Era da Opressão escrita por P B Souza


Capítulo 6
05; Estabelecimento


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novo com cheirinho de pólvora pra vocês!
A revolução tá oficialmente iniciada. E você é convidada(o) para explodir tudo!!!
Boa leitura :D



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05; estabelecimento.

Esgotos de Rosa e Cravo. 16/02/0165

Já fazia vinte e duas horas que Grino e seus homens andavam no escuro.

Não queria olhar para trás e ver os túmulos que fez pelo caminho, as perdas que teve, os amigos que já não voltaria a ver. Havia pensado que seria mais fácil, mais simples do que Londres havia sido, contava com a experiência que não tinha antes, e mesmo assim os inimigos tinham o surpreendido de novo.

Se não fosse Sony invadindo o sinal dos guardas e interceptando suas ordens, Grino e todos provavelmente estariam ou mortos ou presos aguardando a forca. Os guardas, embora exímios atiradores, não foram o maior dos problemas. O problema era sair dali, encontrar abrigo agora que todos caçavam eles.

Ennie passou por Grino abraçando-o com um braço só de forma amigável enquanto não paravam de andar.

— Como está? — Perguntou com a voz tão exausta que entregava o cansaço que seu corpo tentava esconder.

— Diferente de muitos, vivo! — Grino disse a melhor verdade que pode.

— Não se culpe. — Ennie pediu. — Eles sabiam que isso podia acontecer, nós sabíamos.

Sua voz suave disse, como sempre encantando Grino, o fazendo não se culpar tanto, não desistir.

— Estamos só com vinte e oito soldados. — Grino disse com pesar enquanto seus passos ecoavam no corredor.

— Vamos vingar eles, todos eles, e somaremos mais à causa! — Ennie tinha gosto por vingança, mas tinha um controle fenomenal sobre as emoções, podendo deixar qualquer vingança de lado pelo bem maior, pelo grande objetivo.

Então ela soltou Grino e foi à frente da comitiva. Passou por cinco dos soldados que andavam de ombros baixos, cabeças apontando para o chão, balançando, perambulando, quase caindo de cansaço e exaustão. Foi até Sony na vanguarda do grupo.

— Como ele está? — Sony perguntou assim que Ennie surgiu no seu campo de visão periférica.

— A gente perdeu mais soldados, Grino conhecia e gostava de todos eles, afinal ele escolheu os mais próximos a ele, escolheu-os a dedo. Ele sabia que alguns morreriam porém não diminui a dor dele. — Ennie soou tristonha. Sony mesmo carregou dois feridos até ali em baixo. Lentamente, um por um, os feridos foram morrendo, nenhum ficou lá pela estação, não podiam deixar os inimigos pensar que tinham conseguido sequer ferir os invasores. Eles deveriam ser como fantasmas, e assim tinha sido.

— Eu fiz algumas pesquisas, a força tática que enfrentamos é conhecida por Strike Sete. Por terem os melhores atiradores, os sete melhores, não apenas do Estado Cinque, mas de todas as colônias, inclusive, alguns sequer são daqui. Por isso nos acertaram. Também consegui invadir um servidor remoto pelos comunicadores do próprio Strike sete e eles não sabem que nos acertaram o franco-atirador do telhado, de quem roubei o comunicador que invadi, não se lembra nem mesmo de ter atirado ao que parece. — Então com um sorriso de quem se gaba completou; — A melhor parte é que eles sequer deram por falta do comunicador, já que eu deixei um comunicador nosso quebrado ao lado do rifle do atirador. Eu sou muito bom no que faço.

— Isso não muda as perdas, nem as suaviza. Eles seriam importantes, agora estamos despreparados e com menos que o ideal, nossos planos não funcionarão com poucos homens assim!

— Não, mas já é um começo. — Sony disse como se realmente estivesse contente com o resultado final das coisas. Na verdade, ele era um otimista, gostava de ver o lado bom das coisas — Sabemos também que o líder deles foi expulso, o Strike Sete é Strike seis agora, a não ser que alguém entre no grupo. Eu pensei em… — Sony tinha um display LED preso ao pulso, como um relógio, aonde ele foliou até chegar em um rosto com nome ao lado. — Josh Quart. Franco-atirador de Dito Grasso há nove anos, desempregado com pensão do governo, um ótimo substituto para a vaga.

— Josh? — Ennie perguntou sem entender.

— É um dos nossos, mudei o nome e calculei um CI falso com data de expedição antiga de alguém que desapareceu uns anos atrás. Para o governo ele é cidadão de Estado Cinque a quarenta e dois anos, quando nasceu, ele vai se candidatar para o cargo e eu vou assegurar que ele seja aceito. — Sony não parava de planejar e arquitetar, mesmo ali, naquela situação, mesmos cansados e quebrados, ele já pensava no dia por vir, na próxima missão, no próximo golpe. — Não podemos nos dar ao luxo de esperar.

— Já falou com o Grino? — Ennie questionou lançando um olhar para Sony, que olhou para trás, por entre os rostos dos vinte e cinco rebeldes, procurando por Grino que cabisbaixo perambulava sem saber para onde.

— Ele não está em condições para isso… não agora. — Sony respondeu entristecido voltando a olhar para Ennie. — A perca de soldados para ele é mais complicada que para gente… ele ainda é humano demais, diferente de você e eu, pedras no lugar dos corações. — Disse brincando então, tornando a encher seu lábio com um sorriso, mas Ennie não pareceu ver graça alguma.

A verdade é que Grino vinha de outra realidade e embora tivesse se ajustado com o mundo da revolução, seu sangue ainda era de origem distinta. Não era como Ennie e Sony que viam na morte nada além de rotina. Para Grino a morte era algo a se temer, ainda mais a morte sem honra. Para Ennie e Sony a morte sem honra era a mais provável para todos ali, talvez fosse a única.

— Nossa sorte é que ele ainda é humano demais. — Ennie argumentou. — Ainda, pelo menos.

— Entendo. — Sony respondeu olhando para seu relógio de pulso do outro braço. — Temos aproximadamente vinte minutos até a maré cheia de novo. — Disse em um tom de voz mais alto para que as pessoas atrás dele ouvissem também e então um começou a cochichar para o outro.

— De novo. — Alguém retorquiu.

— É. — Sony olhou para frente no túnel, aquela era a pior parte. — Tem um armazém mais à frente. Esses tuneis devem nos levar direto até ele.

— Tempo? — Ennie perguntou.

— Se começarmos a correr agora, dez minutos, andando nesse ritmo meia hora. Se a maré for antes do período esperado… bem se não corrermos talvez precisemos enterrar mais alguém!

Ennie fez que sim com cabeça indo para trás dele.

— Correr pessoal, maré cheia em breve, temos dez minutos para achar terra alta. — Era irônico dizer aquilo quando o teto estava a menos de dois metros da cabeça deles.

Grino acompanhou o ritmo, ele estava exausto assim como todos, mas era uma corrida pela vida. Como sempre em sua vida desde que deixou sua casa. Atrás dele os mais fortes carregavam a carga preciosa que estava no trem, que precisaram retirar às pressas.

Em onze minutos eles ainda corriam em um chão lamacento, Grino estava ao lado de Sony e Ennie atrás coordenando tudo para que ninguém ficasse perdido, os últimos eram os quatro carregando a grande caixa da carga do trem, mas todos levavam algo, fosse armamento, fosse registros, fossem mantimentos ou recursos em geral.

— Olha! — Grino disse apontando para frente. Duzentos metros a frente eles viam luzes estáticas. Era um alívio, pois Sony alertara-os que a guarda de Estado Cinque provavelmente desceria aos túneis procurando por eles.

Encontraram os corpos, sim, mas nada além de corpos! Os rastros a maré destruirá. Não poderão nos perseguir. Grino pensava com um pequeno sentimento de esperança.

Então alguém berrou. Sony olhou para o chão, dos buracos nas laterais dos tuneis a água começava a subir, como uma fonte brotando água do chão, exceto pelo fato daquela água feder esgoto e dejetos humanos, ser salgada pelo mar e amarronzada pela terra.

— Vamos, acelerem o passo. — Grino disse correndo um pouco mais rápido forçando os sobreviventes a fazerem o mesmo, mas os pés afundavam na lama podre e a água se acumulava em poças que criavam quedas por escorregões.

— Mais dois Braços aqui. Vamos mais rápido com isso, não queremos ficar para trás. — Ennie pediu auxílio e mais dois rebeldes vieram ajudar com a carga.

Mais dois minutos correndo, a água já estava até os calcanhares, e cada passo fazia o estardalhaço junto aos outros passos de todos juntos correndo. As canelas molhadas com respingos da pressa da correria iam se tornando pesadas e incomodas, o cheiro se intensificando tornava-se insuportável.

Quando chegaram na luz acharam duas pequenas escadas com uma placa antiga. As escadas eram incrivelmente velhas, e estavam podres, corroídas pela água salgada, as paredes cheias de vida biológica criada pelas marés altas e baixas durante o dia.

— Chegamos! — Grino disse ofegante subindo as escadas, olhou para trás com a água subindo cada vez mais, então para as escadas, percebeu que não eram velhas, e sim desgastadas pela maré. — O que tem acima?

— Um salão, armazém, algo assim. Deve ser vazio. — Sony informou.

Os vinte e oito rebeldes então subiram as escadas com a carga por último. Se depararam no topo com algo inesperado. Um salão não muito grande, paredes com estantes cheias de potes de vários tamanhos, e mesas com homens usando roupas protetoras brancas e amarelas, nas mesas todo um aparato químico profissional e líquidos fluindo de um lado para o outro.

— Mas o que…

Todos começaram a cochichar, os homens de Grino como os homens do “laboratório”, foi uma pequena confusão onde ninguém fez nada além de se assustar e ficar imóvel trocando olhares.

— Esse é o bairro mais pobre, deveria estar vazio, a descrição dizia que devia estar vazio! — Sony cochichou na orelha de Grino.

— Acha que é do governo? — Ennie perguntou. Aquele era o maior temor.

— Quem mais teria dinheiro para todo esse aparato? No bairro mais pobre ainda por cima! — Sony rebateu.

Então, rapidamente, desceu um homem que usava uma roupa estranha preta e vinho com uma capa até o meio das pernas que era bordada nas laterais com um tecido cor de ouro escurecido e, no entanto, a roupa fosse aparentemente nobre, estava desgastada e perdendo a cor, seu rosto era de importância, os olhos castanhos e cabelo preto escovado para trás, um olhar profundo e uma maldade que Grino reconheceu no mesmo segundo, era a maldade de todo homem bondoso com certo poder.

— Quem são vocês?! — Sua voz era suprema, elevada a um nível em que todos podiam ouvir e todos deviam temer, mas sem sequer ser alta demais.

Os soldados de Grino estavam com armas em punho e prontos para a luta, no entanto os trabalhadores ali e o homem com capa não pareciam temer muito, o homem em especial sequer parecia se importar.

— São cientistas, desarmados e inocentes com filhos e filhas em casa. O que vão fazer… — Este homem então se calou com um rosto de surpresa. — Não pode ser verdade!

— Meu nome é… — Grino começou com sua voz emulando rouquidão.

— Grino Joyel II, o rebelde de Londres. — Rider. Grino pensou entrando em choque ao descobrir que aquele desconhecido o conhecia. Quem é você?

— Os habitantes daqui não deveriam saber sobre nós… Ele deve ser do governo. — Sony disse cauteloso com medo de que o governo os tivesse encurralado ali, no entanto a voz do homem era de completa surpresa e encantamento, não de alguém que os procurava.

— Meu nome é Grino Joyel. — Grino disse indo a frente de seus soldados, Ennie e Sony do seu lado. — E vocês, quem são?

— O mesmo que você! — O homem disse andando passando pelas mesas, os cientistas e o resto. — Meu nome é Russel Norm Feltz. Dono deste armazém.

— Não parece um armazém. — Sony olhou para os trabalhadores que definitivamente não estavam armazenando nada.

Russel deu de ombros e então tornou a olhar para Grino, parecia fascinado por ele. Se sabe meu nome, sabe que sou o segundo de meu nome, então sabe quem sou!

— O que fazem aqui? Eu aprecio muito seu trabalho em Londres, mas entenda: Se não me responder não vai mais trabalhar.

Grino olhou para Russel detectando a ameaça, entendo a ameaça acima de tudo. Ele aprecia meu histórico, mas preza pela própria segurança, tal como eu.

— Entendo sua preocupação e desculpe, nunca ouvi falar de você, o que é muito diferente quanto a você sobre mim. — Grino respondeu em fim esclarecendo as coisas. — Minha missão é livrar o povo do governo. É isso que eu faço e sempre fiz, vivo para isso, dar ao povo a liberdade que lhe é tirada ao nascer.

— Nobre como um político, inclusive, soou como um dos Cinque. — Russel respondeu, um tanto frio.

— Eu sei! — Grino retorquiu. — Nosso problema é que estamos andando há já um dia, não temos para onde ir, onde ficar, quase metade dos meus homens estão mortos, afogados no esgoto de sua cidade, e precisamos repor nossas forças.

Russel apontou para a porta de onde tinha vindo.

— Lá em cima o mundo é cruel, mas dentro das minhas paredes existe um armazém, onde podem ficar por um tempo. — Russel disse com um sorrisinho. — E se abrirem a boca sobre esse laboratório vai perder o resto dos seus homens. Aqueles tuneis servem para uma coisa muito boa durante a maré cheia da qual estava fugindo.

— Eu sei! — Grino respondeu, temeroso, mas entendia a reciproca. — Respeito sua casa, e você. Agradeço sua compaixão com a causa comum.

Grino olhou para trás, seus soldados lhe agradeciam com os olhares de quem conseguiu um teto para dormir, mas Grino não estava olhando para nenhum dos seus soldados, estava olhando para aquela descida rumo aos tuneis, agora ela estava cheia de água. Deu graças a Deus por estar ali, vivo, e por seus homens estarem ali, vivos. A água nunca antes tinha representado um risco tão grande para ele como naquele dia, ou em qualquer dia desde então!

 

No outro dia de manhã a equipe de vinte e oito soldados estava deitada sob caixotes macios de pano para confecção. Foram acordados por Russel que não foi muito sutil. Ele chegou e mandou que todos subissem para o escritório de cima, aonde os trabalhadores não iriam os ver.

Grino anuiu e todos subiram, para o escritório isolado, lá eles ficaram confinados, Russel avisou que só poderiam sair às nove horas da noite quando o trabalho acabava e todos iam para casa. Aquela área reservada ao burocrático do armazém um dia talvez tivesse sido cheia de mesas, agora era apenas um grande salão vazio.

Naquele dia Grino, no período da manhã, ficou na janela observando o movimento, fazendo suas análises sobre o distrito, entendendo qual era o ritmo de vida naquele lugar. Russel subia de tempos em tempos para ver eles, não trocavam muitas palavras ou sequer falavam um com o outro.

— Como estão? — Perguntava vez ou outras.

Uma vez ficou alguns segundos recolhendo alguns papéis. Enquanto isso Grino olhava pela janela para a via de trafego lá em baixo, e depois de um tempo olhando viu uma menina passando, ela parou em uma loja, ajeitou os cabelos usando o reflexo do vidro da janela, então se virou encarando o nada, mas para Grino ela estava encarando ele.

— Russo! — Grino chamou. Mais cedo Russel falou para ele chamarem ele de Russo e não Russel, era como o homem era conhecido por ali.

— Oi.

Ele respondeu indo até Grino.

— Quem é ela? — Grino disse com certo encantamento.

Russel olhou pela janela, a menina lá em baixo parecia brilhar, era encantadora mesmo tendo uma expressão de pura tristeza no rosto, ele sabia quem era. Uma menina geniosa e problemática, só era bonita de longe e para os desconhecidos.

— Alayza Rothschild. — Russel disse sem empatia como se apenas respondesse uma pergunta qualquer e apenas por educação. — Tenho que ir!

Grino olhou por mais uns segundos até a menina sair andando e sumir de sua visão.

Naquele 17 de fevereiro Grino ficou o dia todo na janela, até ver a menina voltando, e de repente quando ela estava voltando viu que estava triste de alguma forma, abatida, desesperada até. E aquela sua tristeza chegou até ele, Grino fechou a cortina da janela e também ficou triste, não quis mais nada, aquele dia tinha acabado, naquele dia ele estava triste. Naquele instante percebeu que não podia negar para si mesmo, mas alguma coisa dentro de si lhe dizia para falar com aquela menina. Russel disse para não sairmos daqui. Pensou, já se levantando.

Então, decidido a encontrá-la, saiu.


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Notas finais do capítulo

HEYYY! E então, gostaram? Sim, ficou muito "forçado" esse Grino que deu uma gamada monstra na menina, mas tudo terá seus porquês. A história é um romance além de uma distopia, e como todo bom romance, não pode deixar de ter o "a primeira vista", né nom!
Até o próximo capítulo galera revoltosa!!!



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