Novamente, como sempre, o moreno estava sentado no chão do quarto de Jason, enquanto o loiro mexia freneticamente no computador. Nico tinha toda a sua concentração em um livro, que estava apoiado em suas pernas. Ele gostava de ler, apesar de não ser tão viciado quanto seu amigo, e quando viu a resenha de Jason sobre aquele livro no site da escola, teve de dar uma olhadinha.

E, realmente, era muito bom. Não havia nem três horas que começara a ler e já estava na metade do livro. Era uma estória muito boa, onde estão havendo assassinatos misteriosos e a personagem principal se envolve depois que sua melhor amiga desaparece. O principal suspeito dela é um garoto que acabou de se mudar para a cidade e era seu parceiro de Química.

O personagem principal, a quem a garota culpava pelos assassinatos, era divertido, sarcástico e tinha atitude. Exatamente tudo o que Nico não era, e queria ser. Ele invejava garotos assim, que não tinham vergonha de falar o que queriam.

A porta foi aberta bruscamente por uma Thalia extremamente feliz. Ela tinha um papel em mãos e sorria como Nico, em todos esses anos, nunca tinha visto.

– Adivinhem quem conseguiu acertar todas as questões da prova!? - Exclamou animada, mostrando o papel, onde um grande dez em caneta vermelha estava rabiscado. Jason se virou na cadeira e sorriu.

– Parabéns, Lia. - Disse, calmo. Nico ainda pensava em como os dois irmãos podiam ser tão diferentes. Enquanto Jason era calmo, quieto e concentrado, Thalia era praticamente um furacão, fazendo barulho e bagunça onde passava, além de ser extremamente avoada. Mesmo assim, Nico conseguia gostar de ambos. Quem sabe, se não fosse tão tímido, ele e a garota não pudessem ser mais próximos?

Mesmo assim, sem contar suas irmãs, Thalia era o mais próximo de uma amiga garota que ele tinha, e ele se importava, mesmo que um pouco, com ela. Por isso, ficara feliz em saber que ela passou, apesar de não demonstrar.

Thalia sorriu para o irmão e olhou para Nico, abrindo ainda mais seu sorriso. Nico sorriu minimamente, parabenizando ela. Mas ele não esperava que ela fosse andar até ele, muito menos abraçá-lo. O garoto sentiu seu rosto fervendo.

– Obrigada! - Ela agradeceu. - Não fosse por você, eu provavelmente seria expulsa.

Jason segurou a risada, era engraçado ver seu amigo vermelho, o que acontecia com frequência e mesmo assim não perdia a graça, principalmente por causa dos motivos, sempre bobos na sua visão, sempre tão grandes na visão do pequeno.

Thalia se separou de Nico e sorriu para os dois garotos.

– O que acha de comemorarmos? - Perguntou, animada. - Podemos ir em alguma lanchonete, por minha conta!

– Eu tenho que trabalhar daqui a pouco, então não vai dar. - Jason explicou. - Desculpe.

– Entendo. - A expressão de Thalia passou para uma mais triste. - Vamos nos dois, então, Nico?

Nico ficou quieto, apenas olhando para a garota. Ainda estava sob o efeito do abraço, por isso demorou um pouco para entender o que ela estava pedindo. Francamente, onde ele apertava o botão para voltar para sua velha rotinha quieta? Estava prestes a inventar uma desculpa qualquer para não ir quando Thalia completou, um pouco sem graça:

– Eu vou entender, se você não quiser! - Ela olhou para o chão. - Mas eu estou tão feliz, não queria comemorar sozinha. E, de qualquer forma, estou te devendo uma.

Nico também desviou seus olhos para o chão, desejando que ela não houvesse dito essa última parte. Estava se sentindo culpado por pensar em negar, afinal, era uma conquista dela, e, além disso, não iria fazer nenhum mal. Por isso, antes que sua cabeça pudesse processar mais alguma coisa que o impedisse de ir, as palavras saíram de sua boca:

– Está tudo bem. - Olhou para Thalia, que o olhava espantada. - Eu não tenho nada para fazer, de qualquer forma.

~^~

Estavam em uma lanchonete não muito longe da casa da garota. Não era um lugar sofisticado, mas era aconchegante. Thalia insistiu em pagar, alegando que estavam comemorando algo que ela conseguira com a ajuda do garoto, e, por isso, ele merecia uma refeição de graça.

Nico estava calmo e quieto, como sempre, enquanto Thalia falava animada e gesticulava com a mão. Ela contava histórias sobre seus amigos, sobre Jason, sobre si mesma. Nico sorria de vez em quando, o mais próximo de uma risada que ele conseguia dar sem se sentir envergonhado.

Podia parecer que não, mas ele se sentia confortável na presença da garota. E, além disso, o que ela dissera no dia anterior não saía da cabeça do garoto. Ele pensava se ela realmente o achava bonito, ou se só dissera aquilo para que ele se sentisse melhor. De qualquer forma, ele gostava bastante dela, e também a achava bonita. Afinal, quem não achava?

Thalia parou de falar e Nico olhou para ela, curioso. A garota parecia triste aos olho do moreno, que não entendia o que tinha acontecido. Será que tinha feito algo de errado?

– O que foi? - Perguntou, preocupado. Thalia desviou os olhos.

– Me desculpe. - Pediu. Nico ficou ainda mais confuso. - Eu sempre faço isso, falo mais do que devia. Por isso meus amigos são tão distantes, por isso eu me sinto tão sozinha quando estou com tanta gente. Eu sempre acabo deixando alguém desconfortável.

Nico se surpreendeu. Não sabia que a garota tinha esses sentimentos, e se sentia culpado por não ter conversado direito com ela. Mas, ele ouvira cada palavra, e estava gostando, não estava desconfortável. Queria dizer isso a ela, mas não conseguia.

– Eu não devia ter pedido para que você viesse aqui, você provavelmente me acha irritante e grudenta. - Ela continuou. - Mas eu gosto de você, Nico. Acho seu jeito quieto e tímido adorável. Eu queria ser sua amiga, sabe?

Nico a olhava, sem conseguir dizer nada. Para ele era incrivelmente difícil digerir aquelas palavras, e, quanto mais pensava nelas, mais se sentia inseguro. E se houvesse entendido errado? O fato era que ele gostava dela, de verdade, e não queria vê-la triste.

– Não. - Conseguiu falar. - Eu não te acho irritante, eu gosto de você.

Thalia olhou-o surpresa, seus olhos molhados e uma lágrima caiu de seu olho. Nico sorriu para ela.

– Eu sei que parece que eu não estou interessado, mas eu estou! - Explicou, aumentando um pouco a voz, se arrependendo logo em seguida. Ele corou e desviou os olhos. Realmente não era bom com palavras. Thalia riu e ele olhou para ela novamente, ela parecia muito feliz e o garoto ficou confuso novamente.

– Você está falando sério? - Perguntou. - Eu não te incomodo?

Nico negou com a cabeça. Ela sorriu, aliviada.

– Isso é bom de ouvir. - Ela falou. - Desde que você e Jason se tornaram amigos eu tentei me tornar uma pessoa diferente, menos barulhenta, porque eu sempre te achei interessante. Quando éramos pequenos eu ficava olhando vocês dois brincarem, eu gostava do jeito que você nunca parecia estar interessado em nada, mas, mesmo assim, estava. E isso não mudou nada, mesmo agora, que estamos mais velhos, eu ainda quero ser sua amiga. Mas você e Jason são sempre tão silenciosos e concentrados, você em jogos e livros, ele no computador, e eu não consigo me prender a pequenas coisas.

"Por mais que eu sempre tentasse chamar sua atenção, você nunca parecia realmente interessado em mim. Sempre distante, eu sempre achei que eu fosse extremamente irritante para você, do tipo que você tenta se manter longe, entende?"

Nico olhou para ela, que secava as lágrimas. Ela o olhou e ficaram assim por um tempo, preto no azul, azul no preto.

– Nico, como você me vê? - Ela perguntou. Nico se surpreendeu um pouco, então começou a pensar numa resposta.

Talvez fosse esse o motivo de ele ser tão inteligente, ou pelo menos, de ele sempre tirar boas notas. Nico sempre pensava o máximo que podia antes de responder a algo, sempre deixando sair menos do que ele pensara, sempre medindo as consequências de cada palavra. E, aquela questão em particular, necessitava de muito tempo de reflexão. Ele queria ser sincero, de um modo que não a deixasse triste, e de modo que ele não se sentisse constrangido.

Ele sempre a viu como uma garota extraordinária, um tipo de pessoa que ele sempre quis ser. Alguém alegre, que não tem medo de falar, muito parecida com o personagem daquele livro. Além disso, ela sempre foi muito esperta, e muito ágil. Quando eram pequenos, enquanto ele e Jason brincavam sentados na grama do parquinho, Thalia subia e descia nos brinquedos, além de correr por aí, o que sempre rendeu muitos machucados.

Ele queria dizer que a via como uma irmã, mas não era exatamente isso. Era diferente o seu "gostar" para Thalia e o seu "gostar" para Bianca e Hazel. Queria dizer que a via como amiga, mas também era diferente do seu "gostar" de Jason.

Sua mente vagou para os inúmeros livros que ele lera. Pensava sempre sobre o "gostar" dos personagens sobre as pessoas a sua volta, tentando encaixar Thalia em algum deles. Se lembrou de uma estória que lera algum tempo antes, sobre um garoto que conhecia a garota a um bom tempo, mas os dois não se falavam muito, até que se aproximaram e os seus sentimentos de "gostar" sobre ela se confirmaram.* Era exatamente ali que Nico poderia encaixar Thalia, nesse "gostar" que um dia possa vir a ser um "amar".

Olhou para ela novamente. Como ele diria aquilo? Se dissesse, provavelmente nunca mais conseguiria olhar para ela. Mas, por outro lado, ele resolvera que seria totalmente sincero com a garota. Por isso, sua decisão estava tomada. Suspirou profundamente antes de respondeu.

– Eu não sei como explicar isso deixando totalmente claro. - Ele tentou iniciar. - Eu... gosto de você. Não um gostar de amiga, não gostar como gosto de uma pessoa qualquer, não gostar como irmã. Eu gosto. É o tipo de gostar que não tem explicação.

Thalia refletiu sobre as palavras dele por um tempo, enquanto se encaravam. Ela ficou extremamente quieta. Nico geralmente gostava do silêncio, o permitia pensar perfeitamente e era acolhedor, mas aquele silêncio era do tipo que você torce para que seja quebrado logo. No entando, ele não ousaria fazê-lo.

Estava tão perdido em suas inseguranças sobre ter sido claro o suficiente ou não, que só percebeu que Thalia tinha se debruçado em cima da mesa quando sentiu a gola de sua camisa sendo puxada para frente e seus lábios colados aos dela. Tão rápido quanto começou, o beijo acabou. Thalia se levantou e saiu correndo, deixando, propositalmente, um papel em cima da mesa.

Nico olhou o papel, lendo o que estava escrito nele, e olhou para trás, para a direção onde Thalia tinha corrido, com um sorriso abobalhado no rosto.

"Eu também gosto de você."