Meu irmão? Ou meu Amor? escrita por Neko_kah


Capítulo 3
Beijo de irmão


Notas iniciais do capítulo

Boa noite gente linda



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/620767/chapter/3

Silêncio. Por um momento na escuridão de sua mente, Ikuto pensou estar de volta aquela casa. Não podia, não queria estar naquele lugar. Abriu seus olhos muito lentamente, esperando logo ouvir um grito ou um latido, o medo lhe veio à mente, ao corpo e ao seu coração novamente.

Olhou.

O cenário era diferente do que esperava, ele estava num quarto, não em um porão. E mesmo assim, não era nenhum quarto daquela casa na qual foi obrigado a limpar todos os dias.

Não. Era um quarto rosa, muito bonito e bem arrumado por sinal. Era um ambiente acolhedor. Aconchegante...

Ikuto via a sua frente uma porta de vidro que refletia a lua cheia rodeada de estrelas, umas mais brilhantes, outras menos, mas todas com sua beleza única naquele mar de escuridão chamado por nós de noite. Mas ele não ficou prestando atenção nisso, continuou olhando ao redor. Ao lado da porta havia uma escrivaninha, um pouco bagunçada, com livros, cadernos e canetas, os objetos pareciam ter sido usados recentemente.

Ikuto tentou afastar as cobertas para sair da cama, mas sentiu uma pequena dor em sua perna e em suas costas. Lembrou-se das chicotadas que levou nas costas e de que caiu enquanto tentava sobreviver nas ruas. Mas a dor era menor do que esperava, ele olhou para onde deveriam estar seus ferimentos e viu faixas no lugar. As faixas não o machucavam, não estavam apertadas, pareciam ter sido cuidadosamente colocadas.

“Quem faria isso?” pensou ele olhando mais ao redor do quarto. Notou uma porta entreaberta que parecia levar a outro cômodo da casa.

Um criado-mudo onde se localizavam um despertador, um abajur e... um prato com um belo pedaço de bolo e uma torrada com um pedaço de queijo derretido por cima. A torrada ainda estava quente percebeu ele, ao ver um vapor subindo dali. Alguém devia ter ido ali há pouco tempo, mas...

Aquilo era para ele?

Ikuto achava que não.

As pessoas são más, não faziam curativos e muito menos comida para gente como ele. Gente de rua. Ele sabia disso. Para ele isso era lei, pessoas são más e nada o faria mudar de ideia.

Nada.

“Isso deve ser apenas um sonho... ou talvez outro pesadelo.” Pensou ele. Mas mesmo aquilo sendo um ‘sonho’ ou a realidade, Ikuto sentiu sua fome vindo à tona. Ele não havia percebido o quanto estava faminto até aquele momento.

A comida podia estar crua, envenenada, seja o que for, mas naquele momento isso não importava.

Suas pequenas e frágeis mãos estenderam-se até o prato e trouxeram-no para perto do garoto.

Sem esperar mais nada, começou a comer. Comeu tudo que tinha ali, até o ultimo farelo. Sua fome diminuiu, dando espaço para ele pensar no que fazer a seguir. Alguns curativos e comida não eram motivos para confiar em alguém. Ele sabia que as pessoas adoravam fingir ser o que não eram.

Mentiras. Ele não iria mais viver em mentiras, iria viver independentemente. Sozinho.

Talvez quando crescesse mais fosse procurar sua irmã. Mas apenas para saber como ela estava. Depois iria embora. Arrumaria um emprego e viveria sua vida muito bem sem a ajuda de ninguém.

Ikuto ignorou a dor em suas costas e pernas e saiu da cama. Foi em direção a porta de vidro, talvez a sacada não fosse muito alta. Chegou lá percebendo estar enganado. Se ele pulasse dali, provavelmente acabaria quebrando alguma parte do corpo, ou pior, até morrendo.

Olhou ao redor, a lua não estava muito alta, não devia passar das 21h00min (09h00min). Percebeu então uma arvore muito grande, um dos galhos chegava a sacada e parecia um galho bem firme. Era isso. A chance estava ali, era agora.

Subiu no parapeito da pequena varanda e se preparou para pular no galho. A adrenalina nele aumentou. Estaria logo livre desses adultos ruins e sem coração.

Um, dois, tre-...

Ikuto caiu no chão da varanda.

– Ai - disse ele com as mãos nas costas. “O que aconteceu?” pensou ele, olhou para trás e viu a garotinha do outro dia, com seus olhos caramelo e seus cabelos rosados. Ela estava ajoelhada segurando seu braço. Ikuto entendeu então. Ela o tinha puxado no mesmo momento em que ele deu o impulso para pular. Isso provocou uma reação contrária, fazendo então ele cair para trás junto com a menina.

– Porque fez isso? – perguntou ele ainda desconfiado, mas sem conseguir desviar seu olhar da garota.

– Você ia cair - falou ela com uma expressão séria.

– Eu não ia cair. Eu ia pular na árvore e depois descer – disse ele ainda sentado. Por causa da dor não conseguiu levantar. Ela percebeu.

– E você pretendia sair pelas ruas afora e sobreviver de restos? – continuou ela com as sobrancelhas unidas– E com esses machucados? –

Ikuto se surpreendeu, antes ela pareceu tão pequena e frágil e agora, estava parecendo outra pessoa. Ele não a chamaria de fria, pois mesmo com aquela atitude séria, ela parecia preocupar-se com ele. Isso seria engraçado de testemunhar, se ele fosse outra pessoa. Mas ali, agora, ele estava confuso. Nunca tinha presenciado algo assim. Não era normal alguém se preocupar com ele além de sua irmã.

– Eu ia me virar – disse ele emburrado, mas ainda olhando para a garota atentamente, percebendo todos as detalhes de seu rosto.

– Ah tá, e eu sou feia. – disse a garota sem rodeios fazendo uma pose de convencida. Ela não aguentou muito tempo e logo começou a rir com sua própria comparação, um riso daqueles espontâneos. Verdadeiros.

Ikuto a olhou confuso, ela estava mesmo rindo apenas por aquela frase? Mesmo não achando muita graça, o riso alegre da garota o contagiou e um pequeno sorriso no canto dos seus lábios apareceu.

A menina viu que conseguiu faze-lo sorrir. Ela gostava dele. Desde que o viu naquele beco, sentiu algo em seu coração. Algo quente. Sentiu que deveria ser responsável por ele, mesmo ele sendo mais velho. Protege-lo. Ela já amava aquele garoto naquele pouco tempo que o viu. Um amor bom. Um amor de irmã.

Ela olhou para ele e percebeu que ainda segurava em sua mão. Intensificou um pouco mais aquele aperto por mais alguns segundos para solta-lo logo em seguida, mas apenas para poder abraçá-lo.

Seus pequenos braços entrelaçaram-se ao redor do pescoço dele e seu rosto ficou apoiado no ombro do garoto.

Ikuto surpreso com o gesto arregalou os olhos e ficou paralisado. Um abraço... Quando foi a última vez em que foi abraçado? Ele não lembrava.

– Não vá embora, por favor. Fique aqui. Eu prometo que nada ruim acontecerá se você ficar – disse a garota num tom sereno e gentil, abraçando-o mais forte ainda. Ela não sabia o quanto aquilo significou para Ikuto naquele momento. Ele então retribuiu o abraço e mesmo a menina sendo um pouco menor, ele conseguiu encaixar seu rosto no peito dela. Ele não queria que ela visse seu rosto agora, ele estava chorando. Sem barulho algum, silenciosamente.

Mesmo escondendo-se a menina soube, ela não disse nada, não riu dele, nem zombou. Apenas ficou ali. Abraçando-o gentilmente. Sentindo seu cheiro. Ficou ali no chão da varanda, quieta, deixando com que ele extravasasse toda a dor, todo o ódio, todos os sentimentos tristes e ruins. Seu corpo frio esquentando-se com o calor do corpo dela.

Naquela noite Ikuto sentiu-se melhor. A dor, a raiva, tudo, já era suportável.

Ikuto estava ainda um pouco surpreso e confuso. Ele sempre fora muito quieto e durão. Nunca chorou na frente de ninguém. Nem quando sua irmã foi levada. Nem quando apanhava. Nunca.

E então, simplesmente aparece uma garota que ele nem conhece e “puff”, a parte mais sensível dele aparece. A parte na qual ninguém pensou que existisse, nem sua irmã e nem ele mesmo.

Ikuto já tinha parado de chorar, mas continuava abraçando a menina. Alguns segundos se passaram e a menina de repente se afastou. Ikuto a olhou. Ela estava com cara de quem se lembrou de algo.

– Acho que estou um pouco atrasada, mas... Muito prazer, meu nome é Amu. E você? Como se chama? – falou ela com um sorriso.

– Ikuto – disse ele baixinho. Ela sorriu.

– I – KU – TO – brincou ela com o seu nome. – Ikuto nii-san – continuou.

– Ei, eu não sou seu irmão – disse ele um pouco bravo. Ela riu, o rosto dele tinha uma expressão divertida para ela.

– Agora é. Se você ficar aqui, é claro. – disse ela num tom quase que suplicante para ele – Você vai ficar né? –

Ele a olhou. Seu rosto demonstrava preocupação e súplica misturada com um pequeno sorriso tímido. Uma cena fofa.

– Ta bom. – Disse ele após pensar um pouco. Percebeu ao dizer aquilo, que mesmo que os pais da garota o maltratassem ou gritassem com ele, ele ficaria ali, apenas para vê-la sorrir. Apenas para abraçá-la. – Eu fico.

Amu abriu um sorriso enorme ao ouvir aquelas palavras. Ela estava muito feliz. Agora ela tinha um irmão mais velho. Um irmão no qual ela amava muito.

Ela logo o abraçou novamente, olhou nos olhos dele.

Ele desviou o olhar, virando o rosto e fazendo um biquinho. Ela riu de sua reação. Amu apertou o abraço e foi dar um beijo na bochecha dele, mas não antes de Ikuto resolver virar o rosto para olha-la devolta.

O beijo que antes era na bochecha, virou então um pequeno selinho nos lábios do garoto.

Os dois ao perceberem arregalaram os olhos e afastaram-se. Amu nunca tinha beijado alguém assim. Ikuto também não, mas a diferença é que Ikuto havia visto muitas vezes o “velho” se agarrando com mulheres que ele levava em casa. Ikuto mesmo sem querer, aprendeu vários coisas, algumas das quais pareciam impossíveis. Achava aquilo nojento e repugnante. Mas com Amu foi diferente. Aquele pequeno beijo criou nele uma adrenalina na qual nunca sentiu.

Ele queria mais.

Amu, por outro lado, ficou um pouco constrangida com o acontecido. Um vermelho apareceu em suas pequenas e macias bochechas.

Ela se afastou.

– D-desculpa, foi sem querer – disse ela ainda mais vermelha. Ikuto não se conteve e pela primeira vez riu de verdade. Um riso cheio de alegria e... uma segunda intenção escondida nele...

– Não ria – disse ela fazendo um biquinho. Ikuto olhou para ela. Sorriu debochado.

– Amu... eu estou rindo, porque isso é normal entre irmãos. Todos os irmãos se beijam assim. E então quando você se desculpou eu tive que rir. – disse ele com a maior naturalidade do mundo. Viver na casa daquele velho por um ano inteiro, ao menos ensinou Ikuto a mentir bem.

– É mesmo? – disse ela com as sobrancelhas um pouco juntas e ainda com um biquinho.

– Sim – disse ele, se aproximando rapidamente de Amu e dando-lhe outro beijo suave em seus pequenos lábios. Sentiu um pouco de dor em suas costas com o movimento repentino, mas tentou não demonstrar.

Amu ficou mais vermelha ao receber outro beijo de Ikuto. Mas logo voltou ao normal percebendo que já estava na hora do garoto descansar, se ele ficasse ali a dor poderia aumentar, e ela percebeu que a dor tinha voltado.

– Ta bom Ikuto, mas agora deu. Vem. Você não deve ficar aqui com esses machucados. Volta para a cama e durma um pouco – disse ela mudando rapidamente sua personalidade. Agora Amu estava sendo responsável.

Amu levantou-se puxando Ikuto e o levando de volta para a cama. Ele não resistiu e deixou-se ser levado por ela.

– Agora fique aqui, vou avisar a mamãe que você acordou. – disse ela já indo para a porta.

– NÃO! – disse ele de súbito ao ouvir a palavra “mamãe” – ahn, não precisa incomodar ela, - continuou ele tentando disfarçar seu medo. Na mente dele, os adultos eram ruins. Não o culpem por achar isso. Você acharia a mesma coisa se vivesse trabalhando e servindo um garoto mimado com um Rotweiller o dia todo.

Amu notou a mudança repentina de voz. Tinha alguma coisa errada...

– O que foi? Você está escondendo alguma coisa de mim, não é? – perguntou ela olhando-o diretamente nos olhos.

– N-não – disse ele sem conseguir disfarçar direito a mentira desta vez. Ele tinha medo que o forçassem a falar... Igual faziam com ele antes...

– Não precisa contar. Eu não vou te forçar está bem? Mas tenho que chamar a mamãe ta? Ela estava preocupada e disse que se você acordasse era para eu avisa-la. Não se preocupe. Ela é muito legal... Ah, e não fuja – disse ela com um sorriso, saindo do quarto e fechando a porta, sem dar tempo para ele contestar.

Ikuto se surpreendeu por ela não ter o forçado a falar nada. Ficou um pouco feliz com isso, mas ainda estava com medo...

Minutos intermináveis passam para o garoto. Segundos mais ainda...

Um segundo...

Dois segundos...

Três segundos...

Finalmente após cinco minutos e alguns segundos a porta do quarto se abre revelando Amu com sua mãe logo atrás. Ele treme, mas não demonstra medo, fica com uma expressão séria.

– Então você acordou ahn? Está melhor? Meu nome é Midori Hinamori, mas pode me chamar apenas de Midori – diz a mãe de Amu aproximando-se do garoto. Ikuto apenas mexe a cabeça em sinal de concordância ao mesmo tempo em que observava todos os movimentos da mulher a sua frente.

– Que bom então. Bem, vejo que já comeu e já conheceu minha Amu, né? Espero que os dois se deem bem. Vou trazer um colchão aqui para você poder dormir hoje, e amanhã já arrumarei o quarto de hóspedes para você. Então não precisará dormir no chão. – diz ela gentilmente.

Amu apenas fica olhando com um sorriso no rosto. Estava feliz que Ikuto iria ficar. Estava feliz em ter um irmão.

– Eu... vou ter uma cama? – perguntou ele surpreso.

– Mas é claro, não achou que ia ficar dormindo num colchão não é? Você terá uma cama até encontrarmos os seus pais e aí você poderá voltar para casa. – diz ela dando um sorriso.

– Eu... Eu não tenho mais pais... Eles morreram... Num... Incêndio é... E eu consegui fugir antes – disse ele o mais rápido que pôde para que não resolvessem ir atrás de sua história, descobrirem tudo e o levarem de volta para aquele “velho nojento”.

– Ah, meu Deus, meus pêsames, eu não sabia. Desculpe. Mas então... Fique aqui com a gente... Que tal? Pode ficar o tempo que quiser. Já o considero meu filho. – disse a Sra Hinamori para o menino.

– Não se desculpe a culpa não foi sua. E... – Ikuto olha para Amu, para seus olhos caramelo, para seus cabelos rosados... Para sua boca... Eu fico sim.

– Ah, que maravilha. Então está decidido. Ótimo. Vou lá buscar seu colchão. Hoje você dorme aqui com sua mais nova irmã e amanhã já poderá ficar no outro quarto. – diz ela saindo do quarto.

Amu sorri.

– Weeeeeeeee, você vai ficar – diz ela pulando na cama e abraçando-o fortemente.

– Aii... aii... ta doendo, doendo. – Ikuto geme um pouco por causa dos machucados.

– Ops, desculpa, foi sem querer. – diz Amu soltando-o e inocentemente dando-lhe um beijo na boca de Ikuto.

Ikuto arregala os olhos. Amu percebe.

– O que foi? Beijo de irmãos esqueceu? – diz ela confusa.

– Ahh, claro, sim, sim. – Ikuto diz lembrando-se do que disse antes. – Sim, beijos de irmãos. – Conclui ele com outro beijo.

Logo Ikuto começa a rir com a inocência da menina. Amu não entende e fica ali o olhando confusa, mas não conseguiu perguntar o porquê das risadas. Sua mãe abre a porta trazendo o colchão, o travesseiro e uma coberta.

– Aqui está – diz ela arrumando o colchão. – Hora de dormir. Os dois.

– Eu fico no colchão hoje mãe. Ikuto pode ficar aí hoje. – diz Amu já pulando da cama para o colchão.

– Tanto faz desde que você vá dormir agora, - diz a mãe com um olhar de “já-está-tarde-demais-para-crianças-estarem-acordadas!”.

–Hai, hai – diz Amu – Boa noite Mamãe.

– Boa noite Amu, boa noite Ikuto. -

–... Boa noite Sra Hinamori – diz Ikuto baixinho, logo adormecendo, estava mesmo bastante cansado.

Midori sai do quarto. Amu fica olhando o rosto adormecido de Ikuto até adormecer também.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gostaram? Odiaram? Me deem um sinal de vida D:



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Meu irmão? Ou meu Amor?" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.