Kitty's Pride escrita por Bree


Capítulo 13
Uma aproximação perigosa


Notas iniciais do capítulo

Depois de alguns anos de hiato, resolvi dar mais uma chance a história de Kitty e terminar as suas aventuras. Espero que gostem.



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Não haveria mais tempo para pensamentos idiotas. Assim que deixou a carruagem a jovem avistou Audrey, com um belo sorriso no rosto e vestindo uma linda peça de cetim. Kitty não pôde evitar sorrir de volta ao cumprimentar a anfitriã.

— Srta. Kitty! Já estava imaginando se teria desistido de nós. – Observou Audrey, divertida, agarrando Kitty pelo braço sem grandes cerimônias. – Venha. Colocamos uma mesa no jardim. – Chamou a moça. Kitty lançou um olhar ao primeiro andar da propriedade, e notou que alguém as observava pela fresta da cortina. Sem tempo para identificar o indivíduo, foi guiada por um acesso lateral até o local onde seria servido o chá. A mesa estava enfeitada como que para uma grande festa. Havia muitos doces já servidos e uma criada dava os últimos retoques nos arranjos de margaridas. Kitty fez uma nota mental para procurar saber o quão caro teria sido conseguir margaridas naquela época do ano.

Houve um breve momento de silêncio e logo uma risada feminina e familiar preencheu o outro lado do jardim. Kitty percebeu com um amargor estranho na garganta que Georgiana caminhava ao lado de Sebastian. Sebastian. Sim. Muito mais informal que na noite passada, com algumas olheiras certamente produzidas pela ressaca e sorrindo como um menino. Algo revirou no estômago de Kitty. Eles quase andavam ombro a ombro, o que fez a jovem Bennet desviar o olhar para manter o pouco da dignidade e sentido. Mas não antes de ser flagrada por Audrey, que lhe lançou um sorriso curioso. Kitty corou violentamente.

— Kitty! – Exclamou Georgiana. Fazendo com que Sebastian finalmente as notasse ali e pousasse seus olhos claros em Kitty. O sorriso do cavalheiro se alargou, como uma criança que encontra um brinquedo perdido depois de muito tempo. Kitty mal pôde pensar em quantas frases ele estaria formulando naquele momento.

— Georgia! – Ela conseguiu dizer em resposta, adiantando-se para abraçar a amiga. Ela engoliu em seco, olhando para Sebastian por cima do ombro de Georgiana. – Que bom que está aqui! – Sussurrou à amiga. A sua frente, o homem mexia os lábios para formular uma frase silenciosa que fez Kitty querer lhe dar uma bofetada. “Bem-vinda, Kitty.’’

A jovem Bennet percebeu com pesar, ao seguir os outros para a mesa, que em apenas um dia ela e Sebastian haviam se tornado cúmplices de alguma coisa. Ela não sabia direito o que era, mas sabia que aquilo estava implícito no sorriso que o cavalheiro lhe deu. Além do fato de ser extremamente informal e até descortês na presença dela e não na frente dos demais, Kitty não via nada de muito importante que pudesse ter conduzido os dois até ali. E ainda havia aquela sensação estranha ao ver Georgiana rindo ao lado dele. Que diabos seria aquilo? A jovem suspirou e garantiu para si mesma que não passava de um instinto protetor, já que Sebastian dificilmente seria a companhia ideal para uma donzela. Infelizmente, seu interior ria dela. Kitty era, no fundo, egoísta.

Dispuseram-se com grande espaço na mesa redonda e bem ornamentada. Sebastian ocupou um lugar à sua direita, entre ela e Georgiana, enquanto Audrey sentava-se a sua esquerda. Com um sinal de mão, Audrey pediu que um dos criados trouxesse os primeiros aperitivos daquela tarde. Kitty agradeceu com um sorriso quando o homem lhe serviu uma fatia generosa de bolo de limão. Naquele instante, um amontoado de coisas lhe enchia a cabeça. Mas a mais importante delas era: porque Georgiana não havia dito que viria? Kitty balançou a cabeça levemente enquanto o chá era servido. Certamente a amiga não havia tido tempo. 

Ergueu os olhos na direção de Sebastian, por mera curiosidade, e para sua surpresa, ele não estava mais olhando para ela. Compartilhava um assunto com Georgiana, e logo inseriu as outras duas jovens na conversa.

— Estava aqui dizendo ao Sr. Höwedes o quão belo foi o baile de ontem. – Começou a Srta. Darcy. – Até Albert Walters se divertiu. – Disse ela, fazendo Kitty parar o garfo no caminho até a boca e pousá-lo novamente no prato.

— Os Walters estavam aqui? - Ela perguntou por reflexo, sem se lembrar de ter visto qualquer rastro de Albert ou seus pais. Era quase impossível passar despercebido em um baile como o passado, mas eles haviam conseguido. Isso ou, Kitty percebeu com tristeza, ela estava ocupada demais se escandalizando com o novo vizinho. Sebastian, por sua vez, não deixou passar o interesse de Kitty pelo assunto. Ele ergueu uma sobrancelha e voltou-se para Georgiana.

— Albert Walters? – Perguntou ele, com um belo semblante de divertimento inundando o seu rosto.

— Sim. Uma família adorável. Albert é um amigo estimado de Kitty. Embora Lady Walters torça pelo matrimônio dos dois. – Explicou a amiga, fazendo com que Kitty corasse e desejasse desaparecer. Para tristeza geral, Georgiana se tornava uma tagarela quando estava contente e confortável.  

— Georgiana! – Repreendeu Kitty, por reflexo. A jovem Bennet percebeu quais eram as intenções da amiga. Era como um pesadelo, ver as palavras de sua mãe saindo da boca de Georgiana. – Isso não é verdade!

— Certo então. – Concordou Georgiana, com uma risadinha.

— Não. Não. Devemos debater. A Srta. Bennet mente. – Disse Sebastian, teatralmente, lançando um olhar demorado a Kitty. – Prossiga Srta. Darcy.

— Eu? Mentirosa? – Interrompeu Kitty, antes que Georgiana tivesse a chance de falar. Diferente da noite passada, Kitty estava envergonhada demais para levar as brincadeiras de Sebastian com bom humor.

— Por favor, não importunem Kitty. – Pediu Audrey, tentando dizer algo suave e apaziguador. Infelizmente, aquilo era quase impossível.

— Essa não foi minha intenção. – Garantiu Sebastian, enquanto os criados serviam o resto dos pratos e os deixavam a sós. – Apenas fiquei curioso sobre a identidade de um cavalheiro tão afortunado a ponto de conquistar sua amizade e, quem sabe, sua mão, Srta. Bennet.

— É o herdeiro de um Lord e uma boa pessoa, mas no que se refere a minha mão, não posso opinar. Tal possibilidade não é discutida. – Disse ela, mantendo a calma e olhando para suas unhas.

— Lady Walters já escolhe as toalhas do jantar de noivado, devo dizer. – Disse Georgiana. Era quase como se ela e Sebastian tivessem firmado algum pacto secreto antes de sua chegada. Kitty sentiu-se enjoada diante da possibilidade. Não respondeu nada, dando espaço para que o cavaleiro continuasse.

— É terrível, então, que não tenhamos estendido o convite para este chá ao bom Sr. Walters. – Comentou, bebendo de seu copo pela primeira vez. Kitty se permitiu assumir que o conteúdo do copo não era um simples chá. Ergueu os olhos para Georgiana atrás de socorro, e encontrou um olhar arrependido da amiga.

— O Sr. Walters é dono de uma boa oratória, teria sido um acréscimo valioso, sem dúvida. – Disse Kitty, por obrigação.

— Um homem feliz, além de bom orador. Ser elogiado assim pela dama que tem em alta conta. Posso assumir que é uma boa amiga, Srta. Bennet? – Questionou Sebastian, malicioso.

— Sim, pode. E não se surpreenda. Sou tola a ponto de tecer elogios a todas as criaturas que respiram. – Disse Kitty.

— Duvido muito, minha cara Srta. Bennet. – Começou o jovem. – Pelo meu curto tempo de observação pude notar que é bem sincera.

— Não tão sincera quanto o senhor. É uma qualidade que não assumo por completo. – Disse Kitty, lembrando-se da conversa que tiveram na noite do baile e sobre como o cavalheiro havia enumerado suas supostas qualidades. Audrey e Georgiana se entreolharam, mas a irmã de Darcy não pareceu notar nada de especial. Kitty presumiu, é claro, que Audrey conhecesse bem o espírito do primo, a ponto de não se surpreender com a possibilidade de aquela conversa carregar um significado particular.

O restante do chá foi vivido com alívio por Kitty. Ela e Albert não tornaram a ser o assunto principal, e houve espaço para algumas discussões literárias e narrativas sobre Berlim. O bom humor da jovem Bennet só se alterou quando a Sra. Höwedes cruzou o jardim. Não sabia o que sentir em relação a ela, mas ficou admirada ao ver que a mulher tinha as mãos sujas de terra. Disse aos jovens que se distraíra cuidando do novo jardim, e não fez uma parada demorada. A mesa foi retirada e os quatro amigos em potencial se levantaram para um passeio. A configuração não poderia ser diferente: Sebastian seguia na frente conversando com Georgiana e Audrey e Kitty vinham logo atrás. Kitty garantiu para si mesma que o homem não faria nada de mal a sua amiga. Não havia grande motivo para desconforto. Deixou que os dois tomassem distância e se distraiu em uma conversa.

Audrey Höwedes era uma moça muito inteligente. Ao contrário do que acontecia em muitas ocasiões, Kitty realmente estava ouvindo o que saia da boca da companheira. Poucos minutos depois a primeira metade do grupo se estabeleceu sob um grande carvalho. Georgiana alegava estar cansada, e todos concordaram em parar para descansar os pés. As damas tiraram seus chapéus e se sentaram da forma mais graciosa possível. Kitty, mesmo com os ventos do inverno, sentia o suor escorrer pelo seu pescoço, encharcar seu lenço e descer sobre seu busto. A sensação não era das melhores, e ela mal podia prestar atenção no que os colegas diziam. Sebastian estava no meio de uma frase animada direcionada a Georgiana quando Kitty desprendeu o lenço. O movimento era simples, mas fez o homem perder as palavras. Ele pigarreou uma vez, tentando não ser flagrado pelas outras duas damas, enquanto Kitty inocentemente puxava o lenço, relevando sua pele pálida irritada pelo calor. Um momento breve de contemplação, em que Kitty inclinou a cabeça para trás em busca de ar. Sebastian acompanhou o movimento com interesse obscuro escancarado em seus olhos, mas teve força para terminar o pensamento de forma satisfatória. Mais uma vez, Georgiana pareceu não notar nada, mas Audrey teve de esconder um sorriso com a mão enluvada.

Kitty por sua vez só percebeu o perigo quando era tarde demais. Ela usava uma mão pra se abanar, enquanto as colegas conversavam entre si, e notou que Sebastian a analisava minuciosamente. Seu rosto corou em resposta, mas não pareceu ser suficiente para chamar o jovem de volta ao seu juízo. Ele permaneceu parado, sério, e só depois de alguns segundos de desconforto voltou a participar da conversa. Kitty fez o possível para interagir, mas estava estranhamente abalada. Não era raro ser admirada por um ou outro cavaleiro, mas não da forma imprópria com que Sebastian a fitava. Aquilo era íntimo e visceral. Com alívio, seguiu Audrey quando a jovem sugeriu que voltassem ao seu trajeto. Deixou os outros dois mais uma vez sozinhos, pois era mais seguro não encarar o cavalheiro por hora. Antes que as terras de Ottercrow acabassem os jovens fizeram o caminho de volta. A Sra. Höwedes esperava a todos com uma deliciosa limonada, que Kitty aceitou com prazer.

— Devo insistir que fiquem para o jantar. – Disse a Sra. Höwedes. – Poderão partir ainda em um bom horário, sei que seus irmãos não se incomodarão.

— Agradeço, senhora, mas devo declinar. – Respondeu Georgiana. Kitty quase sorriu, pois sentia que o convite tinha sido feito especialmente para a jovem Darcy.

— E quanto a você, Srta. Bennet? – Perguntou Sebastian, capturando a atenção da tia. Kitty perdeu as palavras por um segundo, fitando o olhar do cavalheiro pela primeira vez desde o momento confuso durante passeio.

— Não quero incomodar de forma alguma. Além disso, preciso de um bom banho. – Disse a garota, tentando sorrir. As outras damas se limitaram a rir com ela, mas Sebastian parecia possuir sua própria piada. As duas convidadas foram levadas até a frente da casa, Georgiana tomou a carruagem primeiro, com a ajuda de Sebastian, de quem se despediu de forma entusiasmada. Era claro que a aproximação dos dois agradava a Sra. Höwedes, que se despediu de Kitty e sequer teve a cortesia de esperar pela carruagem da moça. Audrey tomou as mãos de Kitty nas suas e não segurou um sorriso sincero.

— Foi maravilhoso tê-la aqui, Kitty. Alegrou minha tarde. – Disse.

— Sou muito grata pelo convite. Sua mãe não me deu a oportunidade, mas quero convidar a todos em nome de minha irmã para uma reunião tão agradável quanto essa em Goldenshaw. – Disse Kitty. Audrey ficou muito contente, quase dando pulinhos de alegria. A carruagem dos Bingley parou de forma silenciosa, e Kitty se adiantou para ela como se ela fosse sua única esperança de vida. Alguns poucos passos e ela estaria livre. Mas antes que ela pudesse se refugiar, a mão de Sebastian alcançou sua cintura.

— Permita-me, senhorita. – Disse ele, surrando para ela. Kitty perdeu o pouco ar que tinha. Sebastian tinha as mãos sem luvas, e cuidou de pousá-las de forma estratégica, com a desculpa de ajudá-la a subir na carruagem. Mas não havia nada desinteressado ali. Kitty sentiu que os dedos do jovem se movimentavam de forma indecente mas quase imperceptível. O rosto do jovem estava próximo ao de Kitty, mas ele tinha o cuidado de olhar em outra direção. Não precisava dos olhos para intimidá-la. A jovem se apoiou no pé direito e deu impulso, Sebastian deixou que a mão pousada sobre o estômago deslizasse pela lateral do corpo dela, deixando-a ainda mais escandalizada. A porta da carruagem se fechou, mas os olhos de Kitty ainda estavam bem abertos, fixos no rosto calmo de Sebastian. O comportamento dele havia sido mais que leviano, mas ele parecia satisfeito. Um sorriso brotou em sua boca quando a carruagem de Kitty começou a se deslocar com a moça atônita, e seus olhos acompanharam os dela até que a visitante sumisse de vista.

 


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