Visionária escrita por Jafs


Capítulo 12
Nêmesis




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Não. Não combinava.

Tudo seguiu conforme fora planejado, segundo suas visões. Sem desvios. Exceto, talvez, o fator tempo e por evitar uma possibilidade dos Incubators interferirem. Contudo, para Oriko, aquelas pessoas diante dela nunca deveriam estar ali.

“Você a conhece?”

Oriko ouviu a menina de cabelos brancos perguntar para a sua companheira, que permaneceu em silêncio. Seu vestido negro e o couro que cobria seu corpo passavam um ar de morte e seu olhar era frio e hostil. O fato daquela garota aparentemente conhecê-la tornava esse conjunto ainda mais ameaçador.

Já a outra não apresentava tamanha periculosidade. Oriko logo notou na fivela do cinto da garota uma gema violeta dentro de uma armação dourada em forma de doce. Apesar de que isso não aplacou os seus temores, ela ao menos sabia com o que estava lidando. “Vocês são garotas mágicas. Como se chamam?”

“Garotas mágicas?” De sua expressão séria, Homura repentinamente abriu um largo sorriso. “Não realmente.”

Oriko ficou ainda mais estupefata quando presenciou mais garotas surgindo de repente por detrás daquelas duas. Não, não eram garotas. Pareciam mais com manequins, mas se moviam como se tivessem vida! “O quê... O-O quê?!”

As bonecas, com os seus grandes alfinetes negros em mãos, mudaram a cor de seus olhos e revelaram seus dentes diante de tantos Kyuubeys.

“Crianças! Crianças!” Homura bateu palmas para chamar a atenção delas. “Esses não! Há um rato branco maior para cuidar...”

Quando as bonecas voltaram seus perturbadores semblantes para Oriko, ela deu um passo para trás. Foi então que a garota mágica percebeu que os Kyuubeys haviam se afastado dela.

As bonecas passaram por Nagisa, caminhando em direção a garota mágica branca. “Homura-chan?” Contudo, Homura não se manifestou diante de tal questionamento, apenas cruzou os braços com uma aparente satisfação.

Oriko voltou a recuar com o avanço das bonecas. Ela olhou para garota de longas tranças negras, com fitas violetas e vermelhas. Diante daquilo só havia algo a dizer. “Por que...?” Mas já sem esperanças de uma resposta. Ela virou a cabeça, olhando para o ponto vazio da galeria de anteriormente e logo depois para o grande prisma, onde Madoka aguardava pela sua salvação.

Era verdade, nada estava acontecendo como fora previsto, mas o objetivo continuava ali, intacto. Com a determinação recobrada, Oriko começou gesticular e suas esferas obedeceram. Jogando os braços para frente, lançou-as contra o prisma.

As bonecas agiram rápido. Usando seus alfinetes como bastões, elas rebateram as esferas.

Vendo as esferas retornarem em sua direção, Oriko fez um novo gesto para pará-las e então as fez orbitarem velozmente em volta dela.

“Homura-chan!” Nagisa ficou estarrecida com a luta que estava se instaurando. “Por que está fazendo isso?”

“O nome dela é Oriko Mikuni. Eu a conheci durante minha jornada pelo tempo.” Respondeu Homura, sem olhar para a menina. “Ela só tem um único propósito em sua vida, que é matar Madoka Kaname.”

“Como?!”

“Eu cometi um grave erro quando sai de Mitakihara.” Homura continuou, levemente desviando o olhar para baixo. “Mas ainda posso resolver. Será rápido.”

As bonecas golpeavam com os seus alfinetes, abrindo caminho pelas esferas, até que uma saltou em frente da garota mágica e sua gema prateada brilhante.

Oriko deu um mero passo para o lado, desviando da ponta do alfinete e então o segurou.

A boneca olhou com surpresa diante da expressão severa da garota.

Oriko então usou de sua grande força como garota mágica e arremessou o alfinete, com a boneca e tudo, contra as demais. Sem esperar pelo resultado, ela saltou, escapando de alfinetes que acabaram explodindo o chão da galeria, e pousou em uma de suas esferas.

Mesmo sendo precisas ao rebaterem as esferas, as bonecas não eram capazes de lidar com tantos ângulos de ataque.

Contudo, Oriko logo constatou o quanto elas eram implacáveis. Elas são feitas com algo muito duro, eu preciso de mais força. De relance, ela olhou para a Madoka dentro do prisma. “Eu não posso falhar.” Pulando de esfera em esfera, ela evitava com certa facilidade as bonecas e seus alfinetes, enquanto mais esferas surgiam.

Homura, ainda de braços cruzados, ergueu uma de suas sobrancelhas.

Já Nagisa nem piscava. “Ela é incrível...”

“Preste mais atenção.” Disse Homura. “Observe a gema dela.”

Nagisa viu o forte brilho na gema da Oriko. “Ela está usando muita magia.”

“Controlar todas essas esferas, ainda mais na velocidade que elas estão, está custando caro para ela. Porém, esse não é o maior fardo em suas reservas.”

“Hã?” Nagisa viu o cabelo e o vestido de Homura tremularem.

“Ela tem o poder da presciência. Ela está agora mesmo vendo o que irá acontecer. É isso que está por detrás dos seus reflexos e contra ataques precisos.” Ela então sorriu. “Então que paguemos na mesma moeda.”

Ibari, Ganko, Wagamama, Yakimochi e Higami voltaram a atenção para a sua mestra.

Nagisa viu aquelas bonecas saírem do enxame de esferas e se posicionarem na frente do prisma.

Continuando com os seus saltos, Oriko sentiu que havia aberto uma boa distância de suas perseguidoras. Tendo em foco o prisma, ela juntou algumas de suas esferas e as lançou. Foi grande sua surpresa ao ver bonecas saltarem do chão e ficarem no caminho, bloqueando seu ataque com o próprio corpo delas.

“Guck!” Surpresa ainda maior foi quando um alfinete trespassou seu peito. A agonia foi breve, pois logo ele explodiu.

Oriko segurou sua gema firmemente, ainda com a memória viva do que acabaria acontecendo. Ela percebeu que realmente havia agora algumas bonecas próximas daquelas duas garotas no solo. Nesse momento, ela trocou olhares com garota de vestido negro, que retribuiu com semicerrar de seu olhar. Ela previu o que eu iria fazer?! Ela até aguardou o momento que eu abaixaria a minha guarda. Nisso ela viu que as outras bonecas que continuavam em seu encalço estavam aprendendo o padrão de seus ataques, algumas até já pulavam de esfera em esfera também.

Com elas cada vez mais perto, Oriko sabia que chegaria o momento que ficaria encurralada, mesmo sabendo o futuro, este seria inevitável. “Maldição... essas criaturas... essas garotas... por que... por que elas estão em todas as minhas visões agora.” Ela novamente olhou para o ponto vazio na galeria. “Eu estou vendo isso?” A idéia que passou em sua cabeça ela acreditou que a acalmaria, mas o que cresceu dentro dela foi uma mistura de angústia e medo. “Não... e-eu não quero morrer.” Junto com a sua voz, o lacrimejar exalava a sinceridade naquelas palavras. “Não, não pode acabar assim. NÃO!”

As esferas se iluminaram e logo explodiram em luz, iluminando toda a galeria.

“AAhhh!” Nagisa se protegeu diante da luz cegante.

Em meio aquela luz, as bonecas que estavam perseguindo Oriko saíram voando, capotando pelo concreto úmido.

“Essa Oriko...” Homura descruzou os braços e cerrou os punhos.

Quando a luz foi perdendo intensidade, Nagisa averiguou que Oriko ainda estava lá, em pleno ar sobre uma esfera e com os braços abertos.

As inúmeras outras esferas começaram se agrupar e se fundir, formando no total quatro versões maiores das mesmas, com três metros de diâmetros. Elas se encaminharam para orbitar em volta de sua dona em altíssima velocidade, variando seus eixos constantemente. O vento gerado com isso erguia a longa saia da Oriko, assim como o véu de sua mitra e seu cabelo.

As bonecas se levantaram e arremessaram alfinetes, mas explodiam ao serem interceptados pelas esferas gigantes.

“Parem crianças! Parem...” Ordenou Homura. “Já brincaram o bastante.”

“Ela está usando mais magia ainda!” Exclamou Nagisa.

Homura viu quando Oriko tirou um punhado de cubos da aflição. “Ela veio preparada.” Ela estendeu a mão, conjurando a ampulheta. “Como de costume.” Em sua outra mão, um grande alfinete negro.

“Como assim?” Nagisa voltou a ouvir aquele perturbador tilintar dos alfinetes dentro da ampulheta.

“Ela está explorando o futuro, vendo quais opções que ela tem. Se há alguma forma dela alcançar o que ela deseja...” Homura ergueu seu alfinete e então começou a golpear com a sua ponta no chão.

As bonecas fizeram ao mesmo em uníssono, em um mórbido ritmo.

“Tudo se resume a uma questão de tempo. Você consegue sentir, não?”

“O-O quê...”

Ainda golpeando com o seu alfinete, com a sua atenção voltada para Oriko, Homura respondeu. “Ora! Desespero. Não importa como e onde, quando o inevitável se aproxima, é sempre isso que carregamos dentro nós. ufufuF.”

Não era a primeira vez que Nagisa ficara receosa em relação a Homura, e nem seria a última, mas a entonação de voz e a expressão que sua companheira utilizava trazia uma intimidação que ela somente era capaz de concluir que era diferente de outrora.

“Como... isso é possível?” Oriko respirava pela boca, tamanho seu temor. “Como ela faz isso?!” Por fim, ela afastou sua mão, que continha cubos, da sua gema. Se eu usar mais, não terei o suficiente para Madoka. Logo a escuridão voltava a tomar conta da sua gema, enquanto ela passava mão em seu pescoço e olhava para o prisma.

Por detrás daquela massa viscosa negra e do cristal, Madoka estava em sua inércia serena.

Tal visão ficara borrada. Pressionando furiosamente os olhos para deixar as lágrimas caírem, Oriko só podia voltar a fazer a mesma pergunta. “Por que...?” Usando a esperança que ela havia nutrido como uma força, estendeu e abriu as mãos. “POR QUE EU NÃO POSSO SALVÁ-LA?”

Tudo fora muito rápido. Nagisa mal percebeu que as esferas gigantes haviam deixados suas órbitas para se dirigem ao prisma quando uma série de explosões ocorreu. “AAAHHH!” Abaixando a cabeça, ela sentiu fragmentos de prata e cristal azul a atingindo e caindo a sua volta. Quando a chuva destes parou, ela olhou para o lado para ver Homura, porém ela não estava mais ali e sim voando, em suas grandes asas de energia escura, tendo em uma de suas mãos a garganta da Oriko.

“Guhhnnn...” A garota mágica branca arregalou seus olhos, sentindo a pressão daquele couro frio e áspero. Tentou tirar com o braço, mas não tinha mais forças. Ela então mexeu seus dedos, criando uma esfera.

Logo interceptado e perfurado por um alfinete da Homura. “Você me parece bastante surpresa. Vejo que você levava um tempo para compreender a minha magia.”

“Gaak, Ggnn...” Oriko abriu a boca, mas nada inteligível saiu. Ela então olhou fundo naquele olhar frio da outra. [Quem é você?]

“Isso realmente importa?” Homura franziu a testa. “Por que você sempre faz essa pergunta?”

[O que quer dizer com isso?] Enquanto aguardava por uma resposta, algo naquelas estranhas asas chamaram a atenção dela. Em meio as imagens sem significado, estava se formando uma outra que era um vídeo antigo e mudo. Era alguém com uma câmera correndo pelos corredores de um casarão.

“Gn?!” Oriko logo reconheceu que aqueles corredores pertenciam ao seu lar. Subitamente a câmera caiu no chão e, lentamente, se virou.

Ela teria soltado um suspiro se pudesse.

A câmera mostrava uma garota, exatamente a mesma que a estava segurando, mas com roupas diferentes, um uniforme, que ela pôde concluir que era de uma garota mágica. A garota, com o mesmo olhar frio, apontava uma pistola para câmera. Então apareceu uma mão, do que seria do cameraman, pedindo clemência. Oriko não pôde deixar de arregalar os olhos nesse momento, pois, mesmo ensangüentada, ela sabia muito bem que a manga que acompanhava aquela mão era de um de seus vestidos.

Um flash proveniente da pistola e o vídeo se apagou, dando lugar para dezenas de outros que a envolveram com vários pontos de vistas da sua casa. Quarto, cozinha, banheiro... alguns deles terminavam com um encontro fatídico com aquela assassina, outros simplesmente apagavam, deixando ao encargo dela imaginar qual foi seu terrível fim. Em especial, um em que ela estava apreciando chá em seu jardim e de súbito ela deu violentamente com a cabeça contra a mesa e a xícara.

“Você gosta desse jardim, não? A maioria das vezes eu encontrava você lá.” Questionou Homura com um breve sorriso. “Apesar de algumas diferenças, tudo se resume aos mesmos padrões, nós não conseguimos evitar a estimá-los. Mesmo aqueles que buscam fugir disso, acabam caindo em uma rotina, assim se pode dizer quanto a morte.”

As bonecas haviam se agrupado em uma marcha, com seus alfinetes erguidos, se dirigindo até o local abaixo de onde as duas garotas estavam.

“Eu perdi minha humanidade há muito tempo.” Continuou Homura. “Devo agradecer a você por sempre me lembrar disso.”

[Eu não estou entendendo. Eu nunca encontr...] “Gaah!” Oriko fora chacoalhada por Homura, forte o bastante para que sua mitra deixasse sua cabeça.

O chapéu caiu, indo de encontro à ponta de um dos alfinetes das bonecas.

“Verdade, ‘você’ nunca me viu, mas eu SIM!” Homura apertou ainda mais a garganta da garota.

Oriko nem conseguira engasgar, apenas um espasmo que a fez abrir boca e deixar a língua para fora. Sua face foi tomada por tons rubros e seus olhos esbugalharam.

“Pensei que fosse mais inteligente, mas talvez eu esteja sendo muito exigente diante das circunstâncias, não é? inukiM okirO.”

Em agonia, Oriko segurou firmemente o braço que a estrangulava. Nesse momento ela viu a outra de boca aberta em uma expressão sádica. Dentro não havia gengiva, língua, ou qualquer indício de carne, apenas ossos envoltos em escuridão. [Por favor... eu preciso...]

“Salvar o mundo. Ah sim... tudo de acordo com as suas visões.” Homura interrompeu. “Por falar nisso, acho que devo aproveitar essa oportunidade para fazer um pequeno experimento.”

Oriko viu a garota aproximar a outra mão. Na sua palma, entre as costuras do couro, emergiu uma longa agulha.

Homura estava com agulha perto daqueles olhos verde oliva. “Será que você consegue ver o futuro sem eles? Hmmm...?” Porém, o olhar desesperado da garota foi perdendo foco, as mãos que seguravam seu braço fraquejaram. “Oh... você já está perdendo a consciência.” Concluiu em descontentamento, mas logo voltou a sorrir. “.zev amu ed arrom e rovaf o em-açaf sanepA .atropmi oãN

Assim que Homura a soltou, o destino de Oriko não seria outro além do empalamento, se não fosse pela bolha gigante que estava no caminho e a absorveu.

“O quê?!” Vendo Oriko em segurança, Homura foi tomar satisfação com a responsável por aquilo.

No entanto, quem falou por primeiro foi Nagisa, ainda no chão da galeria, sua face transformada. Seus dentes afiados a amostra e seu bizarro olhar arregalado e irritado. Sua voz, gutural. “ELAWR DISSE ‘SAWRLVAWRR’!”

Com os punhos cerrados, Homura rangeu os dentes. “Bruxa! Você acreditou nela?!”

Nagisa respondeu com outra pergunta. “Por que ela quer matar Madoka?”

Homura balançou a cabeça. “Você não sabe de nada. Ela quer matar para que ela... não se... torne...” Mas ficou paralisada, sob epifania.

“Homura-chan.” Ainda irritada, Nagisa voltou a perguntar. “Você realmente deixou aquele labirinto?”

Homura olhou para Madoka, em seu vestido de divino branco, e então para o couro negro que cobria seu próprio corpo. “Eu, um ser miserável. Então é assim que é.”

Nagisa se acalmou, o pior não acontecera. “Nós ainda temos posse de nossas almas. Nada está perdido.”

“Pois muito bem.” Homura desceu até o chão e dispersou as suas crianças. “Mas digo novamente, você não deve confiar nela.”

“Eu entendo.” Nagisa fez a bolha descer mais e se aproximou dela. “Mas ela merece o benefício da dúvida.”

“Cof, cof...” Em uma tosse rouca, Oriko recobrou sua consciência, apenas para se deparar com assustadores olhos coloridos acompanhados por uma boca forrada de dentes. Ela recuou o quanto pôde dentro da bolha.

“Oh.” Nagisa puxou seus longos cabelos para cobrir sua face, quando os soltou, sua fisionomia já era mais humana. “Desculpe...”

Oriko passava a mão em seu pescoço marcado. [O que são vocês?]

“Pode se dizer que somos defensoras da esperança.” Nagisa deu uma piscadela.

[Esperança...] Oriko voltou a trocar olhares com Homura, que estava em uma expressão séria.

Nagisa juntou as mãos e trouxe ao seu peito, mais receosa. “Não parece, mas ela também é... hehe... mas não se preocupe, estará segura se não tentar sair da bolha.”

“Isso ela já sabe.” Comentou Homura. “Achou que eu não sentiria a magia mesmo camuflando-a?”

Oriko se encolheu e baixou o olhar.

Nagisa ficou curiosa. “O que quer dizer?”

“Ela usou de sua clarividência para descobrir o que aconteceria se tentasse escapar.” Homura deu um leve sorriso. “Agora não tem mais o suficiente para fazer isso de novo, ou corre o risco de não ter magia nem para manter sua roupa.”

“Ah é?” Nagisa se aproximou ainda mais da bolha, deslizando os dedos sobre a sua superfície. “Então é um motivo a menos para você querer machucá-la.”

Homura respondeu prontamente. “Acredite, nunca faltará.”

Oriko não olhava mais para as garotas que estavam lá fora, apenas pigarreava.

“Mitakihara Zero Três.” Nagisa leu o grande letreiro branco na parede. “Estamos de volta ao seu mundo.”

“Não é mais meu.” Homura afirmou, enquanto observava Kyuubeys coletando os cubos da aflição usados que estavam no chão.

“Hã?”

“Longa história.”

“Ah...” Nagisa voltou sua atenção para o prisma e seu monstro. “O que vamos fazer?”

Homura também. “Madoka me parece segura lá dentro e aquilo está sendo absorvido e perdendo força.”

Nagisa olhou para todos aqueles Kyuubeys conectados com a esfera negra. “Sim, mas...”

[Então vocês realmente conhecem Madoka.]

A telepatia de Oriko chamou as garotas. Elas viram ela tentando ficar em pé dentro da bolha.

[Por favor! Quebrem o prisma, é única forma de salvar ela e a todos.]

“Quebrar...” Nagisa balbuciou. Era difícil para ela absorver aquela idéia, quando havia uma abominação de tentáculos negros com óbvias intenções quanto a Madoka,a pessoa do qual a salvou de um destino cruel.

[Eu tive uma visão do futuro! Acreditem em mim!] Desequilibrando-se, em parte devido ao seu clamor, Oriko se apoiou na parede da bolha, movendo-a brevemente.

“Eu acredito que você deva se calar.” Disse Homura, depois voltou a falar com Nagisa, mas não olhando para ela e sim para um ponto. “Além do mais, nós temos um problema mais urgente.”

“Urgente?” Nagisa seguiu o olhar de Homura até um túnel com uma densa névoa.

Continuou a garota de longas tranças negras. “Ali se encontra uma barreira de bruxa.”

“Sério?!”

Bruxa? Barreira? Oriko ouvi atentamente, enquanto limpava seu rosto e engolia a saliva com dificuldade.

“Não deveria ficar tão surpresa.” Homura virou a cabeça por um momento, vendo de relance o prisma. “Consegue sentir os distúrbios do portal? Há garotas mágicas lá.”

“Sim.” Nagisa concordou. “Além da bruxa, acho que tem mais três fontes de magia.”

“Duas garotas estão juntas, a outra está em partes mais profundas...” Homura se aproximou de Nagisa, colocando a mão em seu ombro. “Ouça. As garotas mágicas desse mundo não devem saber lidar com bruxas. Elas correm grande perigo.”

Nagisa se virou. “Oh não...”

Homura segurou o ombro da menina com mais firmeza. “Pelo desejo de Madoka, você deve interceder por todas elas, até mesmo para a bruxa, não?”

“Sim, eu...” Nagisa abaixou o olhar e franziu a testa para logo depois se afastar de súbito. Sua voz era acusadora. “Você quer ficar sozinha com ela.”

As bonecas, logo atrás de Homura, cochichavam sorridentes entre si.

Homura ficou impassiva diante da outra por um momento, até que uma ponta de seus lábios subiu levemente. “Bruxinha esperta... Porém está enganada se é o que está pensando. Eu até ouvirei o que ela tem a dizer, assim como Kyuubey.”

“Por favor.” Nagisa apertou os lábios com apreensão. “Eu quero tanto acreditar em tu...”

As bonecas focaram em Nagisa, suas mãos juntas ao peito e as cabeças baixas.

Já Homura abriu os braços. “Jamais se esqueça. Eu quero o melhor para Madoka.”

Nagisa ponderou quanto ao que fora dito e acenou com cabeça. “Pelo desejo...”

“O mais profundo deles.”

Nagisa suspirou e fechou os olhos, esboçando um sorriso, antes de virar e partir. Em um salto, ela adentrou-se na névoa.

Sentindo o portal reagindo com a entrada da sua mais nova visitante, Homura não pôde deixar de questionar. “Como alguém pode ser tão esperta e ao mesmo tempo tão ingênua...” Se virando para bolha e a garota lá dentro. “Não é?”

“C...” Oriko abriu a boca, mas a voz não saiu com coesão. [Como disse?] Foi quando ela viu uma das bonecas apontar seu alfinete direto para a bolha. Aquele manequim de cabelos vermelhos com um pequeno chapéu preto, em um vestido de saia curta, seu sorriso sardônico e afiado.

“Uma bruxa tão coincidentemente próxima. Devo duvidar que isso seja obra sua?” Homura ergueu as sobrancelhas. “Hmmm...?”

Oriko gesticulou, implorando. [Espera! Espera!] Para a surpresa dela, a boneca logo abaixou seu alfinete e gargalhou sem emitir som algum além de estalos mecânicos.

“Eu deveria matar você agora, mas essa menina me fez lembrar que eu não derramo sangue de fronte a ela.” Homura olhou para criatura de tentáculos, que lutava tanto para quebrar o prisma quanto para não ser absorvida.

Oriko aproximou sua face da superfície da bolha. [Peço que compreenda! Se eu tivesse encontrado outra maneira, eu não teria feito isso.]

“Ah não... não teria...” Homura fechou os olhos. “Quem sabe você estaria matando uma escola inteira.”

[O quê?!] Oriko ficou boquiaberta. [Isso é um absurdo!]

Tão súbito quanto abriu seus olhos, Homura virou sua cabeça. “Mas para proteger o mundo você faria, não faria?”

Oriko recuou, com os olhos arregalados.

“Não pensaria duas vezes... eu respeito isso.” Homura abriu um largo e efêmero sorriso, logo substituído pela seriedade. “Incubator!”

Através da bolha Oriko viu um Kyuubey passando por baixo dela.

[Homura Akemi, para mim seu retorno não é uma surpresa, apesar que eu não esperava que você viesse acompanhada.]

“Eu não estou feliz.” Homura entrelaçou seus dedos de couro. “Contudo, devo dizer que há certa nostalgia em ouvir sua voz novamente.”

[Verdade? Não acho que o intervalo de tempo que se passou desde nossa última conversa tenha sido longo.] A criatura sacudiu suas orelhas pontudas. [Até mesmo para padrões humanos eu diria, mas posso estar enganado. Vejo que até mudou novamente suas roupaaaAAHH...]

Oriko levou a mão à boca ao ver Kyuubey sendo pego pelas costas e engolido por uma das bonecas.

“No. ro. ma!” Homura repreendeu-a. “Eu já lhe disse sobre por brinquedos na boca.”

A boneca olhava assustada para a sua mestra, enquanto o rabo branco felpudo que estava fora da boca se debatia.

Com um tom ameaçador, Homura voltou a falar. “Não irei repetir...”

A boneca ficou de cabeça baixa e então cuspiu a criatura naqueles pés de couro negro.

Homura deu um suspiro, relaxando um pouco, para depois gesticular para bonecas. “Vão brincar um pouco, mas só entre si. Ok?”

Com os pêlos desgrenhados, mas ainda de corpo inteiro, Kyuubey deixou os pés de Homura. [Esses seres não tem saliva, nem sequer uma garganta, interessante.] Com a pata, começou a alisá-los. [Continuando... Não pude deixar de notar que sua magia, ainda que familiar, tem algumas diferenças sutis.]

“Ho... mura... A... A... ke... mi.”

Vendo que Oriko se intrometeu na conversa, Homura não a ignorou. “Ora! Já está conseguindo falar? Usou um pouco de magia ou fui eu que não apertei o suficiente?”

A garota mágica branca pigarreou novamente antes de continuar. “Esse é... o seu... no... me.”

[Ela não parece te conhecer, Homura, mas você a conhece.]

“Sim.” Homura concordou com a afirmação de Kyuubey.

[Por acaso foi em uma de suas viagens no tempo do qual você me contou?]

Ela permaneceu em silêncio.

Mas Oriko não. “Vi-Vi...agens no... tempo? Cof! Cof!”

Os olhos vermelhos de Kyuubey refletiam a garota com a mão em seu próprio pescoço.

“Manipulação... temporal... essa é a sua magia. Por isso que sabe... tanto...”

[Isso pode ser a resposta para outro fato, Oriko, um que você deve ter questionado para si própria.]

As duas garotas ficaram curiosas com o que a criatura tinha dizer.

[Não notei nenhuma medida preventiva sendo usada por sua parte com a chegada da Homura.] Kyuubey balançou sua cauda, quem não o conhecesse diria que ele estaria expressando contentamento com a sua conclusão. [Significa que ela nunca constou em suas visões, não é?]

“Supostamente não era para ela nem estar aqui.” Homura complementou. “E não foi você que a trouxe.”

[Está correta.] Kyuubey acenou. [Ela veio aqui com as suas próprias habilidades.]

“De fato. Eu... não a via.” Disse Oriko. “Somente depois que ela apareceu... que isso mudou.”

[Oriko.] A criatura fixou o olhar na garota. [Você me deu a última peça que eu precisava para compreender a extensão de seu poder.]

“Extensão?!”

[Isso.] Kyuubey se virou para Homura. [Nós também não fomos capazes de senti-la você durante todo esse tempo, até que você se manifestasse.]

“O que isso significa?” Homura observou os fragmentos do pequeno prisma que estavam no chão.

[O fato de nós não a sentirmos ainda deixava muitas possibilidades em aberto. Porém, com a informação da Oriko, podemos nos concentrar na idéia de que você e a outra garota, do qual nossos registros apontam que ela é Nagisa Momoe, estavam em um tecido do espaço-tempo diferente do nosso.]

“O quê?!”

Kyuubey voltou falar com Oriko [Outra dimensão, se não entendeu, e eis aqui o limite de seu poder. As ‘visões’ que sua magia dispõe na verdade são cenários possíveis que ela constrói, usando elementos que pertencem ao mesmo tecido do espaço-tempo no qual você está inserida. As duas não estavam e, portanto, sua magia adaptou sua visão com o que havia disponível.]

“Isso... isso é inaceitável! Está completamente equivocado, Incubator.” Furiosa, Oriko apontou para a massa disforme negra agarrada ao prisma. “Aquela... coisa deve ter vindo do mesmo lugar que essas duas e eu a vi!”

“Não. Ele está certo.” Homura chamou atenção da outra garota. “Aquilo que você chamou de ‘coisa’ é Madoka.”

Em expressão de completa surpresa e confusão, Oriko ficara sem palavras.

[Hmmm... Isso explica muito.] Disse Kyuubey. [Agora sabemos porque essa entidade tem tanto interesse nela ao ponto de nos ignorar. Seria aquilo toda a aflição acumulada por ela?]

Homura pegou uma de suas tranças, balbuciando. “Eu nunca imaginei que ela poderia ressentir tanto a si mesma...”

[O que disse?]

“Que você está certo.” Continuou a garota, alisando o laço vermelho. “Aquilo está em um processo irreversível, buscando uma fusão, e não tem forças para escapar.”

[Uma armadilha.] Concluiu Kyuubey. [Para esse fim que nós construímos tal aparato.]

“Conforme você fora instruído.” Homura viu Kyuubey piscar duas vezes, assim como todos os outros na galeria também o fizeram ao mesmo tempo.

[Homura Akemi, você...]

“Fora... instruído?” Oriko ainda não estava recuperada do choque daquelas revelações.

Porém, Homura não iria esperar. “Incubator tem um contrato com Madoka. Ele está trabalhando sob as ordens dela.”

[Como obteve tal informação?] Kyuubey não tardou em inquirir.

“Simples.” Homura sorriu. “Eu estava lá.”

[Ah... Entendo] Kyuubey fechou os olhos. [Madoka nunca esteve só.]

“Mas não tive nenhuma influência nas decisões dela. Como a escolha desse lugar...” Homura abaixou o olhar, sua voz mais silenciosa. “... por exemplo...”

Oriko arfava, seu olhar perdido. “E-Eu acreditei que o Incubator tivesse forçado ou convencido ela a... a...”

[Eu e Madoka compartilhamos da mesma vontade de manter o universo.]

“Você não sabe de nada, Oriko Mikuni.” Falou Homura. “É melhor que descanse até isso acabar.”

“Espere...” Oriko olhou para o monstro que era absorvido pela esfera, que apenas cobria um pouco mais da metade do prisma. “Isso... isso não pode acabar dessa forma! Você pode impedir!”

“Você não me ouviu?” Proferiu Homura em um tom mais ameaçador.

“Eu posso ter me enganado com algo que eu não vi.” Oriko colocou as mãos sobre a superfície da bolha, se aproximando mais. “Porém isso consta em minhas visões! Se aquilo, que vocês consideram que seja Madoka também, for completamente absorvido, nós todos seremos extintos! Sem exceção!”

Homura ficou olhando para criatura de tentáculos negros. “Diga-me o que viu.”

“Tudo será consumido por uma luz e esta se apagará. Nada irá sobrar.”

[Isso é muito vago.] Disse Kyuubey. [Ainda mais agora que estamos certos de que suas visões não são confiáveis.]

“Maldito...” Oriko exasperou. “Você vem me dizer que valoriza a confiabilidade quando tudo em que você se baseia são em estimativas!”

[Que se referem à obtenção de energia...] Kyuubey respondeu. [Como já havíamos conversado, a certeza que temos é que o universo será realmente extinto se a entropia não for impedida.]

“VOCÊ JÁ CONSEGUIU A ENERGIA QUE PRECISAVA!” A saliva da Oriko respingou sobre a superfície da bolha. “Seu ganancioso e mentiroso...”

Kyuubey fora mais sucinto. [Como Homura falou, o processo é irreversível, temos que ir até o fim.]

“Ah!” Oriko socou a bolha e respirou fundo. Ela não podia desistir. “Akemi-san... você conhece ele, já fora uma garota mágica e, principalmente, você é uma humana.”

Homura continuava a observar a abominação, que tinha seus tentáculos enrolados no vértice do prisma, tentando resistir. “Eu não sou.”

“Eu não sei o que aconteceu contigo, mas para mim você é mais humana do que o Incubator jamais seria.”

[Considerando o histórico de conflitos que sua espécie tem entre si, usar a ‘humanidade’ como argumento é...]

“SILÊNCIO!” Oriko continuou. “Ouça, Akemi-san. Qualquer que seja esse contrato, acha mesmo que ele o respeitaria?”

Alguns tentáculos se desprenderam do prisma. Homura via aquelas pontas trêmulas tentando em vão alcançá-la.

[Nós levamos a sério com os contratos que são feitos, temos políticas muito restritas quanto a isso.]

Oriko ignorou Kyuubey, se concentrando em Homura. “Se isso que você diz ser Madoka, depois que ela for absorvida, acha que ele vai parar? O que acha que ele vai fazer com a garota?”

Homura continuava a observar...

“Akemi-san? Está me ouvindo?” Oriko se desesperou. “Akemi-san! Por favor! Acredite no que eu digo!”

Kyuubey voltou a se manifestar. [Homura, estou apenas fazendo conforme o que fora combinado.]

“Cala boca!” Perdendo a compostura, Oriko insistia. “Akemi-san! Quebre o prisma, é a nossa única esperança.”

[Homu...]

“CHEGA!” Uma onda de choque originou-se em Homura, erguendo seu cabelo e suas vestes. As poças de água da galeria trepidaram, as grandes orelhas de Kyuubey foram jogadas para trás e a bolha rodopiou, desequilibrando Oriko.

Quando tudo se acalmou, Homura disse, ainda sem trocar olhares. “Eu não irei fazer nada.”

Oriko foi tomada pela frustração. “Por quê? Você confia nele?!”

“Eu não confio.” Homura respondeu. “Mas eu tenho uma promessa a cumprir.”

Oriko franziu a testa. “Você condenaria a todos nós por uma promessa?”

Virando, Homura exasperou. “Sim! Sim eu iria!” Abaixando a voz, continuou. “Eu já fiz isso uma vez...”

Balançando a cabeça vagarosamente em negação, Oriko concluiu. “Então você não perdeu a humanidade, você a traiu.”

Homura desviou o olhar. “É... você pode dizer dessa forma.”

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Sem rumo ou objetivo, apenas seguindo para onde aquelas passarelas de pedra os levassem, os soldados de papel marchavam religiosamente.

Até que eles começaram a pisar sobre uma aura violeta.

Eles mal tiveram tempo de parar antes de seus membros e cabeças tivessem sido separados de seus corpos. Seus belos quimonos se desfaziam em cinzas antes de desaparecerem entre as rochas.

A única coisa que restara ali fora uma garota e suas garras de energia. [Amorzinho, a barra tá limpa.]

[Ok. Estou chegando.] Yuma apareceu na névoa, testemunhando Kirika desfazendo as suas garras.

“Mais um grupos deles e nenhum sinal de alguma saída dessa sauna de merda.”

“Papa.” Yuma se aproximou mais. “Talvez devêssemos voltar até a Mami-senpai.”

“Ela quer ficar sozinha.” Kirika respondeu prontamente. “E ela sabe se cuidar.”

“Eu sei.” Yuma pressionou seus lábios. “Mas ela parecia tão mal. Será que ela sabe de alguma coisa? Talvez sobre a Kyouko-neechan.”

“É... talvez...” Kirika virou a face. “Só sei que quando essa névoa se formou, nós já estávamos separadas. Por isso que temos que achar o amorzão para descobrir o que está acontecendo, ou o Kyuubey ou essa outra garota que tu falou.”

“Ela está dormindo dentro de um cristal, ela não vai poder falar.”

Você não me contou sobre essa garota, Oriko. Será por causa dela que você me pediu para fazer aquilo? Kirika ponderava quando sentiu seu uniforme ser puxado.

“Papa! Papa! Olha!”

Kirika seguiu até onde Yuma apontava, se deparando com uma estranha criatura preta com pontos vermelhos sobre a mureta de pedra.

“Parece um rato, mas é muito maior.” Yuma segurou sua vara com mais firmeza. “A-Aquilo ali é um olho? A-Acho que ele nos viu.”

“Isso aqui tá virando um show de horrores!” Irritada, Kirika conjurou suas garras.

Ao ver aquilo, a criatura se estremeceu e correu pela mureta, desaparecendo pela névoa.

“Ei! Volta aqui seu monstrinho!” Kirika chegou a dar um passo a frente, com pleno intento de iniciar uma perseguição, mas parou. “Espera aí. Estou sentindo algo.”

Yuma colocou a mão na nuca. “Eu também. É uma fonte de magia, não é?”

“Sim e está se aproximando rápido.” Kirika fez questão de deixar suas garras ainda maiores.

“Monstro?”

“E dos grandes.” Kirika se virou para Yuma com um sorriso. “Não se preocupe. Papa está aqui para te proteger. Só fique preparada.”

“Sim!” Yuma energizou sua vara, fazendo a bola peluda em sua ponta adquirir um brilho esverdeado.

“Lá vem ele!”

Só foi Kirika terminar de falar que um vulto apareceu caminhando na névoa.

Yuma forçou a vista. “Mas aquilo é...”

“Uma garotinha mágica?” Kirika ergueu suas sobrancelhas.

Nagisa acariciou o pyotr em seu colo. “Você encontrou as duas, bom trabalho.”

“Sim...” Yuma não parava de piscar o olho. “Ela até usa uma touca com orelhas que nem a minha.”

Se aproximando mais das duas, Nagisa perguntou. “Oi. Tudo bem com vocês duas?”

“Sim...” Diante de tal pergunta, Kirika olhou para as suas próprias garras, as fazendo desaparecerem logo em seguida. “Essa criatura é sua?”

Nagisa olhou para o pyotr e depois acenou, confirmando.

Kirika continuou. “Isso aí é sua magia então.”

“Pode se dizer que sim.” A garota de longos cabelos brancos sorriu timidamente.

A vara de Yuma parou de brilhar. “Vendo bem, até que ele é engraçadinho...”

O pyotr abanou suas grandes orelhas azuis. Nagisa entendeu que aquilo era o sinal de que ele queria voltar ao solo. Logo depois de soltá-lo, a criatura saiu correndo até sumir na densa névoa.

Kirika voltou a questionar. “Por onde você veio garota?”

“Ah! Eu vim...” A convicção nas palavras de Nagisa logo esmoreceu. “Eu... realmente não sei dizer onde eu estava... hehehh...”

Kirika deu um tapa em sua testa. “Ah... ótimo.”

Procurando fugir da situação embaraçosa, Nagisa buscou outro assunto de importância. “Tinha outra garota mágica com vocês?”

A pergunta foi como um soco no estômago em Yuma, a surpresa tinha feito ela esquecer daquilo por um momento. “Tinha sim... Mami-senpai...”

Nagisa arregalou de leve os olhos. “Mami?! Você disse Mami?”

“Você a conhece?” Yuma ficou curiosa.

Kirika cerrou os punhos e engoliu seco.

“Sim! Sim!” Nagisa acenou com a cabeça várias vezes, com urgência. “Me diga o que aconteceu.”

“Ela está lutando contra um monstro enorme.” A voz de Yuma foi ficando mais triste, assim que ela abaixava a cabeça. “A gente ia ajudar, mas ela não queria.” Então ela sentiu a outra se aproximar mais. O olhar azul se encontrou com o laranja e amarelo.

“Você deve gostar muito dela.” Afirmou Nagisa.

“Uhum...”

Nagisa abriu um sorriso. “Vai ficar tudo bem. Ela irá aceitar minha ajuda.”

Yuma chegou suspirar, com certa esperança e alívio, mas fora curto. “Tem outra garota, Kyouko-neechan. Nós não a vimos depois que essa névoa apareceu. Ela deve estar perdida em algum lugar.”

O sorriso de Nagisa deu lugar a uma expressão mais séria e preocupante. “E-Então eu tenho que ir.” Ela passou por Yuma e Kirika, seguindo a passarela de pedra.

“E-EI!” Kirika chamou a atenção da garota que estava prestes a desaparecer. “Ao menos sabe nos dizer aonde fica a saída desse maldito lugar?”

Nagisa não parou, mas respondeu na forma de telepatia. [Eu acho que é mais seguro que vocês aguardem aqui. Fiquem paradas e não usem magia, assim vocês não devem ter problemas.]

“EI!” Kirika novamente a chamou. [EI!] Mas em vão, só restava colocar as mãos na cabeça. “Eu não acredito! Primeiro encontro monstros que nunca vi nesse lugar bizarro e agora essa garotinha. Que loucura é essa?”

“Ela disse que esse lugar é mais seguro?” Yuma ficara apreensiva com o que estava prestes a dizer. “Então mama...”

“É claro que não vamos ficar aqui!” Kirika exclamou. “Acha que eu vou dar ouvidos a ela? Amorzão é prioridade!”

“Mas como vamos sair daqui?” Yuma inquiriu.

Kirika olhou para por onde a garota tinha vindo, procurando se lembrar da direção que ela sentira a magia. “Essa garota pode até não saber, mas com certeza ela não veio do nada. Me siga.”

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Sem rumo ou objetivo, apenas seguindo para onde aquelas passarelas de pedra os levassem, os soldados de papel marchavam religiosamente.

Só pararam quando uma garota apareceu voando pela névoa. Suas botinas derrubando dois soldados da passarela em uma voadora.

Rápida com o seu mosquete, Mami deu estocada com a sua baioneta em um soldado assim que tocou o chão. Com ele na ponta da sua arma, ela o empurrou contra a fileira de soldados. A chama das velas acabaram por incendiar ele.

O fogo se espalhou rapidamente entre as criaturas de papel, trazendo o caos. Mami recuou com um salto e converteu seu mosquete em um laço. Usando como um chicote, ela desarmava e cortava os que haviam escapado.

Logo só restaram montes de cinza. Era uma visão que trouxe satisfação para Mami, pois usara pouca magia para obter tal feito. A satisfação só não era maior por causa que o ferimento em seu abdômen incomodava, mas felizmente o laço tinha sido o suficiente para que não perdesse mais sangue.

Luzes. Flashes que fizeram Mami buscar o chão sem pensar, seus instintos de batalha a protegendo de uma súbita ameaça. Deitada, ela descobriu que a fonte eram lasers que cortavam a névoa. “Mas isso é...” Pensou alto, sabendo o que aquilo significava. Rastejou até a mureta e espiou com o devido cuidado.

Os raios de luzes partiam de um ponto específico, mas longe demais para poder discerni-lo na névoa. Felizmente, Mami viu que havia outra passarela em um local mais alto, próximo daquele lugar.

O salto seria arriscado. Se algum feixe de luz a atingisse, provavelmente ela não teria magia suficiente para curar tal ferimento, isso se ele não fosse imediatamente fatal. Mami aguardou por momento que os raios diminuíssem e então pôs magia em suas pernas.

No ar, enquanto alcançava a passarela, ela conjurou um mosquete em mãos no caso de um encontro indesejável, porém não tinha sido necessário. Mesmo que agora estivesse em uma posição mais vantajosa, Mami se aproximou com cuidado da mureta para observar.

Lá embaixo, parcialmente coberto pela névoa, suas suspeitas se confirmaram.

Demônios, mais de uma dezenas deles, estavam em um confronto direto contra o exército de papel e suas velas. A vantagem numéricas daqueles soldados com quimonos não mostrava ser relevante diante dos raios de luz que penetravam e queimavam as suas fileiras. Ainda que alguns conseguissem lançar bolas de fogo, os demônios simplesmente se teleportavam para longe do perigo.

Enquanto Mami testemunhava aquela batalha desigual, ela ouviu o som de um tropel. Uma grande chama anunciava a aproximação de um gigante cavaleiro em velocidade. Os cascos esmagavam os soldados no caminho sem piedade, a lança apontada em direção aos etéreos homens brancos e seus mantos.

Mami, com toda a sua experiência, conseguiu prever qual o seria a reação dos demônios. Assim que o cavaleiro chegara mais perto, eles se teleportaram e o rodearam.

Mas o que veio depois...

Sentados em posição de lótus, os demônios começaram a entoar um mantra e uma aura de luz branca se formou aonde o cavaleiro estava.

“O quê?”

O cavaleiro tentara sair daquela aura, mas seu cavalo de cerâmica refugara assim que alcançavam a borda. Logo os cascos deixaram o chão.

Como se aquilo fosse um papel de parede, a névoa acima dos demônios se rasgou, revelando estrelas brilhando sobre um fundo colorido e vibrante. Grandes pétalas de flores surgiram e rodearam aquele buraco, como se dançassem uma majestosa coreografia.

Mami ficou boquiaberta com o que estava presenciando.

O cavaleiro flutuava, se aproximando cada vez mais daquelas estrelas, até que ele desapareceu de súbito, sem deixar vestígios.

Com isso o mantra parou e a névoa cobrira as flores e as estrelas. Mami viu que os demônios se entreolhavam. Algo não está acerto, acho que aconteceu o mesmo que aconteceu comigo.

De repente uma lança veio voando, atravessando o peito de um dos demônios. Enquanto este era tomado pela escuridão, um manto vermelho se desenrolou no cabo da lança e por detrás dele o cavaleiro e seu fiel cavalo saíram.

Mami falou consigo mesma. “Eu estava certa. É a magia da Kyouko.” Foi então que ela notou grandes chamas vindo por ambos os lados da passarela onde os demônios estavam. “Hã?! Será que...”

Mais cavaleiros apareceram, todos idênticos. Os demônios já haviam mudado de posição e uma nova batalha começara.

“Ah!” Mami procurou se proteger melhor atrás da mureta diante dos novos raios de luz sendo disparados.

Aquilo não intimidou os cavaleiros, mesmo que alguns deles tivessem sido derrubados e fatiados, virando uma nuvem de cinzas. A ousadia de um deles foi tamanha, que ele saltou com o cavalo e tudo contra saraiva de luz. Antes de ser completamente desintegrado, ele enterrou sua lança em um dos demônios.

Outro cavaleiro agiu diferente. Ele arremessou sua lança e desapareceu. Os demônios esquivaram do ataque, mas cometeram um erro ao deixar lança passar, pois um cavaleiro surgiu na névoa em pleno ar para recebê-la. Ele a brandiu, derrubando vários deles de uma vez.

Mami assistia a tudo aquilo. “Eu não posso continuar parada, talvez essa seja a minha chance.” Ela arremessou seu mosquete para o alto e quando caiu, eram vários. Pegando uma de cada vez, ela foi disparando contra os demônios mais ocupados e distraídos. Suas rápidas balas não ofereceram chances.

Até que o último cubo da aflição quicou nas rochas da passarela.

Agora Mami tinha toda atenção daqueles cavaleiros na outra passarela. “Kyouko! Essa foi uma boa caçada...” Sorriu. “Você se lembra?”

Um dos cavaleiros deu um grande salto até onde Mami estava. Todo o peso do gigante se revelava ao pousar, fazendo ela se desequilibrar com o impacto. Contudo, a loira não recuaria.

O cavaleiro aguardava, apenas o cavalo se movia, seus olhos vazios e negros sobre a garota.

Mami não podia temer, não devia, aquela era Kyouko, sua companheira, com a qual ela ensinou e aprendeu.

Ou não?

Uma dúvida perturbadora tomou a sua mente. Aquela era Kyouko? Melhor dizendo, aquela era a verdadeira Kyouko? Sua linha de raciocínio acabou sendo interrompida quando o vibrar e um estrondo anunciavam que outro cavaleiro havia pousado atrás dela.

Mami não se moveu, mas agora mais pela tensão do que cautela, dentro de si seu senso de hostilidade a alertava. “Kyouko... eu ajudei você. Eu estou do seu lado! Eu sei que você não quer me ferir.”

O cavaleiro puxou sua lança, pronto para atacar.

“Não!” Mami saltou para o alto para esquivar e olhou para trás.

O outro cavaleiro não estava olhando para ela. Na verdade, ele estava de costas.

Mami arregalou os olhos. Rapidamente, ela fez laços saírem de suas mangas, formando dois canhões de cano curto. Disparando ambos em uma direção, ela se impulsionou para trás.

Ela pôde sentir o vento em seu rosto quando aqueles cascos gigantes do coice do cavalo passaram rentes a ela. Assustada, ela ficou vendo a passarela e seus cavaleiros sumirem na névoa.

Só então ela se deu conta que ainda estava voando. Ela desfez seus canhões em laços e procurou qualquer passarela onde pudesse se prender.

Mas não deu tempo.

O violento impacto atrás dela a fez perder todo ar em seus pulmões em um grito silencioso de dor. Agora certa que estava caindo, Mami só pôde cogitar que tivesse sido a mureta de uma passarela.

Em sua trajetória outra passarela surgira, as rochas vermelhas crescendo diante de seus olhos. Mami reforçou seu corpo com a sua magia e se preparou para o impacto.

O choque de lado fez seu corpo quicar uma vez. “Uuunnn...” Mesmo com a dor bloqueada, ainda sentira certo desconforto devido ao susto. Seu coração estava acelerado.

Um tilintar. O som do metal encontrando com a rocha.

Mami abriu os olhos e viu pequenos fragmentos do que outrora fora seu pino para cabelo. Com urgência ela se sentou, ignorando os temores em relação a um possível osso quebrado ou órgão esmagado. Para tudo isso havia solução, mas para o que ela começou a procurar, não.

Passando a mão em seu cabelo, ela viu que não estava mais com a sua boina. Mais apreensiva ainda, ela sentiu que seu outro pino para cabelo, o mais importante deles, estava ainda lá, mas com as pontas amassadas ou quebradas. Para seu alívio, no entanto, a gema em seu centro estava intacta.

Mas não suspirou, pois algo grosso estava escorrendo a partir de suas narinas. Ela passou a manga ali e o seu tecido claro ganhou tons rubros.

O som de marcha. Chamas tremulando pela névoa.

Mami esfregou com pressa para se limpar e estendeu o braço, se acostumando com as novas dores. Laços projetaram de sua luva, criando um mosquete de cano duplo. Precisava ter algum paz para se recuperar e então voltar a procurar pela Kyouko.

E quando encontrá-la?

A mão que segurava a arma estremeceu.

Mesmo que eu encontre a real Kyouko, o que posso dizer para ela?

O gosto do sangue preenchia a sua boca.

Por que ela deveria meu ouvir? Se eu não dei ouvidos a ela?

A arma caiu no chão. Estava pesada. Tudo pesava demais.

“Que senpai é essa? A quem eu quero enganar? Eu falhei com Miki-san, Akemi-san...”

A passarela começou a vibrar ritmicamente, acompanhando os passos dos soldados cada vez mais próximos.

“... e eu falhei com Kyouko... e não foi a primeira vez.”

Lágrimas não surgiram. Não... ela não podia se lamentar,a culpa era toda dela. Talvez aquilo tudo fosse a devida punição.

Um novo som de algo quicando na rocha. Não era só um, mas dois semelhantes. Eram latas de refrigerantes com rótulos pretos com bolas vermelhas.

Mami viu eles rolarem até os vultos dos soldados que despontavam na névoa e então estourarem, gerando uma grande barreira de bolhas. Mesmerizada com aquilo, ela mal percebeu a pessoa pousando na sua frente e a abraçando. Sentindo um impulso da outra, ela se viu novamente voando, as chamas ficando pequenas e desaparecendo, longas mechas de cabelo branco que balançavam.

Sentiu um impacto, mas bem mais suave que seu último. Os braços que a seguravam firme demonstraram cuidado ao colocá-la de volta ao chão. Quando a pessoa se afastou um pouco, ela se viu diante de um milagre.

“Bebe?” Mami falou com uma voz fraca, sem piscar.

Nagisa passou a mão no rosto da loira. “Oi...”

Que a segurou com a sua própria, em uma expressão quase imóvel, apenas um sutil movimento em seus lábios. “E-Eu estou sonhando?”

“Não.” Nagisa abriu um tenro sorriso.

Mami estremeceu, agora por não conter a alegria que estava emergindo. “Então a Lei dos Ciclos... ela...” Porém, ela desviou o olhar de súbito e ponderou. “Não... espere... você foi embora com a Akemi-san.”

“Eu fui embora com ela...” Nagisa franziu de leve com que ouvira. “Sim... foi isso...”

Mami voltou a olhar para Nagisa. “Ela está aqui?”

“Homura-chan? Sim, ela está com a Madoka. Kyuubey também está lá e... e...” Nagisa parou, vendo que Mami estava novamente imóvel, sem piscar.

A loira ficou por um momento de boca aberta, antes das primeiras palavras saírem. “Kaname-san?! Kyuubey?! E-Eles estão aqui?”

Nagisa acenou com a cabeça timidamente.

Mami arregalou os olhos, olhando para o chão, completamente perdida. “Oriko-san não mentira?! Mas...”

“Oh... você está se referindo a aquela garota.” Disse Nagisa.

Mami voltou com um olhar inquisitivo para ela.

Que a intimidou. “Erm... Logo que nós a encontramos, Homura-chan lutou contra ela.”

“Ela a matou?”

Nagisa sentira uma familiaridade naquele tom de voz, mesmo assim era perturbador, pois não deveria ter partido daquela pessoa. “Homura-chan bem que gostaria, mas a garota parecia que queria salvar Madoka. Então nós só a subjugamos.”

“Salvar Madoka? Do Kyuubey?”

“Acho que sim. Na verdade, Homura-chan disse que ia cuidar disso, ela parecia saber de algo, mas não quis me contar.” Nagisa sorriu para aliviar a tensão. “Sabe como ela é. Hehe.”

“Sim... sei. Então é isso que está acontecendo.” Com olhar perdido, Mami se pôs de pé. “Ok...”

Nagisa viu a outra garota pôr a mão sobre um laço ensangüentado amarrado em seu abdômen.

Algo que Mami notou. “Não se preocupe, já está seco. Não é tão grave quanto aparenta ser.”

Um dos lados daqueles cabelos loiros estava solto. Não havia um chapéu. Uma das mangas estava também com muito sangue. Mesmo sem considerar os pequenos, mas inúmeros machucados, Nagisa não estava muito convencida. “Tem certeza? Você pode descansar, eu a protejo.”

“Eu estou bem.” Mami deu um peteleco no cacho que sobrara, deixando seu cabelo completamente solto, seu pino com a gema servindo apenas como adorno. “Não tenho mais tempo para descansar. Eu... preciso encontrar a...”

Como Mami não terminara a frase, Nagisa inquiriu. “A bruxa deste lugar. Ela que é a...”

“Kyouko.”

Nagisa se calou. Vendo Mami naquele estado, ela não era capaz de mensurar a dimensão da aflição que ela devia estar passando.

“Bebe. Eu queria lhe fazer uma pergunta.”

A menina ouviu atentamente.

“Desde a última vez que a vi, eu andei pensando sobre o que aconteceu com Akemi-san. Sobre ela ter se tornado uma bruxa... agora Kyouko também.” Mami cruzou os braços e respirou fundo. “Eu não sei se você é capaz de me dar uma resposta.”

Nagisa abaixou a cabeça e ficou de costas para outra.

“Você, assim como Miki-san, por acaso passaram pela mesma coisa?” Mami continuou. “Esse é o destino das garotas mágicas?”

Então houve um silêncio entre as duas. Algo que apenas reforçou o que Mami estava acreditando.

Enfim, Nagisa o quebrou. “Está vendo aqueles símbolos nas rochas?”

Era como se a pergunta tivesse aberto os olhos de Mami. Sim, haviam estranhas marcações que se repetiam ao longo da passarela.

“Eu sou capaz de lê-los. É algo que se tornou natural para mim logo que fui levada pela Lei.” Disse Nagisa. “Você deve estar ciente dos símbolos em seu anel. É a mesma coisa e eles descrevem os nomes que recebemos.”

Mami ponderou, absorvendo aquela informação, antes de inquirir. “E o que está escrito nas rochas?”

“Ophelia.” Respondeu Nagisa. “Esse deve ser o nome de bruxa dela.”

“Nome de bruxa?!” Mami ergueu as sobrancelhas. “Da Kyouko?! Mas o que quer...”

“Isso Madoka me explicou. Antes mesmo de nós nascermos, já ganhamos nomes. É assim que os outros a nossa volta podem nos identificar.” Nagisa continuou. “Porém, isso apenas serve para descrever o tangível. Nossas almas tem um nome próprio, que é moldado a partir das emoções que sentimos, conforme nossos destinos são traçados.”

Mami olhou envolta, mais especificamente para os flashes de luz na névoa e as imagens que eles formavam.

“Eu me chamo Charlotte.”

A voz de Nagisa estava mais baixa, porém grossa, foi o que Mami notou. “Charlotte? Esse não é o nome daquela...”

“Conveniente, não é?” Nagisa se virou, sua face branca e olhos coloridos. “Afinal eu sou a bruxa da sobremesa.”

“’A bruxa da sobremesa’... acho que eu não deveria ficar muito surpresa quanto a isso.”

“Pois é.” Nagisa fechou os olhos com força, sorrindo, voltando para a sua aparência humana.

“Certo.” Disse Mami. “Se você consegue ler essas coisas, então você seria capaz de comunicar com a Kyouko?”

“Se ela dizer algo, eu até posso compreender.” Nagisa voltou a ficar séria, desviando o olhar. “Contudo, uma conversa seria outra história. Nessa condição, tudo fica diferente, entre emoções e memórias, ela está completamente perdida...” De repente, ela sentiu mãos segurando-a firmemente.

“ME DIGA! POR FAVOR!” Mami apelou em desespero. “NÓS PODEMOS TRAZÊ-LA DE VOLTA?”

Agora, o que Mami estava passando era mais palpável. Infelizmente, Nagisa estava consciente que aquilo era um caso totalmente diferente do que ocorreu com Homura. Sua limitada experiência só indicava Madoka como a única solução, mas não estava ao seu alcance. No entanto, ser responsável em esmagar as esperanças da pessoa diante dela, alguém de sua grande estima, era ainda mais impensável. “É... claro! A gente já fez isso uma vez... só que pode ser um pouco mais difícil.”

Mami continuou tensa.

“É que... uhmmm...” Nagisa fez uma careta, erguendo uma das sobrancelhas. “Somos só nós duas dessa vez.”

“Ah... verdade.” Mami virou a face, pensando a respeito. “Desculpe por assustá-la.”

“Não precisa.”

Mami acenou com a cabeça e se afastou. “Então o que podemos fazer.”

“Ela é agora uma bruxa que se identifica como Ophelia, mas as memórias da Kyouko-chan ainda estão lá, ela só não compreende o porquê.” Falou Nagisa. “Eu sei por mim que cada uma delas sempre está ligada com alguma emoção. Seria como montar um quebra cabeça e você, sendo a pessoa mais próxima dela, é a que teria mais chance de conseguir.”

“Eu estava tentando justamente isso.” Mami segurou seu queixo. “Hmmm... mas como vou achar ela entre tantas ilusões.”

“Ilusões?”

“É a magia dela, uma que ela perdeu faz um tempo, mas que agora retornou mais forte do que nunca...”

“Hmmm...” Nagisa ficou pensando com Mami por um tempo, até que seus olhos brilharam com uma idéia. “Eu acho que posso tentar algo.” Disse enquanto cutucava seu nariz.

Mami franziu a testa.

“Ah! É uma coisa de bruxa...” Nagisa ficou passando a mão em seu pescoço. “Haha...”

“Coisa de bruxa?” Mami sorriu com curiosidade, mas logo deu lugar para um semblante entristecido.

“Mami?”

“Desculpe. Desculpe...” Mami balançou a cabeça lentamente. “Eu gostaria de sorrir mais, mas a situação não permite.”

Nagisa concordou. “Sim. Sim...”

“Mas eu preciso dizer isso o quanto antes.” Mami levou as mãos ao peito. “Meu coração estava queimando, tamanha a saudade que tinha de ti, mesmo acreditando que eu poderia nunca mais revê-la. Estou realmente feliz, Nagisa.”

A menina correu e abraçou Mami. “Você vai ter tempo para sorrir, Mami, muito tempo.”

O corpo da loira não estava preparado para aquilo e reclamou de dor, mas lágrimas que desceram de seus olhos não eram por causa disso. Ela passou a mão para retirá-las, sentindo que Nagisa também estava passando por isso.

Peixes coloridos circularam as duas garotas abraçadas.

Até que Mami se moveu. “Nagisa, acabei de me lembrar de algo.”

Nagisa ergueu a cabeça, seus olhos avermelhados, a face molhada. “Sim?”

Mami inquiriu. “’Homura-chan’?”

Nagisa prendeu a respiração e engoliu seco.

“Que bom.”

“Hã?!”

“Akemi-san sempre foi alguém que manteve uma distância entre nós. Uma solidão consentida.” Mami ajeitou a toca marrom de Nagisa. “Quando conheci Madoka Kaname-san e vi Akemi-san de outra forma, eu cheguei nutrir esperanças, mas apenas isso. Agora, eu tenho certeza que o coração dela não está fechado. Obrigada.”

Nagisa não tinha o que dizer, apenas um sorriso fofo. Era realmente uma longa história.

“Pois bem.” Mami se afastou e se virou para onde caminho de pedra levava, seu cabelo solto liberando flores coloridas ao balançar. “Temos que ir.”

Nagisa estava mais aliviada ao ver que um pouco do jeito gracioso da loira havia retornado. Foi quando seus olhos brilharam com uma nova idéia. “Espere! Tem uma forma mais rápida de procurá-la.”

“Oi?”

“Monte em cima de mim!” Nagisa transformou sua face e de sua boca saiu voando a grande serpente, que circulou envolta da outra garota e ficou aguardando.

“Ah sim...” Mami acariciou o tecido negro com bolas vermelhas. “Muito bem, Bebe.” Ela pulou, ficando sobre o corpo da bruxa Charlotte. “Hmm... Eu vou acabar me desequilibrando assim. Só um momento.” Ela abriu os braços e deles saíram laços, que se enrolaram no corpo da bruxa, assim como nas pernas da garota. “Bem melhor.”

Charlotte dobrou seu corpo sinuoso, ficando face a face com ela.

“Agora é com você.” Mami deu uma piscadela.

A bruxa formou um sorriso com a sua gigantesca boca e abanou suas plumas azuis e vermelhas.

As duas saíram voando entre as passarelas.

“Bebe, me avise se encontrá-la.” Mami sentia seu cabelo esvoaçar com a velocidade. Enquanto procurou garantir se sua gema estava firme, a luz quente de labaredas chamaram a sua atenção. “Cuidado!”

Charlotte também percebera e fez uma curva abrupta para escapar da chuva de fogo.

Enquanto isso, Mami já havia encontrado os responsáveis. Soldados de papel em uma passarela acima delas. Ela estendeu um dos braços, criando vários mosquetes no ar, e, ao puxar o braço de volta, disparou.

Os soldados se abaixaram, se protegendo atrás da mureta.

Mami se preparava para criar mais mosquetes quando de repente tudo ficou de cabeça para baixo. “AAhhh!” Mais fogo vinha em outras direções e sua Bebe estava fazendo o possível para desviar. “RECUE! RECUE!”

Charlotte mergulhou fundo na névoa, até encontrar um local na barreira sem passarelas.

O coração de Mami, ou até mesmo todas as suas entranhas, quase saíra pela boca. Sua respiração era ofegante.

Charlotte se virou para loira, com as suas plumas baixas e fazendo um beicinho.

“Não Bebe... não é culpa sua.” Mami deu um tapinha no peito, recuperando o fôlego. “A idéia é boa sim, só precisamos de mais poder de fogo. Eu já cuido disso.”

Os olhos coloridos da serpente se arregalaram quando mais laços apareceram e se juntaram para formar uma base de metal circular sobre seu corpo.

Mami, agora sobre essa base, continuou tecer magicamente com os seus laços até criar um grande canhão de três canos.

Charlotte viu Mami manipular a arma, revelando que a base circular era rotativa.

“Tudo certo.” A loira colocou os braços acima da cabeça, formando um arco. “Estou pronta.”

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Kirika e Yuma caminhavam por uma passarela que não parecia ter fim.

“Será que a gente passou por alguma saída.” A pequena perguntou.

“Não sei, mas isso aqui tem que chegar a algum lugar.” Kirika respondeu. “Só se estamos andando em círculos, mas eu não acho, pois não temos visto mais nenhum monstro.”

“Hum... tomara que a mama esteja bem.” As palavras daquela garota mágica, cujos olhos eram tão estranhos, se repetiam na mente de Yuma. Até que uma luz violeta a chamou. “Papa! Sua gema está brilhando.”

“Sério?!” Kirika olhou para a menina. “Ei! A sua também está!”

“Hã?!”

Kirika levantou seu tapa olho para ver melhor, quando ouviu um som muito distinto.

Eram passos sobre poças da água.

Ela parou e olhou para o chão de concreto úmido. A névoa se dispersava e a cena que se apresentou a deixou atônita.

Um grande cristal, uma garota, muitos Kyuubeys, exatamente como Yuma havia descrito.

Porém havia algo a mais.

Em uma algazarra, pálidas crianças com roupas negras pulavam de uma poça de água para a outra. Uma delas estava olhando diretamente para ela.

“Quê...?” Kirika percebeu que aquelas ‘crianças’ não eram exatamente humanas.

A criança apontou para ela e as outras pararam de brincar.

“Olha! É a mama!”

Ainda um tanto desnorteada, Kirika atendeu ao chamado de Yuma e o citrino se encontrou com a oliva quando viu Oriko flutuando dentro de uma enorme bolha. A garota mágica branca estava se apoiando na superfície, apavorada.

Próxima a bolha, uma garota revestida em escuridão sorria.

“Ah... Você não poderia estar muito longe, não é?” Homura cruzou seus braços costurados. “Mas ao mesmo tempo estou surpresa com a presença dessa garotinha.” Ela desviou olhar e balbuciou. “Será que isso significa que...” Porém não terminou, pois sentiu a parte de trás de sua cabeça atravessando uma superfície lisa e então um puxão. “Gnn!”

Oriko havia empurrado a bolha contra outra garota, essa era a oportunidade que precisava. Puxando Homura pelas suas longas tranças, gritou. “KIRIKA! QUEBRE O PRISMA!”

“A-Amorzão?!” Kirika olhou para o prisma e aquela estranha coisa negra e viva que cobria metade dele. Em seu caminho, aquelas crianças surgiram com o que ela só pôde discernir como sendo grandes agulhas.

“AGORA!” Oriko voltou sua atenção para Homura.

A garota se debatia, com a sua cabeça e ombros já dentro da bolha. Ela estendeu a mão e uma energia escura se formou, criando uma ampulheta.

Rangendo os dentes, Oriko puxou as tranças com toda força.

“AAHHHG!” Homura entrou ainda mais dentro da bolha e ampulheta escapou de sua mão.

O Kyuubey que estava próximo viu ele se espatifar no chão e reverberar uma forte luz violeta.

Essa foi a última coisa que ele viu.

A explosão que se sucedeu desintegrou a criatura e jogou a bolha para o alto. O impacto empurrou Homura definitivamente para dentro da bolha, prensando Oriko contra a superfície do topo.

“Mama!” Yuma energizou sua vara.

Mas Kirika dessa vez conseguiu segurar a garota. “Espera!”

“Não! Temos que ajudá-la!”

“Não, temos que fazer o que ela pediu.” Kirika olhou para as crianças, que se aproximavam, escancarando seus dentes afiados. “Ela está tão desesperada, deve ser muito importante.”

“Mas...”

“Não se preocupe. O tempo estará do nosso lado. Kukuku...” Kirika conjurou suas garras. “Só que eu preciso da sua força. Eu vou guiar você.” Tocando com elas no chão, a garota formou uma aura violeta sob as crianças. “Vai amorzinho! Use seu poder sem medo!”

Yuma respirou fundo e golpeou o solo com a sua vara. Sua magia se misturou com a da aura, o verde preenchendo as lacunas deixadas pela violeta.

As bonecas pararam, maravilhadas com toda aquela luz. Só se deram conta do perigo quando seus corpos receberam um impacto que as arremessou para o ar.

Kirika abriu seus braços e, como se quisesse imitar, a aura violeta expandiu, tomando conta da galeria.

As bonecas, que outrora logo estariam de volta ao chão, agora pareciam flutuar.

“Caminho livre!” Kirika começou a correr.

“E-Ei! Papa!” Com Yuma dando seu melhor para acompanhá-la.

Homura, ainda se recuperando do ocorrido. Viu suas crianças caindo e dois borrões, um negro e um verde, passando rapidamente por baixo delas. “Não!”

Com seus braços jogados para trás, Kirika aproximava-se de seu objetivo. A garota dentro do prisma era o que interessava para Oriko, isso ela tinha certeza. A maior questão era quanto aquela coisa gosmenta negra, mas isso ficaria para depois de salvar seu grande amor.

Dúvidas são inimigas. Mente clara, uma virtude.

Até parecia que o ambiente concordava com aquilo, o caminho parecia estar mais iluminado.

Mas de uma sensação passou a ser uma certeza. Kirika parou diante da luz rosa que cobriu completamente o prisma.

Yuma também. “O que é isso?!”

A luz veio na forma de um flash para Homura, mas ela nem sequer piscou, aliás os arregalou, pois aquele desenho que se apresentou ela conhecia muito bem.

Kirika ficou hipnotizada com a gigantesca imagem de uma estrela de oito pontas com um par de asas brancas, até que a luz ficou ainda mais forte. “Droga!” Se protegendo, ela percebeu que havia surgido uma silhueta em meio a luz.

Um paladino e sua capa ondulante.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo: Meu sonho



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