Fim de semana, e você está checando a sua casa para ver se há focos de dengue. É só isso que passa no jornal e você pensou que se sentiria menos incomodado com os alertas repetitivos se fizesse o que mandam: checou a tigela do cachorro, os vasos das plantas, a caixa d’água e outros possíveis locais com água parada. Acabou de acabar. Pode descansar em paz.

Esses dias têm chovido bastante, mas você sabe que eliminou todos os objetos possivelmente acumuladores de água, então, ao invés de se preocupar, abre o Netflix e faz uma maratona de séries, pois não há nada melhor pra fazer na chuva.

Dois dias depois, o sol abre e não para. Parece que você vai evaporar se sair de casa, mas mesmo assim sai, pois seus amigos são legais e te convidam pra sair.

Mas um dia, você se sente cansado demais pra sair. Está tão quente fora quanto dentro do seu corpo. Sua cabeça dói. Você está doente e começa a suspeitar da dengue. Não há criadouros na sua casa, não, você já checou três vezes pra ter certeza. Mas se lembra do que a repórter disse na televisão, algo como que não faz muita diferença você eliminar os focos na sua casa se o seu vizinho não eliminou.

É isso. O vizinho. Um deles tem uma piscina e não fez nada pra evitar a dengue. É isso. Você está certo que é isso.

Mas antes que possa tocar a campainha dele, você precisa ir para o hospital. Demora um pouco pra lembrar que pode morrer se seu sistema imunológico for fraco e começa a rezar para que ele resista, pelo menos até terminar de tretar com o vizinho desgraçado que não põe cloro nem capa na piscina.

Uma semana e meia depois, você sara, ou algo assim. Você está recuperado e pronto pra dar uma bronca destruidora como um tsunami na pessoa ignorante que deixou focos em casa. Não é porque você está louco da vida que vai gritar com a primeira pessoa que atender a porta, não.

Enfim, você bate em três portas na rua antes de encontrar o verdadeiro bandido. Ele tem uma cara muito irritante, assim como a voz, a postura de preguiçoso e as roupas. Tudo nele parece relaxado. Você sente o seu sangue que estivera contaminado subir à cabeça. Começa a perguntar sobre os focos, como fez com os vizinhos anteriores. Ele responde do mesmo jeito relaxado, parecendo irritado por você estar lá, enchendo o saco dele.

Você começa a sua bronca, dizendo que pegou dengue uns dias atrás, mas não havia criadouros na sua casa, então, quando se recuperou, foi batendo de porta em porta para achar quem era que não eliminou a água parada e todas as investigações apontam para o sujeito. Depois começa a dizer como é horrível ficar doente e como ele é ignorante e começa a xinga-lo, botando tudo pra fora. Ele fica de saco cheio, te xinga e bate com a porta na sua cara. Você toca a campainha, mas ele não volta.

Ainda expelindo raiva, você liga para a prefeitura pra ver o que ela pode fazer. Eles prometem que vem amanhã; Você se sente melhor e pensa que, se estivesse ligando para a polícia reclamando do som alto, eles com certeza nem iam ligar.