Morte aos Lobos escrita por Beatriz Rozeno


Capítulo 12
Capítulo 11 - Lágrimas


Notas iniciais do capítulo

Tudo bem, eu sei q atrasei um dia na postagem do capítulo. Acontece q ontem passou um especial na warner com os dois últimos filmes de harry potter à noite (eu só posso postar de noite), e sabe como é né, vício é vício. Vi os filmes e quando lembrei já era tarde e tive q deixar a edição do capítulo pra hj, assim como a postagem. Fiz algumas mudanças de última hora e por isso demorou muito hj. Mas é q eu queria tudo perfeito.
Tenham uma ótima leitura!



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Meus olhos estão tão pesados que não consigo abri-los de imediato. Não faço a mínima ideia de onde estou, mas sinto que estou deitada em algo macio, muito provavelmente um colchão. Também não sei como vim parar aqui, a última coisa de que realmente lembro é de Thiago olhando fixamente para mim. Meus sentidos voltam a funcionar aos poucos, e finalmente escuto vozes. A primeira que identifico é a de Julie e, surpreendendo até a mim, sinto um alívio enorme ao saber que ela está viva. Em seguida, ouço os outros, conversando sobre algo que não consigo identificar. Mas acho que ouvi meu nome.

Finalmente consigo abrir os olhos. Estou deitada ao lado de uma parede, no quartinho de uma casa bem velha. Fora o colchão, o cômodo tem uma mesa e um banquinho. Uma grande janela permite que a luz do sol adentre o local. Creio que tenhamos parado aqui por pura urgência. Faço um esforço e sento com a costa apoiada na dura parede. Sinto uma dor aguda nos dois braços, mais como um forte formigamento. Olho para eles: ambos os lados estão enfaixados um pouco acima dos cotovelos, e manchas de sangue nas ataduras são visíveis.

Então vejo minha mão esquerda. Uma grande faixa a cobre por inteiro. O cotoco do meu mindinho está coberto, mas é impossível não ver que eu realmente perdi um de meus dedos. Uma onda de horror me atinge, lembrando-me das coisas terríveis que hoje acontecem no mundo.

Pela primeira vez desde que meu pai morreu, eu choro. Um choro incontrolável, que eu guardo há muito tempo. Todas as minhas angústias dos últimos meses são lançadas para fora de mim. Abraço meus joelhos e afundo a cabeça entre eles. Escuto um leve ruído e levanto o olhar. Thiago está entrando no quarto. Quando vê minha situação, fecha a porta atrás de si e vem até mim. Ele senta ao meu lado no pequeno colchão e me abraça. Eu me apoio em seu ombro. Ao invés de finalmente me controlar, choro ainda mais.

— Eu não devia ter deixado você sozinha, Amy. Por favor, me perdoe.

Tenho vontade de dizer a ele que não há motivo para pedir desculpas. Ele não teve nada a ver com isso. Queria dizer que a culpa foi daquela praga, e somente dela. E que se ele não tivesse chego naquele instante, eu estaria morta. Afinal, cada segundo é precioso. Mas eu não consigo dizer nada, pois minha voz não sai, e fico ainda mais triste em não conseguir dizer nada a ele.

Conforme os minutos passam, o choro diminui, e eu fico mais calma. Em nenhum momento Thiago desfaz nosso abraço, portanto, adormeço em seus braços.

**

Depois do que me pareceram algumas horas, acabo acordando. Thiago não está mais aqui, e eu fico sem saber o que fazer. Gostaria logo de sair deste quarto, voltar para a estrada. Mas não me sinto nada bem, então permaneço deitada e imóvel. Eu não sou o tipo de pessoa que espera a solução dos meus problemas caírem do céu, mas não tenho a mínima disposição para nada. Nem mesmo para pegar a garrafinha d’água que está sobre a mesa, juntamente com uma caixinha de cereal.

A porta abre novamente e olho em sua direção na esperança de que seja Thiago, mas é Julie quem entra. Ela vê a água e o cereal intocados e dá um longo suspiro de frustração. Eu sento novamente, fazendo de tudo para que ela não perceba o quanto estou frágil. Ela é uma mulher tão forte e destemida, que é um pouco vergonhoso ser tão fraca na frente dela. Ela com certeza enfrentaria esta situação melhor do que eu. Ela tira uma cartela de comprimidos do bolso de sua jaqueta preta, e senta ao meu lado, não sem antes apanhar a água da mesa.

— Tome, você precisa de mais analgésicos para dor.

Não respondo. Não necessariamente por que não quero, simplesmente porque não consigo.

— Pegue logo, você vai precisar para quando Carol vir trocar o curativo — diz calmamente. — Infelizmente, vai doer muito.

Quando processo as suas palavras em minha mente, acabo dando um sorrisinho irônico. Então respondo:

— Como se você se importasse.

— Olha aqui, garota; estou tentando te ajudar, então colabora comigo e consigo mesma — nesse ponto ela eleva a voz. — Ficar aqui deitada e chorando não vai melhorar sua situação. Então, ergue a cabeça e segue em frente.

Eu a encaro com raiva, e ela devolve o olhar com a mesma intensidade. Acabo cedendo.

— Só cansei de passar por tanta coisa — digo.

— Eu também — responde tristemente. — Mas, sabe, não desiste assim. Eu sei como é, sei como se sente. Muitas vezes eu também pensei em chutar o balde e desistir, e não somente depois do apocalipse. Antes dele também.

— Mas por quê?

Ela reluta em falar, percebo que está decidindo se continua ou não com a conversa.

— Foi depois que eu descobri sobre você, sobre nós, quero dizer. Minha tia me proibiu de ir atrás de você, e então eu entrei numa tristeza profunda. Mas então, depois de uns anos, eu desisti, mesmo sendo maior de idade — ela demora pra continuar. — E quando aconteceu isto com nosso mundo, eu me arrependi de não ter ido atrás de você.

— Então por que todo esse rancor? — pergunto. — Por que me tratou daquele jeito quando nos encontramos? E por que continua agindo assim?

— Você deve saber que tia Yolanda e... o nosso pai... nunca se deram bem. Ela sempre deixou bem claro o que pensava sobre ele.

— Mas e eu?

— Eu acabei criando um ódio por você. Não sei bem o porquê. Talvez pelo fato dele ter ficado com você e não comigo. Sabe, falando assim, percebo o quanto isso é idiota. Eu fui uma imbecil completa, por que pensava: “se eles me amassem teriam vindo atrás de mim”.

— Acontece que te procuramos sim! — digo imediatamente. — Por 17 anos! Foi quando nosso pai enlouqueceu e desistiu por causa da doença dele. Mas nós rodamos o mundo atrás de você.

— Bom, se isso te satisfaz, eu morava no interior de Becker — começa. — Tudo bem que não era um lugar grande e notável no mapa, mas não era invisível. Vocês não rodaram o mundo todo, afinal.

— Espera aí. Você morava no interior de Becker?

— Sim, foi onde nós nascemos. Ou você não sabia disso?

— É claro que eu sabia — respondo sorrindo. — Porque eu também morava em Becker. Mas era no centro do estado, e não no interior, como você.            

Eu entendo o plano de tia Yolanda depois de 22 anos. Ela deixou Julie o tempo todo debaixo do nosso nariz. Deve ter comprado uma casa na parte afastada do estado e dito à Julie que aquela sempre foi a casa delas. Eu nunca pensei nisso enquanto a procurávamos.

Julie entende ao mesmo tempo que eu, e nós acabamos rindo da situação.

— Esse tempo todo — diz ela —, estávamos mais perto do que pensávamos.

— Mas ela disse pra você que foi decisão dela te levar embora, não é? — pergunto. — Nosso pai nunca quis isso.

Julie faz que não com a cabeça.

— Ela fazia questão de dizer que ele tinha me deixado para trás, e ido embora com você.

— Acredite Julie: ele nunca faria isso.

— E como eu posso saber?

— Bem, eu não sei. Mas nosso pai era um homem bom, às vezes problemático, mas uma ótima pessoa — afirmo.

— Gostaria de tê-lo conhecido. Ele morreu não foi?

— Sim... nós estávamos fugindo de um bando de pragas quando ele se sacrificou para salvar a minha vida.

A lembrança daquele dia volta e eu faço de tudo para espantá-la. Então me lembro das fotografias que trago comigo. Tiro do bolso da calça uma foto bem antiga. Ela foi tirada por papai, e mostra nós dois, sorrindo abertamente. Eu tinha apenas um ano naquela época. E, no verso da imagem, pode-se ler: “Com amor, papai.” Estendo a foto para Julie, e ela sorri ao vê-la.

Em retribuição, ela me mostra outra foto, que para mim era desconhecida. Eu e ela, recém-nascidas, uma está vestida de rosa e a outra de vermelho. Atrás da imagem está escrito: “Amy e Julie.”

— E pensar que essa é a nossa única foto juntas — diz ela.

— Uma pena não terem mais máquinas fotográficas — brinco.

— Mas agora são nossas atuais lembranças que valem.

Ela acaba lembrando-se do analgésico e me obriga a tomá-lo. Eu ainda como um pouco de cereal também. Quando Julie começa a me contar sobre sua vida com nossa tia, nossos outros quatro colegas entram no quarto. De início, percebo que eles olham para mim com dó no olhar, mas isso muda quando veem eu e Julie sorrindo juntas. Mas Carol está com uma expressão muito séria.

— Preciso limpar seus ferimentos, Amy — disse ela.

— Tudo bem — digo.

Ela baixa a cabeça, nervosa.

— Você deve imaginar o quanto seus ferimentos foram graves — lembra Carol.

Percebo que os outros também estão estranhos.

— Essas pragas possuem um alto nível de infecção, por conta das doenças lupa e humana. As garras da que te atacou entraram em contato direto com o seu sangue. Sem contar a saliva que ela deixou no seu sangue quando te mordeu...

— Carol, não se preocupe. Pode limpar os ferimentos como quiser, eu aguento — digo relutante.

— Acontece que a infecção se espalhou muito rápido na sua mão. E eu tive que arrancar grande parte da pele dela.

Engulo em seco.

— Quer dizer que minha mão está em carne viva?

Ela afirma que sim.

— Como não temos medicamentos, vai demorar muito para criar outra pele e depois cicatrizar. Talvez meses.

Caroline põe uma bolsa na pequena mesa e pega vários pedaços de algodão e uma garrafa que tem os dizeres na embalagem: Álcool 99%.

— Você vai limpar com álcool puro? — minha voz sai falha.

— Desculpe, Amy. Preciso de algo forte e é só o que temos.

Sinto Julie pegando minha mão esquerda e começando a retirar a faixa. Conforme ela a retira, vejo a imensa mancha de sangue.

Meu coração pulsa forte quando me deparo com o buraco na minha mão. É pior do que imaginava. Carol retirou toda a carne da parte direita da minha mão esquerda, um buraco que vai desde o dedo mínimo até parte do pulso.

Julie segura meu braço de modo que ele fique de lado, para que o líquido escorra livremente quando Carol o lançar na minha mão. Primeiro, ela joga água. Uma dor pulsante atinge o local, e eu retiro minha mão por puro reflexo. Balanço-a em desespero, fazendo com que caia sangue em Carol e Julie.

— Você não pode tirar a mão assim, Amy — adverte Julie.

— A segurem para mim — pede Carol aos rapazes.

Eles me deixam de pé, e eu só consigo pensar na dor que irei sentir. Mas tento pensar positivamente. Carol não tirou tanto a ponto de eu não ter mais os nervos da mão, porque sinto a dor, e seria pior se eu não a sentisse.

Thiago aperta minha mão direita com uma das mãos, e com a outra, segura fortemente meu ombro.

Terry e Bob se abaixam e seguram minhas pernas, um de cada lado. Julie permanece na mão esquerda. Caroline pega o álcool e respira fundo. Julie estende mais a minha mão e agarra meu braço com força. Carol finalmente despeja o líquido.

Provavelmente é a maior dor física que já senti. A ferida aberta lateja intensamente, e eu me debato para tentar fugir da dor. Agora entendo por que ela pediu que me segurassem.

Lágrimas escorrem pela minha bochecha num fluxo intenso. Carol joga mais um pouco do líquido, e eu faço de tudo para escapar da dor quando ela começa a limpar o sangue com algodão. Depois de tanto chorar e espernear, paro de lutar. Meu corpo fraqueja e eu fico parecendo uma boneca de pano. Eles me colocam no colchão e vejo vários pedaços de algodão encharcados de sangue no chão.

Devagar, peço que me deem mais analgésicos e limpem meus braços só depois que eu dormir. Atenciosamente, atendem meu pedido. Julie me dá mais duas pílulas e Carol enfaixa minha mão, e escuto ela sussurrar um breve “Desculpe”.

Viro-me para o lado da parede, ainda chorando. Não demora muito para que o remédio me faça adormecer.

 

 


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Notas finais do capítulo

Só pra esclarecer: quando digo "interior" não é fazenda, com vacas e tal. É interior no sentido de ser afastada do centro do estado (justamente onde Amy ficava quando ela e o pai não estavam viajando).
Como perceberam, esse capítulo foi um divisor de águas para a Amy.
Novamente peço desculpas pelo atraso.
Até o próximo.
Abraços, Beatriz ♥



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