Entropia escrita por Reyna Voronova
Interlúdio
O Crepúsculo
O céu estava lilás. A noite já subia.
As areias estavam estranhamente mais alaranjadas, não a cor pálida da manhã. Já estava começando a esfriar.
O Deserto, no crepúsculo, era como uma sentença de morte. Sair à noite era a morte em si, mas o que precedia a noite era a sensação de estar com armas apontadas a todo o momento, não o susto da escuridão.
Ele parecia um oceano laranja, pronto para engolir qualquer um, fazê-lo se afogar nas areias. Parecia estar encarando.
Um vento frio soprou. O primeiro de muitos.
Naquela hora, o Sanduur não parecia ter som. Parecia estático no tempo e espaço. Um ponto no Universo que era imutável, atemporal, intocado, perfeito, sem fim. Era contrastante ver o lilás do céu com o alaranjado das areias. Um choque térmico de cores que se tocavam na borda do horizonte.
Era como um local ainda mais solitário do que já era. Como se houvesse só o deserto e mais nada, nada. Cada um, um grão de areia. Cada um, voando e flutuando como o vento do Deserto os guiava. Alguns, por sorte — ou azar, nunca se sabe —, jamais precisavam voar.
Era um planeta inexplorado, sem seres alienígenas. Apenas o Deserto e nada mais. O Deserto era a única forma de vida, porque ele era, seria e foi.
O Deserto sabia. Ele era o maior de todos os sábios. Nenhuma mente poderia se equiparar à inteligência e a esperteza de suas areias.
O Deserto era a vida e a morte. Tudo nascia dele, das suas areias, e, no fim, tudo voltava a ele. Todos caíam em direção às areias do deserto, e ela cobria todo o corpo. O nascimento das areias. Depois, em algum momento, o corpo decomposto já se tornando pó, voltava a ele como nasceu. Das areias, o nascimento, e às areias, a morte. Ela sorvia a morte e também a devolvia, mas junto com ela também vinha a vida.
O deserto era um local vasto isolado no meio do Universo, esquecido por Deus. O Deserto, então, assumira seu lugar: era o Senhor Todo Poderoso, o Pai, Onipotente e Onipresente. O alfa e o ômega, o princípio e o fim.
O céu ficou um pouco mais escuro. O crepúsculo até poderia ficar para trás, mas o Deserto não.
O Deserto perseguia. Pois o Deserto nunca ficava para trás. O Deserto
observava.
“Pois tu és pó e ao pó tornarás.”
— A Bíblia Sagrada; Gênesis 3:19.
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