As Crônicas de Pan Gu escrita por Nanahoshi


Capítulo 7
As Crônicas dos Reinos - Procure por Morgan


Notas iniciais do capítulo

FINALMENTEEEEE! Depois de tanto brigar com esse capítulo ele finalmente saiu! Temos enfim a sequência da história de Andreza e Kallahari aeeeee o/ O capítulo é relativamente simples, que abre as portas para o próximo que vai ser bem mais tenso xD Espero que gostem de ver mais sobre esses personagens tão fofinhos *-*
Boa leitura!



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Andreza retirou o nono livro de uma prateleira mais baixa. Abriu no índice e correu os dedinhos pela caligrafia cursiva que enfeitava o papel.  Aqueles livros eram os mais antigos da Biblioteca Real, tanto que alguns, como aquele que segurava, eram escritos à mão. Se ninguém iria contar a ela, iria encontrar por si mesma algo sobre a Guerra pela Cidade da Dor Celestial e a Dinastia do Crepúsculo.  

Aquele livro também não havia nenhuma menção ao nome da guerra ou da cidade. Ela passou para o próximo. Depois de meia hora procurando em livros, pergaminhos e mais livros, ela finalmente achou um que possuía uma menção ao nome da cidade. Ela folheou o livro, afobada, quase derrubando-o sobre a bancada. Quando finalmente chegou às páginas indicadas no índice, seus olhos se arregalaram. Exatamente na posição que deveriam estar as páginas que contariam sobre a Cidade da Dor Celestial havia uma lacuna. Ela passou os dedos no meio do livro, sentindo pedaços de papel rasgado. Alguém arrancara as páginas dali.

Frustrada, a menina fechou o livro e colocou-o no topo da pilha de livros que havia formado sobre a mesa de madeira. Ela olhou para os lados e chamou o primeiro bibliotecário que viu.

—Senhor, poderia vir aqui um minuto, por favor?

—Sim, Alteza? – o alado respondeu se aproximando e fazendo uma reverência.

A menina olhou para o chão de forma desconcertada.

—Eu estou procurando registros sobre a Guerra pela Cidade da Dor Celestial. Procurei em todo tipo de livro e pergaminho, mas nem os mais antigos têm informações. Poderia me dizer se existe algum registro em alguma biblioteca do castelo?

O bibliotecário mediu a princesa de cima a baixo, e sua testa de franziu numa mistura de desconfiança, encantamento e desconforto. Era incrível que uma garotinha de apenas cinco anos estivesse procurando um assunto tão complexo como aquele. Já era impressionante o fato de saber ler naquela idade. O que o levava à desconfiança: por que a princesa estaria interessada naquele assunto? E como ele negaria o acesso aos registros sem que ela arranjasse uma confusão ou fizesse uma birra?

—Hum – ele fingiu refletir e pigarreou – Lamento informar, Alteza, mas esse assunto está entre aqueles que consideramos confidenciais. Apenas os sacerdotes que ocupam os cargos mais elevados e o rei podem ter acesso a essas informações.

Ele prendeu a respiração e esperou que a menina gritasse de forma arrogante com ele. Porém, Andreza apenas baixou os olhos tristonha e assentiu.

—Tudo bem. Obrigada senhor. – disse sem esconder sua decepção.

E sem dizer mais nada, deu as costas e seguiu para a saída da biblioteca. O bibliotecário ficou estático, piscando atônito enquanto observava a pequena alada se dirigir silenciosamente para a porta. Talvez a inteligência da princesa não fosse a característica mais incrível dela, e sim a sua maturidade precoce que prometia à Andreza um futuro brilhante como herdeira do trono dos Alados.

A menina andou alguns passos no corredor com a cabeça baixa rezando para não chamar a atenção de ninguém. Ela se dirigiu para uma saída do palácio que dava numa das enormes plataformas naturais que se formaram ao longo do tronco de uma das Três Árvores das Plumas. Ali havia um posto de vigilância, mas no momento estava vazio. Devia ser o horário de troca de turnos. Satisfeita a menina correu até a beirada da plataforma e pulou para o tronco da árvore, deslizando silenciosamente até aterrissar numa alameda da Cidade das Plumas. Ela seguiu a fileira de casas, se aproximando do rio.

Próximo dali, um grupo de crianças brincava ao redor de uma fogueira e um velho cutucava o fogo enquanto ria delas. Ela parou para observar a cena e sua mente vagou.

Se não queriam contar para ela sobre a Guerra e não havia nenhum livro a respeito do assunto ao seu alcance, como ela iria conseguir alguma informação? Existiria alguém na Cidade das Plumas ou nas vilas próximas que conheceria a história?

O velho que cutucava o fogo riu e acenou para as crianças. Nesse momento, uma brisa soprou, carregando as palavras do alado para a princesa:

—Hoje contarei para vocês a história sobre o Cavalo e o Humano Celestial...

Contar...

Num lampejo, Andreza soube como iria descobrir sobre a história proibida. Inspirando fundo para correr, ela correu entusiasmada direto para o estábulo real.

***

Um barulho no corredor fez Kallahari despertar de seu flashback. Ele piscou e virou o rosto. Dois sacerdotes vinham em sua direção conversando de forma tão compenetrada que nem perceberam a presença do garoto.

—Sim, sim... A nova rainha é a favor do ataque aos Selvagens... – dizia um passando a mão na barba de forma nervosa.

—Mas fiquei sabendo que um dos majores se opôs veementemente, e isso gerou uma tensão dentro do exército. – o outro tinha um olhar tenso.

O pequeno alado ficou encarando as duas figuras enrugadas se distanciarem e sumirem ao fazerem uma curva para pegar outro corredor. Ele bufou e voltou a olhar para a porta da biblioteca.

“Esses velhos que só pensam em fofocar sobre assuntos da corte....”, ele reclamou em silêncio. “Velhos...”

Seus olhos se arregalaram gradualmente quando uma lembrança preencheu sua mente. Ele conseguira fugir com os papéis da biblioteca e os guardara num fundo falso de uma gaveta de seu quarto. Fora outras vezes procurar por informações sobre a Cidade das Tormentas e os humanos meio peixes, mas não encontrara nada. E ele não seria tolo de voltar à biblioteca subterrânea sozinho depois do que acontecera. Ou seja, só havia uma forma de descobrir mais sobre aqueles documentos misteriosos...

Kallahari ergueu bruscamente o cesto de frutas que carregava para a cozinha e correu pelo corredor. Quanto mais cedo terminasse o serviço, mais cedo poderia ir atrás da única pessoa no Reino dos Alados que talvez soubesse mais sobre essa outra raça...

***

Udyni andava esfregando as mãos pelos corredores que serpenteavam dentro dos enormes troncos das Três Árvores das Plumas. A conversa que ouvira sem querer na sala do rei a deixara nervosa, e ela começara a se arrepender de ter sido tão dura com Andreza mais cedo. Ela finalmente chegou ao quarto da princesa, mas ao abrir a porta, percebeu que o cômodo estava completamente vazio.

“Eu mandei ela não sair daqui.”, pensou a sacerdotisa com a testa franzida de irritação.

Ela voltou para o corredor batendo os saltos brancos com firmeza no chão. Alguns criados conversavam enquanto limpavam uma sala com as portas abertas. Udyni entrou bruscamente e perguntou:

—Os senhores viram a princesa? Ela estava em seu quarto da última vez...

Uma das criadas parou de esfregar uma mesa e ergueu o tronco apoiando a mão nas costas:

—Ela passou por aqui faz um tempo. Pelo rumo que tomou e conhecendo os hábitos dela, diria que foi para a Biblioteca Real.

Udyni assentiu e agradeceu. Seguiu a passos rápidos, seus saltos ecoando contra o mármore branco. Assim que chegou ao grande salão repleto de livros, chamou o primeiro bibliotecário que encontrou.

—Ythan, onde está a princesa? Me disseram que ela poderia estar aqui.

—Ela estava aqui há alguns minutos – o jovem alado endireitou os óculos grandes e redondos – Andou procurando alguma coisa nos livros mais antigos na sessão de História, mas já saiu.

Instantaneamente a pergunta de sua aluna ecoou em sua mente:

“O que aconteceu na Guerra pela Cidade da Dor Celestial? E o que é a Dinastia do Crepúsculo?”.

Com o cenho franzido de preocupação, a sacerdotisa agradeceu novamente e saiu. Preocupada com o que sua pupila pudesse estar aprontando para chegar à resposta de suas duas perguntas, Udyni se dirigiu ao jardim para procurá-la.

“Andreza, onde diabos você se meteu? ”

***

Kallahari saltou da égua e olhou em volta. Fora uma viagem relativamente curta até a Vila Nanke, de cerca de três quartos de hora. Era uma vila que ficava a sudoeste da Cidade das Plumas, situada próximo à um precipício gigantesco na fronteira dos domínios dos Alados.

Tivera que pegar a égua emprestada de um velho amigo lenhador, já que com dez anos ainda era incapaz de voar. Porém, com sorte, quando completasse quinze anos, suas asas brotariam de suas costas e poderiam leva-lo a qualquer lugar.

O garoto olhou em volta e tornou a olhar para o animal que o trouxera ali. Deu um tapinha no pescoço da equina e disse baixinho:

—Eu vou procurar o velho contador de histórias. Fique por aí pastando até eu voltar. Só não vá muito longe.

Em resposta, o animal abaixou o pescoço de cor chocolate e começou a arrancar tufos de grama do chão terroso da vila.

“Tomara que ela não vá muito longe”, rezou Kallahari em silêncio abraçado a um pacote pardo que continha os frutos de sua excursão à biblioteca subterrânea. “A grama aqui é bem escassa...”

Ele avançou em direção às casas amarronzadas da vila, todas com runas entalhadas na mesma posição formando um aro ao redor da construção. Aproximou-se do aldeão mais próximo e pigarreou:

—Com licença.

Parecia ser um velho comerciante. Os cabelos brancos e curtos lhe cobriam as orelhas enquanto ele analisava uma longa lista escrita num pergaminho.

—Sim? – ele perguntou sem tirar os olhos do que lia.

—Eu queria saber onde encontrar o velho contador de histórias daqui, por favor.

O comerciante ergueu os olhos para o garoto e o analisou de cima a baixo.

—O velho bardo Morgan? O que quer com ele?

Kallahari olhou para os lados de forma nervosa. Não queria contar para ninguém os reais motivos que o traziam ali.

—Quero perguntar para ele sobre uma história que ele contou.

O comerciante o analisou novamente, demorando-se no pacote que ele trazia abraçado contra o peito. Uma de suas sobrancelhas grisalhas se levantou.

—Eu não sei onde ele está. Na verdade, ninguém nunca descobriu onde aquele velho desocupado mora – ele falava de tal forma que parecia desconsiderar sua própria idade – Ele fica zanzando pela Vila de vez em quando, some e depois aparece.

—Ele esteve por aqui esses dias? – Kallahari questionou começando a entrar em desespero. Precisava encontrar o bardo o mais rápido possível.

—Ontem ele estava no lugar de sempre contando histórias durante a noite.

—Sabe se ele vai aparecer hoje?

—Não. Ninguém nunca sabe. Ele dá as caras quando quer.

O garoto suspirou e olhou tristonho para o chão.

—Obrigado.

Arrastando os pés, o menino se distanciou do comerciante. Por que aquele velho tinha que fazer tanto mistério? Ele precisava urgente de sua ajuda! Erguendo a cabeça, o menino decidiu interpelar mais aldeões, todos se fosse necessário. Nem que ele tivesse que dormir na Vila Nanke naquela noite, ele iria encontrar o bardo Morgan.

E assim se seguiu sua tarde. Conversou com todos os aldeões que encontrou, perguntando por pistas ou qualquer sinal minúsculo que eles tenham visto. Mas ninguém sabia de absolutamente nada sobre o contador de histórias. Nenhum habitante da Vila Nanke sequer desconfiava onde ele morava ou poderia estar.

Cansado e decepcionado, o menino sentou-se debaixo de um enorme coqueiro e olhou ao redor. Os aldeões se misturavam com os viajantes, e vários animais de carga arrastavam produtos e matérias-primas pela estrada que cortava a Vila ao meio. Dentre os transeuntes, um em especial chamou a atenção. Era um vulto miúdo, poderia ser um anão ou uma criança de no máximo sete anos. Ele não podia dizer já que a figura estava encapuzada com um manto cinzento, que ele acreditou estar usando para não chamar a atenção. O que provavelmente o encapuzado não sabia é que sua tentativa de disfarce estava sofrendo o efeito contrário.

Como se para confirmar seus pensamentos, um grupo de cinco garotos barulhentos se aproximou do vulto encapuzando, cercando-o em segundos. Kallahari ergueu o tronco e prestou atenção na discussão.

—Ora, ora, ora! – o mais alto que parecia o líder zombou – O que temos aqui? Por que esse anãozinho está encapuzado?

Os outros arruaceiros riram e fecharam o círculo ao redor do vulto. O líder puxou violentamente o capuz para trás, revelando quem estivera escondendo-se sob o tecido preto.

O sangue de Kallahari gelou. Seus olhos se arregalaram e seu corpo todo tremeu.

“O-o que ela está fazendo aqui?”, o garoto alado exclamou em silêncio espremendo os lábios numa linha fina.

No meio da roda de baderneiros, a princesa do Reino dos Alados se encolhera encarando-os com um olhar feroz.

—Ah, é só uma menininha. – o líder do grupo mediu Andreza de cima a baixo – Estava pensando numa coisa mais incrível.

Um dos subordinados se aproximou e agarrou ela pelos ombros.

—Mas o que uma menininha faz andando por aqui encapuzada? Vai aprontar alguma e não quer ser pega pela mamãe?

Os meninos riram.

—Me solta! – protestou a garota entredentes.

Sem pensar, Kallahari saltou de pé a avançou a passos rápidos para o grupo. Não podia deixar que nada acontecesse com a princesa. Não agora que ele a vira e reconhecera. Sua mãe o mataria se descobrisse que não defendeu alguém da nobreza em perigo.

Seu sangue borbulhou em suas veias com o pensamento. Por quê? Por que era sempre assim? A nobreza sempre tinha que receber todos os privilégios, as atenções, as informações, as melhores coisas... E ele, um reles filho de uma copeira era obrigado a arriscar tudo, até a própria vida para salvar qualquer membro da nobreza em perigo, por pior que ele ou ela seja.

Quando percebeu o rumo de seus pensamentos, balançou a cabeça fervorosamente.

“Não, ela não é uma nobre em perigo. Ela é uma pessoa, uma menina em perigo. Eu preciso ajudá-la.”, ele estreitou os olhos para o grupo de arruaceiros ao reunir coragem dentro de si para enfrenta-los.

—Ei! – ele chamou quando estava perto o suficiente.

Os cinco viraram-se ao mesmo tempo para ele. Os rostos mal-encarados quase fizeram o pequeno alado dar meia volta, mas resistiu e manteve-se firme até alcançar o grupo.

—Por que estão implicando com uma garota tão pequena? Vocês são o quê? Ratos? – ele cuspiu olhando ferozmente para o líder do bando.

Andreza se encolheu e olhou curiosa para o recém-chegado. Uma sombra de reconhecimento passou por seus olhos, e eles se arregalaram.

—Você... – ela falou tão baixinho que só ele conseguiu escutar.

Ele olhou significativamente para ela como se dissesse “deixa comigo”.  Depois do choque inicial de serem abordados daquela forma, os garotos se recompuseram intensificando o olhar intimidador para o recém-chegado.

—Quem você pensa que é pra chegar falando desse jeito com a gente? – vociferou um magrelo de cabelos cor de palha que estava à esquerda do cabeça do bando.

Ele segurou o braço da princesa e puxou-a para mais perto de si.

—Um amigo. Agora sumam daqui.

Eles se entreolharam e depois caíram na gargalhada.

—Você acha mesmo que a gente vai te obedecer assim, de graça? – um outro que estava à esquerda do magrelo que falara antes se aproximou de Kallahari e empurrou-o violentamente. Ele se curvou para frente com brusquidão, mas rapidamente recuperou o equilíbrio sem soltar o braço de Andreza. A menina permanecia calada com os olhos arregalados.

—É claro que vão. – Kallahari abriu um sorriso de deboche – Senão eu vou socar vocês até saírem correndo chorando pela mamãe.

Dessa vez eles não economizaram nas gargalhadas. Riram alto e de forma teatralmente debochada.

—Ah, cara, você é realmente muito engraçado. – o líder do bando limpou lágrimas de seus olhos e passou a mão pelos cabelos ruivos sebosos – Mas nem por isso vamos te deixar sair impune dessa.

Os cinco fecharam o cerco em volta do garoto alado, e ele puxou a princesa para seu peito.

—Escute – ele sussurrou para ela – quando eu disser pra você fugir, corra o mais rápido que conseguir pra longe daqui, e leve isso com você.

Ela apenas assentiu, o rosto enterrado contra o peito do menino sentindo o embrulho que ele apertava com um dos braços que ele confiara a ela.

Um mais gordinho que estava logo atrás do garoto avançou primeiro tentando agarrar o pequeno alado pela nuca, mas Kallahari se desviou habilmente e devolveu com uma cotovelada certeira em seu nariz.

—Corre! – ele empurrou a princesa para fora do círculo e partiu para cima do magrelo loiro.

Andreza quase caiu no chão por causa da força do empurrão, mas logo se recompôs e começou a correr. Ela abraçou o embrulho com força e avançou quase cegamente. Entretanto, um dos integrantes do grupo, ao perceber a estratégia do menino, saiu do círculo mergulhado em socos e pontapés e correu atrás da princesa.

—Não vai fugir, não! – ele berrou diminuindo a distância rapidamente entre os dois.

Por ser bem mais nova e pequena que seu perseguidor, Andreza não teve chance nenhuma de fuga. O valentão a agarrou pelos cabelos e jogou-a no chão. Ela gritou e se encolheu protegendo o embrulho do alado que tentara salvá-la. O menino finalmente a alcançou e, levantando-a pelos cabelos, finalmente percebeu o objeto de cor escura guardado entre os braços da menina. Ele sorriu de uma forma maliciosa e agarrou o pacote de papel pardo, arrancando-o com violência da princesa.

—Não! – ela berrou esperneando – Devolve!

Ele apenas riu e a arrastou de volta para onde seus companheiros estavam.

Enquanto isso, Kallahari distribuía socos e chutes numa habilidade inimaginável para um simples filho de uma copeira do palácio. Entretanto eles eram muitos, e o fato de alguns serem mais altos e corpulentos já o colocava em desvantagem. Ele esmurrou um exatamente em cima do nariz, ao mesmo tempo que bloqueava um chute do líder do grupo com a perna esquerda. Como o movimento fora complexo, o garoto perdeu momentaneamente o equilíbrio, o que deu a brecha perfeita para que um mais corpulento saltasse sobre ele, imobilizando seus braços. O cabeça do bando, ao vê-lo imobilizado, sorriu com escárnio e avançou para acertar um soco na mandíbula de Kallahari.

—Filho da mãe! – ele cuspiu – Agora você vai ver o que é socar de verdade.

O garoto não se intimidou. Encarou o ruivo com tanta fúria que este até engoliu em seco.

—Chefe, olha só o que tinha com a garota.

O outro arruaceiro agora alcançara o bando arrastando a princesa pelos cabelos. Na outra mão ele balançava o embrulho de Kallahari. Quando o garoto o viu nas mãos imundas do brutamontes, chutou o ar repetidas vezes, dando arrancos bruscos com os braços tentando se desvencilhar.

—Solta isso! Isso não é seu! Não sabe com o que está mexendo!

O ruivo se adiantou e pegou o pacote sem nenhum cuidado. O outro jogou Andreza aos pés de Kallahari. Ela caiu encolhida, as mãos protegendo a cabeça. Pela forma como tremia, o alado podia apostar que estava chorando.

"Tsc, eu não sei porque diabos ela está aqui nessa Vila, muito menos porque veio disfarçada. Se eu disser que ela é a princesa, é muito provável que eles não acreditem, então só seria mais um motivo para eles nos espancarem. E ele não podem colocar as mãos nos meus achados! Como vou encontrar a Cidade das Tormentas assim!?"

Ele lutou de novo contra seus agressores, mas foi em vão novamente. Eles agora se concentravam em abrir o pacote de seu refém e examinar o conteúdo. Rasgaram o papel sem cerimônia e o líder agarrou os papéis e o diário, analisando-o com um olhar estúpido.

—Mas que velharia inútil é essa? – ele vociferou – Achei que seria algo mais valioso ou interessante.

Nesse momento Andreza ergueu os olhos. Os círculos negros de suas íris que se confundiam com sua pupila se ergueram para os objetos nas mãos dos baderneiros. O choque que se estampou em sua face foi indescritível. Ela encarou os pergaminhos e o diário com os olhos trêmulos por longos segundos, e depois virou-os bruscamente para Kallahari.

—Foi você! – ela acusou – Você entrou na biblioteca aquele dia e roubou os meus livros!

O garoto engasgou com a acusação dela.

—O quê?

O ruivo deixou um pergaminho cair. Andreza se adiantou e agarrou-o, o que lhe rendeu um pelo pontapé na lateral do rosto. Ela recuou choramingando.

—Fica quieta, sua peste! – ele jogou outro pergaminho no chão – Bom, isso aqui não parece ter valor nenhum.

Ele se abaixou e pegou os dois pergaminhos novamente.

—Isso é seu, não é? – ele chutou as costelas de Kallahari ao perguntar.

O menino reprimiu um gemido e permaneceu em silêncio.

—Eu perguntei pra você. – ele frisou as duas últimas palavras e repetiu o chute.

Kallahari gemeu baixinho e encarou o ruivo.

—Sim. – sua voz saia forte e intimidadora.

—Pra quê isso serve? Pra onde estava levando isso?

O garoto guardou silêncio novamente, o que lhe rendeu mais um chute nas costelas, que já latejavam com uma dor lancinante.

—Guah! – ele arfou.

—Vai responder ou vai querer outro chute? – cuspiu o líder na cara do garoto.

—Eu ia levar isso para o velho Morgan. Eu... preciso que ele me conte uma história. – ele mediu as palavras antes de dizer. Não queria revelar o verdadeiro valor daqueles escritos.

Os arruaceiros apenas riram de novo.

—Como eu imaginei, não tem valor nenhum. Mas já que vocês parecem dar tanto valor pra isso aqui, vou ensinar uma lição a vocês pra que nunca mais mexam com a gente. – e com um sorriso terrível no rosto, o ruivo fez um sinal para que seus subordinados arrastassem eles para um precipício próximo dali.

Havia uma cachoeira dentro do território da Vila Nanke, que por milhares de anos escavara o solo criando um precipício muito alto.

Quando estavam quase à beira do penhasco, o ruivo parou e virou-se para os reféns.

—Vou dar uma chance para recuperar os seus preciosos pergaminhos – ele os amassou de qualquer jeito e enfiou-os dentro do diário – mas vocês vão ter que pegar.

Ele fez um sinal com a cabeça para os que prendiam Kallahari e Andreza e eles o soltaram. Antes que que o garoto alado pudesse avançar no pescoço do ruivo, o outro fez um movimento com o braço atirando os documentos precipício abaixo.

—NÃO! – berrou Andreza se colocando de pé e avançando para a beira do precipício.

Kallahari assistiu à tudo com os olho arregalados, completamente em choque. Quando ele jurou que a princesa se abaixaria para lamentar a perda dos documentos, ela se atirou no vazio atrás deles.

O grupo de arruaceiros parou de rir imediatamente, correndo desesperados para a beira do precipício.

—Ela é louca! – exclamou um deles, mas o filho da copeira não ouvia.

A visão da princesa se lançando atrás dos escritos se repetia sem parar na sua mente.

“Ela... Ela...”

Sem sequer tomar consciência do que fazia, ele correu abrindo espaço entre os valentões e se atirou atrás da princesa. O vento uivou em seus ouvidos, e ele tentou se equilibrar em meio à queda. A princesa estava cada vez mais próxima do rio abaixo deles, e mesmo que fosse pousar na água, não faria diferença. Ela se espatifaria de qualquer forma, e completamente em vão.

“Por que ela saltou? Ela é louca! Ela sequer sabe voar!”

O desespero começou a tomar conta do peito do garoto.

“E eu também não...”

Ele tentou esticar os braços para baixo, mas o vento o desequilibrava toda hora.  Ele fixou seus olhos esverdeados no vulto pequenino de Andreza afundando cada vez mais no espaço e desejou por tudo ter asas, ou pelo menos poder cair mais rápido para alcançá-la.

“Se as minhas asas... Se elas pelo menos... se abrissem...”

Mas não era tão simples. As asas de um alado normalmente apareciam por volta dos quinze ou dezesseis anos. Kallahari só tinha dez, e Andreza não passava dos cinco. O que ele poderia fazer?

Wooosh...

O uivo do vento o deixava praticamente surdo, e eles se aproximavam rapidamente da água. Faltava poucos segundos para o impacto fatal.

“Droga, droga!”

A queda estava no fim, e Andreza ainda estava completamente fora do seu alcance.

Eu... Eu só...

Vários pensamentos preencheram sua mente.  O rosto de sua mãe dizendo para que ele não se atrasasse para o expediente. Depois ela aparecia sorrindo ao encontra-lo estudando em seu quarto. Os rostos das várias outras cozinheiras do palácio passaram sorridentes diante de seus olhos.

“O que vai querer pra comer hoje, Hari?”

“Hari, fiz pudim de chocolate, seu favorito!”

Depois, vários flashes do que descobrira durante seus breves anos de vida surgiram, histórias incríveis que escutara sobre terras longínquas cheias de seres estranhos e incríveis ressoaram em seus ouvidos.

Ele tinha tanta coisa para fazer, tanto a explorar... Ele sequer realizara seu sonho de se tornar um arqueiro...

Algo aquoso umedeceu o canto de seus olhos. Kallahari chorava. Por que fora se meter naquela confusão estúpida?

“Eu só queria... Poder...”

Algo gelado envolveu seus pés, e a névoa produzida pela cachoeira engoliu os dois pequenos alados. Talvez eles sequer tivessem quatro segundos...

“É isso? Será que eu vou... morrer?”


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Notas finais do capítulo

E aí galera o que acharam?? Comentem, opinem, critiquem!
Ah, e não se esqueçam: se você é um leitor que não entendo do jogo está se sentindo meio perdido, pode dar uma olhada no meu tumblr que fiz exclusivamente para essa fanfic
http://fanficperfectworld.tumblr.com/ *-*
E não se esqueçam da sessão PAN! Pergunte À Nana-chan!
Vocês poderão deixar qualquer tipo de pergunta nos comentários, desde curiosidades sobre a fanfic até a cor da calcinha que estou usando! (brincadeira gente AUHSAUHSUAH) Caso a pergunta tenha relação com algum spoiler da história, eu responderei avisando que aquilo será esclarecido posteriormente.
As perguntas e suas respectivas respostas aparecerão nas notas finais do próximo capítulo, e serão respondidas no Tumblr também!
Muito obrigada meus leitores divosos!
Caso vocês queiram saber mais sobre o meu trabalho, curta minha página no facebook que abri recentemente com uma amiga que é uma artista maravilhosa: https://www.facebook.com/sayuuienanahoshi/
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Beijos da Nana-chan!



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