Lealdade, Honra, e um Coração Disposto escrita por Dagny Fischer


Capítulo 33
Capítulo 33 – Doença do Ouro




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Passaram os dias seguintes se preparando para uma possível guerra e um quase certo cerco. Thorin passava os dias no tesouro procurando a Arkenstone, e Bilbo estava se tornando um hobbit muito calado, nada excitado com a lida de guerra. No final do sexto dia depois da morte de Smaug tiveram notícia de que um exército élfico e humano estava nas fronteiras da área da Desolação, e na manhã do dia seguinte um par de batedores veio até o Portão de Erebor; quando viram anões de vigília no balcão, retrocederam sem uma palavra.

“O Rei Avestruz veio!” Fíli foi correndo avisar Thorin. “Mandaram alguns batedores para ver se estamos vivos, Tio. Melhor se preparar para um debate.”

“Vamos ver o que eles têm a dizer.”

Respondeu um Thorin de mau humor. Qualquer coisa que o fizesse sair do tesouro não era benvindo. Ele já havia corrido com a maioria dos membros da Companhia que haviam tentado fazer com que saísse do tesouro por qualquer razão.

Não foi necessário esperar para que uma pequena delegação chegasse até o Portão. Logo Thorin e sua Companhia os viu chegando, Bard dos Homens do Lago e Legolas do povo de Thranduil, mais dois ou três de cada raça. A presença de elfos não prenunciava nada de bom.

“Salve, Thorin Escudo-de-Carvalho, filho de Thráin, filho de Thrór!”

“Salve, Bard da Cidade do Lago.” Thorin não estava de bom humor mas tentava se manter civilizado. “O que o traz a nossas portas?”

“Fui mandado para pedir recompensa pela morte do dragão que assombrava seu reino. Ele queimou nossa cidade e nosso povo está nos ermos.”
“Não por falta de nosso aviso e ajuda prévia.”

“Não tivemos nenhum aviso de que teríamos que lidar com um dragão bêbado.”

“Bêbado ou não, foi um dragão ferido com que tiveram que lidar, debilitado e meio cego.”

“Isso nós não negamos.”

“Então...?”
“Fui mandado para exigir compensação pela morte do dragão que queimou nossa cidade.”

“Descontada nossa ajuda anterior, pode-se pensar nisso, mas não para quem vem armado à nossa porta como se fosse para guerra. E o que faz o rebotalho de Mirkwood à nossa porta?”
Bard mexeu os pés, desconfortável, e Legolas tomou a palavra.

“Thranduil o Rei exige uma parte do tesouro por ter ajudado os homens da Cidade do Lago.”

O quê?”

Legolas olhou para os outros membros da delegação, avaliando-os, e então de volta para Thorin.

“Resumindo, ele é um camarada ganancioso e está tentando obter alguma riqueza dessa bagunça. Eu não concordo com ele, mas se não fizer minha parte ele vai me deserdar, e não estou muito de acordo com essa ideia.” Os outros arregalaram os olhos para ele, espantados. “Qual o problema? Posso ser estúpido, mas sou sincero!”

“Tire a sua sinceridade da minha vista antes que eu enfie uma flecha no meio dela! Não trocarei palavra com a escória de Mirkwood e nenhuma compensação será contabilizada para aqueles que chegam à minha porta armados!”

E com isso a delegação foi dispensada, e um Thorin zangado voltou para seu tesouro encantado por dragão.

ooo000ooo

“Nada bom, nada bom, isso não vai dar em nada bom!” Balin andava na sala de um lado para o outro.

“Como vamos nos livrar dos elfos? Ele não têm nada a exigir de nós!” Fíli estava indignado.

“Pior ainda, eles deviam nos pagar uma compensação por terem nos aprisionado sem causa!” Kíli apoiou o irmão.

“É verdade, é verdade, mas como vamos lidar com esse cerco?”

“Enquanto houver cogumelos, há esperança!” Essa foi a contribuição de Bilbo à discussão.

“Dáin estará aqui dentro de dias. Se o Povo do Lago não raciocinar e os elfos de Thranduil não recuarem, teremos guerra.”

“Aí está, o exército que Thranduil negou a Thrór para derrotar Smaug ele solta contra um dos Povos Livres da Terra-média. Que vergonha para o meu sangue!” Ellen estava aborrecida. “Não é de se espantar que Thorin tenha levado tanto tempo para confiar em mim, se eu tivesse uma experiência anterior com aquele cara eu também não confiaria em elfo nenhum!”

“Se fosse dada uma compensação aos homens da Cidade do Lago, seria o fim do cerco?” Perguntou BIlbo, curioso.

“Thranduil é ganancioso, você ouviu o próprio filho dele falar. Bard não mencionou recompensa para os elfos, todos vocês viram.”

“Mas ele não negou o discurso de Legolas.”

“Ele era só um porta-voz, não alguém que decide as coisas. Tenho certeza de que negociaríamos justamente com ele, mas não tem jeito de acertar as coisas com os elfos lá.”

“Existe mal demais à solta na Terra-média para concordarmos com uma guerra entre os Povos Livres.”

“Mas não procuramos por guerra, a guerra veio à nossa porta!”
E assim a conversa continuou, dado que não havia como conciliar os interesses dos anões e dos elfos; apesar de sua experiência nos ermos durante os últimos poucos meses, nem as mulheres nem Bilbo estavam confortáveis com a ideia de uma guerra contra elfos e humanos, afinal, três delas tinham sido humanas até pouco tempo atrás, e uma delas era uma elfa atualmente. O hobbit era quem se sentia pior sobre tudo isso, e foi ficando mais e mais quieto conforme a noite se aproximava.

ooo000ooo

O dia seguinte encontrou a delegação no Portão novamente. Thorin foi chamado do tesouro, onde dormira aquela noite (ou não tinha dormido nada, como seus olhos sugeriam) apesar de todos os esforços de sua Companhia para tê-lo de volta em seus aposentos.

“O que estão fazendo aqui? Lhes disse que não conferenciaria com pessoas armadas, e que não haverá conferência com a escumalha de Mirkwood de forma alguma!”

Bard tomou a palavra.

“Thorin Escudo-de-Carvalho, não há nada que você preferiria do que um pouco de ouro que não fará diferença nenhuma em seu tesouro mas que fará toda diferença para o povo da Cidade do Lago?”

“Já lhes disse que a compensação virá no devido tempo, mas não aceito pressão de pessoas armadas associadas à escória élfica!”

Não havia jeito de explicar que tudo que Bard queria era liquidar os negócios e garantir ao povo da Cidade do Lago meios para sobreviver ao inverno que se aproximava. O rei élfico tinha influência demais na economia da Cidade do Lago para ser ignorado.

“Ofereço o que está nessa urna em troca de seu valor em ouro.”

Bard disse isso e um belho abriu uma caixinha de madeira; para o desalento dos anões, era a Arkenstone que brilhava lá dentro.

“Como é que chegaram a pôr suas mãos imundas em minha herança? Por que pensam que pagarei pelo que é meu de direito?” Thorin espumava de tanta raiva.

“Se esse for o meio de fazer você ver a razão, é assim que vai ser.”

“Ladrões! Vocês roubaram a herança de minha família! Isso lhes garante guerra sobre vocês e sobre seu povo enquanto o que foi roubado não for retornado! Quem pôs essa pedra em suas mãos imundas?”

Um Bilbo perturbado falou baixinho a seu lado.

“Na verdade, fui eu.”

“O quê?” Thorin olhou punhais na direção do hobbit. “O que você fez, seu descendente de ratos?”

“E-eu lhes dei a Arkenstone.” Bilbo gaguejou. “Pensei que podia comprar a paz com essa troca.”
A Companhia se sentiu perdida; Iris balançou a cabeça, olhos arregalados, quase chorando.

“E como foi que teve a ideia de que era sua para dar?” Thorin gritava agora.

“Bem, você disse que eu podia escolher meu um quatorze avos devido do tesouro, então eu...”

“Seu bastardo!” Chacoalhou Bilbo pela gola. “Queria que Gandalf estivesse aqui para lhe dizer algumas verdades!”

O velho com a caixa de madeira tirou o capuz.

“E aqui ele está, Thorin Escudo-de-Carvalho!” E de fato era Gandalf quem estava lá. “Pode me dizer as verdades nas quais acredita, desde que me devolva meu gatuno, se ele não for mais de seu uso.”

“Leve-o! E leve-o agora, antes que eu mude de ideia e o jogue desses muros abaixo!”
Com isso Bilbo correu escada abaixo, acompanhado por Bofur e Bifur, que foram ajuda-lo a abrir a porta de pedra improvisada, para libera-lo e fecha-la novamente. Iris estava com eles, chorando.

“Como você pôde, Bilbo? Como você pôde?”

Ele olhou de volta para ela, zangado.

“Como eu pude? Como eu pude lidar com esse Thorin belicoso todos esses meses? Como pude lidar com orcs e goblins e aranhas e wargs? Você pode ter inclinação para a lida de guerra, Iris, mas eu, de minha parte, não! Eu quero paz, eu quero minha toca quente no Condado e não ter mais nada a ver com toda essa história!”

Bofur lhe estendeu a mão.

“Por favor, encontre um lugar no seu coração para perdoar Thorin. Óin tem certeza de que ele está com a doença do ouro, ele não está em seu normal.”

“Eu vou, meu amigo, mas a uma distância segura de sua ira.”

Lhe desejo sorte” Bifur gesticulou em Iglishmêk, e Bofur traduziu para Bilbo.

“Eu sei.” Todos se abraçaram calorosamente. “Lhes desejo sorte também, porque enquanto Thorin tiver essa doença, todos você vão precisar dela!” Voltou-se para Iris. “E você, vai me perdoar?”

Ela o socou de leve no peito.

“Como eu poderia não perdoar?”

Bilbo a abraçou com força, beijando seus cachos vermelhos com um suspiro.

“Não é porque eu sou versada para guerra que eu não prefira a paz.”

“Preciso ir agora.”

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Depois de dispensar Bilbo, Thorin apressou-se de volta para o tesouro sem nem um aceno para o restante da Companhia, e ficou por lá mesmo. Bombur foi até ele com um prato de comida no começo da noite e o deixou lá, sem resposta a seu chamado. Na manhã seguinte Balin foi até lá e tentou falar com ele, mas voltou com um olhar enlutado. Logo após o meio dia Lily suspirou, trocou algumas palavras com Ellen e saiu do quartel-general, sem olhar para trás. Achou o caminho até o tesouro e parou na entrada.

“Thorin, você precisa descansar!” Implorou Lily. “O tesouro vai estar aí amanhã, e no outro dia, e em todos os outros dias pelo resto da sua vida! Por favor, deixe isso aí e venha para casa!”

“Eu estou em casa, mulher!” Ele respondeu, um tom zangado na voz. “Cada pedaço de Erebor é meu lar, de cada cascalho até cada poeira de diamante que lutei para retomar, isso tudo é meu lar!”

Lily baixou a cabeça, uma lágrima brilhando no canto do olho.

Todos nós lutamos para retoma-lo.”

“E todos terão seu quinhão do outro.” Ele retrucou secamente.

Ela estreitou os olhos, levantando o rosto para olhar diretamente nos olhos dele, um nó na garganta.

“Eu não lutei por ouro; eu lutei por um lar, Thorin, um lar que a gente ia compartilhar, você se lembra disso?”

Thorin abriu os braços e acenou com as mãos para todo o tesouro à sua volta.

“E não estamos compartilhando esse lar, Lily? Isso é o sonho de cada anão de Cuiviénen até Ered Luin, de Helcaraxë até Harad Distante! Eu te prometi um lar que merecesse você, sua beleza, sua bondade, sua alegria juvenil, e veja, Lily, olhe à sua volta! Tudo isso é nosso, Lily! Esse é o nosso lar!”

Thorin estava tão absorto em sua admiração pelo ouro que nem se deu conta do que o acertou. Mais tarde seria informado de que foi um castiçal enfeitado com gemas vermelhas, que Lily destramente jogou em sua cabeça enquanto ele olhava para as pilhas de ouro.

“Meu lar pode ser até nos ermos, meu caro Midas, desde que você seja o homem que eu conheci; mas esse amante de ouro egoísta e ganancioso não é quem eu conheci, quem eu aprendi a respeitar e a amar.”

Ele esfregou a cabeça no lugar onde o castiçal o acertou, parecendo confuso. Ela continuou.

“O meu lar é onde as pessoas que eu amo vivem; onde estão as pessoas que você ama? Onde estão os seus sobrinhos, Thorin, sua família?”

O anão olhou em volta, perplexo. Se deu conta de que era a primeira vez em anos que Fíli e Kíli não o estavam orbitando. Lily ainda não tinha terminado.

“Seus melhores amigos, onde estão? Balin, Dwalin? Você se lembra quando foi a última vez que tomou uma caneca de cerveja com Glóin e Óin? Uma taça de vinho com Dori?”

Thorin balançou a cabeça. Alguma coisa não estava fazendo sentido. Alguma coisa estava faltando.

“Você costumava ter orgulho de sua atenção aos membros da Companhia, quando foi a última vez que você perguntou sobre qualquer um deles? Você sabia que o último dente do siso do Ori nasceu três dias atrás e ele não estava conseguindo nem mastigar uma fatia de pão? Que Bombur vai até o cultivar de cogumelos todos os dias só porque você prefere os cogumelos cor de salmão e eles só podem ser usados no mesmo dia em que são coletados?”

“Lily, eu...”

“Eu ainda não terminei!” Ela gritou. Estranhamente, ele não reagiu. “Quando eles têm um tempinho livre, você pode ver Bofur e Nori tentando consertar algumas coisinhas que estamos achando no lar do seu avô; Nori não e muito bom nisso, mas ele diz que ainda é jovem o suficiente para aprender se Bofur estiver disposto a ensinar; quando quer que você encontre seu rumo para casa, Thorin, você vai saber sobre o que estou falando.”

Agora ele estava realmente perturbado; não era só o latejar da pancada em sua cabeça, o que ela dizia fazia sentido, ele não conseguia entender direito o que estava acontecendo com ele. Ainda assim, a cobiça pelo ouro era forte nele, visto que um dragão havia feito seu lar sobre aquele ouro durante muito tempo, e quanto mais ficava entre aquele tesouro encantado mais forte a doença do dragão o dominava. O espírito de Smaug tentou tomar conta mais uma vez, e Thorin replicou, áspero e amargo.

“O que você está pensando? O que você está fazendo aqui, afinal? Você nem mesmo nasceu anã, e é sobrinha de uma elfa!”

Ele andava zangado entre as pilhas de ouro, tentando discutir o que não era discutível, desqualificando Lily em vez de contestar seus argumentos. A doença do ouro o havia tomado.

“Você está tentando me tirar daqui para roubar meu tesouro, minha herança!”

“Eu não sou nenhuma ladra, nem ninguém da Companhia!” Lily gritou.

“Você mente! Temos um gatuno na Companhia, contra minha vontade!”

Lily sentou sobre uma pilha de ouro, cansada, e pôs as mãos na cabeça.

“Não, não temos. Se não se lembra, você quase o jogou do balcão ontem. Então você o mandou embora para o povo da Cidade do Lago.”
Thorin não se lembrava, e tinha um olhar confuso, apesar de que nunca reconheceria. Sua memória estava falhando, e só conseguia se lembrar e pensar sobre o ouro debaixo de seus pés.

“Por que você está tentando me afastar do que é meu por direito?”

Lily respirou fundo, esperando conseguir lidar com ele.

“Você é um rei. Seu povo precisa de você. Eu preciso de você! Lá fora, onde as pessoas estão, não aqui, onde o ouro frio está.

“Por que eles não vêm aqui onde estou ao invés de querer que eu vá até eles?”

Seu tom era confuso, soando quase que como uma criança.

“Thorin, olhe para si mesmo! Você está com olheiras, sua comida fica intocada, você se afasta de todos e de tudo a não ser essas pilhas de metal e pedra, pelo amor de Durin, isso não é vida!”

Ele não se sentiu tocado. Toda aquela argumentação fazia com que se ressentisse dela, porque a doença do dragão mexia com sua psique, e ele entrou num surto de raiva novamente.

“O que você sabe sobre a vida? Você é uma criança, você não viu nada na vida, nada! Você não conhece o cheiro de sangue num campo de batalha, não sabe o que é cremar seu irmão, ver seu avô ser decapitado, ver...” Sua voz falhou. “Por que está tentando me afastar do que é meu por direito? Essa é a minha herança, meu tesouro!” Thorin gritou com ela. “O que você está fazendo aqui?

Ela se levantou, uma ira gélida atravessando seus olhos de azul marinho profundo.

“Eu estava procurando por aquele a quem eu amo, por aquele que disse que me amava também. Mas não é possível encontra-lo, então estou dando o fora.”

Lily se voltou para a porta ampla e começou a andar para longe.

“Você pode ir e vir como bem lhe apetecer, você é uma cidadã livre de Erebor.”

“Você não entendeu.” Ela olhou para trás por cima do ombro. “Eu não estou só dando o fora desse lugar amaldiçoado por um dragão, eu estou dando o fora em você.”

Thorin ouviu, incapaz de acreditar. Não podia ser! Ela não podia abandona-lo, ele não podia perde-la!

“Não! Você não pode! Lily! Não me deixe! Lily, você vai partir o meu coração!”
Ele correu na direção dela, tropeçando no ouro escorregadio, caindo uma vez, retomando o passo e se esforçando adiante. Ele estava bem no meio da sala do tesouro e ela estava perto da porta enquanto discutiam, e ela já havia ido. Suas últimas palavras ecoavam na cabeça dele, machucando, cortando todos outros pensamentos para longe dele, e então ouviu a resposta à sua última queixa e seus passos que corriam levando-a para longe dele.

“Você já partiu o meu, Thorin Escudo-de-Carvalho!”

Ele parou no final do corredor, tentando adivinhar para onde ela teria ido. Ouviu o som de um soluço abafado à sua direita, e foi atrás dele. Aquela passagem levaria até o templo de Mahal, e ainda não haviam explorada a área, ela não sabia para onde estava indo, só estava correndo para longe dele. Sua flor de lírio estava fugindo dele! O que tinha feito? A dor em sua cabeça já estava se espalhando como uma onda densa de um mel amargo, borrando tudo que não fosse sua procura por Lily. Gritou o nome dela, e sua própria voz ecoou de volta. Ele estava no templo, afinal, mas ela não estava em nenhum lugar que ele pudesse ver. A luz do final da tarde se filtrava pelas janelas das altas abóbadas, refletindo nos espelhos empoeirados e espalhando um pouco de luz em volta, luz suficiente para seu olhos de anão procurarem por ela, mas não havia pista de onde ela pudesse estar.

“Lily!”

Thorin andou cautelosamente pelo lugar, procurando em cada canto, cada sacrário, sem resultado. Ele não conseguia vê-la, mas tinha certeza de que estava lá, quase que podia sentir o calor dela, e chamava seu nome de vez em quando, sentindo-se miserável e perdido; então olhou para a grandiosa escultura de Mahal, um martelo em sua mão erguido como se para bater. A dor que sentia fluía de sua cabeça para o pescoço e os ombros também, e estava ficando mais difícil suportar; se o martelo de Mahal caísse em seu peito seria misericordioso. Misericórdia!

“Mahal! Misericórdia! Traga Lily de volta! Não deixe que ela parta meu coração!”
Sua voz estava alquebrada de dor quando o um dia orgulhoso rei se ajoelhou diante da escultura de seu Criador e repousou a testa e as mãos no chão de pedra.

“Misericórdia! Eu abro mão de tudo que afastou Lily de mim, que levou minha família e meus amigos embora; eu estava errado, fui enganado por aquele maldito ouro de dragão! Abro mão de cada moedinha que me tentou, desde que eu possa ter Lily comigo! Misericórdia!”

Os soluços incontroláveis de Thorin ecoaram no templo amplo; ele havia partido o coração de sua Joia, e seus estilhaços se cravaram em seu próprio coração. A dor de perder alguém a quem sua alma estava entrelaçada era esmagadora, como se um parte física dele tivesse sido amputada, mas a morte não o tomasse para liberta-lo de seu sofrimento.

Um toque leve nas costas de sua mão estendida o assustou e ele rapidamente levantou o rosto, para encontrar os olhos cheios de dor de Lily fixados nos seus; a face dela estava úmida e suja, como a dele mesmo provavelmente estava, tendo soluçado sobre o chão empoeirado. Ele ergueu uma mão hesitante para o rosto dela, e seus dedos trêmulos tocaram os malares dela e a trança delicada de sua barba. A voz dela era quase menos que um sussurro.

“Você está de volta?”

“Você está?” A voz de Thorin tremia; Lily assentiu levemente e estendeu a mão para o cabelo dele, sua barba, piscando para se livrar da umidade dos próprios olhos. “Você é capaz de me perdoar?”

“Você estava doente. Não era você.”

“Eu… Eu quebrei o seu coração; como posso consertá-lo?”

Seus olhos tinham um olhar arrependido, com medo demais para ter esperança; ela pegou sua mão e a levou para sua cintura, chegando mais perto dele, olhos suplicantes.

“Me faça inteira! Me faça sua!”

Ele olhou para seus olhos brilhantes e soube que ela de fato queria dizer aquilo; seu senso de honra tentou protestar, pelo bem dela.

“Não devíamos...”

“Thorin... tem uma Guerra à mão... podemos estar mortos amanhã... esqueça os costumes e tradições, temos Mahal para nos abençoar, e isso é suficiente.”

Thorin a beijou ferozmente, abraçando-a com toda força, e ela o beijou de volta, faminta, acariciando suas costas e se regozijando no calor de sua boca. Ela não protestou quando suas mãos trêmulas alcançaram por sob sua blusa, nem ele quando ela soltou a gola de seu manto quente; na verdade, ele o pegou e estendeu num pedaço do chão que parecia menos empoeirado e a sentou lá. Balançou a cabeça, pedido desculpas.

“E eu te prometi lençóis de linho...”

“E eu disse que enquanto você fosse quem você é, nada mais importava.” Ele desamarrou as botas dela e as colocou ao lado das suas. “Agora você é você mesmo de novo, e nada mais importa.”

O templo isolado não tinha correntes de ar, mas o inverno estava lá fora, e puseram o casaco de Lily por cima deles para manter o calor; para falar a verdade, não levou muito para que o deixassem de lado como completamente desnecessário. Estavam famintos um pelo outro já há meses, e agora aplacavam a sede no suor um do outro, misturando seus cheiros, e se esgotaram um pelo outro, gritando juntos seu desejo há muito reprimido.

A luz estava sumindo quando finalmente pararam para descansar, ofegantes, a mão dela brincado com os pelos encaracolados do peito dele, onde eras atrás ela havia cuidado da mordida de warg; ele acariciava as costas dela, aspirando o perfume do cabelo dela, e mandou uma silenciosa oração de gratidão ao Vala que criara seu povo. A dor havia passado, sua mente estava clara, seu coração estava resoluto, mas sua consciência lhe dizia que havia feito muita coisa errada enquanto lutava com a doença do ouro; na verdade, ela lhe dizia que se ele tivesse lutado mais ele poderia, talvez, ter vencido a batalha entre seu desejo irracional por ouro e sua mente racional de rei; mas, o que estava feito, estava feito, para o bem ou para o mal, e tudo o que ele podia fazer era tentar reparar o que fosse possível. Beijou a testa de Lily, como costumava fazer antes do desejo por ouro tomar conta dele.

“Como se sente, minha flor de lírio selvagem?”

Ela olhou fundo nos olhos dele, uma nova chama por dentro.

“Inteira. Íntegra. E inquebrável.”


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