A Retribuição escrita por BadWolf


Capítulo 3
Máscaras


Notas iniciais do capítulo

Olá, estou de volta!!!

Finalmente, veremos Holmes e Esther!

Agora, nossos personagens estão no século XX! Ano de 1900, para ser mais preciso! Se passaram cinco anos desde "Laços de Sangue e Fúria". É um tempo bastante significativo, portanto vocês terão algumas surpresinhas... Ou nem tão surpresinhas assim...

Hahahaha Boa leitura!



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Londres, Inglaterra. 20 de Fevereiro de 1900.


Meu amigo caminhava nervosamente de um lado a outro no cômodo. Cachimbo à boca, ele parecia reproduzir a intensidade de seus pensamentos em seus pés. Eu ficara ali, sentado em minha poltrona, com meu caderno à mão, apenas aguardando qualquer sinal de que aquele pequeno e denso problema seria, enfim, solucionado por sua perspicaz mente. Nossos corações encontravam-se aflitos, pois sabíamos que a vida de um homem de bem dependia de nosso próximo passo.

Até que Mrs. Sigerson rompeu um silêncio em meio à cortina de fumaça que já tinha se aglomerado pelo ambiente e de maneira perspicaz retirou-nos daquela escuridão.

“Por que a lareira estava acesa, se não havia ninguém em casa?”

Viramo-nos por um momento, completamente aturdidos. Percebi os olhos cinzentos de meu amigo iluminados, direcionados a também inquilina de Baker Street, Mrs. Sigerson, que ousadamente revelara suas impressões.

“Excelente ponto de vista, Mrs. Sigerson.”, reconhecera meu amigo, para meu total pasmo. Entretanto, sua voz permanecia a mesma impassível e metódica de sempre. As palavras de Mrs. Sigerson deram um novo ânimo ao meu amigo, pois havia interesse e intensa perspectiva exalando de seus olhos, que por sua vez se ilustravam em seu corpo, já desperto pelo novo rumo do caso e que lhe fazia se movimentar por todos os lados em nosso apartamento em Baker Street.


A leitura tinha sido realizada por Arthur Conan Doyle. Sentado em sua mesa do consultório, o oftalmologista entusiasta da literatura e publicador da história de Watson analisou o doutor, verdadeiro autor e narrador de suas histórias por baixo dos aros de seus óculos com olhar de preocupação.

–Watson... – ele ponderou. – O que significa isso? Esta já é a terceira vez que tenta inserir essa “Mrs. Sigerson” nas histórias de Sherlock Holmes...

Watson, que até então apenas aguardava pelo Dr. Doyle, finalmente respondeu. – E ao que parece, a terceira vez que sua participação será cortada de meus contos. Mrs. Sigerson mora no apartamento de baixo, eu já lhe expliquei...

–Sim, o que não é problema nenhum, mas ela vez ou outra está aparecendo por aqui, no meio de suas histórias. Até então, passagens breves, como a introdução de um novo cliente ao Mr. Holmes, mas agora creio eu que a participação dessa moça em suas histórias tenha passado um pouco do limite! Imagine, uma mulher opinando em assuntos masculinos... Dando palpites sobre um caso de assassinato! – o médico parecia horrorizado.

–Mrs. Sigerson não é uma mulher comum, se você pudesse conhece-la você entenderia...

–Watson, Watson... – interrompeu Doyle. – Eu reconheço que você ainda possa ter sentimentos por essa mulher, mesmo ela estando casada com um assassino foragido, mas... Veja bem. Recebo diariamente inúmeras cartas de mulheres interessadas em seu amigo. Você consegue imaginar que os leitores de seus contos podem torcer por um final feliz entre Sherlock Holmes e Mrs. Sigerson?

Watson parecia horrorizado com a mera hipótese. – Jamais, Doyle! Jamais! Isso é ridículo de se pensar! Meu amigo Holmes é um homem completamente focado em seu trabalho, misógino e desprezador de sentimentos. – ele rira. – Imagine, Holmes e Sophie juntos!

–Lembra-se dos problemas que “O Escândalo na Boêmia” trouxe? Até hoje recebo cartas horripilantes do Clube de Senhoras Londrinas da Igreja Anglicana por conta do simples “dar a entender” de sua narrativa quanto à possíveis sentimentos nutridos por seu detetive e uma golpista casada.

–Isso foi bobagem! – resmungou Watson. – Meu amigo jamais teve qualquer coisa de concreto com Adler. Eu apenas narrei os fatos como eles o são. Aliás, ocultar nomes verdadeiros já é um esforço de minha parte, porque se eu pudesse, diria toda a verdade: que foi o príncipe da Áustria, e não de um reino que sequer existe, que teve um caso extraconjugal com uma pianista americana...

Doyle o interviu. – Jamais chame Irene Adler de “pianista”. Sabemos que é verdade, ela é uma pianista, mas o público precisa pensar que ela é uma atriz. Torna sua reputação e caráter mais óbvio.

Watson suspirou. – Doyle, nós fomos amigos de faculdade. Tínhamos o costume de escrever, de mostrar um ao outro nossos contos... Eu respeito o seu trabalho narrando jornadas e aventuras em terras inóspitas, e jamais me intrometi nisto, e gostaria que isso fosse recíproco.

–Watson... Se eu altero uma coisa ou outra, entenda, eu o faço pelo seu bem. A sinceridade em um autor pode ser uma dádiva em alguns casos, como também pode levar à sua ruína. Garanto que você teria milhares de processos a responder se narrasse as coisas exatamente como elas aconteceram. Agora, perceba onde eu quero chegar: por mais que essa moça seja realmente ativa, ainda que o Mr. Holmes não goste dela, a entrada de um personagem feminino iria retirar a atenção do personagem principal, dos personagens principais, incluindo você. Precisamos que todos acreditem que lêem histórias de detetive, e não histórias românticas. Seu amigo, por exemplo, não reclama que as histórias são romantizadas? Pois bem. Imagine a reação dele se ele encontrasse Mrs. Sigerson em seus contos?

Watson se rendeu.

–Ele seria o primeiro a reclamar. Ambos se detestam.

–Pois então. Faremos assim, meu amigo. Editarei a sua história, retirando Mrs. Sigerson, e você se esforce em não acrescentá-la em suas narrativas, combinado?

Watson parecia hesitante, mas cedeu. – Combinado.

Ele já estava de volta à Baker Street, para almoçar rapidamente antes de retornar ao seu consultório. Assim que abriu a porta, encontrou Mrs. Hudson, com o semblante aborrecido.

–É bom vê-lo, Doutor. Aqueles dois estão quase se matando na mesa.

Watson suspirou, resignado. Sabia que aquela era mais uma discussão entre Holmes e Sophie. Ambos tinham gênios difícil que viviam em colisão. Desde que a moça se instalara completamente no apartamento de baixo seu amigo Holmes parecia mais irritado, especialmente quando ela acabava por se envolver, ainda que indiretamente, em seus casos. Mas desde que ela dera um palpite importante em um caso recente, Sherlock Holmes parecia ter adquirido uma implicância ainda maior com a moça.

Ele subiu as escadas, enquanto escutava uma discussão.

–O que pensa que vou dizer a minha amiga agora?

–Não é de meu interesse, Mrs. Sigerson. O fato é que seus argumentos são medíocres, quando comparados à importância do meu experimento.

–Você está atirando desde as oito da manhã! – bradou a moça irritada. Watson balançou a cabeça, pois já entendera o que estava acontecendo. Nos últimos tempos, Holmes parecia obcecado em criar uma roupa resistente a balas. Na verdade, seu experimento consistia em um pesado colete de aço, que o detetive ainda tentava encontrar uma maneira de conciliar peso leve à capacidade de resistir a disparos. Holmes certamente estava testando a capacidade de suporte do mesmo.

–Bom dia, senhores! – disse Watson, tentando quebrar o clima hostil entre os dois moradores. – Mrs. Hudson acertou no tempero da costela dessa vez?

Mas os dois continuavam a brigar.

–Por que não leva seu experimento a um local livre?

–Porque seria inapropriado. Pessoas estranhariam.

–Sim, mas precisa deixar isso na sala de estar?

–Meu quarto é pequeno e preciso de distância para efetuar os disparos. – disse Holmes, olhando brevemente para o manequim, com o colete cravejado de balas dos mais diversos calibres.

Watson sentiu um desejo de dizer “oi, eu estou aqui!”, mas limitou-se a arrastar a cadeira com mais força do que o comum, de modo que ambos foram forçados a voltar seus olhos para ele.

–Vejo que a reunião com Dr. Doyle foi bem-sucedida. Quantos vetos ele fez dessa vez?

Watson bufou. Aquele assunto o irritava. – Alguns. – disse, enquanto preparava seu prato. – Mas o que me surpreende é que nenhum de vocês, em todos esses anos de proximidade, não tenha sacado uma arma um contra o outro. Pensei que o tempo traria as coisas a seu lugar, mas...

–Mrs. Sigerson tem o dom de me irritar, Watson. – disse Holmes, olhando fixamente para Esther, com um olhar que deixava escapar, brevemente, o sarcasmo da situação.

Watson olhou de soslaio para Holmes, e para Esther, tentando entender como um homem poderia ficar enraivecido com a presença de uma moça tão estonteante como ela. Seu amigo era mesmo um caso perdido.

Watson almoçou brevemente e foi embora do apartamento, despedindo-se de seus dois amigos e deixando-os às sós. Como Mrs. Hudson estava ocupada no andar de baixo, ambos puderam conversar sem as máscaras do cotidiano.

–Belíssima atuação. – disse Holmes, com escárnio.

–Não foi uma atuação. Realmente, o som dos disparos assustou a minha amiga Molly. O que ela pensará de minha residência depois de ouvir tantos sons de tiros enquanto tomávamos chá juntas?

–Esther, era apenas um experimento... Eu não matei ninguém. E era melhor que eu fizesse de manhã do que durante a madrugada.

Esther ainda parecia irritada.

–Ainda assim... Molly já está deveras atormentada pela morte de seu noivo. E quando vem me ver, para conversarmos, acaba tendo de presenciar seu treinamento...

–Oh, então essa Molly é esposa daquele engenheiro morto no incêndio da fábrica de parafusos? – perguntou Holmes, interessado.

–Sim, ela mesma. Por que? Acaso está investigando o incêndio?

–Não. – disse Holmes, com convicção. – Convenhamos que seria uma perda valiosa de tempo o uso de minhas capacidades neste “incêndio”. Vejo-o simplesmente como uma fatalidade, algo que vez ou outra ocupa os noticiários, ainda mais em uma cidade tão cercada por indústrias como Londres. Mas devo dizer que a morte do rapaz foi intrigante. Enfrentar as chamas para salvar seu próprio trabalho... Deveras um apaixonado.

–Molly disse que seu noivo era talentoso e muito apegado aos seus inventos.

Com um dos braços apoiados à lareira, Holmes parecia pensar.

–Pergunto-me se ele faria o mesmo, para salvá-la.

Esther se irritou, com a frieza de seu marido.

–Holmes, não seja tão indelicado! É claro que sim.

Holmes ergueu uma sobrancelha, duvidoso.

–Ora vamos, Esther. Nem mesmo você tem tanta certeza. No fundo, mesmo a maior das paixões acaba sucumbindo à racionalidade diante da Morte.

Esther aproximou-se, braços cruzados e expressão séria.

–Está insinuando que você me deixaria para morrer?

Ele riu, divertidamente.

–Eu já coloquei minha vida em perigo por muita coisa cuja importância era bem menor do que sua existência.

Aquele argumento pareceu atingir Esther. Decidida, ela se aproximou devagar de Holmes, deixando seus rostos apenas a centímetros um do outro.

–Então... Você também seria capaz de enfrentar chamas apenas para me salvar, Mr. Holmes? – perguntou Esther, maliciosamente.

–Deveria saber que minha resposta é “sim”, cara senhora Holmes. – ele disse, em um cochicho ainda mais baixo. No entanto, um grito infantil ecoando do andar de baixo fez Holmes ficar alerta, interrompendo bruscamente o raro momento de intimidade entre os dois.

–Parece que temos novidades. – ele murmurou, animado.



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Notas finais do capítulo

Ah, esses dois... Ainda mantendo segredo, como puderam ver... E o que é pior, fingindo que se detestam! Pode isso, produção? Sacanegem com o Watson, coitado!

E alguém tem palpite de que "grito infantil" é esse? Hm?
Acho que eu vou deixar alguns em expectativa depois dessa.... Rs

Aliás, eu estou pensando em colocar a postagem dessa fanfic para todo sábado. Vamos ver.

Um bj! E deixem reviews!



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