Tempo Traiçoeiro escrita por Loren, Sil


Capítulo 3
Capítulo Dois


Notas iniciais do capítulo

N/A Sil: Depois de muito tempo decidimos voltar com esse projeto tão maravilhoso. Espero que ainda existam leitores interessados em ler o que nós temos para contar. Obrigada especialmente a quem comentou os outros capítulos, vocês são demais. ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/586903/chapter/3

Um ano depois...

Naquela manhã, Valentina não acordara nervosa ou ansiosa como Susana dissera que aconteceria, mas o contrário disso. A única condição que a incomodava e com a qual Lúcia fora bastante enfática, era a de que em hipótese alguma poderia pôr os pés para fora do quarto, nem mesmo para o desjejum, o que era uma pena pois o dia parecia esplendidamente bonito. O motivo para todo este alarme desnecessário, na opinião da princesa, era o baile de aniversário que os reis dariam em sua homenagem naquela noite, o que a mesma considerava uma futilidade sem fim.

Durante meses Valentina tentara dissuadir Lúcia da ideia insana de dar um baile, no entanto a rainha destemida possuía uma perspicácia fora do comum e fez uso do artifício mais baixo que se pode imaginar: Edmundo; ou sua persuasão, mais especificamente. A princesa tinha sérias desconfianças de que a fama de ótimo diplomata que pairava sobre o melhor amigo, derivava desse estranho e sutil dom de convencimento.

Quando chegou à esquisita conclusão de que Ed era um manipulador nato e antes que pudesse tramar uma vingança fria e impiedosa contra ele, a porta foi aberta com um barulho estrondoso, revelando uma Lúcia de cabelos desgrenhados, ofegante e com rosto corado, resultados de uma provável corrida.

—Eu nem posso acreditar que é hoje!— falou, enquanto disparava pelo cômodo escancarando todas as cortinas. — Como passou a noite? Eu mal dormi, estou tão ansiosa! Como está se sentindo? 

—Excepcionalmente normal, obrigada por perguntar.

—Deve acrescentar um habitualmente sarcástica nessa frase, sim? — disse e se virou subitamente para a amiga com as mãos na cintura e os olhos semi-cerrados. —Era para estar feliz, hoje finalmente teremos nossa retaliação.

—Perdoe a minha falta de senso e lentidão mas, que retaliação?

—Não me diga que esqueceu! — exclamou, mas percebendo a expressão de dúvida da amiga, sentou-se ao seu lado na cama e tornou a explicar. —Estou falando de Pedro. Hoje você vai estar tão maravilhosa que ele vai enfim perceber o quão idiota foi ao te dispensar.

—Eu agradeço por ter se preocupado comigo, Lú, mas eu realmente não tenho essa pretensão.

—Não precisa ter pretensão alguma, isso vai acontecer involuntariamente

—O que você anda tramando, Pevensie?— Valentina indagou. 

—Eu? Nada. Não fique desconfiando de mim, sou sua rainha. — Lúcia respondeu fingindo irritação e gargalhando logo depois.

*

O loiro ajeitou a gola e passou as mãos nos cabelos. Ajeitou os ombros e sorriu convencido para si mesmo no espelho. A morena revirou os olhos.

—Pelo amor de Aslam, Pedro. Coloque a coroa e vamos descer. Lembre-se que a festa não é sua.- foi a vez dele revirar os olhos.

—Acalme-se, irmã. Respeitarei o momento de Valentina, apesar de quinze anos não ser grande coisa.

Passou a mão sobre a barba, a fim de ter certeza que estaria bem arrumada. Piscou para si e sorriu outra vez. Virou-se para a pequena mesa de canto, onde acima da almofada vermelha estava a coroa.

—Concordo com você.- ele arqueou uma sobrancelha para ela.

Todos sabiam como as rainhas gostavam de festas e faziam questão de que a cada vitória ou data festiva, bailes fossem providenciados. Alguns mais pomposos que outros, mas sempre deslumbrantes.

—Não me olhe desse jeito. Digo a verdade. Não me importo com os motivos das festas, desde que haja alguns para montarmos decorações e dançarmos.

—Quanta futilidade.- ela deu de ombros, sem se importar.

Pedro suspirou. Se tinha algo que o incomodava, não eram as guerras, os constantes furtos no litoral, os gigantes sempre na tentativa de ultrapassar a fronteira ou a falta de acordo com a Calormânia, mas sim a maneira como Susana lidava em certos assuntos. Era uma boa rainha, de fato. Não negava abrigo ou ajuda para quem quer que fosse, até mesmo para aqueles em quem não confiava. Entretanto, como todo ser tem suas boas qualidades a se sobressair, tem os seus defeitos. Susana, antes mesmo de parar em Nárnia, já tinha afinidades com objetos e questões de caráter supérfluos. Após o status de rainha e a facilidade para com esse meio de realezas e formalidades caprichosas, a mente girava grande parte do tempo em torno disso. Porém, sabia quando devia pôr os pés no chão.

—Quinze anos realmente não é grande coisa. Além, é claro, de que se chega a idade ideal para...

—Eu sei, Susana. Há anos você me enche a cabeça com essa ideia.- cortou, fechando os punhos, enraivecido.

—E só continuo pois a situação agora é outra e sabe bem disso.- dirigiu-se para a porta.- Não se trata mais de aparências e sim da segurança de Nárnia. Não se atrase. Deve fazer o pedido ainda hoje.- antes de fechar, aconselhou.-E Pedro?- ele a fitou.- Seja cavalheiro.

—Quando que não o sou?

—Com Vale? Raramente. Com suas cortesãs, quase diariamente.

A porta fechou-se com um baque suave. Ele relaxou as mãos e praguejou.

Susana está certa.

Há três meses os calormanos fizeram seu ultimato: caso um dos reis ou rainhas não se casassem a fim de providenciar um herdeiro, eles reclamariam o direito de soberania sobre Nárnia. Um argumento a princípio infundado, porém ao levar em conta que a própria Calormânia fora fundada por um bastardo de um dos reis de Nárnia, pôde ser considerada a validade da reinvendicação. Supostamente a própria Nárnia poderia contradizer, reclamando a Calormânia, o que fora feito. Edmundo, mestre das estratégias, cuidou do assunto diretamente. Todavia, calormanos não são conhecidos pela sua teimosia por nada. Não se intimidaram com a nova ameaça e deixaram claro que não voltariam atrás. Assim sendo, uma nova guerra iria estourar e não era de mais mortes e sangue manchando o chão que se precisava.

Os Grandes Reis e a rainha Susana decidiram acatar com a condição dos calormanos e Pedro fora escolhido como a “isca”. É claro que o loiro não ficou nada feliz, porém sabia que por ser o mais velho, seu casório teria mais peso e acalmaria as relações com a Calormânia. A escolha da noiva partira da sugestão de Edmundo: Valentina. Para Susana, deveria ser Valentina ou alguma princesa da Arquelândia. Resolveram omitir a intimação de Lúcia, mas sabiam que para ela qualquer uma serviria, exceto Valentina. E para Pedro, o mesmo que Lúcia. Ela não queria intrometer a amiga em assuntos políticos, ainda mais a deixando tão perto do irmão. Sabia que Valentina havia se magoado demais. E ele, bem, a achava nova demais. Pedro não se importava que fosse um casamento de fachada, mas queria ter alguma “diversão”. Além do mais, não ia querer procurar por isso fora da união. Apesar da grande fama de mulherengo, Pedro sempre jurou a si mesmo que quando se casasse, seria fiel. Até que a Morte os separassem. Suspirou.

Esperava que ao menos se casasse com alguém que gostasse, mas nunca encontrou essa pessoa em suas aventuras. Não que tivesse repulsa a Valentina ou coisa parecida, mas a via como uma criança. Além do mais, a relação entre os dois ficara estranha no último ano. A educação e os bons modos permaneceram, mas acabaram por se afastar. Costumavam dividir aulas juntos, como as de lutas de espada e cavalaria. Ela trocou o seu horário. Deixou de ir às caçadas e quando se encontravam a sós em um cômodo, ela se retirava rapidamente. A verdade é que Pedro ficara aliviado. Sabia que ela tinha uma paixão platônica por ele. O afastamento talvez fosse bom para superá-lo. Isto é, até Edmundo propô-la como a futura rainha.

De acordo com o moreno, Valentina seria a melhor opção pois era alguém de dentro de Nárnia e de Cair Paravel. Era confiável e uma referência para o povo narniano, ao qual era muito ligada e adorada. Apesar das boas relações com a Arquelândia e outros, um acordo afetivo poderia causar no futuro possíveis reivindicações, como a que já estava ocorrendo. Susana e Edmundo concordaram, deixando Pedro sem escolha. Valentina saberia da verdade e teria de aceitar o casamento falso, tendo se magoado ou não. Naquela noite, teriam que demonstrar naturalidade para os calormanos. E era isso que Pedro temia.

*

O salão estava simples, porém deslumbrante.

Valentina fizera questão da presença dos plebeus e que fosse agradável tanto para eles quanto para a realeza. Sobre as mesas, toalhas de linho fino cor de creme, com louças brancas e taças de cristal, porém, diferentemente dos bailes anteriores, eram apenas uma taça, um prato, um garfo e uma faca. Durante a sobremesa, fariam a troca para louças limpas, no entanto durante o jantar seria somente aquilo para se servirem. No centro das mesas, nas laterais das portas e nos corrimãos das escadas, buquês de rosas vermelhas quebravam a monotonia entediante das cores claras. As mesas não eram reservadas, cada um se sentaria onde bem quisesse. Haveria a valsa, mas logo seria substituída por uma banda da aldeia.

Susana quase caíra para trás quando soubera das mudanças. Lúcia ficara bem orgulhosa de si e Valentina apenas deu de ombros. A verdade é que ela mal participara da montagem, apenas dissera o que queria: que a festa atendesse a todas as classes, as cores vermelho e creme e que Lúcia fosse a responsável por tudo e não Susana, caso contrário, os plebeus nem sequer seriam convidados.

Os convidados já haviam chegado e tomado seus assentos. Uma trompeta soou ao fundo, a fim de avisar a chegada da aniversariante. Os Reis e Rainhas se dirigiram aos pés da escadaria, elas de um lado e eles do outro. Vale respirou fundo três vezes antes de sair. Ela decidira, por conta própria, quebrar o protocolo do traje. Aos quinze anos, a aniversariante deve se vestir de maneira elegante e modesta, com cores claras para mostrar que sabe de seus deveres. Mas Vale não queria deveres e também não queria se esconder sob panos. Era sua noite. Ela não queria se mostrar uma menina, mas sim uma mulher.

Quando saíra, houvera uma onda de ofegos e murmúrios. A própria rainha gentil quase desmaiara outra vez. Por sorte, a irmã fora rápida e a segurou antes que caísse. O vestido era vermelho, como as rosas. As mangas eram caídas, deixando os ombros à mostra e o peitoral era justo. A saia marcava a cintura e descia rodada e bufante. Os cabelos estavam soltos e encaracolados. A boca, uma fina e comprida linha vermelha.

Ao descer os degraus, percebera alguns olhares reprovadores e outros admirados, mas o que estranhou foi a presença de calormanos. Raramente eram convidados para festividades internas de Nárnia e quando sim, raramente compareciam. Quando percebera a presença de Arquelândios, presumiu que sua festa também serviria como uma reunião entre os povos para estreitar os laços. 

Chegando ao pé da escada, a orquestra já se encontrava pronta para a primeira valsa. Ela sorriu ao ver rostos amigos, mas também sorria de nervoso. Edmundo havia lhe dito que dançaria a primeira música com ela, para ficar mais à vontade. Entretanto, a verdade é que ela não entendia nada de danças e as aulas particulares não ajudaram muito. Estava tão concentrada em lembrar as dicas para não perder o passo que quando se aproximaram estendendo a mão, nem percebera quem era. Apenas reverenciou e estendeu a sua. Somente quando se posicionaram no meio do salão e fitou seu acompanhante, surpreendeu-se com o fato que esse alguém não era Edmundo.

*


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

N/A Sil: Esperamos que tenha gostado. :3



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Tempo Traiçoeiro" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.