A Retribuição escrita por BadWolf


Capítulo 31
Os Preparativos de Uma Guerra


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Bom, o cap disse tudo.
Mas ao contrário de fardas e coturnos, nossos personagens vestem... Smoking?

Boa leitura!



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Cerca de meia-hora tinha se passado, e Holmes estava ainda terminando de usar o smoking que ele tanto detestava. Sequer se lembrava da última vez que usara, e Esther precisou pregar um botão de última hora. Era a primeira vez que ela o vira tão elegante, ou ao menos mais elegante que o habitual.

–Acho que sua gravata está torta. – ela disse, tentando ajeitar o colarinho.

–É só uma gravata, Esther. Ninguém irá perceber.

–As pessoas costumam perceber. Bom, ao menos é o que eu acho.

Holmes a observou por um instante, e perguntou.

–Você nunca foi a um baile de gala, não é?

Ela assentiu. – Não. Mas também, eu confesso que não me deslumbro com grandes festas. Acho que iria me sentir um peixe fora d’água diante de tanta ostentação.

–Esta é a reação que eu sempre senti. Uma angústia, um deslocamento. Ficava metade das festas fumando, do lado de fora. A outra metade, tinha que cumprir obrigações, cumprimentar pessoas hipócritas...

Ela percebeu que Holmes estava desanimado.

–Vamos lá, não fique assim. Pense que a ocasião é importante. Você está prestes a apanhar um homem poderoso, o homem que destruiu minha família, que me perseguiu a vida inteira, que...

Ele percebeu as lágrimas escapando do rosto de Esther.

–Está acabando, Esther... Prometo a você, está acabando. – disse Holmes, abraçando-a com ternura.

–Eu... Eu não posso te abraçar, vai amarrotar o seu smoking. – ela disse, chorosa.

–Dane-se o smoking. Nada deve importar mais que vê-la bem. – ele disse, com afeto, deixando Esther melhor.

Nenhum dos dois percebeu, mas Watson tinha entrado sem querer no apartamento de Esther, sendo surpreendido pela raríssima cena de afeto protagonizada pelo seu amigo. Nem mesmo em seus maiores devaneios, Watson seria capaz de imaginar que Sherlock Holmes poderia ser afetuoso com uma mulher.

Ele realmente a ama.

Antes que estragasse tudo, Watson deu dois passos para trás e fingiu bater a porta outra vez, interrompendo o abraço do casal.

–Holmes? Você já está pronto?

–Sim, eu estou, Watson. Apenas um instante. – ele respondeu, ao grito. – Até mais, meu amor. – disse, num raro rompante de carinho, dando um beijo apaixonado em Esther.

–Até mais, Holmes. E cuidado.

Watson estava sem jeito. Tinha, outra vez, presenciado um momento privado do casal, e esperava que Holmes estivesse absorto em seu objetivo para que não percebesse seu desconforto. Embora ele tivesse perdoado a ambos, ainda era difícil imaginar Sherlock Holmes, o solteirão convicto da Inglaterra e desprezador do belo sexo, sendo carinhoso com uma mulher que, há pouco tempo atrás, era sua noiva. Algo difícil de exigir, mas que ele esperava conseguir com o tempo.

–Você está armado, Watson?

Watson mostrou seu revólver militar, com o tambor carregado. Holmes ficou satisfeito.

–O inimigo que temos adiante é uma raposa perversa. Não saberemos o que ele será capaz quando sentir-se acuado. Ele é um veterano de Guerra, Watson, assim como você. Enfrentou guerras e revoltas em seu país, e é consideravelmente forte para um homem de sua idade, assim pude constatar.

–Veremos o quanto, Holmes. Ele pode possuir todas essas características, mas pelo que contastes, ele agira com certa imprudência.

–Sim. Ele deixou pontas soltas, especialmente seus capangas russos. Acho que ele não imaginou que eu pudesse revertê-los ao meu favor.

–É difícil conseguir lealdade a troco de ameaças e trabalho escravo, Holmes. Devemos nos lembrar que os donos de escravos nestes países tropicais dormem temendo que uma revolta de seus escravos aconteça debaixo de seus pés.

–De fato, Watson. De fato.

–E Esther? O que ela irá fazer?

–Pedi que ela fosse á casa de Mycroft, pois acredito que lá ela estará mais segura. Temo que algum capanga do Duque possa fazer alguma coisa contra ela. Será mais difícil lá porque desde que sofrera o atentado o meu irmão reforçou a segurança. Há agentes do Governo ao redor da casa. Não ousarão se intrometer ali.

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–Sherlock Holmes e Dr. John Watson!

Anunciou o mordomo a presença dos dois ilustres convidados, arrancando olhares de metade dos presentes. Holmes raramente fazia aparições em público, mas aquela era uma ocasião especial. Mal tinha dado dois passos no imenso salão de festas, ele já receber uma recepção calorosa.

–Watson, é um prazer vê-lo novamente! Vejo que trouxe seu amigo. – disse o Lorde, apertando a mão de Holmes com entusiasmo.

–Estou sem casos no momento, Milorde, e pensei em retribuir o seu convite. – disse Holmes, educadamente.

–Ultimamente Holmes anda muito ocupado. Desde que voltou à Inglaterra, seus clientes triplicaram. – disse Watson.

–O que não é de se espantar. Mr. Holmes é um grande detetive, o melhor do mundo, ouso dizer. Aliás, espero que ainda lances algum conto contando o que Mr. Holmes andou fazendo durante esses anos sem dar-nos sinal de vida. – disse o Lorde, com simpatia.

–Um dia, quem sabe... – disse Watson, olhando para Holmes com certa tristeza.

–Aliás, Mr. Holmes, irei chamar minha esposa. Tenho certeza de que ela ficará fascinada com sua presença. Aguarde um instante.

Quando o Lorde já estava longe o bastante, Holmes soltou um suspiro. – Por quanto tempo terei de aguentar isso?

–Acalme-se, Holmes. Iremos falar por uma meia hora e depois sairemos para fumar. É infalível porque o Lorde não pode mais fumar por causa de seu problema pulmonar. Então, teremos tempo para achar o Duque. Bem simples. Aliás, eu ainda não o vi... Será que ele está mesmo aqui?

–Tenho certeza que sim. Há muitos amigos dele por aqui. Ele não perderia essa festa por nada. De qualquer modo, se ele não estiver aqui, significa que já está à milhas daqui, o que torna esse baile nossa melhor oportunidade de pegá-lo.

Holmes estava bebendo champanhe, que tinha acabado de ser servido, quando um nome clamado pelo mordomo atraiu sua atenção imediata.

–Pavlov Levinsky Strauss Liztnukvich Bukszvek Ivanov, Vossa Graça, o Duque Ivanov.

Um homem altíssimo, de quase dois metros de altura de grande porte e um tanto assustador, que lembrava brevemente o porte de um urso, entrara no ambiente. Tinha uma barba espessa, quase cobrindo-lhe todo o pescoço e já grisalha, que denunciava sua idade de cerca de sessenta anos. Os olhos eram azuis e as sobrancelhas grossas, que davam-lhe um olhar forte e decidido. O andar era de um militar, tal como denunciava suas vestes, uma farda militar russa de gala, repleta de medalhas a adornar seu peito

–É ele. – sussurrou Watson.

–Exatamente. O Bravo Urso de Moscou.

–Literalmente, parece um urso.

Holmes riu com o olhar aparentemente amedrontado de Watson.

–Com medo, Watson?

–Não. Só... Bem, a um senhor de idade, ele mantém-se ainda muito imponente. Mas acho que já enfrentamos adversários piores. O padrasto de Miss Stoner, aquele entortador de atiçadores de lareira...

–Não tenho tanta certeza. – afirmou Holmes. – Não é a corpulência deste homem que me assusta, Watson, mas sua esperteza. Decerto ele arquitetou esse plano há anos, minuciosamente, cercando-me e me atingindo por todos os lados, me assistindo ser golpeado com diversão.

–Estaria à altura de Moriarty?

–Não tanto. Mas não deixa de ser um adversário excepcional.

Após deixar sua casaca com um dos empregados, os olhos do Duque imediatamente voltaram-se à Holmes e Watson. Ele não parecia surpreso com a presença dos dois por ali. Ou, se estava, disfarçou muito bem. Holmes manteve seus olhos fixos nele, com o rosto sereno. O Duque devolveu-lhe um olhar mortífero.

–Se um olhar matasse, meu caro Holmes... – balbuciou Watson, enquanto bebia champanhe. – Será que ele irá fugir?

–Duvido muito.

O baile prosseguiu, com os dois adversários a uma distância respeitável, porém insuficiente para neutralizar o ódio resplandescente em cada um daqueles olhares.

De repente, o Duque pegou uma taça de champanhe e se afastou da festa, sem ser notado pelos outros. Não por Holmes.

–Ele está se afastando, Watson. Hora da abordagem.

Holmes e Watson caminharam até sua direção, torcendo para que nenhum convidado amistoso se aproximasse no momento errado. O Duque seguia, adentrava pelos aposentos, que erma imensos, quase incamuflável. Holmes e Watson lhe seguia, mantendo uma distância respeitável.

Num dado momento, o Duque adentrou a uma porta. Havia uma tensão no ar e Watson teve dúvidas se sacava seu revólver ou não. Holmes o deteve, pois precisavam ser discretos. Um confronto ali, iniciado por ambos, poderia dar vatangem ao Duque. Todo cuidado era pouco e ambos tinham chegado longe demais.

–O que faremos? – perguntou Watson, ao cochicho.

–Ele sabe que o seguimos, Watson. Só quer ter uma conversa em um local privado. – disse Holmes. – Mas esteja alerta.

Watson assentiu, e juntos, entraram no cômodo. Era uma escada, que certamente dava para o terraço da casa. Um local privado, mesmo.

–Vejo que nos encontramos, detetive. – disse o Duque, de costas, contemplando a vista daquela magnífica mansão naquela noite de lua cheia.

–De fato. – respondeu Holmes.

–Se nosso encontro está acontecendo agora, posso concluir que descobriu quem estava pisando em você nos últimos tempos. – disse o Duque, virando-se para encontrar Holmes e Watson. – Mas é uma pena que seu lacaio não esteja completamente a par dos fatos. Queria tanto que essa minha aventura se tornasse um caso...

–Conde.

–Duque. Fui condecorado pelo Czar.

Duque. Certamente um adversário digno de ilustrar um dos romances de meu amigo.

–E sei bem porque não posso. Narrar esta pequena aventura que tivemos implicaria que o grande público tivesse acesso ao maior segredo de Sherlock Holmes. Não é mesmo, Watson?

Watson sabia do que o Duque estava falando, e tentou não demonstrar a dor que aquela questão lhe trazia.

–O detetive escapa da morte, mas não volta para casa. Vai à Itália, Tibete, Meca, atravessa meia Pérsia, retorna à Itália e... Bem, no meio do mar se apaixona. Uma judia, filha de um espião inglês que investigava os aliados do Czar na Rússia. Como era que você dizia, Mr. Holmes? Não, espera, não estrague minha tentativa, eu juro que decorei essa passagem justamente para este momento...

O Duque começou a rir, como um psicopata.

–Parece que seu público iria ficar decepcionado ao perceber que seu grande detetive, o homem inquebrável, racional, perdeu-se de amores por uma mulher... Esta é a segunda que o enganou, não foi?

Holmes não entendeu onde ele queria chegar, mas escondeu.

–Eu sempre gostei de meninas, Mr. Holmes, essa é uma fraqueza minha. E quando aquele imbecil do Abraham trouxe seus dois filhos para um jantar em minha casa... Aquela menininha, de cabelos loiros, com aqueles olhos verdes tão curiosos e... Sedutores...

Holmes sentiu repugnância, e um asco que lhe torcia o estômago. Apenas uma força descomunal o impedia de pôr suas mãos naquele homem asqueroso.

–Claro, Abraham percebeu minhas intenções e tentou cortá-las. Quando soube que mandaria sua família de volta á França eu percebi que era hora de agir. Ele foi ao meu escritório em uma tarde e nunca mais voltou para casa. Finalmente, encontrei-lhe uma oportunidade de verdadeiramente ser útil ao meu país, trabalhando para mim.

–E o que fez quando descobriu que ele era judeu?

O Duque segurou um riso. – Não esperava por isso, confesso que fiquei surpreso. Um dos capatazes disse que ele era circuncidado. Isso tornou as coisas mais divertidas, no fundo. Dmitri, que ainda se preparava para ser o meu braço direito, tinha planos de se casar com a filha, e se viu não mais inclinado a isso. Afinal, quem desejaria tomar uma judia como esposa? Mas eu lhe disse que não tinha problemas em se divertir com eles, ao menos para isso eles serviam. Mas ele insistia em um casamento. Eu acatei, a contragosto. Torturei Abraham para que ele assinasse a autorização, mas ele não o fez. Então, paguei para que um padre fizesse o matrimônio, uma certa burocracia. Mas não creio que seja a burocracia do casamento de Esther o mais interessante da história...

Holmes franziu sua sobrancelha.

–Você foi o primeiro. – ele antecipou.

–Exatamente. Sei que quando coloco meus pés em Londres, ela está me rodeando. Eu ficaria preocupado se fosse você, na qualidade de marido. Porque ela deve estar sentindo a falta de um homem de verdade. Homem este que ela provou ainda menina.

Watson segurou Holmes pelos braços. O Duque parecia se divertir com a reação de Holmes.

–Ela quer te destruir, seu miserável. E ela conseguirá o que quer. Esta noite! – gritou Holmes, com o ódio nos olhos.

–Veremos. O jogo ainda não terminou.

–Ele estará terminado em breve para você.

–Você pensa que eu não sei do mandado de prisão que estão preparando contra mim, Mr. Holmes? Da testemunha que conseguiu, das provas? Você deve imaginar que esta noite seja a última que eu passarei na Inglaterra, em todos os sentidos.

–Certamente, a última em liberdade.

–Uma possibilidade, sim. Mas eu sou um homem que enxerga alternativas. – disse o Duque, caminhando até um local específico e, para surpresa de Holmes, sacando uma espada. Como maneira de se defender, Watson sacou imediatamente seu revólver, e o ameaçou.

–Como um ex-combatente, Dr. Watson, o senhor deveria saber que um oficial jamais ataca alguém desarmado. – disse o Duque, com um sorriso escondido entre os bigodes brancos. – Guarde a arma, bom soldado. Não quero machucar você. Desta noite, só o que quero é uma testemunha.

–Testemunha para o quê?!

–Para o duelo que ocorrerá bem aqui.


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Notas finais do capítulo

EITA!!!!

Ufa... Ok, vamos por partes:

=Holmes de smoking
=O nome imenso do Duque (o que queriam, ele é um nobre, caramba!! Vocês já viram o nome e sobrenome do D. Pedro II? Procurem e me entenderão, rs)
=O Duque é um pedófilo
=Esther foi uma vítima dele (isso explica muita coisa, não? Coitada, nem gosto de imaginar o que ela passou nas mãos dele...)
=E será que teremos um duelo entre Holmes e o Duque??

Sabemos que Holmes é um bom esgrimista... Mas será páreo a um veterano de Guerra como o Duque??

Não percam, porque o próximo cap tá sinistro!!!

Até sábado!!!



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