Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 85
Cicatrizes




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Clint olhou em redor, as paredes estremeceram perante as ardentes faíscas que saltavam dos seus olhos, a sua boca moveu-se num grito mudo repleto de paixão e revolta, os seus braços abriram-se num profundo e trémulo abraço, contudo mantiveram-se imóveis, estáticos, presos pelas duras algas do silêncio, a sua mente era entorpecida pelo brutal telintar do choque impedindo-o de pensar, agir ou sentir. O confuso cão branco saltitava tristemente junto da sua dona, cheirando aqui e ali, procurando vestígios da pureza corajosa da jovem, os seus doces olhos encheram-se de mil bagas de água, saudade e contentamento, a sua língua mergulhou nos mais sinceros e gentis latidos de alegria, Diana estava de volta.

— O rosto dela é emoldurado por uma grossa e pesada cortina de tristeza, os seus olhos vagueiam pelas geladas continhas de chuva do passado, os seus lábios perdem-se na secura indomável do deserto, porém contínua linda e pura como se vários meses não tivessem decorrido. - Pensou o Arqueiro tristemente, fitando incrédulo a esguia figura da morena imóvel entre a realidade e a ilusão.

— Clint. - Murmurou Diana em tom sumido, observando a silhueta inexpressiva do mestre das setas, encarando absorto a negra luz do reencontro.

— A voz dela permanece fresca como a brisa do futuro, tranquila como as águas do oceano, pura como o riso inocente de uma criança. - Reflectiu o louro na mesma melancolia que mascarara os últimos meses, olhando abstracto pela vidraça azul da alma da adolescente, no entanto um enorme sentimento de revolta quebrou a vasta barreira do choque, transportando-o de novo para a realidade dura e crua que tivera de suportar durante infindáveis dias.

— Diz alguma coisa por favor. - Pediu a Vingadora em tom abafado, quebrando com passada curta a distância que a separava do Gavião, segurando-lhe na mão.

— Porquê? - Inquiriu o Arqueiro em tom frio, sacudindo a pequena mão da Sereia. - Explica-me, eu preciso de entender.

— Eu vou explicar tudo, senta-te, por favor. - Assentiu a Vingadora em tom desiludido, sabia que o seu aparecimento não seria bafejado pelo crepúsculo da sorte, todavia não esperava uma reacção tão fria e distante.

— Eu não me posso sentar ao lado de uma pessoa que tornou os meus últimos meses num autêntico inferno. Tens noção de quantas noites eu chorei na minha almofada pensando que estavas morta? Tens noção das horas que eu passei vendo as imagens do dia em que tu sumiste? Tens noção das ocasiões em que eu levado pelo desespero e pela solidão implorei ao destino para morrer pensando que te voltaria a ver? Imaginas quantas vezes eu tive de dizer a mim próprio que a vida continuava? - Gritou Clint em tom desesperado, libertando a frustração e o sofrimento que devastavam a sua alma desde aquele dia fatídico em que o diabo planou insolente sobre a terra. - Tens explicações para tudo isto? Há quanto tempo estás tu aqui escondida? O que se passou afinal? Se estavas viva porque não nos pediste auxílio? Quem é afinal aquele sujeito que te levou, ele deve ser alguém importante pois preferiste a sua companhia ao meu abraço quente e apaixonado.

O silêncio congelara a atmosfera, reinando como senhor soberano entre os dois heróis, Diana sentada no sofá, enxugava os olhos à manga da túnica de linha lilás que elegantemente trajava, Clint perdia-se nas entranhas sombrias da confusão e do desalento, caminhando incessantemente de um lado para o outro, respirando com dificuldade pois as recordações e a saudade apertavam-lhe furiosamente a garganta, o cão de pelagem branca e felpuda pousara a cabeça na perna trémula da sua dona, dormitando suavemente sobre o confortável calor do reencontro.

— Eu não condeno nem critico a tua reacção, pelo contrário, eu compreendo, acredita em mim. - Proferiu Diana em voz honesta, relembrando todas as cicatrizes que ainda sangravam abundantemente na sua alma.

— Tu não podes compreender, porque se isso fosse verdade, terias voltado para junto de mim. - Desabafou o Gavião em tom sufocante, cobrindo o rosto com as mãos pois os seus olhos traquinas eram inundados por uma enorme torrente oceânica.

— Não tires conclusões precipitadas, os meus dias também não foram fáceis. - Disse a Sereia em tom baixo e triste, caminhando até ao Arqueiro em passada rápida e decidida, não iria permitir que meros e insuportáveis meses de sofrimento assassinassem aquele amor que demorara tanto a florir. - Bolas Clint eu amo-te! Eu só não voltei porque era completamente impossível, eu estava às portas da morte, possuía múltiplas fracturas, tive que lutar contra as dores sem tratamentos hospitalares, somente sobrevivi e estou agora aqui contigo porque aquele estranho homem me salvou e fez de tudo para eu não desistir de viver.

— Eu recuso-me a acreditar nisso, não voltes a dizer que me amas, porque se isso fosse verdade não me fazias o que fizeste. - Gritou o Arqueiro em tom desiludido, atirando Diana sobre o sofá. - Peço-te que não me voltes a procurar.

— Clint espera, olha para mim. - Pediu a morena em voz estridente e suplicante, retirando a túnica lilás que trajava. - Olha para o meu corpo, o que vês?

— Apercebo-me que está mais magra, perdeu muito peso, muita massa muscular, porém contínua linda e perfeita como se o tempo e a morte não tivessem cruzado a sua vida. - Pensou o mestre das setas de forma involuntária, cedendo temporariamente ao encanto mágico que sentia pela jovem, esquecendo momentaneamente os meses escuros e frios que se arrastavam insolentemente pela sua alma. - Eu não vejo nada.

— As cicatrizes que os ferimentos gravaram na minha pele estão secas, invisíveis e indolores, porém existe uma que teima em não parar o seu doloroso sangrar, esta aqui bem fundo no meu peito. - Disse a Vingadora em tom melancólico, tocando com o seu trémulo indicador mesmo no sítio onde dorme o coração. - Esta ainda chora de saudades tuas, esta ainda sonha persistente com o teu abraço, esta ainda arde com o sabor do teu beijo, esta ainda te ama. - Proferiu de forma apaixonante, derramando sobre o fogo do seu coração a água polida do oceano.

— Diana. - Murmurou o Gavião em tom sumido, aceitando gentilmente aquelas puras e preciosas lágrimas nas profundezas heróicas dos seus braços.

— Se tu soubesses quantas vezes eu pensei em ti, a tua memória era a ampulheta que fazia o comboio do tempo girar, eras o raio de sol que penetrava nas insolentes trevas da minha dor, eras a flor da coragem que alimentou a minha luta, eras a estrela que guiou a saúde até mim, eras aquela força que me ajudou a vencer a tristeza, o teu sorriso foi a espada que aniquilou a solidão, nunca duvides que és importante para mim, acredita nisto. - Disse a Sereia em tom honesto, beijando delicadamente os lábios do Arqueiro, depositando naquele simples e gentil gesto as saudades e privações de meses.

— Desculpa minha princesa, eu deixei-me controlar pelo sofrimento e pela angústia, a tua ausência quase me matou, se não fosse o Steve eu perderia certamente a esperança de te reencontrar, fiquei cego pela luz negra da solidão. - Confessou o mestre das setas em voz dragada pelas lágrimas e pela emoção, abraçando com força a sua princesa do mar. - Mas eu admito que não compreendo uma coisa, porque é que te escondeste aqui? Porque é que não nos procuraste? - Inquiriu em tom confuso, sentando-se no sofá com Diana sobre as suas pernas.

— Bem, durante todo o tempo em que eu permaneci naquela vereda campestre com o meu novo amigo, ele mencionou por inúmeras vezes que eu devia manter-me segura, longe de perigos ou confusões, então fiquei apreensiva, sem saber o que fazer no meu regresso, senti-me amedrontada, pensava se realmente corria perigo, por isso fiquei aqui, ponderando qual o melhor caminho a seguir. - Explicou a Vingadora de forma pensativa, brincando distraidamente com o cabelo do Arqueiro. - No entanto depois de tanto reflectir, constato que continuo perdida, não encontro soluções nem respostas, apenas me cruzei com uma perfumada lufada de ar fresco, tu.

— Ele falou-te sobre a origem desse tal perigo? - Questionou o louro em voz preocupada, acariciando o rosto da adolescente.

— Não, ele não me disse nada em concreto, apenas mencionou que enquanto ele estivesse por perto nada de mal me aconteceria. - Respondeu Diana em tom analítico, recordando aquele rosto imerso em mistério e nostalgia. - Eu confesso que fui imprudente, logo que cheguei aqui, faz dois dias, devia ter de imediato procurado a vossa ajuda.

— Eu agora compreendo a tua atitude, talvez seja melhor ficares aqui durante alguns dias, vou usar a minha influência na S.H.I.E.L.D para tentar averiguar se realmente as suspeitas desse tal homem têm algum fundamento, por enquanto o teu regresso ficará em segredo, o que achas? - Sugeriu o mestre das setas de forma pensativa, não podia perder de novo o rasto da mulher que dava sentido à sua vida, nem que para isso tivesse que trazer à tona do seu espírito o seu antigo posto como espião altamente treinado.

— Achas que consegues descobrir alguma coisa? - Inquiriu Diana de forma insegura, talvez não fosse boa ideia envolver Clint nos seus assuntos, temia pela vida do seu namorado, não podia ficar com mais uma morte na consciência, não conseguia abrigar durante mais tempo a solidão na sua casa.

— Eu não garanto nada, contudo farei tudo o que estiver ao meu alcance para descobrir o que se passa, podes ficar tranquila, minha princesa. - Proferiu Clint de forma pensativa, desenhando na sua mente mais remota e escondida as peripécias daquele improvável plano.

— Como está o Steve, o Tony, em fim como estão todos? - Perguntou a Sereia de forma distante, a saudade e a ausência derretiam milhares de faúlhas incandescentes no seu espírito.

— Eles têm-se mantido fortes, unidos pela esperança de te encontrar, nenhum deles desistiu de ti, foram bem mais leais do que eu. - Respondeu o Arqueiro de forma desiludida, jamais se iria perdoar por ter duvidado da força e da coragem da sua namorada, logo ele que conhecia tão bem a sua personalidade guerreira e destemida, contudo o desgosto e a saudade levam-nos a cometer loucuras das quais é impossível fugir.

— Não te recrimines, talvez eu reagisse da mesma forma que tu, ou quem sabe ainda pior, todos nós somos diferentes, possuímos diferentes maneiras de reagir perante cada situação, não te censuro. - Garantiu a Vingadora em voz cansada, depositando a cabeça sobre o ombro do Arqueiro, finalmente encontrara o conforto e o calor que buscara durante tantos meses, caindo por fim num sono tranquilo e perfumado nos braços daquele que mais amava, sonhando com a promessa que aquele amor duraria para sempre.

Algures, nos buracos mais refundidos de Nova Iorque o veneno e a malícia caminhavam de mãos dadas com a perversidade e a soberba, conjecturando o avanço sibilado do pecado e das trevas, sorrindo malignamente em cada ribombante palavra de cobiça.

Velhos inimigos saem da toca, como é que este plano malicioso influenciará a vida de Diana? Como reagirão os Vingadores ao espantoso aparecimento da Sereia? Conseguirá Clint conter o perigo que espreita em cada esquina? Estarão os Vingadores prontos para colocar fim a uma ameaça que colocará em causa os sistemas informáticos do planeta?


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