Visionária escrita por Jafs


Capítulo 2
Novos amigos, velhos inimigos




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Kyouko estava estirada no sofá com um pirulito na boca, observando pela janela do apartamento o céu aberto e ensolarado de uma tarde de sábado. Apesar disso, o dia estava frio o suficiente para ela ter que vestir um suéter de lã, com listras vermelhas e brancas, assim como uma calça jeans.

“Como está o meu cabelo?”

A pergunta forçou Kyouko a virar sua cabeça e ver Mami, ainda em seu uniforme da escola, passando a mão em seus grandes cachos.

A ruiva voltou a olhar para janela, respondendo com certo fundo de rancor. “Amarelo.”

Aquilo não agradou Mami nem um pouco. “Kyouko...”

Kyouko voltou a se virar para Mami, dessa vez sem esconder a raiva. “Eu já disse o que eu acho. Convidar elas pra vir pra cá é estupidez.”

Mami esmoreceu, achou que aquele assunto já estava resolvido. “Elas também não estão mais recebendo visitas do Kyuubey. Faz sentido que ele não queira mais contatar eu e você, mas elas? Agora sabemos que deve ser outra coisa.”

“É!” Apesar de concordar, Kyouko continuava em tom ríspido. “Só que se aquela lá tem algo pra dizer, que contasse tudo e pronto.”

“Mikuni-san disse que era algo que precisaria ser discutido.” Respondeu Mami.

Kyouko balançou a cabeça. “Estou te falando, isso é roubada das grandes.”

“Ela foi muito cordial.” Mami continuou. “E se elas quisessem tentar algo, a melhor oportunidade seria ontem, pois nem tínhamos purificado nossas gemas. Além disso, aqui ela estaria arriscando chamar a atenção da vizinhança.”

Kyouko arrancou o palito da boca e mastigou o que havia restado do pirulito com raiva.

Mami sorriu, mantendo sua compostura. “Por que não me conta a história que você tem com elas, talvez isso faça eu mudar de idéia.”

Kyouko virou a cara, respirando com força, quase bufando.

Mami fechou os olhos. “Bem...”

A campainha tocou.

“Ah! Elas já chegaram.” Mami contornou a mesa de vidro triangular e tirou o palito da mão da Kyouko.

“Ei!”

“Vá atender elas Kyouko. Eu vou na cozinha preparar algo rápido.” Mami saiu com pressa, dando as costas. “Não tive tempo para fazer compras. Procure ser educada, ok?”

Kyouko esfregou olhos. “Que saco.”

A campainha toca novamente.

Suspirando, Kyouko saiu do sofá em um salto e caminhou até a entrada. Ao abrir a porta, se depara com os tão esperados visitantes.

Oriko vestia um uniforme escolar. Contudo, diferente da escola de Mitakihara, era bordô, incluindo a saia, com detalhes brancos. Havia um laço preto amarrado na gola. Uma chuca branca prendia seu longo rabo de cavalo que pendia para o lado esquerdo.

Kirika, a primeira vista, parecia estar usando o uniforme de garota mágica devido a sua jaqueta preta sobre uma camisa branca com gravata. Porém estava usando uma saia rosa shock com listras brancas. Também havia rosa na sua meia calça, que ela estava usando somente na perna esquerda. Em uma tira amarrada na cintura, ela tinha um porta celular com a aparência de um gato de pelúcia.

Entre as duas, estava Yuma, com vestido verde escuro. Seu cabelo tinha dois clipes com bolas douradas, um em cada lado, formando tranças.

“Oh... Sakura-san.” Oriko falou calmamente. “Podemos entrar?”

Kyouko fez uma careta. “Se eu disser que não, vocês vão embora?”

“Eu ouvi isso Kyouko!”

A ruiva revirou os olhos ao ouvir a súbita voz da Mami vindo do fundo do apartamento.

“Receba elas, por favor!”

“Ouviram, né?” Kyouko disse para as visitantes em um tom cansado. “Vocês são bem vindas aqui...” E deixou o caminho livre.

Colocando a mão nas costas da Yuma, Oriko guiou a menina para dentro do apartamento. Ela logo encontrou o local para deixar os sapatos. “Aqui Yuma.”

Logo atrás delas estava Kirika, que aproveitou para dar uma piscadela para Kyouko, acompanhada do som de dois estalos que ela fez com a língua no céu da boca.

Kyouko rangeu os dentes, enquanto fechava a porta. Quando se virou, Oriko e Yuma estavam olhando para ela. “Que foi?”

“Nada.” Disse Oriko, fazendo um ligeiro recuo diante daquela rispidez. “Apenas estamos aguardando você nos mostrar o local.”

“Ah é. Vem comigo.”

As quatro garotas foram até a sala onde havia o sofá e a mesa de vidro baixa ao centro.

“Vocês podem aguardar aqui.” Disse Kyouko.

“Obrigada.” Respondeu Oriko. Nessa hora ouviu-se o som de um liquidificador. “Tomoe-san está na cozinha?”

Kyouko estava indo em direção a uma estante da sala, onde estava um celular. “É. Ela não perde a chance de preparar algo pras visitas.”

“Posso vê-la?”

Kyouko já estava distraída com o celular. “Se ela deixou vocês entrarem no apartamento, por que não?”

“Claro...” Após concordar, Oriko voltou sua atenção para Yuma. “Fique aqui e se comporte bem.”

“Uhum.” Yuma olhou de relance para a garota ruiva com uma expressão de receio. “Eu vou ficar com papa.”

Aquela afirmação fez Kyouko tirar os olhos do celular por um momento.

Kirika se intrometeu. “Amorzão, pode ficar tranqüila quanto a Yuma. Não vou tirar os olhos do meu amorzinho.”

Oriko veio com um olhar de suspeita.

“O que foi?” Kirika ficou curiosa.

“Eu acho que Yuma que não deve tirar olhos de você.”

“Hãããã? Euuuu?!” Kirika ficou boquiaberta, colocando as mãos sobre o peito como se tivesse levado uma flechada. “Como pode pensar isso de mim? Eu sou uma santa!” [A não ser que aquela ruivinha tenha um chilique.]

[Então não a instigue.] ”Ótimo.”

Após dar a resposta, Oriko se dirigiu ao local de onde havia originado o som. A cozinha era próxima da sala e não era muito espaçosa, porém bonita, com azulejos amarelos com desenho de flores combinando com o conjunto de armários.

Próxima ao fogão, Mami estava prestes a usar a manteiga para untar a frigideira quando se deu conta da pessoa que estava na entrada. “Oh? Oriko Mikuni-san?”

“Peço perdão pela minha intrusão.” Oriko caminhou pela cozinha, passou por Mami e empurrou a jarra do liquidificador.

Mami estranhou aquilo.

“A jarra estava muito próxima da beirada, podia cair a qualquer momento.” Disse Oriko.

“Verdade?” Mami franziu a testa. “Nem notei. Obrigada. Você é bem cautelosa.”

“Eu apenas percebi, por sorte.” Oriko examinou o avental que Mami vestia, de cor verde desbotada com um grande bolso azul com bordas vermelhas. Ela não conseguia tirar da cabeça de que aquilo estava sorrindo para ela. “O que você está preparando? Se precisa de alguma ajuda...”

“Ah... não precisa.” Mami gesticulou. “São panquecas, é fácil.”

“Oh.” Oriko ficou olhando para o conteúdo da jarra.

“É para acompanhar o chá.” Logo após dizer isso, Mami teve um leve sobressalto. “Nossa, nem perguntei se vocês queriam chá. Eu devo ter um pouco de café...”

“Lá em casas todos gostam de chá.” Oriko levou a mão ao peito. “Eu mesmo diria que tenho um vício.”

“Você também? Haha.” Mami ficou mais aliviada. “Eu não consigo passar um dia sem uma boa xícara.”

Oriko olhou novamente para jarra.

“Hum?” Mami ficou curiosa com aquilo.

“É que...” Oriko ponderou por um momento antes de continuar. “Você disse que panquecas são fáceis, mas eu nunca consegui acertar a receita. As minhas ficam com aspecto de borracha.”

“Uhum...” Mami ficou cutucando o queixo. “Você deve estar colocando mais farinha.”

Oriko balançou a cabeça, concordando. “Eu tenho medo que elas quebrem, então eu deixo elas mais grossas.”

“Se quiser que elas sejam mais grossas, tudo bem, mas...” Mami pegou um ovo. “É uma questão de proporção. Para cada xícara de farinha a mais que você colocar, vai precisar de mais um desses, assim como leite e manteiga.”

“Mas eu acho que não chego a colocar mais uma xícara.”

“Você deve medir.” Mami colocou o ovo de volta no lugar. “Por exemplo, se usar meia xícara de farinha, usa metade do resto. Bata o ovo em uma travessa separada para poder dividir, você pode aproveitar o resto para uma outra receita.”

“É?” Oriko ouvia atentamente.

“Claro.” Mami abriu uma das portas do armário e pegou o saco de farinha. “Vou até fazer elas um pouco mais grossas para te mostrar.”

/人 ‿‿ 人\

Enquanto se podia ouvir o som da fritura vindo da cozinha, Kyouko estava sentada sobre uma almofada no chão. Ela se debruçava sobre a mesa de vidro enquanto jogava no celular. Pelo canto do olho ela via que Yuma estava sentada no sofá, mãos juntas ao corpo e balançando as pernas, seus olhos azuis focados no que ela estava fazendo. Aquilo trazia uma sensação de desconforto para Kyouko.

Kirika fazia o reconhecimento do lugar. Caminhava pela sala, examinando a decoração, passando a mão e sentido a textura dos móveis. Até que algo captou seu interesse.

“Essa então é a família dela.” Kirika segurava um porta retrato.

Kyouko virou-se para Kirika com uma expressão de fúria. “Bota isso de volta!”

“Nossa!” Kirika colocou o que estava segurando no lugar. “Pelo visto acordou no lado errado da cama hoje...”

Perdendo completamente a vontade de continuar, Kyouko fechou o jogo e deixou o celular sobre a mesa. “Por que você não fica quietinha ali no sofá também? Hein?”

“Porque é um tédio.” Kirika então sorriu para Yuma. “Você já me conhece, não é amorzinho?”

Yuma abaixou a cabeça e sorriu também.

“Tch...” Kyouko procurou ajeitar o laço que prendia seu rabo de cavalo, mais por nervosismo do que por necessidade. Foi então que ela se lembrou de algo. “Ei. Seu cabelo não era roxo não?”

“Eu cheguei a pintar dessa cor?” Kirika ficou olhando, tentando se lembrar.

“Você pinta o cabelo?” Kyouko indagou.

“É claro! Por que sempre ter a mesma cor? Que sem graça. Apesar que agora estou com o meu cabelo original, ainda não decidi qual vai ser a minha próxima cor.” Kirika puxou uma mecha de cabelo. “Estava pensando também em colocar uma tatuagem.”

“Sério?” Kyouko fez uma careta.

“É.” Kirika apontou para o seu próprio peito. “Eu queria colocar o nome dos meus amorecos aqui, bem pertinho do coração. O que acha?”

Kyouko ergueu uma das sobrancelhas como resposta.

“Kyouko.” Mami surgiu pela porta da cozinha. “Poderia ajudar arrumar a mesa para nós, está quase pronto.”

“Certo.” Kyouko ficou de pé e foi até a cozinha, sem tirar os olhos da Kirika.

/人 ‿‿ 人\

Yuma pegou com o garfo uma panqueca inteira, coberta com xarope de milho, e empurrou boca adentro.

“Yuma!” Oriko, que estava sentada ao lado, puxou um lenço do bolso do seu uniforme. Ela começou a esfregar com força para limpar as bochechas lambuzadas da Yuma, que estava ainda de boca cheia. “Não tente colocar algo maior que a sua boca. Para isso que serve a faca.”

Com os olhos fechados, devido toda aquela esfregação, Yuma se esforçava na mastigação. Depois fez mais força para engolir. “É que é muito boooom.”

Assim como as duas, as outras garotas também estavam sentadas em almofadas próximas da mesa.

“Huhu.” Disse Mami, sorrindo. “Eu diria que esse foi o resultado de um esforço conjunto.”

“Não é verdade. Eu mais recebi uma lição do que ajudei.” Oriko estava dobrando o lenço que havia usado. “Não posso deixar de ressaltar também que o seu chá preto está excelente.”

“Sim, mas eu acho que o do meu amorzão é o melhor.” Kirika complementou.

“Aham. Esse seu ‘amorzão’ deve ser a melhor em tudo.” Kyouko comentou enquanto colocava mais uma panqueca em seu prato. “Heh. Você agora chama ela assim e a outra aí de ‘amorzinho’.”

“Verdade.” Kirika concordou. “Meu amor por Oriko é tão intenso que, quando Yuma surgiu em minha vida, eu passei por um dilema. Poderia dedicar meu amor a ela também?”

Kirika se levantou, para a surpresa das outras.

“Mas logo vi que era tolice pensar dessa forma. As pessoas dizem que devemos espalhar o amor.” Kirika abriu os braços e levou as mãos ao alto. “Isso é tão idiota! Não precisamos dividir, nós podemos criar mais!”

Mami estava boquiaberta diante daquilo. Oriko apenas se encolheu, fechando os olhos e levando a mão à face. Yuma estava com olhos vidrados em Kirika, com um largo sorriso.

A garota que estava de pé pousou a mão no peito. “Sabe quando nosso coração se expande a cada batida? É o amor querendo sair, querendo nascer! Devemos dar à luz e trazer algo que tanto falta nesse mundo.”

“Bwahahaha!” Kyouko desatou a rir. “Continua esse papo aí, criançola.”

“Kyouko...” Mami alertou.

O olhar de Kirika cresceu. “Você... me chamou de criança?!”

“Kirika! Senta!”

Kirika simplesmente caiu sobre a almofada com a ordem da Oriko.

Suspirando, apertando os lábios, Oriko falou. “Sinto muito pelo que testemunharam. Kirika é imatura...”

“Eu não...” Kirika cruzou os braços e fez bico.

“...algumas vezes.” Continuou Oriko.

“Ah...bem...” Kirika sorriu. “Pode ser. Quem não é, né?”

“Contudo devo agradecê-la por fazer me lembrar. Eu me deixei levar pelo momento e ainda não tratei o assunto pertinente.” Oriko terminou de dizer com um olhar sério.

“Ah! Finalmente.” Proferiu Kyouko.

Oriko colocava mais chá em sua xícara. “Quando foi a última vez que Kyuubey visitou vocês?”

“Faz quase um mês.” Respondeu Mami.

“Então foi no mesmo tempo que ele deixou de nos visitar. Vocês devem estar tendo problemas com os demônios renascendo a partir dos cubos.”

“Vfocês tambffém? Hffuh?” Disse Kyouko com a boca cheia. “Hmmm... Nós vamos fazer uma limpa amanhã, onde nós estamos guardando os cubos.”

“Uhum. Por acaso vocês andam olhando os noticiários?”

Tomada por momento de epifania, Mami arregalou os olhos. “Eu vi que houve um aumento substancial de atos violentos em Tóquio. Vandalismos, incêndios... até homicídios. Então, os demônios...”

“Sim. Eles estão por trás disso.” Oriko foi assertiva. “Como sabem. Os demônios se alimentam das emoções dos humanos. Especialmente as negativas como remorso e arrependimento.”

“Claro que sabemos.” Mami confirmou. “As pessoas que ficam tempo demais sob a influência dos demônios se tornam psicóticas. Não julgam mais seus atos e tomam atitudes extremas. Aquela pessoa que você jamais pensou que faria algum mal, de um dia para o outro está matando e destruindo seus próximos.”

“Eu passei em Asunaro recentemente.” Kirika interviu. “O noticiário local relatou dois casos de suicídios em massa.”

“Geralmente, pessoas possuídas por demônios cometem homicídios seguido de suicídio.” Comentou Oriko. “Esses casos em Asunaro são bem incomuns, mas pode haver ligação.”

Um semblante triste surgira na face de Yuma.

Mami não escondia sua apreensão. “E-Então isso está ocorrendo em todo o Japão?!”

“Infelizmente.” Oriko fechou os olhos. “Quando eu perguntei sobre os noticiários, eu me referia aos internacionais.”

“Cuméquiééé?!” Kyouko arregalou os olhos.

“Não é só isso.” Oriko continuou. “Eu acredito que, além de não contatar as garotas mágicas, ele também não esteja mais fazendo contratos. As garotas que perecem não estão sendo repostas.”

“Por falar nisso.” Kirika cortava a sua panqueca. “Eu não encontrei nenhuma garota mágica em Asunaro. Só um monte de miasma. Deve estar infestado de demônios por lá.”

Aquelas afirmações haviam deixado Mami completamente atônita. “I-Isso é... terrível.”

“Só podem estar brincando.” Kyouko abriu um largo sorriso. “Estão me dizendo que aquela peste caiu fora com o rabo entre as pernas?”

“Não.” Oriko balançou a cabeça. “Se fosse o caso, eu não estaria aqui conversando com vocês.”

Houve uma pausa, um silêncio no ambiente que permitia ouvir o som da cidade lá fora.

“Ele está aqui.”

A afirmação da Oriko trouxe a atenção de Mami de volta. “Aqui?! Aqui em Mitakihara?”

“Sim.”

“Perái! Perái!” Kyouko interrompeu. “Como é que você sabe disso tudo. Hein?”

Todas olhavam para Oriko. “Eu adquiri uma habilidade intrínseca ao fazer meu contrato. Um dom.”

Yuma abaixou a cabeça. Kirika sorriu levemente.

Oriko bebeu um gole de chá antes de continuar. “Eu tenho uma forte conexão telepática com Kyuubey.”

“Hã? Conexão telepática?” Kyouko ficou surpresa.

“É. Eu sou capaz de sentir a presença dele em longas distâncias, apesar de ser algo vago, especialmente se houver obstáculos.”

Kyouko lambia um pouco de xarope de milho que havia ficado no canto do lábio. “Então você sentiu que ele está aqui.”

Oriko apenas acenou, confirmando. “Se eu estiver próxima o suficiente, eu posso até ler a mente dele.”

“Que... que habilidade incrível!” Disse Mami, um tanto abismada.

“Não acham estranho?” Oriko questionou.

Kyouko franziu a testa. “E bota estranho mesmo! Esse negócio de conexão telepática.”

“Não, eu digo... por que Mitakihara? De tantos lugares possíveis, por que justamente aqui? Vocês por acaso conseguem suspeitar de algum motivo? Algo que ele possa ter dito ou feito a vocês?”

Mami e Kyouko se entreolharam por um momento e então a loira respondeu. “Não... eu não consigo encontrar algo.”

“Claro que não. Tolice a minha perguntar.” Oriko estava com olhar penetrante, vidrados nas duas anfitriãs. “Contudo, não importa o porquê. O que importa é descobrir o que aconteceu com Kyuubey.”

Mami concordou. “O que eu puder fazer para ajudar...”

Oriko sorriu. “Eu não esperava menos de uma defensora do bem tão experiente.”

“Oh, eu não sou tudo aquilo.”

“Mami-senpai!” Yuma ergueu a cabeça, seus olhos cheios de admiração. “Mama disse que você tem anos de experiência.”

Mami se surpreendeu diante daquela súbita reação.

“Não seja modesta.” Disse Oriko. “Quando perguntei se haviam outras garotas mágicas para Kyuubey, você foi o primeiro nome mencionado. O fato de você ter defendido Mitakihara todo esse tempo sozinha é um feito impressionante.”

“Ei! Eu tô aqui.” Kyouko, com o seu garfo, empalou uma panqueca com violência.

“Uhum. Kyouko tem plena razão, não lutei sozinha.” Mami viu o reflexo da sua face no fundo da sua xícara de chá, a imagem era de uma expressão neutra, mas aquilo não refletia o que estava por dentro. “Na verdade, éramos seis.”

“Seis? Garotas mágicas?” Kirika ficou espantada. “Seis? Sério?! Seis?!”

“Chega de perguntas Kirika.” Repreendeu Oriko. “Sinto muito pelas perdas.”

“Não se preocupe. Está tudo bem.” Mami esboçou um sorriso.

Oriko então olhou para Kyouko. “Bem... Agora Sakura-san está vivendo com você. Ela mudou bastante desde a última vez que a vi.”

“Mudei é?” Kyouko questionou com um tom de curiosidade.

“Seu linguajar melhorou, creio que o convívio com Tomoe-san tenha sido benéfico.”

“Tá querendo testar a minha paciência?”

“Kyouko! Isso foi um elogio.” Mami comentou.

“Mami-senpai.” Yuma tinha a atenção voltada para Kyouko. “Você e ela são como mama e papa?”

“Como?!” Mami arregalou os olhos.

Kyouko estava incrédula. “C-Claro que não! De onde você tirou isso?” Então ela cruzou os braços. “Nosso relacionamento é... é mais como um contrato de trabalho.”

“Como assim? Hmmmm?” Agora era Kirika que estava com curiosidade.

“Ela me oferece um teto e comida e eu ofereço a minha lança. Heh.” Kyouko deu uma piscadela.

Para Oriko, aquela afirmação apenas levantava mais questões. “Se eu me lembro bem, eu tinha oferecido uma proposta similar.”

“Ééééé.... ahaha...” Kyouko começou a rir com certo ar de nervosismo. “E-Eu decido onde eu quero trabalhar. Captou? HAHAHAHAAaaaa...”

Oriko dirigiu um olhar questionador para Mami, que lentamente degustava sua xícara de chá com os olhos fechados e em silêncio.

“É... hum...” Tal silêncio era pesado demais para Kyouko, que decidiu se dirigir a pessoa que havia originado tal embaraço. “Ei coisa miúda.”

“Meu nome é Yuma!” A menina disse emburrada.

“Tá. Faz quanto tempo que é uma garota mágica?”

Com o questionamento da Kyouko, Yuma começou a contar nos dedos e então mostrou a mão para Oriko, que aprovou. Depois falou entusiasmada. “Quatro meses já!”

“Que legal!” Kyouko fingia estar tão entusiasmada quanto. “Com todo esse tempo em atividade, aposto que um demônio já fritou você pelo menos uma vez.”

Mami fitou Kyouko com uma expressão desaprovadora.

“Não, isso nunca aconteceu” Yuma sorriu. “Mama e papa cuidam de mim, assim como protejo elas.”

Kyouko estreitou o olhar. “Essas aí não são seus pais. Cadê eles?”

“São sim!” Yuma rebateu. “Nós somos uma família de garotas de mágicas que tem a nobre tarefa de manter Kazamino segura e em paz.”

“Que piada.” Kyouko balançava a cabeça negativamente, sorridente. “Já deu pra mim.” E se levantou.

“Hã?” Mami ficou surpresa.

“A panqueca tava boa.” Kyouko se dirigiu a saída.

“Onde você vai?”

“Passear pela cidade, desestressar. Pode ficar aí com essa ‘família’.” Foram as últimas palavras da Kyouko antes do som da porta do apartamento se fechando.

Suspirando e esmorecida, Mami voltou sua atenção para as visitas. “Desculpem pela Kyouko. Ela agiu de forma rude durante todo esse tempo.”

“A atitude dela é compreensiva. Ela deve guardar certa animosidade em relação a mim e Kirika.” Afirmou Oriko.

“Eu cheguei a perguntar sobre o que aconteceu entre vocês para ela, porém ela evitou o assunto.”

“Ela não contou a você?” Oriko indagou em tom de estranheza. “Não vejo o porquê de esconder esses fatos e nem devo guardar segredos, ainda mais que estamos aqui para pedir ajuda.” Então ela fez uma pausa, molhando os lábios na ponta da língua, antes de continuar. “Quando Kyuubey me informou sobre você, eu havia acabado de fazer o contrato. Como ele havia me dito que você estava atuando sozinha, na época eu considerei que talvez você não quisesse companhia. Então Kyuubey me informou que não havia nenhuma garota defendendo Kazamino.”

“Nenhuma mesmo?” Perguntou Mami.

“Você deve estar fazendo essa questão porque sabia que Sakura-san estava lá.” Oriko mantinha um semblante sério. “E sim. Eu encontrei ela lá. No primeiro momento eu achei que Kyuubey estivesse enganado ou mentido, mas não. Ela não se comportava como uma garota mágica deve. Sakura-san apenas eliminava alguns demônios, os mais fracos e fáceis, apenas o suficiente para ela purificar sua gema e subsistir.”

As mãos de Mami, que estavam repousados sobre saia, se fecharam. Um ar de tristeza e melancolia se estampava em sua face.

“Eu tentei dialogar com ela, mas Sakura-san respondia com agressividade e ameaças. Ela realmente queria ficar só. Eu fiz tudo que pude, mas no fim das contas ela deveria me considerar como uma invasora, uma concorrente.”

Kirika decidiu participar. “É verdade. Ela parecia um animal raivoso, só faltava espumar pela boca.”

“Ah sim.” Oriko continuou. “Logo depois que comecei a atuar em Kazamino, Kirika apareceu durante umas das caçadas e me ajudou. Desde então eu sabia que garotas mágicas podiam atuar juntas. Também descobri que assim era mais eficiente.”

“E mais seguro.” Mami concordou.

“Por isso eu tentei novamente formar uma aliança com Sakura-san, mas ela continuou recusando. Então eu e Kirika começamos a eliminar os demônios todas noites, não deixando sobrar um.”

Kirika, sorridente, novamente complementou. “Aí a cabeça quente sumiu. Kyuubey falou que ela tinha vindo para essa cidade.”

“Isso tudo aconteceu antes vocês me encontrarem?” Perguntou Yuma.

“Uhum.” Oriko acariciou os cabelos verdes da menina, depois dirigiu a palavra para Mami. “Por isso que é uma grande surpresa ver ela junto com você, junto com alguém. Ela até lhe deu ouvido algumas vezes. Se há alguém que possa convencê-la de que eu nunca fui uma adversária dela, seria você.”

“Entendo, mas... eu não posso garantir.” Respondeu Mami.

“Por favor, tente.” Oriko juntou as mãos. “Precisamos de toda ajuda possível nessa hora. Apesar de eu morar aqui, eu atuo em Kazamino. Vocês devem conhecer cada canto dessa cidade. Se me puderem me guiar para lugares que vocês suspeitam que Kyuubey esteja localizado, aliado a minha conexão telepática, nós o encontraremos.”

“Então essa é a ajuda que precisam.” Mami ponderou. “Bem, amanhã à noite nós vamos ao local onde estamos estocando os cubos das aflições.”

“É o que Sakura-san havia comentado. Ótimo. Seria um bom lugar para começarmos.”

“Mas estou avisando, é muito perigoso. Haverá muitos demônios. Até eu já sofri ferimentos nessas ocasiões.”

Kirika se espreguiçou, deixando escapar um bocejo. “UAhhh... Fica tranqüila, nós estamos passando por isso em Kazamino também.”

“E quanto mais garotas mágicas, melhor!” Yuma deu soco no ar com puro entusiasmo.

Mami voltou a sorrir. “Huhu. É. É sim...”

/人 ‿‿ 人\

As três garotas caminhavam pelas ruas de Mitakihara. A visita havia terminado e a noite já despontava, com suas estrelas e o frio. O último resquício do pôr do sol era uma faixa laranja no horizonte.

Kirika passava a língua entre os dentes. “Foi muito bom. Essa loira sabe receber convidados.”

“Sim.” Oriko segurava a mão de Yuma, que estava um tanto quieta. “Yuma? Algum problema?”

“Eu... estou me sentido mal por mentir para Mami-senpai.” Respondeu a menina.

Oriko concordou. “É ruim, eu entendo. Nós sabemos que ela é uma pessoa de bom coração. Contudo, ela não nos conhece.”

“É amorzinho.” Kirika cutucou a bochecha da Yuma. “O poder da mama de ver o futuro é legal, mas as pessoas podem se assustar e terem receio porque é algo muito poderoso.”

“Eu sei também que Tomoe-san não iria acreditar.” Oriko argumentou. “Ela iria pedir para provar e nós não temos tempo para isso.”

Kirika olhou para Oriko. [A gente realmente precisa delas?]

[Essa é a única forma.] Oriko respondeu telepaticamente, sem que Yuma suspeitasse.

[Eu acho que só convencemos a Tomoe. A cabeça quente lá não vai dar ouvidos.]

[A confiança que Tomoe-san tem de nós ainda é frágil. O convite para ajudá-la com os demônios é um teste.] Oriko continuava com a telepatia. [Amanhã vamos tornar essa confiança algo mais definitivo e então eu acredito que Sakura-san irá ceder.]

O celular de Kirika toca. “Opa! Deve ser a minha mãe.”

As três param de caminhar.

Kirika atendeu. “Oie mamãe! Saudades?”

Oriko e Yuma se entreolharam, sorrindo, diante das caretas que Kirika fazia enquanto estava no celular.

“Eu estou com aquela garota da escola Shirome. Hã?! Voltar pra casa? Ah não... deixa eu passar mais essa noite. Ah vai...” Por fim, Kirika desligou o celular e resmungou palavras ininteligíveis.

“É falta de educação desligar sem se despedir, ainda mais para a sua mãe.” Apontou Oriko.

“Ela anda vendo os noticiários e se impressiona fácil.”

“Ela tem razão em ter medo. Você devia estar lá para protegê-la.”

Kirika fez um beiço, falando com um tom choroso. “Ahhh... Assim você não me ajuda...”

Yuma ficou rindo. “Hihi. Papa sendo bebezão de novo.”

“Para ver você sorrindo, eu posso ser um bebezão o dia todo.” Kirika se inclinou para Yuma. “Mas não posso deixar minha mãe esperando. Um beijinho para o meu amorzinho.” Ela então beijou-lhe a testa. “EEEEE....”

“Hum?” Oriko testemunhou Kirika se levantando e abrindo os braços para ela.

“UM BEIJÃO PARA O MEU AMORZÃO!” Kirika, em um salto, agarrou Oriko e deu um longo beijo na face. As duas quase caíram no chão.

“KI-KIRIKA! A-Assim não! Você não é pequena para ficar pulando encima dos outros.” Oriko colocou a mão aonde havia ficado a marca avermelhada do beijo.

Kirika começou a se afastar das outras duas, andando de costas. “Amanhã bem cedinho eu já apareço. Antes do café da manhã!”

“Estarei aguardando.” Afirmou Oriko.

Kirika se virou, mas logo depois voltou a olhar para as duas. “Ah! E não morram de saudades.”

“Vamos nos esforçar em sobreviver a isso.”

Yuma acenou. “Tchau papa!”

Então as duas viram Kirika, saltitante, desaparecer na esquina.

“Papa é um bobo.”

Oriko trouxe Yuma para perto de si, deixando a menina recostar sua cabeça em seu corpo. “Sim. Ela insubstituível. Assim como você.” Sorrindo, ela continuou. “Olha, por que não fazemos uma surpresa para papa no café da manhã? Tomoe-san me passou algumas receitas bem fáceis e eu acho que tenho os ingredientes em casa.”

Yuma pulou de alegria. “Legal! Mami-senpai é incrível. Aposto que com ela, nós vamos achar o Kyukyu logo.”

“É...” Oriko observou o céu estrelado. “Com certeza.”

Não muito longe dali, no alto de uma construção e sob o espectro da noite, uma criatura estava em seu cumprimento do dever. Seu par de olhos vermelhos observava as duas garotas atentamente.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo: Fé cega



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