Pensão da tia Odete. escrita por Costa


Capítulo 4
Capítulo 4




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Estava dormindo, bem dentro do normal para aquele lugar, quando a maldita da vizinha de cima colocou a música no último volume novamente. Com o susto quase cai da cama. Levantei esbravejando e fui para a sacada. Será que aquela desgraça não dormia? Ainda eram 6 horas da manhã.

–Ô do rádio? -Gritei da sacada.

Esperei um pouco e nada, mas também seria impossível ouvir algo com aquela música alta.

–Senhora, será que dá para abaixar a música, por favor? Quero dormir. –Gritei novamente e nada.

Fui até meu quarto e peguei uma vassoura. Subi na mureta da minha sacada e comecei a bater na sacada da maldita. Tomara que assim eu conseguisse chamar a atenção.

–Depois eu que sou a culpada de você ficar dando show! –A vizinha da sacada ao lado falou.

Quando olhei até me assustei era a criatura nefasta, era a Lívia.

–Não estou dando show, apenas quero dormir, mas com essa música é impossível. –Falei.

–Eu também queria dormir, mas fui acordada por uns gritos de um louco.

–Não sei como consegue dormir com essa música.

–É questão de costume, mas com seus gritos eu não consigo. A proposito, bonita cueca, acho que o Camilo e o Ricky Martin gostaram. –Ela falou rindo e apontando para baixo.

Só então me dei conta de que estava apenas com uma samba-canção em pé na sacada e da rua o gay com o cachorrinho me despia com os olhos. Me senti estuprado por aquele olhar. Desci rapidamente e coloquei uma calça e uma camisa e voltei para a sacada.

–Ui, isso tudo é medo? –Ela me alfinetou.

–Não tenho medo de ninguém, mas não queria bancar o ridículo aqui, de ridículos já bastam vocês. –Falei.

–Você é um amargado mal humorado. Precisa aprender a ser mais sociável com as pessoas e levar as coisas com mais diversão.

Agora quer dizer que eu sou o Amargado e o mal humorado? É muito abuso mesmo dessa dai.

–Prefiro nem te responder, dona. Não quero ficar aqui discutindo com você.

–Nem eu quero discutir com você, é gastar saliva. –Ela disse e entrou para o quarto.

A vizinha de cima ainda não tinha saído, não poderia também deixar aquilo assim. Onde estava a política de boa vizinhança daquela pensão? Saí do meu quarto e subi as escadas até o terceiro andar. Tentaria conversar primeiro com a moradora antes de fazer uma queixa para a proprietária. Tomei coragem e bati na porta. Tive que bater algumas vezes para ser atendido e quando a porta finalmente se abriu era a piranha do outro dia que mandou a Lívia me bater. Ô ódio!

–E aí, bonitão. Deve ser o novo morador que o pessoal falou. –Ela me cantou na maior cara de pau.

Por sorte ela não me reconheceu. Ao menos não sentiria raiva de mim, por enquanto.

–Oi. Sou eu sim.

–A que devo essa magnifica visita? Quer entrar?

–Não, não quero. Só queria pedir se a senhora não poderia, por favor, abaixar um pouco a música. É que eu preciso dormir e não consigo com o som tão alto assim.

–Dormir agora? Mas você não trabalha não?

–Trabalho, mas a noite.

–Eu trabalho em casa e não consigo fazer nada sem música, posso abaixar um pouco, mas não desligarei. Tudo bem?

–Claro, agradeceria muito.

–Por nada. Faço tudo por você. Mas, qual é mesmo seu nome?

–Rogério.

–Sou a Flávia. –Me puxou e beijou-me a bochecha.

–Prazer, senhora.

–Senhorita.

–Senhorita, desculpe-me.

–Vou lá abaixar, mas fica me devendo uma. Depois tomamos uma cerveja para compensar.

Com você? Nem morto.

–Claro, mas deixa eu ir que realmente preciso dormir um pouco.

Sai de lá quase fugindo, mas, quando achei que fosse chegar ao meu quarto, Camilo e Ricky Martin apareceram como num passe de mágica. Só faltou a purpurina colorida.

–Bundinha! –Juro que entendi ele falar bundinha olhando para minha bunda.

–Bom dia.

–O que aconteceu com você? Estava lá pendurado na sacada.

–Nada de mais, um assunto sem importância, mas que já resolvi.

Ele já estava me dando medo, me olhava de cima a baixo. Como queria entrar correndo ao meu quarto

–Que bom, fico feliz que tenha resolvido.

Nesse momento apareceu a outra mariposa, a ranzinza que eu não sei o nome, me olhava com uma cara de ódio como se quisesse me matar.

Ainda não tá pronto, Camilo? Vamos nos atrasar para o trabalho. –Ele gritou com o amigo ou namorado, não sei o que são.

–Aí, Jorge, deixa de ser chato e neurótico. O salão só abre às 8 horas, dá tempo.

–Dá se você não demorar para se arrumar, mas você sempre se arruma mais que o necessário.

–Tenho que ficar bonita, ora.

–Tá, mas vamos logo.

–Tá bom, seu chato. Até mais, vizinho.

A mariposa alegre saiu saltitando com o cachorro e o outro continuou me olhando feio.

–Abre o olho, hein, novato! –Me ameaçou e saiu andando.

Entrei no meu quarto ainda não acreditando que tinha sido ameaçado por um gay ciumento. Esse dia estava estranho. Tirei minha calça e minha camisa e deitei-me na cama. Agora, sem ouvir aquela música horrorosa, conseguiria dormir. Estava quase pegando no sono e outro nefasto som começou. A maldita aumentou novamente o volume. Sai, possesso, para a sacada com a vassoura. Já estava subindo na mureta para tentar chamar a atenção da Flávia quando uma voz irritante me desviou do meu objetivo.

–Não é ela. –A criatura, da outra sacada, falou.

–O quê?

–A música. Agora sou eu.

Era brincadeira. Ela estava fazendo para me irritar.

–Será que a madame pode abaixar?

–Não, não posso. Já que você me acordou e depois que acordo não consigo mais pegar no sono, resolvi arrumar meu quarto e só consigo fazer isso ao som de uma boa música.

–Desde quando pagode é boa música? Música boa é rock, Elvis Presley.

–Querido, eu vivo no Brasil e amo pagode, samba. Nada dessas gringolandias suas.

–Se não abaixar eu vou reclamar com a proprietária.

–Pode ir, a tia Odete e o seu Rodolfo saíram mesmo, não há ninguém e, se quer saber, eles também adoram essas músicas.

Tentei mudar de tática e ser bonzinho.

–Será que você pode abaixar, por favor? Mais tarde precisaremos trabalhar e não conseguiremos se estivermos com sono.

–Fale por você. Eu consigo levar o trabalho numa boa, mesmo sem dormir.

Agora eu tinha certeza, era pra me irritar.

–Você me paga, me aguarde!

Entrei para dentro, estressado, afundei no travesseiro e tentei cobrir a cabeça para abafar um pouco o som. Mesmo com essa música horrorosa e sabendo que, provavelmente não conseguiria dormir, tentaria.

Continua.


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