Julgamento de uma Ilusão escrita por Mirai


Capítulo 11
Muralhas e pontes


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas! Já tem um tempo que não atualizo a fic, já que estava terminando as avaliações e os trabalhos.
Bem, espero que gostem do capítulo! ♥



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Surpreendi-me, enquanto sentia o vento cortante e gélido entrar pela janela do veículo, assim como algumas gotas de chuva, que molhavam meu uniforme. Um arrepio subiu por minha espinha enquanto Vicente diminuía a abertura da ventana.

— R-Relação…? Como assim?

— É, vocês são só amigos? A-Assim, eu não… como eu digo…? — ele tentou se expressar, mas não pude deixar de perceber que seu rosto estava um pouco avermelhado, embora estivesse um pouco frio — Eu vou respeitar se vocês forem alguma coisa além, eu só… perguntei por curiosidade, tem horas que parece.

Vi-o se encolher um pouco no banco do ônibus, talvez pela baixa temperatura.

— Mas o que te fez pensar isso? — perguntei, confusa. Será que alguma menina fez algum comentário?

— Bem… esse período de trabalhos em que pouco nos falamos, pude notar que ele te observa muito. Fora o jeito que ele te carregou hoje, foi tão… estranho…

— Não, só somos colegas de classe. Nada mais.

— Lembra daquela promessa que a gente fez no 9º ano? — ele perguntou.

— De que, se alguma coisa errada acontecesse comigo, eu podia contar para você?

— Essa daí mesmo! — ele sorriu, parecendo feliz por eu lembrar — Eu não vou te obrigar, mas se algo estiver te preocupando, me conta. Eu não quero que você fique triste. E, mesmo assim, se for para ficar triste, ficamos tristes juntos! — ele colocou a mão esquerda sobre meu ombro.

Abaixei minha cabeça. Eu precisava contar isso a ele, até mesmo porque fizemos uma promessa. Respirei fundo e comecei.

— Eu nunca te contei o porquê de eu ter saído da outra escola no meio do ano, né?

— Não. No dia que você começou a contar, parecia tão triste… eu não insisti em saber o motivo, não queria te ver mal.

— Foi porque… em 2011… — tentei focar no que ia dizer — um menino disse que queria conversar comigo perto da piscina… mas, em vez dele, duas meninas estavam lá. Elas me humilharam e… — respirei fundo para conseguir dizer tudo de uma vez — tentaram me afogar na piscina da escola. O menino ficou assistindo tudo.

— O quê?! — Vicente exclamou, por sorte não atraindo a atenção das pessoas em volta — Como assim?

— Mas… — emendei, fazendo-o me olhar com uma expressão horrorizada — o nome dele era Alexandre. Nome e sobrenome iguais ao do que estamos estudando agora.

— Não… pode ser… — Vicente sussurrou — Mas ele sabe que você… bem, que você é a menina que ele assistiu ser quase afogada?

— Parece que sim. — murmurei.

— Era por isso que você parecia não ficar muito à vontade comigo no começo? — ele perguntou, subitamente.

— Bem, não era que eu não ficasse à vontade… — disse, meio sem jeito — acho que, no fundo, eu sabia que não precisava ter medo de você, pois você é totalmente diferente dele.

— Eu confesso que eu tinha medo que você fosse me tratar mal como todas as outras. Eu tinha criado um certo pânico de falar com meninas por causa do que aconteceu depois do incidente da Nádia, mas, por algum motivo, quis falar com você… — Vicente disse, embora cabisbaixo, com um pequeno sorriso — Eu não me arrependo disso.

— Sério? — perguntei, com dificuldade. Era um pouco engraçado o fato de termos nos conhecido em épocas tão delicadas: ele ainda superava o suicídio de Nádia, enquanto eu tentava esquecer todo o incidente com aquele menino de casaco azul. Eu sabia disso, por isso nunca contei toda a história, não aceitava ser um fardo para ele.

— Sério, mesmo você omitindo seus sentimentos para não preocupar ninguém. — ele disse, como se conseguisse ler minha mente — Mas, sem brincadeiras, está se sentindo melhor agora?

— Bastante. Muito obrigada mesmo, Vicente. — agradeci.

— Não precisa agradecer, Bia. — ele disse, parecia ainda se recompor da surpresa — Eu nunca pensei que você já tinha passado por uma situação tão complicada.

— Eu peço desculpas por não ter falado antes… — me redimi.

— Tudo bem, não precisa se desculpar.

— Mesmo? — perguntei — Você sempre diz que não precisa se desculpar…

— A gente aceita as desculpas de alguém quando estamos magoados, mas queremos dar uma segunda chance para a pessoa. — o com heterocromia respondeu — Eu não fico magoado por quase nada do que você me vem pedir desculpas. Por isso eu digo que não precisa.

Sorri. A maneira em que ele sempre fazia com que eu me sentisse bem era tão incrível. Embora o dia escolar não tivesse começado bem, a forma com que ele estava terminando era bem melhor.

— Você é bem paciente… — eu brinquei — Eu acho que já teria desistido de mim mesma, a esse ponto.

Olhei pela janela, infelizmente já estava perto de onde Vicente descia.

— Ah, daqui a pouco você vai ter que descer… — resmunguei — Você está com um guarda-chuva, né?

— Ah, sempre levo um comigo. Não se preocupe. — ouvimos o som das portas do ônibus se abrirem — E outra coisa: não desiste nunca, entendeu? Até amanhã, Bia, e se cuida.

— A-Até amanhã…! — respondi, sorrindo.

As portas do ônibus se abriram, permitindo que o de íris bicolores descesse do veículo.

Acompanhei-o caminhar pela rua deserta, com o guarda-chuva preto o protegendo dos fortes chuviscos. Respirei fundo, estava com a consciência bem mais limpa agora, mesmo que tenha desmaiado, que Alexandre tenha precisado me carregar no colo, que Mariana e suas colegas tenham se aproximado de Vicente, que eu tenha perdido a matéria de hoje… tudo isso eram meros detalhes.

Fechei o zíper do meu casaco e abri mais a janela, deixando o vento bater em meu rosto com mais força. Sempre quis que o dia seguinte chegasse logo, assim poderia ter a companhia de Karol e Vicente. Já fazia um tempo que não conseguia falar com ela, sentia sua falta. Durante as férias, pensei que só esperaria o dia seguinte para ver Vicente, e que eu não precisaria me preocupar com outra pessoa.

Talvez, se eu soubesse que seria tão complicado falar com Vicente depois, eu teria valorizado ainda mais todos os momentos que passei ao lado dele. A cada dia que passava, o grupo de meninas ia notando mais um ponto positivo nele. A sua simpatia, paciência e carinho pelos demais a encantaram e, devo admitir, era raro encontrar algum rapaz com ao menos metade disso.

Era como se elas tivessem construído uma muralha entre eu e ele. Uma muralha resistente e alta que, embora tentasse quebrar ou pular, nunca conseguia. Ao mesmo tempo surgiu uma ponte. Uma ponte que ligava Alexandre a mim.

Da mesma forma que, a cada dia eu ficava mais distante de Vicente, com tudo resumido a simples cumprimentos e acenos de despedida pela janela do ônibus, eu também estava sendo levada para um lado oposto por Alexandre. Sua companhia me fazia ficar cada vez mais desconfortável, mas eu não me sentia confiante o suficiente de trazer nada do incidente de anos atrás à tona.

Não ainda.

Já nos últimos dias de aula, o professor de Educação Física pediu para que um aluno de confiança guardasse alguns objetos usados na aula. A aluna escolhida foi eu, infelizmente, ainda que eu nem fizesse as aulas regularmente. Levantei-me, peguei os objetos e me dirigi a um lugar que me fazia lembrar um sótão, por ser repleto de coisas empoeiradas. Entrei com dificuldade naquele cômodo estreito e longo e guardei tudo em seus devidos lugares. Fiz questão de demorar, aliás, não estava com ânimo de sair e voltar a aturar Alexandre, ainda que toda a poeira estivesse fazendo meu nariz ficar irritado.

— Maldita alergia… — sussurrei, enquanto percebia que demorar naquele cômodo só me traria prejuízos.

Fui me distanciando do final do “sótão” e, para a minha surpresa, a porta estava fechada. Estranhei, me aproximando e tentando abri-la.

Estava trancada.

Respirei fundo. “Ninguém teria me trancado aqui, certo?”, repetia em minha mente, enquanto tentava girar a maçaneta e abrir a porta, sem sucesso. Gritei por ajuda, mas ninguém parecia ouvir. Sentei-me no chão, as costas encostadas na porta trancada. Ouvi ruídos abafados do outro lado daquela parede grossa. Pareciam passos. Em seguida, ouvi o som da chave girando na fechadura, o que me incentivou a me afastar da porta. A luz entrou no cômodo, me fazendo ver uma silhueta com dificuldade. Uma silhueta feminina. Pisquei os olhos para me acostumar à claridade e pude reconhecer minha “heroína”, a qual jamais esperava: Mariana.


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Notas finais do capítulo

O que será que a Mariana queria ajudando a nossa queridíssima protagonista?



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