O som da mensagem enviada era agradável. Um sininho delicado tocava para confirmar que o destinatário recebera e que ela podia guardar sua pokégear. Lyra suspirou e subiu nas costas de sua Pidgeot. O imponente bater de suas fortes asas as tirou do chão rapidamente e lhes deu o céu. Lyra não estava com a roupa que costumava usar, era um dia especial. Por algum motivo ela decidiu usar algo mais sóbrio.

Trajava um vestido preto cuja as alças amarravam atrás do pescoço. Era justo até a cintura e então ficava largo e solto até o meio das coxas, onde acabava. Então vinham suas meias de sempre, brancas até acima dos joelhos terminadas em uma faixa preta e, nos pés, sapatilhas da mesma cor do vestido. Seus cabelos estavam presos como de costume, mas ela deixou seu chapéu na bolsa, não queria usá-lo no momento.

Só havia um item de seu atual vestuário que não pertencia ao conjunto: A blusa preta com as linhas vermelhas nos extremos e uma linha que contornava a cintura. Gostava daquela blusa mesmo que não lhe pertencesse, mas sabia que precisava devolvê-la. Enquanto voava para Indigo Plateau, Lyra calçou luvas negras que deixavam as pontas dos dedos desprotegidas apenas. Enfrentaria a elite de treinadores, precisava estar preparada.

Mas se perguntava se ele vira a mensagem.

Suspirou diante da porta do lugar. Era imponente e inédito. Não lembrava até então, mas não conseguira ver o lugar da última vez que estivera ali. Perdera a consciência antes mesmo de sair da caverna às suas costas, mas agora lá estava ela. Finalmente. A porta abriu para ela e revelou o belo e intimidador interior do ambiente em que estava. Sua Pidgeot grasnou intimidada e tensa enquanto se esforçava para acompanhar a treinadora.

– Que foi? Quer entrar? - Questionou ao pássaro. Ela abaixou a cabeça aceitando a proposta. - Certo, daqui a pouco vou precisar de você.

Recolheu o pokémon voador e decidiu deixar seu Umbreon sair. A eeveelution espreguiçou e saudou a treinadora com evidente disposição. Lyra sorriu e afagou atrás da orelha do pokémon, e então foi para o balcão de compras. Pegou alguns itens e medicamentos e decidiu esperar no saguão. Ele estava demorando. Umbreon pulou no sofá onde ela sentou e deitou ao seu lado. Esticou as patinhas para relaxar um pouco enquanto apoiava sua cabeça no colo da mestra, que distraidamente começou a afagar sua barriga.

Um suspiro cansado escapou quando ela pegou sua pokégear novamente. Nada de novo. Talvez ela devesse ligar. Então o dispositivo vibrou e uma doce melodia que imitava um sininho tocou. Animada, Lyra abriu... Para ver que era uma mensagem de sua mãe. Guardou de volta em sua bolsa.

Qual era o problema dele? Primeiro ele desaparecia do nada durante os treinos, então ele nunca mais aparecia casualmente como viva fazendo e agora ele não a veria enfrentar a Elite? Ela honestamente acreditava que ele se importava. O pequeno Umbreon percebeu o incômodo que a consumia e levantou preocupado. Choramingou baixinho e lambeu o rosto dela para depois passar a cabeça sob o queixo da menina e subir em seu colo.

Lyra abraçou o companheiro e distribuiu afagos por seus pelos negros e dourados até decidir seguir em frente. Não precisava dele ali.

Levantou decidida e seguiu escada acima até o guarda que permanecia na entrada do caminho para o campeão.

– Bom dia. - Disse ela.

– Bom dia, minha jovem. Tem certeza que vai enfrentá-los? Uma vez que você entrar, não pode mais sair.

– Eu sei, eu sei... Vou entrar sim.

– Vai sozinha? Quero dizer, a maioria dos treinadores que vem batalhar aqui vem com mais alguém, um familiar ou amigo.

– A-ah... - Ela forçou um sorriso - Acho que vou sozinha, mas se alguém chegar pra assistir pode deixar entrar... Obrigada, moço.

– De nada... E boa sorte!

Respirou fundo e, liderando o caminho, seguiu com seu Umbreon. Em pouco tempo chegaram à primeira sala. Do outro lado do local de batalha estava um jovem de cabelos roxos, roupas estranhas e bufantes e combinando com a sala roxa.

– Seja bem-vinda. - Disse ele. - Meu nome é Will e eu sou o melhor com pokémons psíquicos, vamos lutar.

– Certo. Umbreon, essa é sua.

A luta foi fácil, ela não esperava por isso. Um a um os pokémons de Will foram subjugados pelo impiedoso Umbreon. O dano sofrido por ele foi mínimo naquela batalha, e após recolher sua recompensa, Lyra seguiu para a próxima sala.

Esta sala era climatizada. Tipo grama, provavelmente.

– Meu nome é Koga, vou te mostrar como não só de força vive um pokémon com os meus tipo grama!

– Vamos então, Ty!

O pequeno Umbreon recuou para trás de Lyra, enquanto o grande Typhlosion veio para o seu lugar. Ele rugiu ansioso e acendeu as chamas que ficavam atrás de seu pescoço. Koga pressionou os lábios. Ela conhecia as suas fraquezas.

A luta foi mais rápida que a anterior, sequer encostaram em seu Typhlosion. Ela cumprimentou o derrotado e colheu sua recompensa, seguindo lentamente para a próxima sala. Ty e Umbreon a seguiam leais e firmes, mas ela estava distraída, em outro lugar. Onde ele estava?

O calor a envolveu assim que entrou. Não gostou daquela sala e queria sair de lá o quanto antes. O terceiro membro da Elite Four a recebeu curtamente. Tipo lutador, ele disse.

– Vamos, sua vez, Lulu.

O lendário saiu de sua Master Ball silvando agudamente para ameaçar seus adversários. Sem dúvida seu poder psíquico era intenso, pois um a um os pokémons caíram. Até mesmo o Onix de Bruno cedeu ao poderoso Hydro Pump de Lugia. Mais uma batalha tranquila. Recompensa, saudação, seguiu em frente. Mal prestava atenção nas batalhas.

Seguiu agora com Lugia acompanhando junto aos outros dois até a próxima sala. Era mística, agradável. Uma mulher de cabelos azuis claros esperava por ela.

– Meu nome é Karen e eu vou te mostrar o poder oculto dos pokémons obscuros. - Riu - Seja bem-vinda.

– Obrigada... Ty, posso contar com você de novo?

O pokémon rugiu intensamente e avançou para o campo de batalha. Não foi difícil, mas das 4 batalhas foi a única com complicações. Karen também tinha um Umbreon, ágil e bem treinado. Embora Ty fosse forte, sua força de nada adiantava se seu alvo não fosse atingido. Mas com muito esforço ela derrotou a última da Elite Four e teve o caminho livre.

– Você sabe o que realmente importa. - Disse Karen com um sorriso sincero - Eu admiro e respeito isso em você. Vá em frente, o campeão te aguarda.

– Certo, obrigada...

– Ei, o que foi? Pra alguém que venceu a Elite você não parece muito animada.

– Não é nada, eu só estava esperando alguém vir me ver batalhar, mas acho que ele não vem.

– Hum, isso não é bom. - Aproximou-se de Lyra e colocou a mão em seu ombro - Eu não o conheço, ou você, mas sinto que você não terminará sua próxima batalha sozinha. Vá em frente, seja confiante, não deixe isso tirar seu foco. Você mereceu chegar aqui, não perca isso.

– Obrigada, Karen. - Lyra sorriu, mas dessa vez foi um sorriso honesto. Ela tinha razão. - Espero que você esteja certa.

E seguiu. Seus pokémons se agitaram às suas costas. O clima ficava tão tenso que ela mesma podia sentir na pele a mudança ao redor deles. Avançou cautelosamente até a última sala, então finalmente pôde ver o campeão. Era Lance, que havia ajudado conta a Equipe Rocket algum tempo atrás. Silver também ajudou. Foi lá que ele percebeu que precisava mudar, foi graças à Lance. Ele era formidável, e agora o enfrentaria.

Ele jogou a capa por cima do ombro e sorriu.

– Sabia que nos encontraríamos aqui, Lyra. Você está destinada à grandeza. Mas chega disso, sabemos por que você está aqui, vamos começar.

Lyra suspirou. Libertou os demais pokémons que carregava consigo enquanto Lance deixou seu Gyarados sair. Não gostava de pokémons do tipo dragão por serem grandes desafios, mas se não os superasse não seria digna do título que almejava.

– Lulu.

O pokémon avançou. A batalha foi difícil, o dano recebido por seu Lugia foi maior do que esperado, mas conseguiram subjugá-lo. Então veio o Aerodactyl. Apesar de recuperar Lugia de seus ferimentos, o pokémon recebeu dano crítico demais e acabou ficando incapacitado de continuar. Mandou seu Umbreon, mas mesmo assim mais um pokémon foi derrotado. Finalmente com seu Dragonair e um pouco de sorte conseguiu derrubar o pokémon, mas não foi barato, estava com dois pokémons a menos e um já ferido.

Lyra começou a tremer. Perdia a confiança em si mesma e começava a abalar a de seus pokémons. Um Dragonite. Tirou seu Dragonair de campo tão rápido que mal pôde acreditar. Respirou nervosa, olhou em volta, fechou as mãos. Sua Pidgeot avançou, mas com um golpe elétrico ela também caiu. Apenas dois pokémons restantes. Ela não ia conseguir.

– Vamos Lyra, qual seu próximo pokémon?

– Eu...

Sua força se esvaía. Ela mandou que sua Ninetales avançasse contra o pokémon voador. Seu pokémon raposa era forte, conseguiu dar algum dano, mesmo que não fosse particularmente eficaz, mas a velocidade de Dragonite era mais que sua companheira podia acompanhar e, com um golpe intenso, foi arremessada para fora do campo. Um pokémon restante.

– E então? - Questionou Lance com os braços cruzados.

Ela não respondeu. Não conseguia sentir força em suas pernas ou confiança nela mesma. Alguma coisa havia dado muito errado com ela, ela não costumava ser assim. Ela queria que Silver estivesse ali. Talvez não conseguisse se concentrar por ele não estar lá. Ele disse que iria, mas não estava. Provavelmente ela achou que ele se importava mais do que a realidade, ele não devia se importar de tanto assim.

Fraqueza. Ela gostaria de poder se entregar, não queria sacrificar mais um companheiro, ela não era digna do esforço deles. Ergueu o olhar desanimado para Lance. Ele provavelmente estava decepcionado. Todos estavam. Seus joelhos cederam, estava realmente fraca. Teria que ir até o final e ver seu amado Typhlosion sofrer por sua imaturidade, sofrer com a fúria dos dragões de Lance até cair como ela fazia agora. Mas seus joelhos não chegaram a tocar o chão.

Ela não entendeu, aguardava o impacto, mas algo interrompeu sua queda. E então Lyra olhou para o lado.

Como sempre, ele a olhava de cima. Havia conseguido se apoiar sob seu braço direito e, assim, segurá-la. Sentia agora o braço esquerdo dele às suas costas, fazendo com que se erguesse novamente. Os olhos vermelhos intensos e frios, os fios da mesma cor diante do rosto. Ele não sorria. Colocou Lyra em pé novamente.

Talvez por ela estar com a blusa dele, eles estavam parecidos. Uma camisa preta. Parecia formal demais para ele, mas talvez por ser uma ocasião importante. Ele também estava todo de preto. Silver não a soltou depois de colocá-la em pé, mas falou baixo, com tranquilidade e um toque amargo de sinceridade na voz.

– O que você pensa que está fazendo? - Questionou.

– Você...

– Eu não vim até aqui ver você ser assim, qual é o motivo disso?

– Você... Você veio. - Sorriu.

Silver recuou e olhou para Lance. Pôde vê-lo encarar o campeão com desgosto antes que ele voltasse a olhar para ela. As mãos dele foram de encontro aos ombros de Lyra e ele voltou a falar.

– Você ainda pode ganhar, seu Typhlosion ainda está em pé e...

Ele parou de falar, provavelmente por perceber que ela não estava ouvindo nada. Tinha o olhar fixo nele, um misto de comoção e alegria brilhavam em seus olhos castanhos, mas não parecia prestar atenção. Um suspiro. Ele pressionou os lábios e puxou Lyra para si, envolvendo-a em um abraço. Não foi algo esperado. Ele a envolveu com cuidado, com carinho. Foi... Bom, mesmo que breve. Logo se afastaram e ele a encarou ainda sério. Ele estava com o rosto corado, tal como o dela deveria estar.

O garoto a observou de cima a baixo, então ele fez algo mais inesperado que o abraço. Ele sorriu para ela. Era outro rosto. O sorriso era curto, discreto, mas era sincero. Ela sabia que poderia passar horas encarando aquele sorriso, sabia que fizera algo para merecer vê-lo sorrir.

– Você consegue ganhar. Vá lá e seja a treinadora que você me ensinou a ser.

– Silver...

O sorriso enfraqueceu aos poucos até se tornar uma lembrança na memória dela. Ele a soltou, mas antes de sair colocou uma mecha solta do cabelo dela atrás de sua orelha. Silver então se afastou e foi para a lateral do campo, local onde expectadores poderiam acompanhar as disputas sem atrapalhar.

Ele tinha razão.

– Certo. Certo! - Ela sorriu e assumiu sua pose de confiança novamente. - Ty, vamos acabar com isso.