Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 88
A claridade azul da noite




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— Se a vida fosse uma poesia, eu desejava que a minha descrevesse as belas histórias de príncipes e princesas, as grandiosas e honradas aventuras dos grandes e destemidos heróis do antigamente, os dignos e estrelados reinados dos reis gloriosos que surgem entre a luz dourada do sol, as viagens imaginativas e perfeitas através das velas suaves e ondulantes dos barcos do sonho e da fantasia, porém esses desejos são impossíveis, por isso somente desejo a paz e a felicidade do mundo. - Pensava a Sereia de forma desiludida, cravando os seus lindos e tristes olhos no ecrã da TV onde os seus amigos e companheiros eram dizimados pela implacável Sociedade da Serpente. - Quando a justiça dos homens não se faz sentir nos conflitos, batalhas e guerras, cabe-nos a nós, os Vingadores resgatá-la da sua misteriosa toca e trazê-la ao encontro daqueles que a necessitam. - Reflectiu determinada, à medida que colocava rapidamente o seu fato de Sereia, à muito guardado nos cofres silenciosos e tristes do seu medo e da sua insegurança. - Não permitirei que a morte, através do seu punho negro, derrame sobre a terra mais grãos de desalento e caos, desta vez ela não engrossará as suas pútridas fileiras, eu não vou deixar! Esperem por mim!

                O potente carro da adolescente destronava o alcatrão das estradas da soberania do silêncio e da arrogância, enquanto o seu sangue escarlate fervia como mil tochas incandescentes caindo do céu aveludado sobre a terra escura, iluminando-a com o perfeito luar dos vulcões em erupção. Os seus indomáveis e intransponíveis pensamentos patinavam descontrolados pela imensidão luzidia das estrelas, à medida que a implacável justiça brotava em cada artéria cintilante do seu coração. A sua respiração, ofegante e ansiosa, perdia-se pelas bagas ilusórias do passado e do futuro, precipitando-se suavemente até aos espíritos lutadores dos seus companheiros. As luzes dos carros que, arrogantemente desfilavam pelas veredas alcatroadas e sujas, iluminavam as almas dos que possuíam a coragem de cair nos confins do sono naquela cidade forjada pelo caos e pelo vício, a luz do tremendo sobressalto de Diana incendiava a vida daqueles que permaneciam acordados, imersos naquela rotina perdida e atroz, lutando agressivamente para que a noite jamais chegasse, temendo tombar pesadamente naquele sono que todos desejam, no entanto apenas alguns têm a coragem de abraçar, contudo essa noite que tantos receiam estava mais perto dos seus olhos do que poderiam imaginar.

— Alguns acreditam que a mulher simboliza fragilidade, fraqueza e sensualidade, reduzindo desta forma o nosso papel e estatuto na sociedade ao nível de uma pequena e efémera flor, porém nós, as mulheres, possuímos uma força encarcerada no nosso coração que é capaz de mover montanhas, possuímos uma coragem que jamais foi vista ou equiparada, possuímos a extraordinária capacidade de criar laços tão apertados e tão fortificados que muitos ignoram ou não compreendem, por isso estou aqui, pondo de lado os meus receios, medos e inseguranças, expondo a minha própria vida aos perigos que a quiserem tomar de assalto, porque a sobrevivência dos meus companheiros sobrepõem-se em grande escala ao meu bem-estar. - Reflectia a jovem Sereia de forma honrada e digna, sentindo o seu coração rebentar numa onda de confiança e satisfação, vendo a estrada caprichosa ceder aos passos seguros dos seus mais profundos desejos e motivações, naquele momento o seu símbolo de Vingadora renasceu nas entranhas do seu peito, iluminando o céu com a claridade azul da noite.

— Tens a certeza que é isto que pretendes realmente fazer? - Perguntou uma voz calma, vinda das profundezas do assento traseiro do carro, fazendo a jovem dar uma descontrolada guinada no volante, subindo atrapalhada por um passeio, para sua tremenda sorte vazio àquela hora.

— O que fazes aqui? Como entraste sem eu dar por nada? - Questionou Diana em tom sufocante, rodando a sua cabeça na direcção daquela familiar voz, reconhecendo de imediato a quem pertencia, o Caminhante das Sombras estava sentado muito direito, encostando-se à porta do lado esquerdo, fitando a jovem com aquele rosto oculto pelo véu cintilante do mistério.

— Tu ainda és muito inexperiente no que diz respeito à análise do terreno, seria bastante fácil para um inimigo te apunhalar pelas costas, podes ser dotada de capacidades impressionantes, contudo não possuís factores fundamentais cuja falta de aquisição te poderão custar a vida. Certamente deverias avaliar melhor o teu programa de treino e focares-te naquilo que realmente importa. - Sugeriu o Viajante do mistério em tom pensativo, olhando Diana com profundo interesse, talvez toda aquela coragem e dedicação lhe custasse a vida, porém conhecia do antigamente aquela expressão repleta de dignidade e sentido de sacrifício, uma expressão que personifica todo o vasto e belíssimo conceito de liberdade numa pequena e brilhante memória, nada poderia fazer para a demover dos seus objetivos, o destino daquela menina ficou traçado desde o seu primeiro contacto com as gotas salgadas do oceano.

— Não posso ser egoísta ao ponto de sobrepor a minha vida às vidas daqueles que fizeram de mim aquilo que hoje sou. - Respondeu Diana em tom decidido, dando pouca importância ao discurso proferido pelo estranho homem, naquele momento nada mais lhe interessava, nada mais era digno das suas atenções. - O medo não me vai encarcerar nas suas prisões, eu sou livre!

— Não sejas precipitada, tu podes ser livre, porém também podes e deves estar em segurança! - Retorquiu o Viajante do mistério em voz suplicante, cerrando os punhos com força, fruto da enorme frustração que corria pelas suas veias.

— Não posso abandoná-los! Se o fizesse estaria a ir contra a tudo aquilo em que acredito, estaria a ir contra a tudo aquilo que me incutiram, não pretendo esquecer os valores morais sobre os quais rejo a minha vida, nem pensar! - Retaliou a morena em tom irritado, travando bruscamente, evitando passar a um sinal vermelho. - Tu não és obrigado a vir comigo, podes sair quando quiseres, para falar a verdade nem sei o que fazes no meu carro!

— Diga o que disser tu não vais desistir do teu objetivo, pois não? - Questionou o Caminhante das sombras em voz baixa e sofrida, olhando para o contador de quilómetros que subia a tremenda velocidade.

— Não, nada nem ninguém me vai desviar do caminho que escolhi! - Exclamou a adolescente de forma determinada, parando o seu potente carro a um quilómetro do local do terrível massacre, seria melhor envolver-se nas sombras para que a sua chegada sortisse o efeito de surpresa que desejava. - Vem se quiseres. - Disse, olhando com arrogância para o estranho homem, começando a trepar pelo passeio sujo e escuro que a conduziria novamente até ao ceio dos heróis mais poderosos da terra.

— Talvez te deixe cometer esta loucura sozinha, adeus. - Respondeu o Viajante do mistério em tom aborrecido, partindo a tremenda velocidade, deixando Diana entregue à sua própria e azarenta sorte.

                A corajosa e destemida Sereia caminhou silenciosamente através daquela noite escura e deprimente, iluminando os seus decididos passos com a claridade azul dos seus olhos sonhadores, o luar distante e pálido cintilava em cada janela fechada dos muitos adormecidos prédios Nova-iorquinos, dando-lhes um aspeto fantasmagórico e esfumado o que fazia com que a ansiedade da adolescente crescesse exponencialmente no seu coração. As emoções da Vingadora escorregavam por um gigantesco turbilhão de vento gelado e cores indefinidas, à medida que se embrenhava cada vez mais fundo nas entranhas arrepiantes daquele mortífero e inesperado conflito, o seu músculo cardíaco martelava insolentemente contra a sua garganta, tornando a sua respiração mais fina e ofegante, contudo a sua atrevida coragem jamais seria destronada pelo medo e pela ansiedade que percorriam o seu frágil corpo.

— Será que este ataque é o tal perigo que aquele estranho homem referenciou por inúmeras ocasiões? - Pensou Diana ligeiramente alarmada, estagnando na ombreira escura de uma esquina, relembrando as infindáveis recomendações tecidas por Clint e pelo Caminhante das Sombras. - Será que me vim colocar na boca do lobo? - Questionou-se em silêncio, sentindo a sua determinada coragem recuar perante aquela terrível hipótese. - Mas já que vim até aqui não posso vacilar diante desta abstracta prova do destino, talvez este ataque esconda algumas respostas que procuro, nunca se sabe. - Cismou, dando mais uns passos na direcção do conflito, deixando nas suas costas o ruído ensurdecedor das janelas a guinchar, assombradas pelo fantasma do luar.

No interior silencioso da Microsoft, Janet e Scott afundavam-se tristemente naquela escuridão caprichosa que teimosamente cegava a sua determinação e força de vontade, nunca antes o sucesso se escondera tão bem nas entranhas frustradas de qualquer missão, era difícil continuar, levar a cabo aquela tarefa, era impossível chegar ao lugar onde a concretização resguardava o seu lindo e fresco sorriso, pois era patrulhado pelas forças armadas da insegurança e do desalento.

— Talvez não tenha sido talhada para ser uma Vingadora, provavelmente deveria seguir o meu sonho e tornar-me estilista, possivelmente irei ponderar o meu papel na sociedade. - Reflectia a Vespa em tom angustiado, voando levemente até ao lugar onde Scott, melancólico, a aguardava. - Já descobriste alguma coisa?

— Parece que algo ou alguém se agita furtivamente nas sombras, contudo ainda não consegui identificar a sua verdadeira localização. - Respondeu Lang em tom urgente, sentindo a adrenalina arder nas suas minúsculas veias. - Já enviei diversas das minhas formigas, porém elas não retornam, estou preocupado. - Admitiu de forma pensativa, quem seria aquele que possuía a capacidade de confundir insectos que passariam normalmente despercebidos.

— Que coisa mais bizarra, olha Scott ali. - Murmurou Janet em tom alarmado, apontando entusiasmada para um vulto rastejante que se arrastava a grande velocidade pelo pavimento alcatifado, seguido bem de perto por milhares de formigas inspectoras.

— Maldito, eu já tinha ouvido falar nele, como é que não pensei nisto mais cedo, sou tão burro! - Exclamou o domador de formigas em tom recriminador, avançando furiosamente na direcção do seu oponente.

— Não me digas que ele é quem eu estou a pensar? Não pode ser, fomos tão ingénuos. - Desabafou a suave Vespa em tom depreciativo, voando nas asas daquela inesperada e derrotista missão até ao seu foragido adversário.

— Sim ele é aquele que se distingue da Sociedade da Serpente como sendo o mais flexível, ele é aquele conhecido por Cobra. - Explicou Scott adoptando um tom mais dramático, desviando-se de um potente raio lançado pela sua parceira.

— Sua maldita insignificante. - Sibilou o Cobra em tom arrastado, sentindo o impacto doloroso proporcionado pelo feroz ataque da Vespa.

— Scott, ele está a fugir, rápido! - Gritou Janet apavorada, chocando precipitada contra um vidro duplo. - Ele esquiva-se por qualquer fenda por mais pequena que seja!

— Certo, ele está a dirigir-se para a entrada principal, vou comandar as minhas formigas até lá! - Retorquiu o Homem-Formiga em tom apressado, seguindo a tremenda velocidade atrás de um enorme bando de formigas.

— Vamos apanhá-lo! - Gritou Janet em tom estridente, voando na retaguarda acompanhando o fino recorte desenhado pelas minúsculas formigas, não podiam deixar escapar aquela oportunidade, aquela captura era fundamental para um despontar claro e prospero do futuro, nada nem ninguém podia travar aquele desenlace.

— Era fundamental a presença do Homem de Ferro nesta captura, certamente ele terá um mecanismo qualquer que sem dúvida alguma facilitará a imobilização deste verme rastejante. - Comentou o domador de formigas em tom pensativo, seguindo a sua patrulha até ao desfecho imprevisível daquela missão. - Não consigo apanhar comunicações de nenhum dos nossos companheiros, faz pelo menos meia hora, isto não é nada bom, o que é que se terá passado lá fora? Eles não podem ter sido todos vencidos, não pelas mãos desta escória nojenta. - Analisou apreensivo, traçando com angústia os pilares negros da humanidade pintada com as tenebrosas cores da submissão e da maldade.

— Não posso deixar que a minha coragem vacile perante as garras da insegurança, não posso permitir que o medo me encarcere nas suas teias medonhas, não posso deixar que as trevas apaguem subtilmente a luz da minha determinação, o caminho é em frente, longe das bermas tristes da cobardia e do abandono, não posso fraquejar, não posso virar as costas e deixá-los ao alcance tenebroso dos dentes aguçados a venenosos do destino, eu lutarei por vós, lutarei por mim, lutarei pelo futuro até que a última estrela de valentia suma da colina azul da minha alma! - Exclamou Diana em tom corajoso, avistando Steve baloiçando na fina linha que o conduzia ao mundo das trevas e no leve fio que o traria de novo até à brilhante luz do sol da liberdade. - Quanta cobardia eu vejo! Como te atreves a afincar as tuas mandibulas medonhas num homem como ele? - Gritou em tom descontrolado, sentindo as poderosas vibrações da sua voz percorrerem drasticamente o quarteirão silencioso, imobilizando a dança trémula das estrelas e da lua. - Criminosos como vocês não escaparão, isto é uma promessa! Nem que eu morra na tentativa de vos encarcerar nenhum dos meus companheiros perecerá diante das vossas mãos pecaminosas!

— Realmente devo estar no meu leito de morte, estou a escutar a voz da Diana, bolas nem a morrer a deixo de a ouvir a reclamar, caramba! - Pensou Clint angustiado, sentindo a luz brilhante da noite fugir-lhe pelas pupilas cerradas. - Nunca pensei morrer antes de a voltar a ver, ao menos percorro o limbo embalado pela sua voz.

— A voz da Diana entra pelos meus ouvidos como uma poderosa e mágica tempestade, todos estes choques deixaram a minha mente entorpecida, talvez ela me guie até Valhala. - Pensou Thor tristemente, emergindo no oceano negro da melancolia.

— Parece que a pancada na cabeça me está a provocar alucinações, talvez a morte traga até nós o mais profundo dos desejos, quem sabe. - Lamentou-se Tony de forma deprimente, afogando-se no rio quente e venenoso do seu sangue.

— Diana. - Murmurou Steve emocionado, sentindo os seus corajosos olhos despertarem perante a claridade azul da noite, a Sereia estava ali, imóvel na sua frente enfeitiçando com a magia turbulenta da sua voz os engenhos agressivos do mal, ela estava ali para o salvar, para os salvar a todos.

— Miúda insolente e metediça, terás o mesmo destino dos teus companheiros. - Sibilou a feroz Anaconda, sentindo o seu orgulho ferido, nunca antes o seu poder fora posto em causa, nunca antes fora enfrentada daquela forma arrogante e luzidia, Diana não poderia viver para contar a história.

— Afinal onde está o Clint, eu não o vejo! - Pensou a Vingadora apreensiva, lançando um enorme pontapé na direcção de um dos arrepiantes braços da sua inimiga. - Não penses que será assim tão fácil!

A claridade azul da noite brinda os heróis mais poderosos da terra com as estrelas do milagre e da esperança, conseguirá a Sereia salvar os seus companheiros?


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