Night Visions escrita por Isaque Arêas


Capítulo 11
Round and Round


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo foi baseado em "Round and Round - Imagine Dragons": https://www.youtube.com/watch?v=JD92Ui_PWKQ



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O ser permaneceu parado na minha frente. Os olhos amarelos penetravam a minha mente. Eu não sabia quem era, mas podia sentir algum tipo de energia emanando dele. Ficamos nos encarando por alguns segundos. Ele não parecia sequer tentar me atacar e aquilo estava me deixando bastante confuso. Dei alguns passos para os lados, na tentativa de movê-lo. Ele me seguiu com os olhos. A sala, ainda que possuísse luzes instaladas e acesas no chão, continuava bastante escura. À medida que eu andava para a esquerda, ele andava também. Permanecemos naquela dança bizarra e covarde por algum tempo. Girando e nos analisando. Ele parecia me estudar.

Eu já estava cansado daquilo e finalmente entendi que não sairia da sala enquanto não o destruísse. Mesmo que não quisesse destruí-lo preferi tomar a atitude de confrontá-lo de vez. Corri em sua direção. Meus braços acenderam o vermelho intenso de meus raios e então disparei contra ele. Eu não entendi muito bem o que aconteceu, apenas o vi estendendo uma capa e à medida que o tecido subia e flutuava no ar a figura desaparecia e por fim meus raios não o atingiram. Até que senti um golpe vindo contra as minhas costas. Fui ao chão e quando olhei para cima pude vê-lo melhor... Ou melhor: vê-la.

Era uma mulher alta e magra. As luzes tornavam seu rosto mais pálido. Tinha os olhos amarelos. Seu rosto tinha traços finos e nobres. Usava uma tiara dourada, quase como um elmo bem detalhado, seu design percorria pela testa, se tornavam penas metálicas na altura dos olhos e desciam até as maçãs do rosto. Os cabelos negros eram curtos e estavam completamente jogados para trás, escorriam até o pescoço. Trajava uma roupa acinzentada como uma túnica e que se bifurcava na cintura fazendo parecer que era uma saia rasgada dos lados dando espaço para as pernas e uma capa longa com algumas penas também acinzentadas na região do pescoço. Parecia uma verdadeira rainha bastante calma e ao ver que eu continuava a observando não tentou nenhum golpe contra mim. Ela claramente parecia não querer me enfrentar.

Me levantei e novamente lancei uma rajada contra ela. Ela saltou e com um rodopio no ar me acertou com um chute, me lançando para o lado e para o chão novamente. Ela estava começando a me irritar e eu podia sentir o meu corpo recarregando. Eu lancei outro e outro raio em direção a ela, mas ela sempre conseguia encontrar um jeito de desviar deles. Era uma verdadeira acrobata e seu corpo parecia se movimentar como um elástico.

Parti para o combate corpóreo, mas ela bloqueava meus socos e chutes. Ela realmente estava mais preocupada em se defender do que em me atacar. Ela saltou e percebi que também poderia voar. Com um rasante ela veio em minha direção ao que acredito tê-la surpreendido quando voei desviando de seu golpe. Ela aterrissou e repentinamente suas mãos se iluminaram com um brilho cinzento. Seus braços e mãos pareciam dançar enquanto feixes de energia saíam de seus dedos como tentáculos que tentavam me derrubar. Quanto mais tempo eu ficava perto dela, mais ela parecia ser poderosa. Fugi de cada um dos tentáculos de energia voando, até que a garota desistiu da ideia e ao me ver ainda desnorteado no ar, se lançou em minha direção.

Ela agora me golpeava em nossa luta aérea. Eu conseguia bloqueá-la e ela também fazia o mesmo, ao passo que nenhum dos dois acertava de fato o outro. Em um momento a peguei desprevenida e consegui derrubá-la. Quando me preparava para finalizá-la com um de meus raios ela simplesmente pareceu ser absorvida pela sua capa e desapareceu novamente. Eu precisava dos meus instintos para encontrá-la, ou pelo menos tentar adivinhar onde ela reapareceria. O cheiro dela então a denunciou. Reapareceu atrás de mim e antes que ela pudesse reagir, a empurrei contra a parede. Com meu braço esquerdo pressionei seu pescoço e com o direito eu ameaçava lançar um dos raios contra seu abdome.

— Espere! — Ela disse enquanto tentava respirar — Você não precisa fazer isso! Eu sei como sair daqui — ela sussurrou.

Afrouxei o meu braço.

— Não, não pare. Eles estão nos observando! — sussurrou novamente.

Ela me golpeou na barriga, me lançando para trás.

— Como eu sei que você não está mentindo?! — Sussurrei para ela.

— Não posso garantir nada, apenas confie em mim — ela sussurrou de volta.

Dali em diante parecíamos coreografar nossa luta. Eu não a atingia com força, ela muito menos. E sempre que o ataque se tornava mais corpóreo, ela me contava sobre o plano.

— Eles estão nos observando. As paredes são transparentes para eles, mas não para nós. — disse ela.

— Você em um momento sumiu e reapareceu atrás de mim, por que não faz isso novamente e sai daqui?

— Não é assim que funciona... Já teria feito não acha? Suas ondas de energia podem nos tirar daqui?

— Eu disparei contra você naquele momento. Quando errei, elas bateram nas paredes, mas não pareceram surtir efeito algum.

— Talvez precisem de mais impacto.

Continuamos nossa luta falsa enquanto pensávamos no melhor modo de escapar dali.

— Já sei. — ela disse enquanto fingia me golpear na barriga — Conte até dez na sua cabeça. Eu vou me materializar atrás de você. Atire na minha direção sem dó.

— Mas e se te atingir?

— Já disse para confiar em mim — Ela sorriu e sumiu na minha frente.

Dez. Nove. Oito. Sete. Seis. Cinco. Quatro. Três. Dois. Um.

Respirei fundo, me virei e lancei a rajada na direção dela, que realmente estava materializada atrás de mim. Tudo se tornou um clarão vermelho e eu não conseguia mais vê-la. Quanto mais energia eu liberava, mais ela parecia surgir dentro de mim. O êxtase que a energia causava era maravilhoso e eu continuava lançando meus raios intensamente. Então ao fundo se ouviu:

— Tudo bem 675, já chega.

Aquilo era o sinal de que eu deveria continuar. Pensei que poderiam “desligar” meus poderes novamente, então lancei meus raios com ainda mais intensidade.

— 675 JÁ CHEGA! PARE COM ISSO!

— Alguém faça alguma coisa — disse uma voz no fundo.

Então pude sentir as paredes vibrando e ouvi o trincar delas em uma parte onde meus raios atingiam. Já não estava pensando direito, a energia falava mais alto que meus sentidos e minha mente e então, ao mesmo tempo, toda a parede oval que compunha a sala explodiu fazendo chover os pedaços do vidro e revelando uma saleta onde antes poderiam nos ouvir.

— Ótimo trabalho! — disse a mulher com quem antes eu lutava.

— Como você...

— Você tem seus truques. Eu os meus. Agora, me escute — ela se aproximou e colocou as mãos sobre o meu ombro — Nada do que eles disseram é real. Fuja daqui o mais rápido que você puder. Eu sei que você quer vingança, mas acredite em mim, não é o momento ainda.

Olhei seus olhos profundos.

— Você não entende. Eu não vou fugir dessa vez!

— Você precisa... Nós somos todos parte do mesmo jogo! Eles estão jogando conosco aqui! — Respirei fundo — Você sabe quem te fez mal?

— Eles.

— Errado. Seu problema não é com eles, eles são só cientistas sem senso de errado. O seu problema só está começando meu amigo radioativo. Matá-los não vai preencher o seu vazio existencial.

— E para onde você vai?

— Você quer se vingar da Fox Industries, não é o momento. Já eu... Tenho outras contas para acertar, bem mais específicas que as suas, a minha vingança sim é necessária — disse a garota sorrindo cinicamente e se afastando. Ela então girou sua capa e mais uma vez desapareceu.

Eu não fazia ideia de quem ela era ou porque estaria ali, mas decidi aceitar seu conselho. Estava tão cansado. Tudo que eu queria era ver Samantha novamente e se a mulher estivesse certa eu poderia ser morto ou pior: ser capturado novamente. Precisava encontrar a saída. Quando as paredes quebraram revelaram imensos paredões de concreto e a saleta por onde eles nos ouviam. Me aproximei dos paredões para tentar ouvir algo do outro lado, mas eram extremamente densos. Pensei em abrir caminho pelo teto, mas tive medo de mais uma vez aquela ser uma base subterrânea e acabar sendo engolido pelos escombros. Me restava a saleta de comando.

Ela ficava um pouco acima do chão onde eu pisava, quase que escavada no paredão de concreto. Voei até lá. Todos haviam fugido e do outro lado da porta que dava acesso ao resto da instalação eu podia ouvir o alarme soando. Abri a porta e me deparei com um grande corredor. Para que lado seguir? A sorte acabou me mandando para o lado direito. Enquanto eu caminhava podia ouvir os disparos. Provavelmente ela estaria lutando contra alguns daqueles homens. Fiquei imaginando o que a havia trazido até aqui. De qualquer forma não era hora de pensar nisso, precisava agir.

O corredor me levou até um hall com diversas entradas e repleto de seguranças, todos com seus trajes pretos parecidos com o que eu estava usando e com seus capacetes de raposa. Sei que havia dito que apenas fugiria, mas precisava enfrentá-los se quisesse que isso acontecesse. Mais uma vez meus braços brilharam e eu apareci na sala.

— Ei, idiotas! Por que não enfrentam a mim?!

Na mesma hora os disparos começaram, mas eu não me deixei ser atingido. Agora estava preparado para o que viria e sinceramente, percebi que havia me controlado demais quando estive em minha antiga casa, talvez houvesse sido pelos últimos incidentes com Samantha, mas agora nada iria me parar. Meu disparo se mostrou muito mais eficiente que o deles e um a um foram derrotados. Enquanto estava no meu êxtase de energia não percebi que fui atingido de leve no braço e também no abdome. O sangue começou a escorrer, mas eu precisava continuar.

No hall havia um pequeno mapa dos andares da instalação. Eu me encontrava no quinto subsolo. A saída mais próxima estava localizada cerca de seis andares acima. Eu não podia perder mais tempo. Agora que sabia para onde deveria ir e que tinha a certeza de que não estava coberto por solo poderia simplesmente atravessar os andares.

Me agachei para ganhar impulso e coloquei as mãos à frente para quebrar o teto quando passasse. A energia percorreu meus punhos. Saltei. Um dos andares foi furado, então outro e outro. Parei mais uma vez para ganhar impulso e então mais seguranças surgiram ali. Dessa vez eram diferentes. Eles trajavam uniformes brancos e tinham detalhes levemente em azul. Os uniformes também eram diferentes, pareciam mais resistentes e suas armas pareciam mais potentes. Eram apenas quatro deles, mas algo me dizia que não seria tão fácil quanto os outros.

Se deslocavam vagarosamente, me cercando na sala. “O que eu vou fazer? O que eu vou fazer?” eu pensava. Então apenas me deixei levar pelo que a energia faria. Da última vez que isso aconteceu eu explodi toda a instalação onde estava, mas agora eu sabia que poderia controlar melhor essa habilidade. Eu não imaginava o alcance das armas e nem mesmo seu impacto, então deixei a energia fluir. Senti meus olhos queimando juntamente com meus ossos. A energia começou a deixar meu corpo, ainda que não houvesse se dissipado em feixes eu podia sentir as ondas emanando através de mim, minhas veias se dilataram e aos poucos a sala inteira sentiu os efeitos. As luzes começaram a piscar e as armas a derreter e explodir. Antes que os homens fugissem minha mente pedia que eu me deliciasse mais uma vez com a morte de cada um e eu tentava bloquear aquele pensamento a qualquer custo. Tentava me lembrar do olhar de Sam quando descobriu que eu havia matado pessoas e aquilo pesou bastante no meu julgamento do que era certo e errado.

Todas as “raposas” se aproveitaram do meu momento de misericórdia e fugiram para longe, tinham medo de que eu as destruísse e eu achava aquilo ótimo, sem saber haviam tirado o peso da decisão que estava sob os meus ombros. Me agachei novamente e saltei furando mais um andar, outro e outro. Cheguei ao topo, agora só precisava encontrar a saída. Atravessei um pequeno corredor e cheguei a um hall de entrada, mal podia acreditar que finalmente sairia dali. A porta estava diante de mim, era uma porta de metal, como se estivesse escondendo algo altamente perigoso. Realmente estava. A princípio fiquei receoso de que pudesse ser uma armadilha e que assim que eu saísse mais alguns daqueles soldados me encontrassem, mas precisava arriscar... Era a minha liberdade que estava em jogo.

Eu a abri e, para minha sorte, não havia ninguém do outro lado. Acredito que a garota atraiu toda a atenção para si, eu torcia para que ela estivesse bem. Caminhei através da porta e me deparei com uma floresta. Eu não sabia se era a mesma floresta em que um dia eu estive, mas pelo menos estava fora do laboratório agora. As feridas já não sangravam mais, mas ainda doíam.

Corri floresta adentro com medo de que pudessem me perseguir. Quando me afastei um pouco resolvi dar um impulso e voar para longe. Aquela não era minha floresta, eu podia sentir isso, mas agora eu estava livre novamente e diferente da outra vez eu tinha um lar para onde voltar. Dessa vez eu não estava andando em círculos na floresta, eu estava disposto a buscar pela minha vida, eu iria até Samantha e diria o quanto eu a amava e o quanto precisava dela. Eu teria finalmente o controle. A mulher da instalação estava certa, nós somos partes do mesmo jogo, mas pela primeira vez na breve parte da minha vida que eu me lembrava, eu me tornava um jogador e não um mero espectador.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler mais um capítulo!
Bem, estamos realmente na reta final da história, espero que estejam curtindo os rumos que a história está tomando. Se quiser deixar um comentário ou sugestão fique à vontade. Não se esqueça de favoritar e indicar também :D