– Bugsy! – Curvo levemente os joelhos para abraçar-lhe á sua altura. Eu sou relativamente baixinha, mas como ele ainda é bem jovem, na idade de seus treze anos, é um pouco menor. – Quanto tempo que não te vejo!

– Digo o mesmo. Você parece ter esquecido dos amigos desde a conferência. – Diz, separando o abraço. Sorrio, meio sem jeito. Realmente, eu havia falado menos com meus amigos, com exceção de Jasmine e Falkner, desde a conferência de ligas, sem alguma razão em especial.

– Sorry! Prometo manter mais contato assim que terminar com toda a papelada chata do ginásio, ok? – Seu sorriso retorna com a frase, ainda mais forte e vibrante. – E aí, o que tem feito da vida?

– Tenho treinado bastante com alguns amigos meus de outras regiões, apreciadores do tipo inseto tanto quanto eu! Estou aqui para a final do Pokéathlon! Vou competir contra um dos meus companheiros de treino, um membro da Elite de Sinnoh! – Sua animação era contagiante. Desde que o conheci apreciei sua capacidade de estar sempre alegre, esse foi o maior fator que fez com que nos tornássemos amigos.

– Boa sorte, campeão. Manda ver!- Respondo, brincando com suas madeixas cor lavanda.

– Voltei! – Vejo Morty entrar pelo portão do Parque, segurando as chaves do carro e pondo-as no bolso. – Pronta para ir, rosada?

Fico envergonhada. Não é comum eu estar conversando com um amigo e do nada surgir um rapaz entrosando, me chamando de rosada e alisando meus cabelos. Bugsy parecia confuso.

– Nossa. – Ouço o especialista em insetos falar, surpreso. – Não sabia que você estava namorando o líder do ginásio de Ecruteak, Whitney.

Minhas bochechas ardem como chamas.

– N-nós não somos namorados, nem pensar! Ele só está me dando uma carona. – Respondo totalmente constrangida. Morty ri mais alto do que deveria.

– Parece que minha fama de galã ficou tão grande que sempre que me veem com uma garota acham que estou namorando ela. Haja paciência.

Bugsy dá de ombros, pegando sua rede que estava presa ás costas por um elástico.

– Acho que vou treinar mais um pouco e tentar capturar algum Pokémon tipo inseto interessante por aqui, enquanto a final não começa. – Sua animação retorna, trazendo a minha de volta consigo. – Whitney! Eu gostaria muito que você estivesse lá na hora que eu for competir. Será que tem como você ir? Seria um bom apoio!

Congelo por alguns segundos. Essa era uma opção meio inviável, já que a competição de Bugsy seria uma das ultimas, relativamente tarde, por volta da hora que eu e Morty teríamos que estar saindo daqui. Mas... Eu sinto que devo isso a ele. Ele me ajudou bastante quando comecei a liderar o ginásio. Solto um curto suspiro.

–... Claro, Bugsy. Estarei lá! – Respondo, expondo um falso sorriso.

– Legal! Então te vejo mais tarde. Até mais, Whitney, e... Morty, certo?

– Segundo minha certidão de nascimento, certo! – O loiro responde, cruzando os braços e sorrindo de canto de modo sarcástico. Eu reviro os olhos e faço sinal para Bugsy ignorar as ironias bestas de Morty. O garoto dá de ombros novamente e corre em direção ao estádio do Pokéathlon.

– Você me disse que tinha mais amigos da minha idade... - Ouço o nativo de Ecruteak resmungar ao meu lado. – Não é o que parece.

Lanço-o um olhar gelado.

– E você me disse que não era um chato. Não é o que parece, também. – Noto que minha voz afinou além da conta devido á raiva. Levo as mãos á boca, envergonhada. Odeio quando isso acontece, me sinto uma garotinha mimada chorando em uma loja de doces. Morty nota minha vergonha, rindo. – Para de rir! Não é engraçado.

– Eu nunca disse que não era um chato, princesa! – Um sorriso sincero se forma em seu rosto, me deixando ainda mais corada. – Vem, vamos almoçar.

Estende o braço para mim. Arregalo os olhos por alguns segundos, sem saber ao certo o que fazer. É uma sensação estranha, eu estava com raiva dele há menos de dez segundos, e agora eu envolvo seu braço com o meu e encosto minha cabeça em seu ombro, indo assim até o restaurante.

Por mais que eu tenha me arrependido profundamente assim que encontrei com o tecido macio de sua camisa, não conseguia--ou queria--sair daquela posição. É estranhamente confortável caminhar ao seu lado, com nossos braços cruzados, sentindo sua respiração em meus cabelos. Chegamos á um restaurante rústico, próximo ao estádio do Pokéathlon. Estava mais cheio que o normal devido ás finais da competição. Separo-me do loiro e empurro a porta dupla de vidro, abrindo a passagem para o interior do restaurante. Quando eu ia dar meu primeiro passo para dentro, sinto Morty segurar meu pulso sem muita força.

– Entrar com tanta pompa não é algo que você vai desejar fazer, rosada. O pessoal costuma se animar muito quando vê algum líder de ginásio ou membro da elite saindo por aí com outra pessoa, principalmente com algum outro dessa classe. Melhor tentar ser discreta o máximo possível.

Apesar de meu lado mimado gostar da sensação de ser notada e receber atenção pública, ser vista andando por aí com o Morty por olhos desinformados poderia gerar alguma conclusão precipitada, assim como a que Bugsy teve, que eu não gostaria que caísse na boca do povo, então sigo seu conselho. Entramos lado a lado, de cabeça baixa, escolhendo a mesa de dois lugares mais próxima, encostada á parede e ao lado de uma grande janela.

– O que vai comer? – Pergunta, segurando o cardápio e dando uma olhada rápida.

– Não estou com fome. – Minha animação de alguns minutos atrás havia sumido. Algo dentro de mim me incomodava. Não alguma dor ou mal estar, algo que nem eu mesma sabia o que era. Apoio minha cabeça em minha mão, com o cotovelo na mesa de madeira. Fixo meu olhar no horizonte através da janela, tentando ao máximo não manter qualquer contato com Morty. O loiro suspira.

– Boa tarde. Como posso ajuda-los? – Uma garçonete sorridente aproxima-se da mesa, trazendo em uma bandeja duas garrafas d’água e dois copos com gelo, de cortesia da casa.

– Um filé á parmegiana com uma porção de batatas fritas, por favor. – A garçonete anota rapidamente em seu caderninho. – E para a senhorita, frango grelhado com salada verde.

Dou um pequeno salto para trás, em surpresa. Ele é surdo ou cara de pau, mesmo? A garçonete fita-me com um olhar preocupado, enquanto Morty olha em minha direção, de um modo sarcástico que pareceu aumentar ainda mais meu ódio.

– Não se preocupe com ela, é meio sequelada. – Adverte á garçonete, que dá um sorriso constrangido e retorna em direção á cozinha. O sorriso do loiro desaparece, olhando-me com desdém, enquanto meu olhar de desprezo continua firme em sua direção. Faz muito tempo que não fico com tanta raiva de alguém. O ódio acumulado dentro de mim por alguma razão desconhecida parece vir à tona com qualquer coisa besta.

– Qual seu problema? Eu disse que não estou com fome! – Digo, levantando-me em parte da cadeira.

– Abaixe o tom de voz, Whitney. – Morty fala com uma seriedade incomum, como se reclamasse com uma criança desobediente. Noto que eu estava falando mais alto do que deveria, de modo que algumas pessoas no restaurante me fitavam com curiosidade. Sento-me novamente, cruzando os braços e franzindo o cenho em indignação. Uma parte de mim fica perturbada com o fato de ele não ter usado o apelido que tanto usa para me chamar. O loiro apoia os dois braços na mesa e olha fixamente pela janela, sem dizer uma palavra. Um peso súbito surge em minha consciência, como se eu tivesse feito algo que o havia deixado extremamente chateado.