Tempestuoso escrita por babsi


Capítulo 20
Capítulo 20: Cinzas


Notas iniciais do capítulo

Pessoas, tudo bem?
81 acompanhamentosssss! Vocês são lindjos! (coração)
Espero que gostem do capítulo!
Nos vemos no final e obrigada à todos que comentam, recomendam e favoritam a fanfic! Não parem nunca, pois são vocês que me dão gás para escrever!
(Nyah! não deixa eu fazer coração, gente)
(já falei com vocês sobre isso, né?)
(e sobre ditadura tb)
(é a ditadura, só q na internet)
(me bja democracia)
(emoticons já)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/588334/chapter/20

POV DARYL:

Encosto numa viga que dava sustentação ao mezanino, observando Beth refazer o curativo no braço de Thea.

No final das contas, o errante que tentou matá-la na floresta havia salvado sua vida. Um tanto irônico, mas tudo parecia uma grande ironia quando se tratava de Thea.

Suspiro, tentando mudar o rumo de meus pensamentos, sem muito sucesso. Não importava o quanto eu tentasse, só o que eu conseguia pensar era na porcaria do errante com os dentes em seu braço, e em como aquilo havia me assustado como o diabo.

Por que infernos todos meus pensamentos tinham que ser inundados por aqueles olhos verdes gigantes e assustados? E por que eles me afligiam tanto?
Aquela não era uma coisa que eu estava acostumado a sentir, e eu não queria me acostumar. Aquela porcaria toda fazia com que eu me sentisse fraco e não havia espaço para fraqueza. Nunca houve, e não seria agora que passaria a haver. Pessoas fracas eram devoradas. E eu não era um fraco. Talvez porque nunca tive nada a perder.

Olho em volta, analisando o galpão onde estávamos. Era no meio do nada, perdido em algum mato, perto de alguma estrada que levava para Washington e, pelo cheiro de terra úmida, perto de algum rio. A noite ainda estava alta, e todos pareciam cansados demais para abrir a boca. Havíamos despistado a manada de mortos, nos infiltrando na mata sem nenhum rumo, correndo como desgraçados. O galpão tinha sido um lance de sorte, se é que isso de sorte realmente existisse... Para nós ela raramente dava as caras.

Thea me olha, levantando uma sobrancelha, uma pergunta muda de "por que diabos você está me encarando". Viro o rosto, um tanto irritado por ter sido pego no flagra.

Irritado era um estado que me descrevia bem desde que a arrastei para longe daqueles carniceiros como o diabo fugindo da cruz. A partir do momento em que chegamos ao galpão e nos colocamos em segurança, eu me pus a fazer vigia, buscando ficar o mais afastado dela possível. Não era uma tarefa fácil, já que a cada segundo meu cérebro buscava uma justificativa para espiar o que a maluca fazia, e aquilo estava me deixando louco.

Eu não gostava de sentir o que eu estava sentindo, e eu sequer sabia o que era. A única coisa que eu sabia, era que aquilo me causava cólera, ao mesmo tempo que se misturava com uma espécie de fúria. Eu tinha vontade de pegar Thea pelos cabelos e arrastá-la para algum lugar onde pudesse mantê-la segura, onde a maluca não pudesse se meter em nenhuma confusão, mas eu também tinha vontade de gritar, censurar cada atitude sua e gracinha fora de hora. E, ao mesmo tempo, eu também queria prensá-la contra uma parede e mandar tudo para o inferno.

Olho pela janela de vidro fumê, logo acima de onde o resto do grupo estava reunido. Era um galpão grande, com paredes de tijolos, teto de metal, um grande mezanino de aço e uma guarita sobre este. Janelas se estendiam pelo andar intermediário, dando uma visão completa da clareira do lado de fora, se prolongando até a cabine de tijolos.

Ouço passos subirem a escada de metal, estreito os olhos para a imagem miúda segurando um fuzil.

– De volta ao poleiro. - Carol diz, olhando em volta.

Tento esconder um sorriso nostálgico, mas Carol parece percebe-lo. Ela percebia coisas demais.

– Você sente falta. - afirma.

– Era um bom lugar. - Dou de ombros, sem ter muito o que dizer.

A prisão era mesmo um bom lugar para nós, com seu grande terreno fértil, que prometia comida e autossuficiência, e grades fortes, que nos traziam segurança, pelo menos dos errantes. Mas, isso não serviu de muita coisa, não nos manteve à salvo do mais perigoso...

– Eu fiz o que fiz exatamente por ser um bom lugar. - ela diz, como se isso justificasse ela ter matado e carbonizado duas pessoas.

Eu nunca tinha parado para pensar muito sobre o que ela havia feito. Rick sempre fora um homem justo, então eu simplesmente aceitei a expulsão, contrariado, mas sem conseguir pensar em algo que não fosse manter minha família à salvo. Se isso significasse abrir mão de Carol, eu o faria.

– Eu nunca te julguei sobre o que você fez, Carol. Você é pragmática, e eu admiro isto, mas não justifica. - digo, vendo um errante passar por entre algumas árvores próximas e seguir seu caminho.

Um carniceiro não era motivo para preocupação, e eu sabia disso, mas não conseguia controlar a tensão em meus músculos toda vez que via um deles se arrastar por aí. Errantes deixavam todos apreensivos, sempre tendo que prestar atenção a tudo e em todos. Nós nunca conseguíamos escapar deles completamente.

– Eu sei que não, mas eu não me arrependo... Já conversamos sobre isto. Para mim, um lugar seguro sempre vai vir antes das pessoas.

– Sem pessoas não há como construir um local seguro. - solto, sem prestar muita atenção, meus olhos caminhando para Thea, que fazia alguma gracinha com Judy.

– Chegamos a um impasse. - ela diz, seguindo meu olhar. Vejo um meio sorriso malicioso nascer em seu rosto, pela visão periférica. - Eu sei que disse que não iria mais me intrometer, mas...

Suspiro, interrompendo-a.

– Se vai começar a encher o meu saco com mais uma das suas conversas sem noção, pode dar no pé. - digo, sem paciência para ouvir suas fantasias de clube do livro.

– Não está mais aqui quem falou. - ela levanta o braço, se rendendo. - Mas, eu não vou te deixar em paz até que tome uma atitude e pare com esse jogo de molha e seca eterno entre você e Thea.

– Você realmente vê coisas onde não tem e, mesmo se tivesse, não é como se fosse da sua conta. - digo ríspido, sentindo a sutil verdade de suas palavras.

Eu e a maluca estávamos mesmo num jogo eterno de molha e seca. Ela provocava, eu perdia a paciência, nós acabávamos nos agarrando em algum lugar completamente inapropriado, e agíamos como se nada tivesse acontecido, para depois de uma briga idiota começarmos tudo de novo.

– Você não me engana, Daryl. Nós dois passamos por coisas demais para conseguir esconder algo um do outro.

– Pare de me aporrinhar, Carol, meus pensamentos já são o suficiente. - estreito os olhos em sua direção, tentando dar um basta naquela conversa.

– Quando você vai parar de medir as coisas e fazer o que quer de verdade? É sempre sobre salvar os outros, mas nunca sobre você. Uma hora Thea vai se cansar de chover no molhado, Daryl. Ela é uma garota cheia de vida, sem meios termos e não vai aceitar essa frieza toda por muito tempo.

– Talvez seja melhor que ela não aceite. - digo, vendo Thea falar algo com Carl, fazendo o menino revirar os olhos e, com um sorriso no rosto, voltar a ler suas HQs.

Ela era mesmo cheia de vida, tempestuosa, e duvido que conseguiria lidar com meu jeito por muito tempo. E, além disso, o que eu poderia oferecer a ela? Eu não era o tipo de cara romântico que ela devia estar acostumada e também não passaria a ser de uma hora para outra. O mundo era violento demais para qualquer tipo de envolvimento. Lori e Rick eram a prova disso. Relacionamentos eram frágeis, exigiam dedicação e eu não podia arcar com mais responsabilidades. Eu tinha pessoas para manter a salvo, principalmente Thea, e eu não colocaria ninguém em risco por algo mais frágil que a própria vida.

– É mais do que sobreviver, Daryl. Sobreviver para você é fácil, sempre fez isso, mas nunca aceitou que você pode viver, ter alguma coisa a mais. Você merece isso tanto quanto Rick, tanto quanto qualquer um aqui e lutar contra seus sentimentos só vai tornar tudo mais difícil. Eu sei que não sou a melhor pessoa para falar sobre esse tipo de assunto, visto que eu era casada com Ed... - ela ri irônica - Mas, por um tempo, ele foi realmente bom para mim. É bom ter alguém com quem compartilhar as coisas, Daryl. Pode parecer banal, mas tudo fica mais leve. Essa solidão toda não faz bem para ninguém, nem para você. É triste e você merece mais. - ela diz, colocando a mão em meu ombro, e descendo as escadas logo em seguida.

Continuo parado, olhando para Thea. Olhos verdes grandes e brilhantes, feições delicadas e o jeito de menina mimada. Ela me fascinava mais do que eu gostava de pensar, e talvez eu gostasse disso mais do que o necessário.

– Essas loucuras da Carol estão começando a influenciar. - digo, desviando os olhos para janela.

Ou a fazer sentido.

(...)

Rick se aproxima, subindo as escadas do poleiro.

– Vai ficar aí a noite toda? - pergunta, olhando pela mesma janela que eu.
Já era madrugada, todos já estavam dormindo e eu não conseguia pregar os olhos.

– Não tenho sono.

– Algum motivo especial? - ele pergunta, me fazendo franzir o cenho. Rick dá de ombros, divertido e depois suspira, coçando a cabeça. - Hoje foi difícil. Esse negócio com Eugene... Eu só espero que Abraham não faça nenhuma estupidez.

– Abraham ficou puto da vida, com razão, mas não acho que vá fazer alguma idiotice.

– Essa história de Eugene era a única coisa que o mantinha focado. Depois que perdeu a família ele disse que tentou suicídio, e ter encontrado uma "missão" foi o que o manteve vivo, o que o fez ter um motivo. - ele diz, pensativo.

– Ter um motivo é tudo. - digo, pensando em qual era o nosso. Talvez manter uns aos outros à salvo, mas esse era um motivo frágil demais, porque sempre que alguém morria, nós perdíamos o foco.

– Nós temos que continuar, Daryl. Não podemos deixar isso que aconteceu abalar o grupo. Ninguém acreditava, mas todos torciam. Essa mentira nos deixou desmotivados, e isso mata mais que os errantes.

– Cansei de mortes. - digo, lembrando de Bob e Sasha. Rick fica em silêncio, talvez pensando o mesmo. - Estamos ficando sem suprimentos, temos que providenciar o quanto antes e montar um acampamento em algum lugar. O inverno está chegando.

– Então vamos nos manter focados nisso mas, por enquanto, temos que nos ater em trazer Abraham, Rosita e Eugene de volta.

– Sairei amanhã de manhã com Glenn, Michonne e Maggie para rastreá-los. - digo, procurando-os com os olhos. Meus olhos pousam em Thea, dormindo ao lado de Michonne, no pé da escada. Rick segue meu olhar, levantando as sobrancelhas.

– Ela teve sorte. - diz, como se isso significasse algo.

– Ela quase morre uma vez por dia, não acho que isso seja sorte. - respondo, entredentes. Ele ri, me fazendo franzir o cenho.

– Michonne disse que ela sabe correr, mas não sabe lutar. Talvez devesse ensiná-la.

– Não é problema meu. - minto, fazendo minha garganta queimar com a mentira. Ela sim problema meu, um puta dum problema. Ela havia me pedido, e eu neguei. A culpa sobe com tudo, me fazendo desviar os olhos.

– Pode ser, mas não foi o que pareceu. - provoca.

– Andou trocando impressões com a Carol, por acaso? Não dou a mínima para o que pareceu.

– Carol anda tendo impressões? - ele ri, divertido. - Não é culpa dela se você não é um bom fingidor.

– Esse grupo virou um clube de fofoca? Vocês deviam começar a cuidar da vida de vocês.

– Clube de fofoca eu não sei, mas Beth e Carl já começaram um bolão. - Rick ri, se voltando para a escada. - Carl deu até o fim de semana para você se resolver com Thea, Beth deu até o fim do mês e Tara acha que você nunca fará. Estamos numa segunda feira, o prêmio é um par de meias. Carl está mesmo precisando de meias. - termina, descendo as escadas, com um sorriso sugestivo.

– Bando de velhas futriqueiras.

(...)

Amanhecia quando Tyreese sobe para trocar de turno, logo eu sairia com Michonne, Glenn e Maggie à procura de Abraham e os outros.

Ty acena com a cabeça, ajeitando a touca. Devolvo com um movimento similar, sem trocar palavras. Tyreese havia acabado de perder a irmã e eu não sabia muito o bem o que dizer para ele desde então. Era sempre assim quando alguém de nós perdia.

Entro no cubículo, que antes era a guarita, à procura de minha mochila. Quando chegamos ao galpão eu simplesmente joguei todas minhas coisas lá dentro e me pus de vigia, sem me preocupar com essas futilidades de acomodações. Não ficaríamos por muito tempo lá, então pouco importava.

Abro a bolsa, a procura de uma pedra de amolar e algum lenço. Eu sempre limpava e afiava as flechas antes de sair numa busca, era um custume e eu não abriria mão dele.

Sento sobre uma mesa de metal, encostando na janela. Com a visão periférica podia ver um errante cambaleando na porta do galpão. Aqueles malditos carniceiros sentiam nosso cheiro como caçadores, não tinha para onde fugir, eles sempre nos achavam.

Três batidas na porta me fazem levantar a sobrancelha. Desde quando eu não ouvia algo como um pedido de licença? Quando se tratava de portas, o único barulho que importava era o da fechadura rompendo quando esta era arrombada. Era quase ridículo como coisas tão idiotas como batidas na porta fizessem tanta falta. Balanço a cabeça, afastando esses pensamentos e sussurro um "entre" sem muito me interessar com quem batia. Pelo menos batia.

– Oi. - a cabeça de Thea aparece na porta, com uma feição tímida. - Pode mesmo entrar? Não que isso importe, porque já estou entrando mesmo. - ela dá de ombros, e faço o mesmo. Não é como se eu esperasse que ela fosse pedir permissão. Thea não era do tipo que fazia isso. Ela simplesmente entrava, não pedia, nem pensava duas vezes.

– O que foi? - pergunto, vendo-a parada em minha frente, com um pacote de bolachas salgadas e barras de cereal na mão. Ela vira a cabeça para o lado, como se me analisasse, mas só consegue ficar parecendo uma boneca de dar corda, com aqueles olhos verdes hipnóticos, quase diabólicos.

– Fiquei sabendo que vai sair com Mich, Glenn e Maggie atrás do ruivo mentecapto, da Rosita e do falcatrua... - diz, como quem não quer nada.

– Não, você não pode ir. - digo, cortando qualquer ideia sua que pudesse surgir.

Thea dá de ombros, como se já esperasse por isso. Ela não retruca, somente se joga ao meu lado, sem nenhum cuidado, derrubando uma flecha no chão. Ela pega apressada, voltando a se sentar logo em seguida, com um sorriso forçado. Me estende uma barra de cereal, que eu aceito sem muita cerimonia. Ela mesmo havia dito que não devia-se recusar comida no apocalipse.

– Eu não quero ir. - ela responde, depois de um tempo olhando para o errante pela janela e mastigando. - Acho que estou meio traumatizada.. E cansada também. Quase morrer cansa, sabia? - continua, com um tom dramático. Balanço a cabeça, tentando não me irritar com seu descaso.

– Não é engraçado, sua idiota.

– Tudo é engraçado quando as coisas saem bem, Daryl. Você que é rabugento demais para entender isso. - diz, dando mais uma mordida na barra. - Não vai comer a sua? Tem chocolate!

– Você podia ter morrido, Thea. - olho para ela, procurando algo parecido com temor em seus olhos. Ela levanta uma sobrancelha, como se não desse a mínima. Era mesmo maluca, aquela idiota. Não tinha um pingo de cautela com nada.

– Aquele errante que tentou me matar antes me salvou. Talvez eu devesse enterrar o corpo dele em agradecimento. Acha que é uma boa forma de agradecer? Enterrar a pessoa, eu digo. Eu não gostaria de ser enterrada, acho que tenho claustrofobia, mas parece uma forma de mostrar respeito, sabe? Parece uma coisa digna, uma forma de trazer paz para o morto. Eu queria enterrar todos os mortos do mundo, mas não dá para fazer isso...

– Quando vai parar de falar merda? Ou melhor, quando vai parar de falar? - pergunto, me irritando, mas sem conseguir não achar graça em toda sua falação. Ela falava tanta porcaria junto que não tinha como não achar algo divertido.

– Pensei que já tínhamos passado dessa fase, Daryl.

– A fase em que eu te mando calar a maldita boca?

– Não a fase em que você reclama das minhas tagarelices.

– Dá na mesma.

– Claro que não dá. Quando alguém manda outro alguém calar a boca, é uma coisa meio da boca pra fora. Agora quando alguém manda outro alguém parar de falar, é uma coisa mais intensa.

– Para mim continua dando na mesma, mas já que você insiste nisso: cala a boca, Thea.

Ela sorri, jogando os cabelos para o lado, com seus dramas de sempre. Sua vozinha irritante dizendo em minha mente "eu sou uma lady, Daryl". Sorrio de lado, vendo-a olhar tudo em volta.

– Legal seu quarto. - diz, pegando uma flecha e girando nos dedos. Arranco-a de sua mão.

– Para de brincar com isso, uma hora vai acabar se machucando. E não é um quarto, não estamos num hotel.

– Certo, Cavaleiro do Apocalipse! - ela revira os olhos teatralmente. - Eu sei que não é um hotel, é um galpão. Eu não sou idiota, seu estúpido.

– Sim, você é. Anda criativa hoje? Ruivo mentecápto, Falcatrua, Cavaleiro do Apocalipse...

– Eu sou sempre criativa, Daryl. Vai dizer que você ainda não percebeu o quão excepcional meu cérebro sublime é?

– Excepcional. Tá aí uma palavra que eu usaria para descrever esse seu cérebro idiota. - provoco, vendo-a rir. Ela revira os olhos, com seu jeito dramático, me empurrando com os ombros como se fossemos velhos conhecidos. Era como se fossemos.

– Sua gentileza chega a me assustar, Daryl. Pelo menos dessa vez não me chamou de esclerosada.

– Excepcional, esclerosada... Quando você é o contexto elas se tornam quase a mesma coisa.

– Cada dia mais delicado. Um lorde! Chega a me dar arrepios tanta expressão carinhosa junto. - ela brinca, aqueles olhos verdes brilhando em diversão.

– Por que? Não gosta? - pergunto, ainda em sua brincadeira, mas sem conseguir esconder meu real interesse naquilo. Desvendar Thea parecia ser uma tarefa cada dia mais interessante.

– Eu gosto de tudo que vem de você, Daryl. Inclusive seus elogios. - diz, tão séria quanto podia parecer.

Meus olhos se estreitam, focando nos seus. Verdes e límpidos, tão sinceros que chegavam a me enervar. Aquilo não era certo, muito menos adequado. Eu tinha coisas mais importantes para me preocupar do que com aquele par de olhos, eu tinha pessoas para procurar e pessoas que eu queria manter a salvo.

"Quando você vai parar de medir as coisas e fazer o que quer de verdade?", a voz de Carol ecoa em minha mente. Travo a mandíbula.

"Para o inferno com toda essa merda", é só o que consigo pensar antes de beijar Thea.

Minhas mãos vão para sua cintura, enquanto ela enrosca os dedos em meu cabelo, arranhando a nuca com suavidade. O beijo se aprofunda, cada vez mais desesperado. Aperto sua cintura por dentro da blusa, ela sorri, puxando meu cabelo, num incentivo mudo. Minhas mãos sobem por suas costas, acariciando a pele, trazendo-a para mais perto a medida em que o beijo ficava mais desesperado. Deito-a sobre a mesa, jogando as flechas para longe num movimento rápido, elas caem no chão com um barulho metálico. Me coloco sobre ela, cobrindo seu corpo com o meu.

– Daryl. - ela geme, quando eu mordo seu lábio inferior. Thea arranha minhas costas enquanto minhas mãos rumam para sua blusa, ela levanta os braços, facilitando o movimento de tirar o pedaço de tecido.

Meus olhos correm por seu corpo, seu peito descendo e subindo a medida em que respirava, num movimento hipnótico, e a barriga lisa, coberta por cicatrizes que eu desconhecia o motivo. Meu olhar se enche de cólera. Passo a mão por uma cicatriz arredondada. Queimadura de cigarro. Eu tinha algumas parecidas. Thea se encolhe, como se aquilo a deixasse incomodada.

– Cigarro. - ela diz, virando o rosto. Puxo seu rosto de volta para mim, vendo sua expressão se suavizar aos poucos.

– Quem foi? - pergunto, tentando não demonstrar meu desconforto com o assunto. Não queria que ela entendesse errado e se sentisse humilhada. Eu, mais que ninguém, entendia o que era ter cicatrizes, o que era ser submetido à elas. Thea engole em seco.

– Não importa, eles já estão mortos.

– Eles? - pergunto, me forçando a esconder a raiva.

Que tipo de filho da puta seria capaz de machucar alguém como Thea? Sinto ódio, minhas mãos coçam, querendo socar algo. Eu mataria qualquer um que tentasse tocar nela de novo. Meus olhos correm para os diversos ferimentos na barriga. Mais marcas de queimadura, algumas cicatrizes alongadas, como cortes. Meu sangue sobe.

– Estão mortos, Daryl. Terminus já queimou. - ela pontua, mostrando que não queria falar sobre o assunto.

"O quanto você sangrou por elas, Gareth?", sua voz ecoa em minha mente, me fazendo lembrar da primeira vez que as vi.

Desvio o olhar, sem conseguir encará-la. Terminus tinha queimado, mas suas cinzas ainda estavam em Thea. Enraizadas como uma praga. Nunca sairiam, nunca iriam embora. Eu sabia como era aquilo.

Sinto angústia, aflição. Thea era vívida demais, sensível demais. Intensa. Esse mundo não era para ela, tudo era violento demais para toda sua leveza. Era torturante pensar o tamanho do esforço que ela fazia para lutar com tudo que havia passado e seguir em frente como se nada daquilo a afingisse. Ela era forte, determinada. Tempestuosa.

– Não vai acontecer de novo. Nunca mais. Não se eu puder impedir, Thea. - digo, olhando firme em seus olhos, para não deixar nenhum tipo de dúvida.

Ela sorri, brincando com meu colete, quase desconcertada. O que era uma novidade e tanto para mim.

– Claro que não vai, Daryl. Você é minha babá e vai me proteger de todos os perigos, lembra?

Talvez esse mundo não fosse para ela, mas com certeza, Thea era necessária para esse mundo. Ele precisava de sua leveza tanto quanto eu.

– Vou. - digo, passando os olhos pela bandagem recém colocada em seu braço. Ela segue meu olhar. - Não vai acontecer de novo. - repito, reforçando minha promessa.

– Eu tive medo. - ela diz, olhando de volta para mim. - Não do errante, não de ser mordida. Eu não tenho medo disso. Eu tive medo daquela ser a última vez que eu fosse te ter assim tão perto, Daryl. Eu nunca senti tanto medo em minha vida. - ela confessa, com os olhos verdes quase transbordando. - Aquilo me deixou realmente assustada. E eu não sei porquê.

– Eu também não sei. - falo, talvez muito baixo.

– Você vai lá fora hoje, e eu vou sentir esse mesmo medo. Isso também me assusta. - sua voz treme, e a ideia de vê-la chorar parece pior que a imagem do errante mordendo suas botas.

– Essa também não vai ser a última vez, Thea. - é só o que eu consigo dizer, tentando tranquilizá-la.

– Você consegue me prometer isso?

– Não, esse é o tipo de coisa que não posso prometer.

Ela assente, como se concordasse com o que eu dizia. Thea podia ser completamente maluca, mas entendia muito bem nossa realidade. Ela tinha visto mortes o suficiente para entender como era difícil se manter a salvo. Era mais fácil garantir para os outros.

– Não precisa prometer necessariamente isto, Daryl. Você é muito literal! - ela revira os olhos teatralmente, começando com suas sandices. - Só me promete que você vai fazer de tudo para esta não ser a última vez que a gente se agarra num lugar bizarro. E não, isso não é um convite!

– Você ainda está com essa ideia idiota de "convite"? - pergunto, tentando entender como sua mente absurda trabalhava.

– Não é idiota, você é idiota. Promete, Daryl! Se não vou ter que arranjar outra pessoa para me prometer essas coisas. Não que eu tenha muitas opções... Ou eu cometo um pecado direto na fonte e fico com o Padre, ou eu cometo um crime e fico com Carl. Nenhuma das duas me agrada, se quer saber. E as duas são pecado! Se bem que eu acho que beijar uma criança é mais pecado que beijar um Padre, mas sei lá né...

– Se eu prometer você cala essa boca? - pergunto, um tanto divertido.

– Claro, estúpido! Ou você realmente acha que eu quero traçar o Padre?

– Eu sei lá o que você quer, Thea. - respondo, um tanto incomodado com a ideia dela se agarrando por aí com Gabriel. Ela me olha séria, exigindo uma resposta. - Eu prometo, sua idiota! - digo por fim, me sentando. Ela se levanta, procurando a camiseta de forma desajeitada.

– Direto... Sem nenhuma sutileza! Foi tão espontâneo que acho que a ideia de me ver beijando outras bocas realmente te afetou, Daryl. - diz, em tom provocativo, colocando a blusa e jogando em mim o pacote de bolacha.

– Você é retardada? - indago, vendo o pacote atingir a janela acima de minha cabeça. Ela dá de ombros.

– É seu almoço, cuida bem dele. - diz, apontando para a embalagem que caíra em meu colo, e abrindo uma barrinha de cereal. - Vou indo agora, já te beijei demais por hoje. Sem falar que Glenn deve estar te procurando para vocês caçarem os falcatruas.

Ela arruma os cabelos, dando batidinhas no rosto, e morde a barra de cereais.

– É para disfarçar. - diz, dando mais uma mordida. - Pessoas que comem não ficam se beijando, entende? Faz sentido, não faz? Claro que faz! Aliás, ninguém pode saber que a gente anda se beijando, Daryl. Eles tem um bolão! Você sabia disso? Um bolão apostando quando é que a gente vai ser comer! Achei isso um absurdo, mas no lugar desse povo eu também faria o mesmo. Enfim, vou indo. Disfarça essa cara antes de sair, tudo bem? Ou meus amantes vão perceber que você está apaixonado por mim e aí fodeu tudo! - ela diz, saindo do quarto como se nada tivesse acontecido. - Quer barrinha de cereal, Ty? Daryl queria comer todas, mas não deixei. Odeio gente egoísta! - ouço ela dizer, com uma cara de pau inacreditável, antes de bater a porta.

Fico em silêncio, com o pacote de bolacha nas mãos e uma expressão confusa. Talvez Thea não estivesse assim tão errada em suas brincadeiras.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

UÉ, DARYL, ANDA PENSANDO EM PAIXÃO? EM BEIJAR SOMENTE UMA BOCA?
Gente, a campanha #THEALIBERALOGOOTESOURINHO está em sua fase final. Logo, logo, PIRATAS DO CARIBE! huhu
Obrigada aos 81 acompanhadores (?) da fanfic e, quem nunca se manifestou, por favor, se manifeste! Comentem, recomendem!
Milhões de obrigadas aos leitores comentadores que eu amo muito! Continuem comentando e recomendando que meu amor só vai aumentar e a mão que escreve não parará nunca de tremer!

(acompanhadores é estranho, mas acompanhantes é pior. Parece que a fanfic é uma prostituta)
(se ela fosse, seria uma de luxo)
(óbvio)

Beijos de luzzzzzz