Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 4
IV


Notas iniciais do capítulo

Oie!
Estou tão feliz com o sucesso da fic! Não esperava tudo isso pra falar a verdade... Enfim, trago um novo capítulo e espero que gostem, afinal é a primeira aparição do Bucky!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/697672/chapter/4

A silhueta de Wanda atravessava a escuridão,explorando mais uma vez a noite de Wakanda. Seus pés eram silenciosos no piso, pois não era hora de rondar corredores ou se esgueirar por passagens na imensa construção. Se dobrasse a esquerda e seguisse adiante por dez metros, para então subir mais dois lances de escada, encontraria a voz serena de Steve. Stevie, que conversava noite sim, noite não com seu amigo congelado.
Haviam pessoas dormindo, outras ainda trabalhando. Pessoas que cuidavam do bem estar da equipe, agraciados com a confiança do próprio rei T’challa para que houvesse sigilo e paz.

Sigilo e paz.

Aquelas palavras borbulharam trêmulas nos lábios da jovem, a qual seguia sem rumo. As luzes vez ou outra a alcançavam em meros fachos; existiam momentos em que alguém pensava ter visto uma figura feminina vagueando por aí.
Quando isso acontecia, seus dedos tamborilavam quase que sozinhos, naquele seu instinto rubro. Apenas um movimento e o indivíduo não se recordaria do vulto ou do arrepio que sentiu da nuca aos pés. Apenas um movimento a mais e este indivíduo gritaria em pura agonia, visitado pelos mais táteis pesadelos que ele sequer imaginava que tinha.

Wanda fez força para acalmar as mãos ligeiras e as vozes dos pensamentos alheios, que ficavam mais próximas e mais interessantes. Seria tão fácil errar um movimento e pronto! Ela não seria a jovem trôpega e ferida. Seria a bruxa.

A bruxa que vagava Wakanda. Que matara pessoas, responsável pela morte de onze wakandanos. Que destruíra Sokovia. Que seguira um robô feito de vibranium e crueldade. Que era responsável pela morte do próprio irmão.

Houve um pulso escarlate.

Njeri.

Os olhos da moça tornaram-se vermelhos por detrás das pálpebras.

Njeri, que estava ali. Pensava nela, em Wanda. Estava trabalhando até tarde, um andar abaixo do chão onde Wanda se encontrava, com mais de trinta centímetros de concreto de espessura. Tinha olheiras. Pensou na própria filha, uma garota pré-adolescente. Pensou no sorriso dela, nas tardes em que passavam juntas. Pensou em seu cabelo crespo e macio, que adorava acariciar. Perguntava-se se teria outro filho ou não. Então lembrou-se do grito que dera mais cedo, o corte profundo da estrangeira, sangrando enquanto objetos pairavam no ar contra a física do mundo.

Wanda viu a si mesma assim como a doutora assistia células se desenvolverem e reagirem à substâncias através da lente de um microscópio. Era uma jovem pálida, de rosto abatido e olhos opacos. Olhos que estavam além da tristeza, além da fúria. E o homem loiro que conversava com essa jovem também enxergava isso.

O ruído de sua queda soou mais alto e pior no corredor largo, rasgando o silêncio da madrugada.  As mãos e os joelhos dela foram ao chão, e provavelmente a pele tinha se esfolado. Estava no agora e estava sozinha. Sacudiu a cabeça, livrando-se da mente de Njeri. Não queria estar ali. Não queria saber que ela se preocupava. Não queria enxergar sua felicidade ou sua tristeza.

Não queria contaminá-la.

A luz vermelha de seus olhos se apagou por fim. E o homem loiro da lembrança da doutora lhe estendia a mão, com sua aura azul, sempre azul. Stevie.

* * * * *

Lá estava ele, o homem no gelo.

James Buchanan Barnes. Sargento Barnes. O Soldado Invernal. Uma arma, uma máquina. Um experimento, assim como ela. Assim como o agente Rogers.

Tantas coisas em comum. Engraçado, porém, como os três eram vistos de formas tão distintas.

Um herói, símbolo nacional. A Aprimorada caótica. O maior acusado de atos terroristas.

Bucky.

Steve o chamava assim, apenas assim. Bucky. A feiticeira inclinou o rosto enquanto encarava a câmara de criogenia, a qual emitia levemente a fumaça do ar condensado. Bucky; testou a palavra nos lábios. Chamá-lo assim trazia uma aura bem diferente de seu corpo desacordado ou da expressão fechada, mas era uma aura melhor. Mais amena, mais nostálgica.

Bucky.

Por que ninguém o chamava somente de James?

Inclinou o rosto, por um momento hipnotizada pelo o que os sussurros rubros lhe diziam. Massageou as têmporas,numa vã tentativa de ser discreta. Então soltou ar pela boca, de súbito exausta.

—Foi um dia longo, Wanda.– Ele suspirou, a luz branca e artificial tingindo o seu rosto. Seus cílios pareciam alvos, e as íris feitas de vidro. Seu peitoral subia e descia num ritmo constante e tranquilo, assim como todo o resto de sua postura jazia relaxada contra um dos painéis eletrônicos. –Se bem que Clint me deu a honra de mostrar repertório inteiro de xingamentos do século XXI.

Os braços de Steve se cruzaram bem diante do coração.

—Xingamentos são a primeiras palavras que se aprende em outra língua. Eu tinha que ter escutado.

—Não tinha, não.– Lançou um olhar desconfiado, daqueles que duravam menos de um segundo. Também fez menção de dizer algo, algo que parecia entalado na garganta. Parou. Respirou fundo. Deu uma pequena risada, abafada para não despertar quem dormia. Como se fosse possível. Depois soltou, meio de repente: – Clint disse que transpassaria uma flecha no meio do “A” do meu capacete se te visse machucada de novo.

Ainda balançando as pernas no ar, em cima de um banco alto para uma tela de monitoramento, Wanda passou a mão no joelho esquerdo. A queda há poucos minutos atrás abrira pontinhos de sangue aqui e ali, de leve. Ficaria roxo logo. Com a ponta dos dedos acariciou a marca de uma ferida mais antiga, hoje branca e cicatrizada.

Foi quando... Quando balas atravessaram o torso inteiro de Pietro. Quando ela caiu de joelhos.

Ambos sabiam o que ele estava querendo dizer, tanto que não foi surpresa o silêncio dela, muito menos o fato de Steve não se insultar. As palavras não ditas pairavam como flocos de neve no meio do cômodo, acumulando-se no chão.

“Wanda, você vai ficar bem?”

“Você irá até as Dora Miljae pela manhã?”

“Posso tentar falar sobre isso com você?”

A resposta era seu contínuo e desconfortável silêncio. Wanda poderia saber de muitas coisas, o que era alegria e o que era dor; O que o ilustre Capitão América conversava com seu amigo há momentos atrás, sobre aquela vida de outra era; Ou o pior medo da inabalável Viúva Negra.

Mas não sabia responder algo para Steve. Stevie.

—Percebi quando veio aqui pela primeira vez, há algumas noites. –Ela piscou diversas vezes, desviando o rosto do Capitão. Seus pensamentos estavam nela, e tais pensamentos a puxavam feito a ressaca da maré. Sentia a visão obscurecer, sentia o mundo tornar-se carmim. Um gemido escapou de sua garganta. – Eu estava falando sobre o Brooklyn. E sobre a Peggy. E sobre como o gosto de cachorro quente parece diferente agora.

Seu cabelo castanho serviu de cortina para que não encarasse Steve, ao menos não diretamente.

—Desculpe.

Steve não parecia ofendido e aquilo também a irritava, de certa forma.

—São só histórias de um velho com noventa e cinco anos de idade. Constrangedor. Mas, me acalma.

Uma pausa, bipes e bafejos vieram dos aparelhos que mantinham James onde estava.

—Eu... Eu gostei daquela parte. Do circo.

—Ah, – Ele riu. – Dos amendoins? Céus, ainda bem que circos não são mais assim.

—Pareceu engraçado.

Os braços dele descruzaram-se do peito.

—E foi. Foi mesmo. Você tinha que ver por si mesma, os palhaços daquela época eram horríveis. Houve uma vez que Bucky e eu...

As crônicas de um garoto loiro raquítico e seu amigo que sempre o socorria foram longe, tão longe quanto as memórias permitiam. Steve falava como se o rapaz congelado pudesse ouvir, e quem sabe sorrir com as catástrofes que eles sem querer aprontaram na festa de aniversário de Dolores, uma garota ruiva.
Isso a distraía de uma maneira agradável, pois enquanto ele narrava suas lembranças, Wanda não era obrigada a encará-lo de volta e nem a mente dele a fisgava para dentro. Era difícil olhar para aqueles olhos sem deixar de recordar a vida que ele nunca teve, a dança que jamais existiu... O Estresse Pós-Traumático da guerra. Wanda incendiara os medos dele antes. De todos eles.

Nat. Stark. Banner.Thor.

Ultron estava certo. Ela os despedaçou de dentro para fora.

E agora que poderia ser útil e ajudar Bucky, Wanda não conseguia. Não era capaz. Um toque errado naquela mente preciosa e vulnerável, e ela se partiria em pequeninos cacos.

—Desculpe.– Murmurou, para ninguém e para todos.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então, animados? Espero que sim!
Comentários são sempre bem-vindos ♥