Just Another Game - Jogos Vorazes escrita por Brooklyn Baby


Capítulo 11
A Aliança


Notas iniciais do capítulo

Oi, leitores!
Vim avisar que farei uma dobradinha: Amanhã já sai capítulo novo (A entrevista), e se tudo caminhar como planejado, Sábado ou Domingo estarei postando o fim da primeira parte - O último dia antes da Arena e Cornucópia. Espero que gostem.
Boa leitura!



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 Nada precisou ser dito. Silenciosos, Emmettt e eu tomamos o elevador até a cobertura do Prédio dos Tributos. Decidi dar uma trégua aos pensamentos hostis sobre meu parceiro. Ficamos em silêncio debaixo de um grande carvalho que parecia instalado no centro do lugar, perto de uma fonte de pedra. O barulho da água fluindo era confortante de alguma maneira. Apesar de uma leve neblina que havia se instalado a nossa volta, a atmosfera lembrava mais um sonho do que outra coisa ameaçadora. 

 Nenhum de nós dois fazia ideia de quanto tempo ela esteve ali, nos observando.

 Maryah deslizou pelo tronco até o chão com perfeição, flexionando levemente os joelhos e pousando no chão sem fazer muito barulho. Como um gato. Sua cabeça se movimentou levemente, de um lado para o outro - Para Emmett e depois para mim. Mesmo sendo incrivelmente sutil, eu podia enxergar a diferença no modo de olhar, a falta de confiança no olhar opaco que cruzara com o meu parceiro, e o brilho acalorado junto com um sorriso oculto que lhe tomaram a face quando o olhar foi direcionado a mim. Em frações de segundo, ela fazia isso. Misturada com a neblina, os arbustos e ramagens, a pele pálida e o cabelo negro de sempre, os olhos azuis tão reluzentes quanto a lua cheia que brilhava majestosa sob nossas cabeças, Maryah nunca parecera tanto com uma divindade quanto agora. 

— Certamente não poderia comentar sobre o assunto no Centro de Treinamento, mas gostaria de saber o que aconteceu na noite em que eu e Kaylee nos deparamos com você numa situação... Tão peculiar  — Emmett me surpreende ao começar com isso.

 Maryah me dá um olhar confuso. A princípio, não entendo.

—  Estava… trabalhando. – A garota do 12 diz, sem muita convicção. Parecia desconfortável.

 Me dou conta de que não havia contado à Emmett. Havia guardado o segredo de Maryah comigo, sagrado. Era óbvio que os últimos dias não me deram oportunidade e sequer vontade para partilhar qualquer coisa que eu pensasse ou soubesse com meu parceiro. Então, quando o vejo abrir a boca, o corto na hora:

— Ela estava fazendo algo importante, Emmett. Não era ela naquela carruagem. Não era ela no hall, esperando o elevador.

 Meu parceiro escolhe o silêncio. Seu olhar vagando por algo através de Maryah. Intimamente, ambos sabíamos. Mas só agora Emmett havia tomado a certeza que eu já havia abraçado há muito tempo: Stellmaryah fora a assassina de Smith.

 Talvez fosse meu olhar perdido, talvez fosse a vontade de colocar para fora, ou ambos. Mas Maryah começou a falar. Ela contou sobre o pai que abandonou a família. Contou sobre o irmão que morreu de tuberculose, e sobre como o destino de sua mãe fora selado quando, desesperada e furiosa por não conseguir os medicamentos necessários para salvar a vida do filho, agrediu um pacificador.

Vejo algo em Maryah, enquanto ela fala. Vejo algo na garota do 12, que duvido ser possível ser visível para Emmett. Ela era uma garota doce e gentil. Não era um monstro ou uma assassina. Era tão humana quanto eu.

— Eu nunca mais a vi, até aquela noite  — Concluiu Maryah, dando-me um olhar de gratidão. Sorri triste.

— E qual era o seu objetivo, naquela noite?  — Emmett surge.

— O que aconteceu depois que sua mãe foi levada? — Eu venho em seguida.

 Maryah baixou os olhos por um breve momento.

— Peregrinos. Sociedade secreta do Distrito 12, que não existe mais. 

 Um arrepio gelado de medo percorreu minha espinha, enquanto eletricidade quente e pura pulsava em minhas veias. Aquele era o tipo de histórias que só se ouvia em lendas, em livros de ficção proibidos de antes dos Dias Escuros. Eu não ousaria perguntar diretamente, mas Emmett ousou. Maryah confirmou. Ela fora treinada para ser uma assassina. 

— Fui ensinada que só existe um Deus, a morte. E ela precisa de escravos para realizar seu trabalho. Nós.

 Fiquei confusa. Estaria ela falando dos Jogos?

— Eles são os escravos? — Apontei para a Capital a nossa volta. 

 Eram a primeira coisa que me vinha a cabeça, junto da palavra morte a assassinato. Os Jogos Vorazes, criados e festejados por eles. As pessoas da Capital.

— Nós  — Maryah repetiu, convicta.

— Porque vivemos então? — Persisto, ainda sem compreender.

 Maryah balança a cabeça em negação.

— Eu não sei, não criei as regras. Apenas cumpri o que me foi ordenado.

 O baque da percepção me atingiu. Nós éramos de fato escravos da morte. Matávamos uns aos outros, independente de quem havia criado o sistema e nos enfiado ali. Estávamos nos preparando para isso, seríamos assassinos quando a hora chegasse.

 Eu e Emmett seríamos... Maryah já era.

—  Quantas pessoas você já matou?

 Os olhos azuis da menina vagueiam pela escuridão ao longe no jardim. Ergue três dedos. Algo em seu gesto me parece simbólico. Penso que já vi aquilo antes, só não me recordava o significado. O pensamento se esvai e logo fico surpresa. Achava que o número fosse maior.

— E como você se sentiu depois disso?  — Emmett quis saber, parecendo curioso.

— No meu caso? Alívio extremo.

 Olho de um rosto para o outro, me sentindo um peixe fora d’água.

— Creio que sou a única aqui que jamais imaginou que teria de matar alguém um dia.

— E pode se sentir feliz por isso  — Respondeu Maryah, soando realmente sincera.

— Vai acontecer, mais cedo ou mais tarde  — Minha replica é automática. 

 Ninguém fala nada por um tempo. Todos parecem absortos em um tipo de pensamento particular, exceto eu. Eu apenas me perguntava no que os dois estavam pensando.

 De repente, Emmett decidiu quebrar o silêncio. E também decidiu fazer o que Stellmaryah havia feito sem hesitação há um tempo atrás. Ele contou sua história. Eu presto atenção, formando a imagem na minha cabeça.

 Emmett tinha oito anos quando entrou para a Academia de Carreiristas. A mesma idade que a irmã mais velha havia entrado. Ele se sentia empolgado, porque a irmã fazia parecer ser divertido. E no começo foi. Até que Emmett quis conhecer outras coisas, e sua irmã percebeu. Ela também tivera a mesma vontade, entre os treinamentos rígidos e o isolamento das pessoas de vida mais simples e aparentemente mais feliz. Faye, a irmã de Emmett, o levava escondido para a praia. Todos os dias, meia hora antes do fim do treinamento, eles saíam. Depois virou uma hora, e duas. E então havia dias em que eles sequer apareciam na Academia.

— Meu pai nos seguiu uma vez. Ele descobriu. Eu nunca o tinha visto tão furioso.

 Pelo que Emmett havia revelado, os pais dele eram bem parecidos com os pais da minha mãe - Queriam fazer dos filhos campeões dos Jogos, queriam usar sua prole para seu próprio benefício, ter prestígio e fortuna em cima dos filhos. A troco de suas vidas... A mãe havia ficado menos rígida, contou ele, depois do que houve com Faye. Mas para ele, não era menos culpada. Dava para perceber a mágoa em sua voz e uma certa repulsa toda vez que pronunciava as palavras “mãe” e “pai”. 

— Faye tinha acendido uma fogueira. Ela admitiu toda culpa. Não que eu não fosse apanhar mais tarde mas, naquele momento meu pai decidiu castigá-la primeiro. Puxou seu braço e colocou sua mão nas chamas. Eu só assisti, como um covarde.

 Imaginando a cena, encolhi os ombros. Era cruel demais. 

— Minha irmã jamais foi a mesma comigo outra vez. Talvez meu pai tivesse ameaçado fazer algo contra mim  — Ele deu de ombros.  — Nós ainda éramos próximos, mas não tínhamos mais segredos. Não éramos mais cúmplices. Nunca mais tocamos no assunto, sobre nada que havia acontecido. Continuamos firmes e focados  — Emmett deu uma risada irônica.  — Jovem como eu era, tinha a ideia de que se eu ou Faye ganhássemos os Jogos seríamos livres. Ricos, famosos... Mas então... Ela morreu. 

— Sinto muito  — Maryah falou.

 Minha voz estava presa. Meu olhar perdido até que senti os olhos de Emmett sob mim. Eu o olhei e nossos olhares se chocaram. Eu me lembrava daquela sensação já ter acontecido antes... Uma descarga elétrica percorre meu corpo durante todo o tempo em que sustento seu olhar. De novo e de novo.

— Eu havia esquecido da sensação que Faye me mostrou. A de liberdade. De felicidade. Eu tinha apagado essa memória e fui voluntário na Colheita, eu precisava terminar isso pela minha irmã e não tinha mais nada a perder. Mal sabia que o destino me pregava uma peça. Todos aqueles sentimentos e lembranças voltaram nos últimos dias. 

 Me senti uma tremenda covarde por desviar o olhar naquele momento. Meu coração, só percebia agora, martelava como se fosse arrebentar as costelas. Meu rosto também estava quente. 

 Maryah pareceu perceber. Ela abaixou os olhos para o chão. Emmett fez o mesmo depois de um tempo. Tentei me recompor, o que levou um tempo. Meu coração ainda pulsava furiosamente quando comecei a falar.

 Chegou a minha vez. Por algum motivo, me senti meio sem jeito. Como se fosse uma privilegiada entre dois injustiçados. A maior perca que havia tido na vida, fora a de minha mãe, e eu havia lidado bem com ela. Não tinha traumas, como Emmett tinha. Não era sozinha, como Maryah. Todavia, nenhum dos dois parecia neutro ou negativo diante dos meus relatos. Maryah sorria vez ou outra quando me ouvia falar sobre Matt, como se conhecesse o tipo de relação que eu lhe narrava. Emmett tinha um brilho de fascínio nos olhos e um sorriso bobo e diferente de qualquer sorriso que eu já havia visto estampado em seu rosto, quando eu contava sobre a rotina mais simples, porém, cheia de companheirismo e amor que tinha com Kriss todos os dias. Percebi que, de certo modo, eles se enxergavam em mim. E se eu analisasse bem, no fundo de cada um deles, também havia um pouco de mim. Naquele momento eu tive a clara percepção de que a nossa aliança era a aliança certa. Fosse como fosse, seja lá o que estivesse esperando por nós.

 Algo inesperado aconteceu, então. Subitamente, parei de falar. Os sons do salto alto de Sienna estalando no chão foram um alerta para que Maryah, em movimentos velozes, voltasse para o topo da árvore. Ergui a cabeça rapidamente para onde ela tinha ido, enxergando o brilho do azul de seus olhos no escuro. Então ela se embrenhou mais na copa do carvalho e desapareceu. Senti o puxão de Emmett em meu braço, e ele me guiou até a fonte do barulho. Sienna nos deu uma bronca, dizendo que precisávamos estar descansados para a entrevista que seria amanhã. Descemos novamente para o quarto andar.


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Notas finais do capítulo

Até a próxima! ♥



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