Sobre Príncipes e Princesas escrita por Hanna Martins


Capítulo 3
Aceita um chá sem açúcar?


Notas iniciais do capítulo

Queria agradecer a todos os lindos que resolveram embarcar comigo nessa nova jornada. Obrigada! Vocês me deixaram sorrindo por dias!



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Acho que eles não sabem o que fazer comigo. Fiquei o dia inteiro no quarto. O único contato que tive foi com Sebastian e aquele principezinho mimado, também conhecido como meu futuro... marido (argh, essa palavra me causa calafrios. 18 anos e estou prestes a me casar, quem é que tem uma sina desta?). Ainda bem que ele não deu mais as fuças reais por aqui, depois daquele banho surpresa.

Sebastian sempre vem aqui e pergunta se estou bem ou precisando de algo. E como bônus, lança aquele sorriso que pode causar graves acidentes em pessoas desavisadas.

Estou praticamente incomunicável. Sebastian ficou com meu celular, pois, segundo ele, poderiam descobrir o meu número e coisa e tal. Mas, consegui falar com minha mãe, rapidamente, é verdade. Parece que minha família aprovou muito bem essas “férias” na casa de campo da família real. Bem, pelo menos, alguém está aproveitando, né?

Também estou sem acesso à internet, “não queremos que você veja coisas desagradáveis”, afirmou Sebastian. Aquele fã-clube do príncipe Leon é doído igual a ele. Se antes, já estavam criando mil e uma teoria sobre a noiva do príncipe e não a viam com bons olhos, imagina, agora! Nem quero saber, ou melhor, imaginar.  

Sem comunicação, praticamente trancafiada em um quarto, isso não está parecendo uma prisão? Com a diferença que tenho um belo guarda.

Dou uma boa espreguiçada. Essa poltrona é mesmo confortável, também deve ter custado uma fortuna. Fecho A sangue frio de Truman Capote e olho pela janela, tenho uma boa visão do jardim. Só de olhar para o laguinho, mal posso conter uma risada. A expressão da Sua Idiota Alteza foi hilária. Porém, foi lamentável perder o resto do espetáculo, porque tive que me afastar o mais rápido possível, já que ele estava preste a gritar “corte a cabeça da plebeia”. E eu quero manter minha cabeça exatamente onde está.

Decido dar um pequeno passeio no jardim, preciso esticar as pernas, fiquei muito tempo na mesma posição.

Mal dou dois passos pelo jardim e avisto uma figura estranha. Uma garota, usando um moletom com um longo capuz, que cobre a metade do seu rosto. Ela caminha apressadamente. Por alguma razão, essa cena me soa muito familiar.

A garota vem em minha direção. Tenho um mau pressentimento sobre isso. Seus passos são cada vez mais rápidos, ela quase corre. A garota estranha se aproxima de mim e quando está a poucos centímetros puxa a minha mão, me arrastando para um arbusto.

O que acabou de acontecer aqui? Quem é essa maluca que arrasta desconhecidos para um arbusto?

— Ei!

A garota faz sinal para que eu me cale.

— Quem é... — não consigo terminar minha frase, pois ela tampa minha boca com a mão.

Perfeito, fui sequestrada.

A garota olha como se tivesse alguém a perseguindo. Noto dois seguranças do palácio andando pelo jardim.

— Ela não está aqui — diz um dos seguranças em seu rádio de comunicação.

— Vamos procurar na ala oeste — sugere o outro.

Os dois vão embora. Mas, a garota não retira a mão de minha boca, preciso fazer algum barulho para ela se lembrar da minha presença.

— Ah... — ela volta a cabeça em minha direção e, finalmente, se dá conta da minha existência. — Desculpe! — retira a mão da minha boca.

— Você está fugindo deles?

— Eles querem a minha cabeça — declara.

Olho para ela. Consigo ver agora boa parte do seu rosto, o capuz escorregou um pouco de sua cabeça.

Incríveis olhos verdes, cabelos negros que caem até seus ombros, rosto perfeito (por que será que todos os membros dessa família têm perfeição na genética?). Charlotte. A princesa caçula da família real. Com seus 16 anos, ela já roubou o coração de todo adolescente ou pré-adolescente de nossa nação.

Os príncipes e princesas desse país têm sérios problemas com disfarces. Ela até usou a mesma estratégia que Leon, cobrir o rosto com um capuz. Será que quando pequenos os príncipes recebem treinamento de como se disfarçar? Se for o caso, as aulas não deram certo, dinheiro mal investido. 

Charlotte rapidamente ajeita seu capuz.

— Prazer, Charlie — estende a mão para mim. — Você deve ser a Emma, não é?

Assinto, enquanto aperto a mão dela.

— Belo chute no traseiro do meu irmão! — faz sinal com o polegar. — Tenho certeza que ele mereceu.

Então, Leon é tão chato que até mesma a sua irmã ficou feliz com aquele chute em traseiro? Interessante.

— Como você soube?

— As notícias se espalham bastante rápido por aqui — responde simplesmente, dando os ombros.

Charlie se levanta do chão.

— Preciso de um lugar para me esconder... — olha em direção ao meu quarto e sorri. — Eles não vão pensar em me encontrar ali...

Sem pensar duas vezes, ela caminha em direção ao meu quarto. Charlie tem um andar que me recorda vagamente ao da rainha, mas, há algo de energético e diria que até selvagem em seus passos. No meio do caminho, ela se volta para mim.

— Ei, Emma, você não vem?

 Ela prossegue em direção ao meu quarto e eu a sigo.

Charlie instalá-se na poltrona em que eu estava e olha pela janela.

— Eles não vão me pegar! Vou bater meu recorde dessa vez — afirma entusiasmada. — O que você está fazendo para passar o tempo? — volta-se e pergunta subitamente para mim. — Minha mãe deve ter estabelecido a medida máxima de segurança com você, sem celular, internet, não é mesmo?

— É. Nada.

— Escuta, Emma, quem foi designado como seu guarda-costas, por acaso, não é o Sebastian, é?

— É.

— Merda!

Charlie se levanta igual a um gato fugindo de água.

— Tenho que cair fora.

Mal Charlie dá dois passos, a porta se abre.

— Charlotte! — ela congela praticamente.

Sebastian a olha com o cenho franzido. Ela se vira cautelosamente com um sorriso no rosto e a expressão de garota inocente. Esse povo real deve fazer aulas de atuação, tenho certeza.

— Bash — Charlie usa um alto grau de meiguice na voz. — Você não vai contar para a minha mãe que estou aqui, vai?

— Charlotte — ele a repreende.

— Por favor, Bash! Por favor — Charlie implora com as mãos juntas. — Poxa, eu nunca te pedi nada! Só dessa vez, sim? Me ajuda, Bash! Por favor — ela atua tão bem que eu até mesmo estou acreditando que ela é a pessoa mais inocente do mundo.

— Sei... Charlotte, isso não funciona comigo.

Charlie bufa.

— Argh, Bash, você é um... — ela tenta não soltar um palavrão. — Eu odeio você, Bash!

Ele tenta disfarçar um sorriso e ser profissional, mas o canto dos lábios o trai.

— Vamos, Charlie, a rainha quer que você vá ao chá.

Ela cruza os braços em sinal de protesto.

— Charlotte!

— Não!

Os dois se encararam, acho que a terceira guerra mundial vai começar por causa de uma briga entre a princesa caçula e o guarda-costas real e se denominará: “A grande guerra do chá”.

— Certo, eu vou — concorda, Charlie, depois de um tempo. — Mas, tenho uma condição.

Charlie me puxa.

— Emma vai comigo — sorri.

Por que eu sempre me ferro nas mãos da família real? Quem eles pensam que eu sou? Vovô, eu queria que você tivesse pensando em mim, quando aceitou aquele presente “inusitado” do rei.

— Não — eu e Sebastian falamos em uníssono.

— Ah, por quê? — ela entrelaça seu braço no meu.

— Você sabe que será melhor para Emma não se expor.

— Mas, ela não vai se expor — garante Charlie. — Vai ser apenas um chá. Apenas algumas pessoas da associação de hipismo. Além disso, é um evento totalmente informal... sem muitas pessoas. Eu prometo que vou cuidar da Emma, vou trazê-la inteirinha, sem nenhum pedaço faltando. Vai ser bom para ela — afirma com muita confiança. — Ela passou o dia inteiro trancada nesse quarto... — Charlie faz uma expressão que deixaria o gato de botas do Shrek com muita inveja.

Sebastian nos olha.

— Está bem — cede entre um suspiro.

— Mas eu não... — começo a protestar.

— Vamos, Emma — Charlie me interrompe, praticamente me arrastando junto com ela.

O que há de errado com essa família real? Primeiro, o avô me dá de presente um neto real, depois o neto real fica me provocando com aquelas piadinhas sem graça, e agora a caçula resolve me arrastar por aí. Essa família tem sérios problemas, e o pior, problemas comigo.

— Por que você quer que eu vá a esse chá? — pergunto, enquanto Charlie me conduz por algum corredor completamente desconhecido para minha pessoa.

— Porque vai ser divertido — responde simplesmente. — Você vai ver. Chás são sempre tão chatos.

— E como eu entro nessa história?

Charlie apenas sorri e começa a andar apressadamente (mal consigo ver por onde estou andando), enquanto tagarela sobre coisas aleatórias sem tomar um fôlego sequer. Tenho que dar meus parabéns a princesa por sua incrível capacidade falar. A garota merece um prêmio.

— E aqui estamos nós! — aponta para um jardim.

Parece que estou em um daqueles filmes de época com direito a chás nos jardins. Há mesas espalhadas, algumas delas têm comida. O jardim é bem maior do que o que fica em frente ao meu quarto. Acredito que o conceito de poucas pessoas para Charlie, é diferente do meu. Para mim, poucas pessoas são cinco, para ela, cinquenta. As pessoas caminham e conversam entre si.  

Olho para ela, que ignora totalmente o meu olhar.

— O que ela está fazendo aqui? — uma voz, que esperava não encontrar tão cedo, ressoa em meus ouvidos.

O conceito de diversão de Charlie também é diferente do meu. Acho que entendi o porquê do “vai ser divertido”.

A princesa caçula sorri para Leon, usando aquele sorriso de garota inocente.

— Ela é a minha companhia.

Ele olha para ela como se estivesse ao ponto de esganá-la lentamente.

— Por que você está tão preocupado, hein?

Ela dá uma rápida olhada pelo jardim e detém seu olhar em um ponto qualquer.

— Ah, entendi... — sorri, voltando seu olhar para Leon. — Venha, Emma, vamos deixar o idiota do meu irmão.

Finalmente, alguém que concorda comigo. Leon é um idiota. Talvez, eu e a princesa caçula podemos nos dar bem.

— Seu irmão é sempre um idiota assim? — falo, enquanto nos afastamos dele.

Ela ri.

Charlie e eu andamos um pouco pelo jardim. Eu me interesso por uma mesa cheia de pequeno bolinhos, tortas e biscoitinhos de chocolate. Estou morrendo de fome, e já que estou aqui, não é bom desperdiçar comida. Pego um prato e começo enchê-lo. Depois de ter o prato devidamente abastecido, escolho uma das mesas mais afastadas do jardim. A princesa foi cumprimentar algumas pessoas.

— Divertindo-se, plebeia?

— Estava até ser interrompida por você — falo, levando a minha boca uma grande porção de torta de morango.

Leon senta-se na cadeira vazia a minha frente. Que petulância, será que perguntar se pode sentar-se vai acabar com seu sangue azul?

Seus olhos verdes, de um verde único e profundo, me analisam.

— Seu traseiro ainda está doendo? — indago.

— Plebeia, eu não estaria tão feliz se fosse você... — ameaça.

— Eu é que não estaria tranquilo se fosse você — revido. — Tenho certeza que sua bunda ainda está doendo.

Nos encaramos. Leon arqueia sua sobrancelha e me analisa. Eu apenas lanço meu melhor olhar: “você quer levar outro chute no traseiro?”. Ele se inclina sobre a mesa, apoia o queixo em cima das mãos em uma posição de desafio. Esse principezinho é mesmo muito petulante. Cruzo meus braços.

— Ah, aí está você! — uma voz interrompe nosso duelo silencioso.

Volto meus olhos para a voz. Uma garota loura, que parece ter saído de algum catálogo de modelos, alta e magra, olha para Leon. Ao seu lado se encontra uma garota ruiva com o rosto de uma atriz de cinema. A garota ruiva olha para a garota loura, noto certa apreensão nos olhos claros e cristalinos dela.

— Muriel — sibila Leon. Ele parece não estar muito feliz em vê-la e não faz muita questão de esconder esse fato. — Não sabia que estava aqui...

Muriel sorri. Porém, não é um sorriso nenhum um pouco gentil e amável, há certo veneno em seus lábios.

— Eu e Lyane também fazemos parte da associação de hipismo ou se esqueceu disso, Leon? — sua voz possui uma pitada de deboche.

 Ele sorri.

— Impossível.

— Não vai nos convidar para nos sentarmos? — noto Lyane dar um pequeno puxão em seu braço, quase imperceptível.

— Claro, sentem-se, por favor — Leon convida, embora o convite soe mais como um pequeno desafio.

— Obrigada.

Muriel se senta e Lyane meio a contragosto também acaba a acompanhando no ato.  

— Você é... — Muriel olha para mim com certa arrogância. Seus olhos azuis sondam cada centímetro de mim. Odeio essa sensação de que estou sendo julgada por um crime que não cometi.

— Emma — digo.

— Ah, a prometida do príncipe — sorri. Mas, eu não gosto nenhum pouco desse sorriso. — Você precisa fazer-nos uma visita ao clube de hipismo.

— Não, melhor não — intervém Leon.

Esse principezinho está querendo decidir as coisas no meu lugar?

— Sobre o que vocês estão conversando? — indaga Charlie, sentando-se perto de mim e comendo um dos meus biscoitos.

— Estamos convidando a Emma para fazer uma visita ao clube de hipismo — responde Muriel.

— Mesmo? — ela olha interessada para Muriel e Lyane.

— Seria bom Emma conhecer nosso clube... — fala Lyane, que parece ser bem mais simpática que Muriel, pelo menos, não lançou seu olhar de julgamento sobre mim.

— Mas Leon parece não ter aprovado a ideia — interrompe Muriel com um sorrisinho no canto da boca. Um sorrisinho bem irônico. — O que acha, Emma, de visitar nosso clube amanhã?

— Não... — Leon começa a protestar.

— Adoraria! — respondo. 

Leon me lança um olhar de advertência. Ele deve estar com medinho da plebeia envergonhá-lo perante seus amiguinhos da realeza.

— E pode contar comigo nessa visitinha — fala Charlie.

— Mal podemos esperar — diz Muriel. — Não é mesmo, Lyane?

Ela assente, enquanto toma um gole de chá.

Acho que chega de chá por hoje.

—  Com licença — falo me levantado da cadeira.

— Não se esqueça da visita, Emma — diz de modo presunçoso Muriel.

— Não esquecerei — garanto.

Se os amiguinhos de Sua Idiota Alteza forem todos como essa aí, estou perdida.

Charlie me segue.

— Amanhã vai ser bastante divertido — ela sorri. — E aqui está Emma, sã e salva. E não está faltando nenhum pedacinho, pode conferir! — fala para Sebastian que nos espera em frente a uma grande porta.

— Ótimo, Charlotte. 

— Eu fiz um bom trabalho, não fiz? — ela sai quase flutuando com seus passos de fada, uma fada um tanto selvagem, diga-se, mas ainda uma fada, me deixando a sós com Sebastian.

— Espero que Charlie não tenha te colocado em alguma encrenca — sorri com seu melhor sorriso matador. Sebastian precisa parar de lançar esses sorrisos, isso pode não ser recomendado para garotas que sofram do coração.

— Eu também espero — falo mais para mim mesma do que para Sebastian.

— Vamos?

— Sim.

E lá vou eu de volta a minha pequena prisão. Sei que amanhã minha cabeça pode não estar mais sobre meu pescoço. 


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Notas finais do capítulo

O que acharam do capítulo? Temos novos personagens na área, o que acharam deles?
E nosso casal encrenca até ganhou um nome: Leomma, dado pela linda da Gabi Ferreira. E o apelido do Sebastian, Bash, foi dado pela Ellen Freitas, e já estou usando rsrsrsrs