A Rainha Dourada. escrita por AnaBonagamba


Capítulo 8
Lealdade.


Notas iniciais do capítulo

Este aqui, um xodó. Aproveitem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/590591/chapter/8

A companhia não poupou esforços para acomodar Lied, em respeito a Fíli. A alegria em ver o jovem anão tão envolvido era superior a qualquer índice de desconfiança carregada pelos olhares auspiciosos e destemidos dos membros da raça, inclusive, após a brincadeira, todos notaram o mesmo brilho irradiando de Kíli em relação a Tauriel. Uma elfa não seria o mais adequado para o príncipe anão, entretanto, o romance se faria necessário para acender a chama da esperança entre os mais novos.

Devidamente apresentados, tagarelavam entre si, ainda racionalizando informações. Gandalf e Bilbo juntaram-se em seguida, Lied apercebendo-se de que o mais franzino tinha traços extremamente suaves e carência de pelos no rosto, mas, puramente educada, decidiu não questionar. O paradeiro daquele grupo essencialmente diferenciado também lhe era desconhecido, algo que talvez com um pouco de perspicácia pudesse reverter.

– Da onde você é mesmo, criança? - perguntou Bálin, cortês.

– Windmill Plains, fortaleza de Dragon Forest, meus senhores. Um lugar bastante cômodo, construído sobre planícies, fez com que esse reino se tornasse um dos mais prósperos entre os cinco da região. - a moça riu enquanto alguns dos espectadores se espantavam. - Como fica bem próximo à duas florestas e uma montanha, os ventos favorecem moinhos de grãos, recolhidos do cultivo em terrenos apropriados. A organização prevê que todos os habitantes da fortaleza e suas vilas possuam o máximo de aproveitamento com as vendas e isso garante níveis de subsistência adequados a seres humanos.

– Então, a senhorita diz que é um domínio de homens? - continuou o ancião.

– Sim.

– Um reinado humano sendo parte dos mais afortunados? - riu Dwálin, deixando sair pela boca algumas migalhas. - Isso é inacreditável.

– O senhor Dwálin me entendeu mal... - corrigiu a menina com delicadeza. - Eu disse que é um reino humano, mas o reinado, digo, a coroa, na verdade pertence a um eldariano, de raça pura inclusive. É uma das criaturas de Ilúvatar mais sábias que já tive oportunidade de conhecer.

Gandalf atentou-se, rígido, ao indagar:

– Sir Táris, senhor das brisas do oeste?

Todos olharam abismados, já que o mago fazia-se conhecedor de algum conteúdo referente àquele mundo inovador. Lied abaixou o olhar, contando o tempo de forma retrógrada.

– Mestre Gandalf... - Lied parecia atordoada. - Eu teria de ter vivido, no mínimo, há duas Eras atrás para conhecer Táris, zoti i erërave¹.

– Hm...Isso significa que pelo menos outros três ou quatro reis ou rainhas passaram pelo trono de Dragon Forest.

– Muito contestador. Acredito que sim. - a jovem bebericou um pouco de leite, acompanhando-o com o olhar. - Interessante, pois aquele que nos referimos atualmente como m'bret² é herdeiro direto da linhagem de Táris: seu bisneto, Aaron.

– Ao que vejo você é muito devotada a esse soberano... - comentou Fíli com aparente ciúmes.

– E sou, de fato. - sorriu tristemente. - Minha mãe foi abandonada pouco antes do meu nascimento...Algum conforto lhe concedera o rei, até sua morte precoce e, desde então, me financia no essencial, como um patrono.

O anão relaxou numa pequena reverência dolosa.

– Por isso usa trajes tão finos? - inquiriu Bofur divertido, quebrando todo o desconforto. Lied corou, passando os dedos displicentemente na saia do vestido de linho cru, leve e elegante.

– Acho que tenho idade o bastante para escolher as minhas roupas, senhor Bofur.

– E idade, também, para se alojar sozinha numa estalagem beira-estrada, imagino. - adicionou Glóin.

– Nós mulheres de Dragon Forest somos independentes a partir dos vinte , meus senhores, mas não nego que esta é uma separação dolorosa. Algumas se casam, outras se aventuram, como eu. A situação é que tenho me aventurado há praticamente cinco anos.

– Mas acredito que esse elo não tenha se rompido facilmente, - disse Gandalf. - afinal, você não está tão longe assim de casa.

– Estava de partida para o norte quando, sem razão, decidi parar. - ela olhou Fíli com carinho. - Acho que precisava de um momento a sós para tomar a decisão final de me ausentar. As coisas estão meio conturbadas, uma jovem mulher solteira no palácio não seria de grande utilidade.

– Seu pai não fica preocupado? - Kíli debruçou-se na mesa. - Minha mãe ficou desesperada ao se despedir de mim e Fíli.

– Aaron não é do tipo que se inquieta diante de alguns caprichos. Diferente de outros, é uma pessoa ativa e produtiva, levantando cedo todas as manhãs para ajudar no plantio. Ele acompanha todo o processo cuidadosamente para assegurar rendimento máximo, e trata das ervas e das árvores como seres vivos dignos. Não há o que deixe de florescer em seus jardins.

– Cada rei é peculiar a seu próprio gênero.

– Exato, mestre Gandalf. - assentiu solene.

O grupo continuou o desjejum com animação, sempre questionando Lied acerca do universo paralelo que se encontravam. A moça fora interrogada várias vezes a respeito dos doze reinos, e como se mantinham unidos. Explicara que o convívio era unificado através das ordens imperiais, oriundas de Imperial Wharf, o cais responsável por receber e distribuir igualmente todos os suprimentos básicos. Além disso, lhe era competido tratar de assuntos militares. O imperador era elegido entre os doze reis, que tão logo seria substituído pelo herdeiro ou confidente.

– Por hora, ao que se sabe, não se decidiram...

– Não seria mais fácil listar a partir dos melhores? - Fíli aproximou-se, interagindo.

– São boas as tentativas. Ironicamente, os melhores não têm o menor intuito de subir ao trono imperial.

– Que tolice. - bramiu Glóin.

– Acho que deve ser estarrecedor ter de abandonar uma terra e um povo que lhe foi destinado, abrir mão do carinho e da atenção, da cultura; se desfazer dos problemas já conhecidos e assumir um todo, sem qualquer segurança ou certeza.

– E como eles são escolhidos? - Óin mastigava uma pasta endurecida, a outra mão sustentando o aparato auditivo.

– A partir do quanto são capazes de enviar ao império sem abalar suas próprias demandas.

– Deve ser difícil manter a ordem de uma estrutura tão complexa. - divagou Bálin. - Os reis devem ser muito cientes de si mesmos...

– E de suas riquezas, claro.

O argumento foi suficiente para que todos contassem seus áureos períodos de fortuna e bonança, repleto de ouro e gemas preciosas. Tauriel isolou-se, sentindo a empolgação de Kíli com as antigas histórias de seu povo, notando precisamente que o mais imponente e austero anão não se encontrava junto deles. De alguma maneira, sabia que era o certo a ser feito. Levantou-se, tocando o ombro de Kíli levemente, pedindo para que ficasse ali. Assim que se viu ausente de toda movimentação, tomou nos braços uma cesta de pães e acrescentou duas garrafas com leite, subindo em seguida.

Desde a mais tenra idade, a elfa fora treinada para ser a melhor combatente de Mirkwood, assumindo sua função de capitã da guarda quando muito de seus colegas não haviam sequer lutado realmente. A missão, inicialmente, parecia simples: comando absoluto, estratégia e agilidade. Livrar os limites do reino de qualquer ameaça aparente. Com o passar dos anos, as ocorrências tornaram-se rotineiras, e a impossibilidade de descobrir suas razões amotinando a mente da ruiva. Desprovida da palavra, curvava-se diante de Thranduil, seu Rei, ainda que em desacordo, obrigada pelo seu ofício a adorá-lo. Mesmo que Légolas aliviasse a tensão entre os dois, havia sempre a dúvida quanto sua forma de governar, tão cheio de si, arrogante e individualista.

Cada degrau acima, uma profunda meditação.

Seria possível que estivessem buscando por ela? Lembrava-se da expressão espantada de Légolas próximo ao Portal, chamando seu nome através da barreira de cristal. Seus doces olhos azuis amedrontados. O príncipe de Mirkwood nunca a deixara sozinha, mas agora era diferente, não tivera escolha. Não precisaria manter a postura impenetrável, nem fingir ser inatingível. Sentia-se livre, sem orcs e aracnídeos violentos atentando-a em seus mais íntimos sonhos. O sol brilhava, a luz incontida que há tanto não lhe tocara a face. Um começo, uma chance que ela abraçaria como uma velha amiga tão longamente esperada.

Inibida, resolve anunciar-se com um leve toque na porta do cômodo, adentrando-o sem esperar pelo convite. Rapidamente, coloca a cesta sobre a única mesa de canto, puxando-a mais para perto da janela. Thorin fitou-a, descrente.

– Por que está fazendo isso?

Tauriel já estava de saída quando a voz grave do líder da comitiva atingiu-lhe a audição. Virou-se para ele, caminhando até seu encontro.

– Se algo conheço do orgulho dos anões, já se dera por satisfeito da boa vontade desta casa ontem a noite.

– Não pedi pelos serviços, muito menos os seus.

– Sei que não, e não estou ofendida.

O herdeiro de Erebor conservou o porte desconfiado.

– Esse não é, em geral, o comportamento de um elfo.

– Sim para com aqueles que detém sua lealdade.

– É isso o que possuo, pois?

Tauriel reconsiderou, levando a perspectiva para outro lado.

– Estou a parte, tal qual vocês, mas poderia simplesmente negar-me.

– O que Thranduil pensaria disso? - o anão não se aguentou em questionar. - A capitã da guarda, alto nível de confiança entre os seus, tratando de lealdade com um anão que vagueava em suas terras, miserável.

– Não acho que ele tenha de pensar em nada, já que de minha parte possuía apenas um a mais para lutar em suas causas estúpidas.

– Mas isso não a impediu de lutar. - provocou, fissurando-a.

– Minhas palavras são irremediáveis, contrastando com o desejo em meu coração. Não sou como ele, Thorin Oakenshield. Jamais daria as costas diante de um povo a ser destituído de sua própria terra.

Tauriel sentiu-se culpada pelo pronunciamento, seus sentimentos extravasados enquanto Thorin a encarava, estupefato: a lembrança da desolação de Smaug atingindo-o propositalmente, recordando-o da desgraça de seu povo. Consequências insondáveis da ganância e da indiferença.

O silêncio confirmava o que ele já sabia. A culpa. Quem havia dado o primeiro passo para as discórdias entre Erebor e Mirkwood se estabelecerem.

Seu avô Thrór, a quem tanto se assemelhava.

Abaixou a cabeça, os cabelos negros despenteados a encobrir-lhe o rosto. Tauriel voltou-se para a janela, sentando-se no parapeito, um único obrigado rompendo dos lábios de Thorin antes que alcançasse a mesa e se dispusesse a comer. Com um sorriso nobre, a elfa esperou que terminasse a refeição, antes de descerem para junto da companhia.

Afinal, o dia estava apenas começando.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Traduções do eldarien (//albanês)
¹. zoti i erërave: Senhor dos Ventos.
². mbret: Rei.

Tentei aprofundar minhas ideias a respeito de Tauriel, porém, torna-se um personagem um tanto complexo de ser analisado, afinal, tudo o que se sabe sobre ela provém do filme e, ainda sim, temos sempre a impressão que constrói-se mais a partir de Kíli do que de sua própria originalidade. Perdoem-me se pareceu melancólico, mas não enxerguei de outra forma.

Foi necessário que Thorin acreditasse em seus dotes para que possam, finalmente, partir da estalagem. O bom senso recaiu sobre ele, na lembrança de que Thrór fora o responsável por plantar a semente da discórdia entre os elfos, ao negar as gemas cinzentas da pura luz das estrelas a Thranduil (cena exclusiva de Uma jornada Inesperada - extended edition). Para quem não teve a chance:

https://www.youtube.com/watch?v=B80WZ-IXT3w (The Hobbit: An Unexpected Journey Extended Edition - Thranduil in Erebor)

Me arrepio loucamente assistindo essa passagem, uma pena que tenha sido excluída!

Estou um tanto carente de comentários. Vou aguardar um retorno de vocês, leitores, antes de postar o próximo. Obrigada pela atenção dispensada e até breve!

PS: Por que albanês? Bem, se tiverem curiosidade, ouçam as frases no idioma original e perceberão que possuem um tanto de sensualidade e elegância - menos que Sindarin, mais que khuzdul (apesar de achá-la extremamente sexy, é um tanto agressiva, como russo e alemão, fonética pouco trilada. Não poderia utilizá-las de qualquer forma, porque saberia exatamente o que estão dizendo e impediria a pesquisa...se alguém por aí falar albanês, por favor, se pronuncie!)



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Rainha Dourada." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.