A Retribuição escrita por BadWolf


Capítulo 24
Retaliações


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Vamos ver como Baker Street ficou depois dessa bomba??
Preparem-se, pois há muitos escombros.

Um abraço e boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/598932/chapter/24

A porta se fechou pesadamente. Holmes suspirou. Jamais pensou que um rompimento com Watson tivesse o poder de fazê-lo sentir tanta dor. Sem dúvida, o médico lhe era muito mais estimado do que ele admitia.

Eu o perdi, ele pensava. Perdi sua amizade, e com razão. Fui um crápula. Realmente, eu não sou merecedor de sua amizade. Só o que trouxe á ele foi dor e decepção. Quando voltei, após anos dado como morto, jurei a mim mesmo que jamais o enganaria. E o que fiz? Roubei a mulher que ele amava, em suas costas, e o enganei por cinco anos!

Eu fiz por merecer. Watson estará bem melhor agora, longe de alguém como eu.

–Holmes... – disse Esther, ainda soluçando. – Sherlock... Não fique assim.

–Esther, eu... Eu acho que é melhor que eu me afaste, ao menos por um tempo.

Esther não parecia satisfeita com isto.

–Mas para onde você vai? Pall Mall?

–Não, isto está totalmente fora de questão. Meu pai e meu irmão ainda estão na cidade e hospedados com Mycroft. Não quero encontra-los por lá. Talvez eu... Talvez eu alugue outro apartamento.

–Fique aqui, Holmes. Comigo. Há espaço suficiente para nós dois...

–Esther, eu não quero provocar Watson ainda mais morando com você...

–Não é uma questão de provocar, Holmes. Esta é a sua residência. Todos sabem que você mora aqui. Onde mais os seus clientes irão procurar-lhe?

Holmes parecia reflexivo a respeito.

–Eu não estou pedindo que... Assuma nossa relação. Vamos manter as aparências, do jeito que sempre funcionou. “Aparentemente”, você ainda mora em 221-B, e eu sou apenas sua vizinha, tudo bem?

–Você realmente não se importa de mantermos segredo a respeito de nós dois? – Holmes parecia descrente com a proposta de Esther.

–Sinceramente? Não. Como eu disse às vésperas de nosso casamento, “eu já tenho problemas demais, não preciso dos seus”.

–E quando o Duque Ivanov não for mais um problema? – perguntou Holmes, provocando Esther a dizer-lhe a verdade.

Esther disse, com hesitação. – Talvez eu pense a respeito. Afinal, tudo pode acontecer. Um dia, talvez, John Sigerson pode sofrer um acidente na Amazônia, ou mesmo ser pego por uma tribo de canibais... A pobre Mrs. Sigerson estaria viúva, e disponível a um novo casamento.

Deus, essa mulher acha solução para tudo.

–O que foi, Mr. Holmes? Parece assustado com a possibilidade...

Holmes observou-a rir, e não pôde deixar de se iluminar por seu jeito sempre tão espirituoso e bondoso. Ele sorriu de volta, ainda que fracamente, e voltou-se ao seu prato.

–Uma mulher comum certamente se sentiria ofendida e não hesitaria em exigir o casamento. Se eu propusesse algo assim, ela me acusaria de ser um homem sem cárater e promíscuo, mas... – ele pareceu desistir. – O fato é que eu não esperaria tamanha compreensão ou mesmo inteligência e frieza de uma pessoa de seu sexo. Poucas pessoas agiriam como você, Esther, e digo isso em todos os sentidos, não apenas neste. Apesar de todas as desgraças que ocorreu em sua vida, em sua família, você ainda se mantém forte.

De repente, ela pegou em sua mão.

–Do que sei sobre você, este também é o seu caso.

Holmes pareceu estremecer, e por um momento, desviou o olhar de Esther. – Naquele quarto, quando fomos descobertos por Watson, eu... Eu não pude deixar de me lembrar dos meus dias de menino, quando encontrei minha mãe com... Ele. – ele disse a última palavra com asco e tremor. – Eu sei perfeitamente como ele está se sentindo, e o admiro por não ter agido com violência, da mesma forma que meu pai o fez. Isso é apenas mais uma prova do quanto sua amizade me é valiosa, Esther. Ele é um homem íntegro e não merecia o que fizemos a ele, ainda que não tenha sido nossa intenção. O impressionante é que fazíamos tudo com tanto cuidado... Encontro-me ainda sem entender como ele chegou à conclusão a nosso respeito.

–Isso é um caso a se pensar mais tarde, Holmes. Agora, vamos tomar café.

–Será que ele já foi ao consultório?

–Eu o ouvi sair cedo, mas não sei dizer para onde ele foi. Talvez tenha ido se encontrar com a meretriz...

–Isso não é da nossa conta, Esther, da mesma maneira que nossa relação também não é mais da dele. Vamos, então.



000000000000000000



Holmes e Esther sentaram-se na mesa, que já estava parcialmente usada. Ainda havia uma xícara de chá sobre a mesa, a xícara de Watson, sinal de que ele tinha saído mais cedo que o costume, sem sequer ler o jornal da manhã, que estava intacto sobre a mesa.

Enquanto Esther estava servindo a Holmes com uma xícara de chá, Mrs. Hudson apareceu. Holmes ainda tinha dúvidas quanto à ciência de Mrs. Hudson a respeito dos acontecimentos daquela noite. Os gritos de Watson poderiam ser escutados pela senhoria? Eles foram suficientes para que ela entendesse o porquê da discussão entre aqueles dois grandes amigos?

Para infelicidade de Holmes, ela já sabia, porém de forma diferente.

Ao menos ele pôde apurar isso, pela maneira um tanto brusca de colocar o omelete e bacon de ambos sobre a mesa, e o olhar frio que lançou aos dois. Claro. Watson já tinha contado a ela as boasnovas de Baker Street a respeito de seus dois inquilinos.

–Deseja alguma coisa, Mr. Holmes? – ela perguntou, com frieza e indignação que Holmes jamais presenciara em alguém tão doce quanto Mrs. Hudson. O que diabos Watson havia dito a ela?

–Mrs. Hudson?

–Dr. Watson pediu para avisar que suas malas já estão prontas.

Holmes arregalou seus olhos cinzentos em surpresa. – O quê?!

–Holmes... – pedia Esther por mais paciência.

–E a senhora o fez, eu presumo?

–Sim. – respondeu a senhoria, sem hesitar. – Eu sei que não devo me meter na vida de meus inquilinos, mas... Não sou obrigada a ser conivente com... Tamanha falta de pudor e moral! De todos os inquilinos que eu tive, Mr. Holmes, eu jamais poderia imaginar que o senhor fosse capaz de... Ah, eu não tenho nem coragem de dizer...

–Pois diga! – insistiu Holmes. – Diga, eu desejo saber do que estão me acusando.

Mrs. Hudson olhou para Esther brevemente, aparentando relutância.

–Que o senhor era amante de Mrs. Sigerson.

Holmes bufou, um tanto envergonhado. – Mrs. Hudson, por todos estes anos de companhia e parceria, acho que tenho uma dívida para com a senhora e o dever de lhe explicar o que verdadeiramente está acontecendo aqui

A senhoria parecia curiosa, mas não queria inclinar.

–Não, Mr. Holmes, eu acho que...

–Mrs. Hudson, por favor, sente-se.

–Mr. Holmes, eu tenho que...

–Por favor, sente-se.

–Mas Mr. Holmes...

–Sente-se, Mrs. Hudson! – gritou Holmes, obedecido prontamente.

Com os dedos entrelaçados, como nas diversas ocasiões em que estava diante de um caso, Holmes preparou-se para explicar o ocorrido.

–Mrs. Hudson, muita coisa aconteceu durante esses anos que estive fora de Baker Street. Eu fugi de um assassino, estive em locais perigosos, corri risco de vida, usei uma identidade falsa... Mas de todas que posso enumerar, Esther é uma delas.

Antes que Mrs. Hudson lhe perguntasse quem era Esther, Holmes tratou de explicar.

–Esther é o nome verdadeiro de Sophie Sigerson, Mrs. Hudson. Eu a conheci em um navio, a caminho da França. Formamos uma amizade, até que nos separamos. Anos depois, eu a reencontrei já comprometida com Watson, vivendo uma nova vida na Inglaterra, com um novo nome e sobrenome. Começamos a perceber que... Que... Nossos sentimentos iam além de uma amizade, então... Esther separou-se de Watson e casou-se comigo. Mas tudo em segredo. Ela se casou com o meu nome falso, o nome que adotei enquanto dei-me por morto. Nós achamos a alternativa a mais viável, porque, a senhora sabe os tipos de perigo que envolvem uma associação para comigo... Se ela se casasse com o Mr. Sherlock Holmes, estaria na linha de fogo todo o tempo, e não era isso que nenhum de nós dois queríamos. O fato é: nós dois somos casados, e não amantes. Portanto, não há nada de imoral nisso. Ou a senhora ainda acha que há?

Mrs. Hudson estava pensativa.

–Então, o senhor é o John Sigerson?

–Sim, sou eu. Esse foi o nome que usei quando me fiz de morto.

A senhoria parecia confusa.

–Dê-me um tempo para pensar, Mr. Holmes. Isso é muito confuso.

Holmes sorriu. – O tempo que precisar, Mr. Hudson. Apenas peço que, por favor, não nos trate com hostilidade. No fundo, a única coisa errada que fizemos foi omitir a verdade de Watson. Fizemos isso porque pensávamos no bem dele, mas estávamos errados. Ele merecia saber de tudo.

Mrs. Hudson assentiu com a cabeça e, levantando-se, despediu de ambos os dois, deixando um mistério no ar. Pensativa, Esther virou-se para Holmes.

–Acha que ela aceitou isso bem?

–Não sei, Esther. Sinceramente, eu não sei. Aliás, toda essa confusão interrompeu a nossa investigação do Conde Ivanov. Vou descer parte das minhas malas para a sua casa. Depois disso, vamos retomar o caso. Ainda há peças a se encaixar.

Holmes apenas desfez uma mala dentro aquelas três, que abrigavam seus objetos pessoais. Seu kit de Química, livros e arquivos permaneceram no mesmo local. O apartamento de Esther era deveras pequeno para abriga-los, e o próprio sabia que uma hora ou outra, retornaria aos seus aposentos.

Havia um enorme mural no pequeno aposento que Esther utilizava como escritório secreto, escondido por uma cortina. Ali ficavam seus objetos judaicos e também referentes ao seu trabalho na Agência de Inteligência. Cada um deles tentava analisar conexões.

Pela primeira vez, em todas as investigações, Holmes estava no centro, rodeado de linhas.

–Faz sentido, Holmes. Quando colocamos você como alvo, tudo se conecta.

–Exatamente. Este não é um assunto governamental, é pessoal. – disse Holmes, parecendo ansioso. – O que só torna tudo mais interessante.

–Consegue enxergar alguma maneira de chegar ao Conde?

Holmes parecia reflexivo.

–Acho que... Por Deus, Esther! Nos esquecemos de um detalhe importante! – Holmes deu um tapa em sua própria testa.

–O quê?!

–Precisamos falar com meu irmão, Sherringford... – ele disse, apoiando-se na mesa e escrevendo um pequeno bilhete rapidamente. – Vou marcar um almoço com ele no restaurante The Imperator. Tenho certeza de que ele não ira recusar. Parece que teremos alguma luz neste caso.

Esther não conseguia compreender qual relação o primogênito dos Holmes poderia ter com o Duque Ivanov, mas confiava que Holmes estava, por algum motivo, no caminho certo, e que tinha visto uma pista. Não à toa ele era famoso justamente por enxergar o que ninguém conseguia.

Àquela altura, Holmes já estava no andar de baixo, nos aposentos de Esther, retirando algumas roupas recém-colocadas no armário de volta à mala, sem qualquer explicação. Esther o observa a fazer isso, ainda confusa e esperando por explicações.

–Faremos uma rápida viagem, Esther. Mas antes, preciso falar com meu irmão e também mandar um telegrama ao Inspetor Jevons, de Yorkshire, que será de grande ajuda em meus planos.

–Uma viagem? A Yorkshire?

–Exatamente. O Conde deixou uma ponta solta, e ela está lá. Faremos assim: você irá viajar disfarçada, para evitar que descubram os nossos planos. Irei encontrar meu irmão para acertar nossa ida até lá. Farei parecer uma ida pessoal.

–E minha bagagem?

–Não será necessário muito, pois acredito que ficaremos por lá no máximo dois dias. Posso levar algumas roupas suas em nossa mala. Não será bom você a andar pela cidade com alguma mala. Espere aqui, Esther, que em breve mandarei um recado avisando de seus próximos movimentos.

–Certo. – disse Esther, ainda atordoada com a reviravolta. – Você não vai me contar nada?

–Tudo ao seu tempo. Agora, vou me encontrar com Sherringford. – disse Holmes, dando-lhe um rápido beijo. – Aguarde aqui.

Holmes colocou seu chapéu e saiu imediatamente de Baker Street, a passos apressados. Com muita sorte, pôde encontrar um cabriolé vazio a passar na porta de sua casa. Tudo estava acontecendo tão rápido que ele mal viu o próximo cabriolé a parar na porta do 221-B, muito menos os seus ocupantes.

Uma fascinada Rose Willians descia, com seu melhor vestido e chapéu enterrado na cabeça, bem distante da prostituta baixa de Whitechapel. Tinha a porta aberta por Watson, que gentilmente a ajudava a descer e também a pegar suas malas.

–Nunca me imaginei morando em sua casa, como a Mrs. Watson. – ela disse, exibindo uma aliança.

–Eu sei que não estamos agindo corretamente, que ainda não nos casamos, mas... Não vejo porquê adiarmos este momento. E por favor, Rose, não diga a ninguém que você ainda não é casada comigo. Quero que lhe tratem com dignidade. – disse Watson.

Rose não estava completamente a par do que estava acontecendo, mas imaginava que ela estivesse envolvida. A maneira repentina e passional como Watson chegou em sue apartamento lhe tinha alertado a isso. De repente, lá estava ele, com aliança na mão, pedindo-a em casamento. Parecia que ele estava disposto a casar-se com ela naquele mesmo momento, se não fosse por toda a burocracia da lei britânica que lhe dava um mês para esperar. Ainda assim, ela sabia que a felicidade dele não era genuína, e embora algo lhe dissesse que estava sendo usada para outra finalidade, mais uma vez, ela não se importava. Viver como Mrs. Watson tinha lá seu preço.

Esther estava escovando a peruca que usaria no disfarce. Entre tantas escondidas em um fundo falso no armário, ele decidiu usar uma de cabelos escuros. O vestido, de roupas bem mais simples, também estava sobre a cama, pronto para ser usado. Agora, só faltavam as ordens de Holmes.

Enquanto terminava de se aprontar, vestida como uma mulher de poucas posses, Esther ouviu uma agitação. Era a voz de Watson, ressaltada, em um tom mais alto. Ressabiada, ela retirou do gaveteiro um pequeno revólver de bolso e foi ver o que estava se passando.

Deparou-se com uma cena surpreendente: Watson, ajudando o cocheiro a subir com as malas, enquanto uma mulher vestida elegantemente, mas com a classe de uma mulher pobre, dava ordens e pedia cuidado.

–É a minha maquiagem que está aí, e não a sua mãe, seu idiota! – ela gritava com o cocheiro, carregado de malas.

–Mas o quê...? – Esther tentava analisar a situação. Lembrava-se daquela moça de algum lugar, mas não sabia onde... Sim! Ela estivera em Baker Street, alguns dias atrás! Procurando por Watson para lhe entregar uma carteira...

Aquilo só poderia significar uma coisa...

–John, querido, cuidado com sua perna! – pedia Rose, com uma voz melosa. – Deixe que o cocheiro o faça, meu amor. Esse palerma é pago para isso!

Mas é claro. A primeira providência do Dr. Watson é colocar sua amante dentro de casa. Esther cruzou os braços, consternada. Ainda bem que ela estava indo embora dali.

Ao ouvir um barulho vindo do andar de cima, a moça subiu as escadas rapidamente. Para sorte de Esther, um menino de recados apareceu na porta, dando um sinal de que deveria ir à estação. Era um alívio para Esther que ela não estivesse ali para assistir mais um segundo do espetáculo bizarro que Watson estava preparando em sua vingança infantil.

–Atrás de pão velho, garota? – perguntou Rose, ao ver Esther, em roupas simples, de costas, já saindo da casa.

–Não dona, eu acho que errei de casa... – disse Esther, adicionando um sotaque suburbano à voz e saindo de Baker Street, sendo logo ignorada por uma ocupada Rose. Ainda tinha uma caminhada á estação para fazer.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Putz!!

E como retaliação, Watson expulsa Holmes e coloca Rose Willians no lugar.
Aff, e ela ainda dá uma zoada básica na Esther...

E aguardem, porque essa ida à Yorkshire vai render um bocado.


Obrigada por acompanharem, e deixem reviews!!!

Até quarta!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Retribuição" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.