Mais que o Acaso. escrita por Thaís Romes


Capítulo 7
Um passado cheio de acasos.




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OLIVER

Entro no restaurante, e um garçom me guia até a cozinha onde aconteceria o evento. Meia dúzia de casais estavam postos atrás de balcões duplos, com um pequeno fogão de mesa. Felicity já estava atrás de um desses, olhando para os ingredientes a sua frente como se eles fossem pequenos seres de outro mundo. Nunca a vi tão linda antes, usava um vestido vermelho, os cabelos soltos e dessa vez estava sem óculos. Ela sorri de forma encantadora, quando nossos olhos se encontram e vou em sua direção, parando sem saber como cumprimenta-la, então por fim nos abraçamos, o que é muito melhor do que eu gostaria que fosse.

—Desculpe o atraso. –murmuro quando nos afastamos. –Minha irmã estava em minha casa, aliás preciso trocar minhas fechaduras. –ela dá risada, mas eu estou falando sério. Thea ainda vai me levar à loucura.

—Está tudo bem, na verdade você está adiantado. –dá de ombros, apontando para o relógio. –E eu já sou bem acostumada com atrasos. –sussurra a última parte, como se estivesse falando sozinha.

—Ótimo.

—Olha, quando eu disse que sou ruim nisso, não estava exagerando... –seus olhos parecem assustados.

—Eu sou muito bom nisso, então vamos ficar bem. –respondo, girando uma faca nas mãos para me exibir um pouco, vendo seu queixo cair em surpresa.

—Okay...

A aula era mesmo divertida e Felicity não estava exagerando quando disse ser ruim, na verdade, ela parece ter amenizado, por que ruim é um eufemismo para a verdade. –Você não pode colocar canela no pato. –pego o pote de sua mão, antes que ela o vire.

—Pensei que fosse pimenta do reino. –justifica inocente e dou a ela o potinho certo, segurando o riso.

—Vai precisar que mais do que só essa aula. –brinco, virando o vinho branco na tigela. –Aqui, deixa eu te ajudar.

—Tenho medo de matar meus filhos de fome. –exagera. Envolvo suas mãos pequenas com as minhas, e começo a fazer os movimentos certos para temperar a ave. Não percebo a proximidade entre nós até que nossos narizes se esbarram por acidente. Prendo a respiração, olhando para seus olhos azuis presos aos meus, depois para seus lábios cheios... –Você leva mesmo jeito com as mãos. –diz sem graça dando um passo para trás, depois fecha os olhos ao perceber o duplo sentido na frase. –Quero dizer, com as mãos no pato...

—Gosto de cozinhar. –dou de ombros, tentando deixa-la mais à vontade.

—Deve ser esse o problema, eu gosto de computadores! –sorri como uma criança e não posso deixar de retribuir.

 Algo parece chamar atenção dela, e vejo uma participante saindo do banheiro com um pedaço de papel higiênico preso aos pés. Felicity passa por mim, vai até a mulher que continuava andando, sem dar conta de sua presença. Ela pisa no papel o soltando do sapato da outra, se vira e volta para nosso balcão, como se nada tivesse acontecido. Apenas olho para ela admirado, acho que essa é a primeira vez que alguém me faz perder o fôlego.

—Isso está tão bom, que não acredito que cheguei perto dele! –falava de boca cheia, revirando os olhos de forma exagerada, enquanto experimenta o pato.

—Você é uma cozinheira tão ruim, que chega a ser engraçada. –solto dando risada. –Sem ofensas.

—Acredite, eu já estou acostumada. –dá de ombros. –Nem o Ollie come minha comida. Descobri quando Wally tentou dar para ele um bife que eu tinha feito, e o cachorro saiu choramingando da cozinha! –tombo minha cabeça para trás, em uma gargalhada.

—Está brincando comigo!

—Não, é verdade. –garante, me fazendo rir ainda mais. –Wally, perguntou se eu o estava punindo, quando sugeri fazer um jantar em seu aniversário.

—Pobre garoto!

No fim da noite saímos do restaurante juntos. Caminho a seu lado, com as minhas mãos bem seguras em minhas costas, a essa altura não confio mais em mim. Felicity entra em uma minivan azul, antiga, e abre a porta do passageiro para mim. Entro no carro, que tinha cheiro de alvejante, frango frito e o que eu acredito ser perfume infantil.

—Esse não é seu carro. –comento, pois tenho certeza de ter a visto em um volvo preto.

—Ah, o meu carro deu problema. –diz se ajeitando no banco de uma forma engraçada. –Esse é o carro do meu... ex marido. –por fim ela encontra uma posição que a agrada, e se vira para me olhar. –Ganhei o Wally nesse carro. –olho assustado, o que a faz dar risada. –Não necessariamente no carro. –começa a narrar.

“Barry e eu estávamos voltando de Central City, era nosso último ano no MIT. Nós fomos visitar a família dele no feriado e Barry cismou de voltar mais cedo para a faculdade, mesmo eu dizendo que daria a luz naquele dia. Podia sentir, mas Barry era o ser mais teimoso que já passou nessa terra e continuou a insistir, falando sobre um trabalho que eu teria que entregar no dia em que as aulas voltassem.

Nós dirigimos na chuva, por algumas horas, brigando sobre como ele era teimoso e como eu me achava a dona da verdade –palavras dele, não minhas- foi quando minha bolsa estourou. Bem ai, onde você está sentado.

Não sei por que, mas pensei que não deveria ter meu filho no banco da frente. Só conseguia pensar em todos os besteiróis americanos que assisti em minha vida, e imaginar Wally saltando de mim e pregando no vidro do carro. Então tentei passar para o banco de trás, mas eu estava imensa, e meu pé bateu bem no rosto de Barry. Eu quebrei o nariz dele.”

—Não! –exclamo dando risada.

—Pode acreditar. –ela mesmo solta uma risada curta. –Aquilo ficou jorrando sangue e ele não conseguia mais dirigir.  –Felicity gesticulava sem parar. –Então trocamos de lugar e eu fui dirigindo e chorando, enquanto Barry me perguntava sem parar o tempo das contrações. Com o rosto todo sujo de sangue, coitadinho. –ela suspira, olhando para a janela do carro. –Ele tinha um nariz lindo, quer dizer, ele era bonito, muito bonito. Mas o nariz era perfeito. Só o que eu conseguia pensar enquanto dirigia, é que havia destruído o nariz dele.

—Nossa. –é só o que consigo dizer.

—Depois disso, sempre que brigávamos ele tocava o nariz, desse jeito. –ela passa as pontas dos dedos, demonstrando o gesto. –E eu ficava possessa!

—Não acho que era por querer. –pondero.

—Faz muito tempo que eu não faço isso. –comenta olhando em volta.

—Dar a luz dentro de um carro ou quebrar o nariz de alguém? –debocho fingindo espanto.

—Nenhum dos dois! –responde, empurrando de leve o meu braço. Depois ela se recosta no banco, fechando os olhos, antes de voltar a falar. Me pego olhando feito bobo para seu pescoço exposto, e a curvatura de seu queixo.  –Estar dentro de um carro, em frente a um restaurante.

—Eu nunca fiz isso. –ela me olha surpresa. –Não em frente a um restaurantes, mas existiram muitos bares... –coço a cabeça, sabendo onde aquilo acabaria. –Felicity, eu preciso te contar uma coisa...

Acontece que quando a encaro, não consigo formar as palavras.Só o que existia era os seus olhos azuis me observando e uma expectativa mutua que pairava no ar. Gostaria de dizer que agi por instinto, que fiz sem pensar, mas a verdade é que só penso nisso a um longo tempo. Aproximo meu rosto do dela, parando a alguns centímetros antes de encostar nossos lábios, apenas deixando a tensão entre nós se acumular. Felicity cobre a distância que restava e sinto sua boca macia na minha. Coloco minha mão em seu rosto, enquanto aprofundo o beijo, mas me lembro de que deveria ir com calma, dou um selinho, finalizando e me afasto.

—Mais uma coisa para a minha cota de “primeiras vezes”. –parece falar sozinha.

—Acho melhor eu ir. –falo em meio a um suspiro, já com as mãos na maçaneta.

—Claro, nos vemos depois. –sorri e eu retribuo, antes de sair do carro.

FELICITY

—Nós sabíamos que uma hora isso aconteceria. –Sara fala, dirigindo a caminho do meu trabalho, depois de termos deixado os meninos na escola e passado no escritório de Laurel, para saber do processo contra a empresa aérea. –E começar logo com Oliver Queen, não me parece tão ruim. –ela sorri sugestiva e eu apenas retiro meus óculos, coçando meus olhos.

—Eu não consigo parar de falar do Barry quando estou com ele. –desabafo. –E fico me perguntando, o que será que ele pensa a respeito...

—Não disse a ele que você é aquela palavra com “v”! –me olha de lado, brava, eu faço careta negando. –Ah Fel, você é impossível!

—Eu sei, eu sei. –choramingo, recolocando os óculos.

—E o que fez a semana toda, quando o vê na empresa? –pergunta, estacionando o carro em frente a QC.

—O evito? –respondo em tom de pergunta, me encolhendo de seu olhar furioso.

—Sai do meu carro. –diz apontando para a porta.

—Precisa parar de me expulsar dos lugares, sempre que te irrito de alguma forma... –tagarelo, e Sara abre a minha porta.

—Sai. –pisco para ela, a vendo fazer força para manter a pose. –E resolva isso! –a ouço gritar quando já estou do lado de fora, e bato a porta com força em resposta. –Se quiser que eu te busque, é melhor prestar atenção nesses modos mocinha!

Entro na empresa, ainda rindo e chamo o elevador. Acho que Sara tem passado tempo demais com os meninos, e mais tempo ainda me vendo dar bronca neles, mas a verdade é que ela está certa, correr de Oliver não vai ajudar em nada. E até que foi um bom beijo, foi um beijo legal.

—A quem você está querendo enganar... –penso alto.

—Bom dia. –me assusto quando vejo Diggle esperando o elevador a meu lado.

—Bom dia, John. –respondo, levando a mão ao peito. –Eu nunca te vejo chegar. –sussurro, e o vejo esboçar um pequeno sorriso.

—Não parecia estar com a cabeça por aqui, Felicity. –o elevador chega e nós entramos juntos. –A propósito, o antigo supervisor costumava dobrar expediente, espero que não estejam te fazendo ficar até tarde. –comenta em tom amigável, e sorrio.

—Que nada, saio todos os dias as quatro, tenho uma boa equipe e não é tanto trabalho assim, não sei o que o outro supervisor ficava fazendo. –murmuro passando a mão na testa. –Ainda preciso esperar uma hora, até buscar meu filho mais novo na creche.

—Como se chamam, os seus filhos? –questiona interessado.

—Wally e Bart. –respondo com um sorriso largo, mostrando a ele a foto dos garotos em meu celular. –E você John, tem filhos?

—Uma. –ele me mostra a tela do celular, onde uma linda garotinha morena, estava vestida como princesa, sorrindo. –Sara, tem dois anos.

—Ela é perfeita. –elogio sincera. –Minha melhor amiga também se chama Sara. –conto.

—Então ela deve ser muito bonita e inteligente, ouvi dizer que todas as Saras são. –diz todo babão, olhando a foto do celular.

—Isso tudo e mandona! –acrescento o fazendo dar risada.

 Poderia conversar com ele por horas, mas o elevador para em meu andar e preciso me despedir. Prometemos um ao outro que nos falaríamos em breve, e talvez Bart gostasse de brincar com Sara qualquer dia desses, o alertei do perigo, mas ele pareceu gostar da ideia mesmo assim.

O dia passou arrastado, covardemente não sai para fazer minha pausa nas horas de sempre. Ainda não sei o que dizer para Oliver quando o ver, ou o que esperar. Afinal, ele também não me ligou depois do beijo, e isso já faz uma semana. Saio pontualmente as quatro, quando o elevador se abre vejo o motivo do meu tormento nesses últimos dias, usando calça e blusa social, com uma gravata preta, segurando o paletó nas mãos. Me faz pensar naquelas capas de revistas, chega a ser estranho o quanto esse cara é gostoso.

—Hey! –cumprimenta um pouco sem graça, quando entro no elevador da mesma forma.

—Oi. –nós nos olhamos por um momento, sem saber o que falar. –Eu ia te ligar. –dizemos juntos. –Isso é embaraçoso. –comento, e parece quebrar em fim o gelo.

—Viajei para Metrópoles, eu realmente te ligaria. –parece fazer questão de esclarecer.

—Tudo bem, Oliver. Não precisa ser estranho.

—É, não precisa ser. –respira fundo. –Podemos conversar? –ai... Conversar nessa situação nunca é algo bom, mas sorrio para ele de forma educada e balanço a cabeça confirmando.

Saímos em silêncio da empresa, dou alguns passos tirando meu celular da bolsa,  Oliver parece surpreso quando eu não vou em direção ao estacionamento. –Não veio com seu carro?

—Não, mas minha amiga vai vir me buscar. –balanço o celular para ele. –O que quer conversar? –Oliver olha para os dois lados, antes de me puxar para um lugar mais discreto, entre o estacionamento e a calçada.

—Eu não bebo. –fala parecendo apreensivo.

—E eu já percebi isso. –respondo sem entender.

—Não Felicity, eu não bebo, mais. –tira uma moeda do AA do bolso. –Estou a um ano sóbrio. Quando te disse sobre os bares, é verdade. Eu sempre estava na porta de um, com um copo na mão. –dispara, sem tirar os olhos dos meus. –Os tabloides nem sempre contam mentiras...

—Entendo. –mando uma mensagem para Sara, informando que já havia saído. –Está tudo bem Oliver, eu não vou misturar as coisas. –começo a andar, voltando para a porta da empresa, e o escuto chamar meu nome.

—Felicity! –Oliver segura meu braço, me girando para que o olhe nos olhos. –Espera.

—O que você quer Oliver? –pergunto irritada, me sentindo tola. –Quer saber? Eu não sou divorciada. –disparo. –Meu marido morreu a um ano em um acidente de avião. Desde então tenho vivido para meus filhos, e vai ser assim pelo resto da minha vida. Você foi o primeiro cara por quem me interessei desde então, eu não quis te contar que era... –suspiro, juntando forças para dizer a palavra. –Viúva, por que você parecia gostar de mim, e foi a primeira pessoa que foi legal comigo sem parecer ter piedade. Eu gostei disso. Eu gostei de você... –ele me beija, me calando. É, não dá pra dizer que esse beijo é bom, por que esse cara mexe com tudo dentro de mim, apenas encostando os lábios nos meus, acho que bom é uma ofensa, excelente seria mais adequado...

—Não estava dando uma desculpa. –diz, me soltando atordoada. –Eu quero ficar com você, só quero que saiba quem eu sou quando estiver comigo. E eu também gostei de você...


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham curtido, comentem e me contem tudo!
Bjnhos