Feiticeira teimaram em seu desejo de tingirem-se de carmim. Ela piscou e piscou, desviando do rosto do rei. Talvez devesse ceder ao ímpeto de checar as palavras não ditas de T’challa, de sondar suas intenções em sua origem mais pura. Seria esclarecedor. Seria errado.

Ela decidiu fazer isso da maneira mais honesta que conhecia:

Perguntando.

— Somos nós os alvos ou Wakanda?

T’challa levantou-se da mesa, num movimento suave.

 – Essa é uma das questões.

A conclusão foi sentida por cada um dos três.

— Eu sou grato por tudo o que fez por nós, vossa Majestade. – Steve ergueu o olhar, inabalável. – E partiremos se nossa presença representar uma ameaça ao país. Só peço que... Que não desista do Bucky. Por favor.

O sorriso irônico de Sam desapareceu, dando lugar à uma face dura, feito o soldado que de fato era. Aquilo, mais o pedido de Stevie, quebrou o coração de Wanda em cacos ainda menores.

— Você é grato e eu não sou hipócrita, senhor Rogers. Há alguém ameaçando meu país e meus aliados. E para esse alguém, eu me dirijo como o Pantera Negra.

Wanda conseguiu encarar T’challa de volta. Pelo o que sabia, panteras possuíam um comportamento silencioso e elegante, por mais que tenham patas capazes de esmagar um crânio e garras afiadas o bastante para estraçalhar gargantas. Mas, caso soltassem um único som de aviso... Soariam assim como o monarca de Wakanda falou.

Inteligente e implacável.

— Então.... – Sam alongou as últimas vogais, passando os dedos pelo fino bigode. – Ficamos?

Os hologramas se apagaram junto ao brilho azul e líquido vinda da mesa. Já as luzes do recinto voltaram à sala, tal qual ela estava antes. Mais serventes adentraram no salão com bandejas nas mãos, colocando taças de vidro diante de cada um.

T’challa, o Rei, sorriu.

— Querem sobremesa?


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Notas finais do capítulo

Se avistarem algum erro, me avisem!
Comentários são sempre bem-vindos! Eu adoraria saber o que estão achando, se conseguem imaginar pra onde a fic vai ou quem mais vai aparecer...
Enfim, beijos e até a próxima!

**Update 2020**
Então, gente. Escrevi isso nos avisos iniciais, mas senti necessidade de repetir aqui. Eu tenho ainda dúvidas sobre a minha representação de Wakanda e seus respectivos personagens, portanto adoraria correções. Desde o momento que comecei, tentei melhorar como autora e pessoa, mas ainda sou uma pessoa falha. O que eu puder desenvolver melhor, excluir e alterar, eu o farei.