Viro-me em sua direção, mas meu olhar permanece baixo.

– É, parece que sim. – Levanto o olhar, olhando-o nos olhos com o cenho franzido. – Mas foi uma só bandeira! Não é como se fosse uma diferença gigante!

Um sorriso de desdém se forma em seu rosto.

– Continua sendo uma derrota. E eu vou te perturbar por um tempão com isso!

– Boa forma de retribuir o que eu fiz por você, senhor medo de altura! – Respondo, afetada com a situação. Ele parece retornar á realidade, ficando meio sem jeito e com as orelhas um pouco avermelhadas. – Vamos embora logo antes que a saída fique lotada de novo.

Abro novamente o alçapão, fazendo sinal para ele descer primeiro.

– Você não vai querer falar com o pirra... Com o Bugsy, antes de sair? – Pergunta, levando a mão á nuca, meio desconfortável.

– Eu ligo pra ele mais tarde... Se eu me lembrar.

Ele consente com a cabeça, descendo pelas escadas que levavam até o camarim. Desço em seguida, olhando em volta e vendo como o lugar ficava diferente sem um monte de treinadores correndo de um lado para o outro como doidos. Abrimos as portas, fazendo uma brisa refrescante entrar por todo o aposento.

– Tem alguma ideia de quanto tempo levará para chegarmos a Mahogany? – Pergunto, enquanto andamos lado a lado até a saída do Parque Nacional.

– Talvez umas duas horas, mais ou menos. – Responde, sem mostrar expressão. Após poucos minutos de caminhada em silêncio chegamos ao bom e velho arco de metal que demarca o parque. Ele faz sinal para que eu esperasse ele ir buscar o carro onde ele fora estacionado. Assisto parada ele se afastar, com os braços cruzados nas costas. Sinto o Pokégear vibrando em meu bolso novamente.

“Oi, Whitney. Desculpa por desapontar você... Sei que tinha bastante confiança em mim, mas eu não fui capaz de provar que eu mereço essa confiança...” Dizia a mensagem que Bugsy me mandara. Sinto uma pena sem tamanho de sua situação.

“Não diga isso, Bugsy. Eu sempre vou confiar em você. Você tem potencial. Foi só uma bandeira de diferença, além disso, ele é um membro da Elite, não deve ser fácil derrota-lo.”

“Obrigado, Whitty!”

Sorrio com sua resposta e com o apelido usado por ele. O Bugsy me considera como irmã mais velha desde que nos conhecemos, ele conta comigo pra quase tudo, e eu sei que também posso contar com ele. Em pouco tempo, vejo o carro preto se aproximar no horizonte. O loiro sai pela porta do motorista, andando em direção á porta da carona e abrindo-a para mim. Após eu entrar, ele fecha a mesma e volta ao seu lugar de motorista, ligando a ignição do carro e tomando rumo do nosso caminho.

– Então, já que eu ganhei a aposta, posso escolher as músicas que vamos ouvir no caminho? – Pergunta, sorrindo.

– Tanto faz. Contanto que não coloque nenhuma música com gritos escandalosos ou letra nojenta. – Respondo enquanto olho pela janela. O céu tinha um tom de laranja e violeta lindo, bem clássico de fim de tarde, e o sol já estava se encaminhando ao seu lugar no horizonte, e em pouco tempo estaria se pondo. Morty liga o rádio do carro, dando inicio á uma música de melodia relativamente calma.

“I remember what you wore on the first day

You came into my life and I thought

“Hey, you know, this could be something.”

‘Cause everything you do and words you say

You know that It all takes my breath away

And now I’m left with nothing”

O loiro parecia sentir a melodia entrar em seu corpo, com os olhos semicerrados de um modo que pareciam estar abertos somente pela necessidade de ter que continuar observando a estrada. Era uma música bonita, definitivamente não do tipo que eu esperava vindo do loiro.

“So maybe It’s true

That I can’t live without you

Maybe two is better than one

But there’s so much time

To figure out the rest of my life

And you’ve already got me coming undone

Now I’m thinking two is better than one.”

Morty canta essa parte na mesma melodia da voz do cantor. É como se as duas vozes se completassem, causando uma harmonia calmante. Eu nunca o tinha ouvido cantando... Era lindo. Como se fosse uma terapia para mim. Uma pequena fatiga surge em meu corpo. Estou acostumada a dormir um pouco depois que almoço, e como não tive tempo de fazer isso hoje, o cansaço veio á tona assim que me coloquei em uma posição confortável. O sono lentamente começa a tomar conta de mim, enquanto ouço a voz do loiro cantar em ritmo sereno. Deito a cabeça na poltrona do carro, pondo-me a dormir em poucos minutos.

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Um pequeno som agudo acorda-me de meu sono. Outra música tocava no rádio, desta vez, mais animada e com um ritmo mais rápido. Mantenho meus olhos quase cerrados, mas de modo que eu conseguia ver levemente o que estava ao meu redor. Meu olhar encontra o rosto cansado do loiro, como se estivesse exausto depois de muito tempo dirigindo. Algumas vezes, seu olhar mudava de direção, retirando-se da estrada e observando-me de canto por poucos segundos.

–“Derreter.Eu me sinto derreter por esse sentimento.

Não posso dizer que gosto de você... Mas...

Derreter. Não posso deixar nossos olhares se encontrarem.

Eu não sou muito de amor e essas coisas, mas eu, realmente... Gosto de você.”.

Fecho meus olhos por completo novamente, cerrando-os com certa força. Senti minhas bochechas arderem. A parte da música que ele cantara aparentava ser o refrão ou algo do tipo. E nas últimas três palavras, seu olhar se virou em minha direção com um sorriso. Um sorriso sincero. Ele dá uma risada baixa e fofa.

– Desculpa por te acordar. – Diz, acariciando meus cabelos. Viro a cabeça, tentando impedir que visse minhas bochechas vermelhas como morangos.

– Não me acordou. Ainda estou dormindo. Continue dirigindo e finja que não estou aqui! – Respondo, pondo os pés na poltrona e abraçando meus joelhos, deitando meu rosto nos mesmos. Que vergonha! Por que eu sou tão estúpida?

– Fingir que você não está aqui é impossível, rosada!

– Hm. – Murmuro, levantando levemente a cabeça, de modo que meu rosto apenas ficasse visível de meus olhos para cima. Olho pela janela. O céu que se exibia por trás das árvores estava muito escuro, com muitas estrelas, e a lua cheia iluminando-o por completo. Estava lindo, mas... Por que está tão escuro? Ele disse que chegaríamos em duas horas, e saímos do Parque Nacional seis da tarde, então não deveria estar tão escuro.

– Quando chegaremos a Mahogany? – Pergunto, olhando em sua direção. Ele parece meio desconfortável.

– Bem... Eu não sei.

Retorno á minha posição normal, fitando-o com olhos arregalados. O que diabos ele quer dizer com “Não sei”? Perdeu a noção?

– Como assim você não sabe??

– Vou ser sincero com você: Já faz algumas horas que eu não tenho a mínima ideia de onde estamos. Não estou acostumado a dirigir por aqui á noite.

– O QUE??

Meu grito parece assusta-lo, de modo que ele tem um pequeno espasmo e arregala os olhos momentaneamente.

– Calma, rosada. Aposto que não devemos estar muito longe de Mahogany.

– Morty, nós estamos em uma FLORESTA! NÃO TEM FLORESTAS NAS REGIÕES PRÓXIMAS A MAHOGANY!!

– Não é uma floresta, é uma área arborizada! Não deve ser muito extensa, aposto que conseguimos achar alguém não muito longe daqui que possa nos dizer que caminho seguir.

– Hm. – Murmuro, com raiva. – Então continua seguindo em frente até acharmos alguém.

– É esse meu plano, flor! – Responde, sarcástico. Desvio o olhar, pegando meu Pokégear no bolso e olhando as horas.

– Quase onze horas?! Esteve perdido todo esse tempo??

–... Talvez.

Levo a mão á testa, tentando controlar minha raiva.

– Se você perambulou por todo esse tempo, ou estava andando em círculos que nem um idiota ou já estamos do outro lado do continente!

– Você quer parar de resmungar, por favor?! Poderia estar pior.

– Por favor, não fale essas três palavras...

– Quais?

– As que você acabou de falar. Elas sempre pioram tudo.

– Poderia estar pior...?!

– CALA A BOCA!

Ele faz uma cara de desprezo, como se minha fúria excessiva o estivesse deixando com raiva também. Cruzo os braços, olhando o pouco de estrada que podia ser vista á frente. O carro balançava um pouco, como se estivéssemos em uma estrada esburacada. Vez ou outra o loiro bocejava, parecia cansado. Não o culpo, dirigir tanto tempo deve ser cansativo, mas a raiva que eu sentia dele no momento não permitiu que eu sentisse pena ou algum tipo de sentimento piedoso por ele.

Enquanto eu flutuava sozinha em meus próprios devaneios observando a lua pela janela, a velocidade do veículo parece diminuir subitamente. Olho em direção ao loiro, com curiosidade. Ele apenas olha em direção ao volante, sem demonstrar expressão.

– Como se estarmos perdidos já não fosse inconveniência o suficiente... – Ele diz, apoiando os dois cotovelos no volante, levando as mãos ao rosto, soltando um suspiro breve.

– O que houve dessa vez?

– A gasolina está acabando. O resto que tem seria o suficiente apenas para mais alguns metros. – Quando eu ia abrir a boca para surtar quanto á nossa situação, ele põe o dedo indicador sobre meus lábios, me impedindo de falar qualquer coisa. – E antes que a senhorita reclame, discutir não vai resolver nada. Eu tenho uma lanterna no porta-malas. Vou encostar o carro em alguma parte da estrada e vamos á pé procurar algo ou alguém para nos guiar.