Begin Again escrita por Nina Spim


Capítulo 5
Chapter Five


Notas iniciais do capítulo

Oi, meus amores! Obrigada pelos reviews! Por favor, continuem comentando!
Boa leitura! Beijos!



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Parte IX – Às vezes, as emoções se confrontam

Como pequenas mágoas

Algo que eu não posso explicar

(Don’t Let Go, Lea Michele)

Estou observando a minha foto que foi publicada na matéria de Noah. Um exemplar da edição dessa semana chegou para mim há dois dias, e eu já reli a reportagem mais de cinco vezes. Mas o que mais me prende é a foto. Ela me fez parecer comum, mas especial. Quer dizer, a Quinn. Ela tem mesmo um dom incrível com esse negócio de fotografia!

Não menciono o meu encontro com ela para Finn. Não porque ache realmente necessário esconder isso dele, mas porque é indiferente. Foi algo de, o quê? Dois minutos? Coincidências acontecem, ok. Não é nada de mais. Eles estavam lá, jantando. Como eu e Finn. Nada especial. Certo?

Mas me pego pensando sobre eles, juntos. Sei que parece controverso, mas esse pensamento me ocorre toda hora. Esteve presente na minha mente todo o trajeto do restaurante para casa.

A equipe da Variety é relativamente pequena, de modo que a última página é guardada para dar os créditos aos profissionais. Todos os nomes aparecem (não sei exatamente a lógica da ordem) e, ao final, existe uma foto em grupo, reunindo toda a equipe. São mais ou menos umas 40 pessoas. E Quinn está bem ao lado de Puck. Eles sorriem como se fossem um casal. A mão dele está sobre um dos ombros dela, como se fosse muito natural esse gesto.

Fecho a revista com um suspiro, bem no momento em que Finn sai do banheiro. Ele me olha e, depois, seu olhar recai na revista. Não sei decodificar muito bem o que está passando pela cabeça dele, mas eu digo:

– É uma ótima matéria – eu me defendo. Ele caminha até a cama e se acomoda ao meu lado.

– Eu sei, eu li. Deixe isso para lá, ok? – Finn sugere num tom inquieto. E daí tira a revista das minhas mãos e a joga no criado-mudo. Entendo o que ele quer fazer. Ele a jogou o mais longe possível de mim para que eu não possa pegá-la de volta, pelo menos até amanhã de manhã. – Vem cá – e me puxa para o lado dele. Eu encaixo a minha cabeça do ombro dele, sem nem perceber.

Na festa sobre o casamento, eu tinha achado que Quinn estava com Sam. Eles pareciam perfeitos juntos, ambos loiros e altos. Mas agora... E se ela estiver com o Noah? Não faço ideia se garotos do tipo “encrenca” fazem o tipo dela. E se fizer? Espera aí, eu nem ao menos sei se ela ainda gosta de garotos. Certamente não há nenhuma garota por perto. Até agora.

Finn beija o meu ombro e depois meu pescoço. Sinto as mãos dele abaixo das minhas roupas, mas eu desfaço o contato, impaciente. Ele me encara, sério.

– Estou cansada, desculpe. Amanhã tenho um dia cheio com aquele photoshoot e tudo mais – eu lhe digo, sentindo-me culpada por dentro. Mas decido que não vou demonstrar isso. Porque, se ele souber que estou me sentindo culpada, vai querer saber o motivo. E não posso dizer que não estou no clima para transar com ele porque outra pessoa está na minha mente.

– Tudo bem – ele acaba dizendo. Não sei se está falando a verdade.

{...}

Ainda estou perfeitamente maquiada. O photoshoot ocorreu como planejado e ainda são onze da manhã. Sinto-me meio estressada, apesar de não deixar isso aparentar aos outros. A equipe fotográfica é muito profissional e gentil. Estou numa cadeira afastada dos demais, tentando relaxar meus músculos tensionados.

Estou protelando ao máximo mandar algum e-mail para Quinn, embora ela já tenha aceitado a minha proposta. Sei que isso não é benéfico, afinal, quanto mais cedo fizermos o book, mais rápido nós duas seguimos em frente mais uma vez. Mas não consigo me entender neste exato momento. Sei o que preciso fazer, mas isso não é o que sinto que quero fazer.

Adiar isso só parece infantilidade, por isso respondo ao e-mail dela:

Hey,

Há um hotel-fazenda nos arredores de North Fork, uma área cheia de vinícolas, onde pode ser um local perfeito para o book. Se tiver outro espaço em mente (que seja aberto e natural), por favor, diga.

Qual é a sua disponibilidade?

Até breve,

Rachel Berry.

Sinto-me ansiosa e temerosa, ao mesmo tempo. Parece que fiz alguma coisa errada. Tipo, mentir para o Finn na noite de ontem (mas preciso me defender e dizer que seria muito anti-feminista da minha parte fazer sexo se, na verdade, eu não estava a fim de fazer). Mas e qual é a minha desculpa agora? Não tenho nenhuma. Finn pode reclamar o quanto quiser (coisa que já fez mais de uma vez) sobre Quinn nos fotografar, mas, sinceramente, a quem mais poderia recorrer? E ela é boa. Ela capta o que for com emoção. Tenho certeza de que será fichinha fazer esse book. Ela sabe tornar algo singular em algo espetacular e singelo. E é o que procuro. Não quero esses fotógrafos que trabalham com artistas e que os fazem parecer fulminantes e sexys em cada click. Quero alguém que saiba quem sou e que fotografe a minha essência.

Dispo-me do traje usado nas sessões de fotos e volto a me sentir novamente apenas Rachel Berry, uma garota qualquer. É mais fácil ser essa Rachel. Sem máscaras, sem amarras, sem sorrisos forçados. Somente eu.

Agradeço ao pessoal e pego um táxi. Poderia ter chamado o Carl, que é o meu motorista fixo, mas não quero ver ninguém conhecido. Na verdade, a única pessoa conhecida que gostaria de ver não pode ser, exatamente, encontrada. Será que é esquisito se eu perguntar o endereço dela? Provavelmente. Ela quer distância. É o que tem feito todo esse tempo.

Distância. Isso parece bom. Necessário. Mas por que sinto como se não pudesse agüentar isso?

Paro no Central Park. É uma decisão que tomo sem pensar, totalmente por impulso. Eu sonhava em morar em Nova York e vir para esse parque o tempo inteiro, no passado. É engraçado saber que, agora eu vivo aqui permanentemente, eu mal tenho tempo para fazer qualquer coisa ligada aos meus desejos próprios. Estou sempre enfiada em algum teatro, em algum prédio posando para fotos, ou indo a programas e a eventos sociais destinados a celebridades. É estranho pensar nisso. Sou uma celebridade. E, até onde sei, sou bem aceita. Não há muito que se dizer sobre mim – nada negativo, quer dizer. Sou sempre “a atriz e cantora da Broadway, que estreou em Funny Girl”. Alcançar o estrelato aconteceu de forma trabalhosa e, não faço ideia do porquê, mas... Agora parece que isso não faz mais tanto sentido. Quer dizer, foram ótimas experiências. E My Fair Lady está fazendo sucesso. Os aplausos ainda me animam e me lembram o porquê escolhi tudo isso para a minha vida. Mas, quando retorno como Rachel Berry no mundo real, tudo o que está fora dele (do mundo real, digo) parece que não faz parte de quem eu sou.

Sou música, isso é um fato.

Mas será que quero sê-la para sempre?

Não dá pra acreditar que escolhi essa vida só por causa dos aplausos e das capas de revistas... O que eu queria para mim, no passado? De verdade? Fala-se muito sobre a felicidade e eu achava que a felicidade era isso: um palco da Broadway. Eu achava que não tinha que escolher entre um amor amoroso e o amor que sentia pela Broadway. Porque a Broadway sempre esteve no topo de todas as minhas prioridades. Mas, agora, por que sinto que preciso de uma nova prioridade?

Por que sinto como se, na verdade, eu não soubesse mais o que devo sentir?

Ando pelas alamedas do parque sem reparar em muita coisa. Estou apenas vagueando por aí, sem direção ou planos.

Depois de bastante tempo, começo a ouvir apitos e gritos. A princípio, acho que é apenas mais um grupo de adolescentes sem causa. Mas, quando finalmente consigo distinguir o grupo, noto que todos estão vestidos da mesma forma: com camisetas vermelhas que exibem a frase “Abraço Grátis!”. Alguém se aproxima de mim e me pergunta se aceito um abraço. Eu sinceramente não sei o que dizer, porque nunca vi esse tipo de coisa acontecer. Mas acabo aceitando.

– Hoje é o dia mundial do abraço? – pergunto à menina que me abraçou.

Ela ri e pergunta:

– Você não gosta de ser abraçada a qualquer hora?

Isso deixa claro que o que quer que tenha mobilizado toda essa gente não tem a ver, exatamente, com a loucura.

– É um trabalho social. E vamos aparecer na Variety.

Variety. Isso acerta em mim como milhões de gelos lançados sobre mim. Rapidamente, vasculho o grupo atrás de mais informações. Procurando por ela.

Sorrio para a garota e agradeço pelo abraço. Ela meramente segue em frente, abordando outras pessoas.

– Rachel?

Viro-me em direção à voz. É claro que é Quinn. Eu sabia que poderia encontrá-la. Caramba, isso é muito estranho. Parece que o destino está querendo dizer alguma coisa.

Tenho ciência de que pareço assustada e aliviada, tudo ao mesmo tempo, quando olho para ela. Reprimo a vontade de jogar meus braços nela.

– Oi. Você organizou isso?

Quinn sorri e faz que não.

– Abrimos uma seção de “Fotos da semana” e achei que começá-la com algo inspirador seria bom. Fotografei aquela garota te abraçando. Ficou muito espontâneo.

– Mas não vai publicar essa, né? – pergunto, meio insegura. Só Deus e Quinn sabem o tipo de cara eu fiz quando fui abraçada. Vai ser uma vergonha se eu parar nessa seção por algo tão ridículo.

Quinn ri; sua risada bate em mim como ondulações suaves. Ela é tão gentil e graciosa.

– Não, se você não quiser. Tenho o suficiente para fazer uma exposição. Posso enviá-la para você, quer?

– O quê? – fico confusa. Por que não estou prestando atenção?

– A foto. Você a quer?

– Ah. Sim. Por favor.

Quinn sorri de novo.

– Bem. Preciso ir, desculpe. Tenho apenas mais meia hora. – e então ela faz algo que nunca imaginei que o faria por espontânea vontade: toca meu antebraço com gentileza enquanto ainda sorri – A gente se vê.

Fico parada, observando-a se afastar de mim. Nem mesmo uma resposta sou capaz de lhe dizer. E isso me faz parecer completamente imbecil. E deselegante.

– Quinn! – eu exclamo. Minha voz está alta. Pigarreio, contendo o meu desconforto. Ela olha para mim – Eu estava pensando... Quer tomar um café? Depois de tudo isso? – aponto para sua câmera.

Um sorriso lento se forma no rosto dela. Ela está encantada, ou algo perto disso. Sorrio para ela, mais à vontade.

– Com certeza. Posso dispensar o carro, sem problemas. Encontramo-nos aqui daqui a meia hora? É o tempo que preciso para finalizar isso. Posso descarregar as fotos no meu notebook, de qualquer maneira.

– Meia hora. Estarei aqui – eu lhe asseguro.

Parte X – Eu amo o modo como você ama

Mas eu odeio o modo que

Eu deveria te amar de volta

(Miss You Love, Silverchair)

Sinto-me desapropriada com a minha calça jeans comum e a minha camiseta que tem a porcaria de um cachorro estampado nela. Eu não faço ideia do porquê escolhi isso para sair de casa. Quer dizer, TUDO BEM. Eu apenas estava lá no Central Park fazendo o meu trabalho. Você não precisa estar fabulosa para fotografar, ou andar pelo parque. Mas, se eu soubesse que eu iria me encontrar com a Rachel – caramba, como isso foi acontecer, aliás? –, eu totalmente teria feito escolhas melhores!

Mas respiro fundo, escondendo a minha vergonha pelas minhas roupas. Estou carregando o meu equipamento comigo, porque não posso me separar dele. Rachel está com um vestido simples, azul escuro, mas consegue estar bem melhor do que eu. Estamos andando em silêncio há uns dez minutos, rumando para o Dancing Crane Cafe no Central Park Zoo. Não estamos necessariamente muito longe, mas é uma caminhada relativa.

– O que está fazendo por aqui? – tenho coragem para inquirir. Posso observar o perfil dela quase próximo ao meu, seus cabelos escuros se balançando e suas pestanas longas se batendo.

– Saí de um photoshoot. Ainda é quinta-feira, então Finn está na faculdade. Não queria ir para casa e ficar sozinha. – Rachel explica com calma.

– Ele está se graduando de novo? O Finn, digo.

– Não – ela balança a cabeça – Ele dá aula de Literatura Inglesa.

Ah. É claro. Ele é professor. Caramba. Por mais que isso soe estranho, parece que funciona muito bem para ele. E aposto como a Rachel entende o lado dele. Ela deixou muito claro naquela entrevista que eles se apóiam mutuamente.

– Oh. – eu digo. – E você fica sozinha todas as tardes? – assim que me dou conta do que acabei de perguntar, me sinto desconfortável mais uma vez. – Quero dizer... – preciso consertar o que disse, mas não sei explicar de outra maneira e deixo isso no ar, suspenso entre nós. Rachel, ao contrário do que imagino, não se sente sem jeito. Ela dá de ombros.

– Às vezes – ela afirma.

A gente se encara por uns dois segundos. Ela desvia o olhar primeiro.

Há mesas vagas do lado de fora do restaurante (o que é um milagre) e nos acomodamos em uma delas. Rachel pede um cappuccino gelado e eu, uma batida de chocolate com café. Ficamos em silêncio mais uma vez. Olhamos ao redor e nos olhamos. Diversas vezes. Até que Rachel junta as mãos no tampo da mesa e pergunta:

– Por que a fotografia? Quer dizer, o que a decidiu largar Yale?

Fico surpresa. Mas é natural que ela queira essas respostas. Não há muitas perguntas de minha parte em relação à ela, pois desde o último ano da escola eu já sabia que tudo o que está acontecendo agora realmente aconteceria. Sabia que Finn e Rachel ficariam juntos. Que cresceriam juntos. E que selariam o casamento. E é justo pensar que, daqui a algum tempo, bebês aparecerão e todos ficarão encantados com a notícia.

– Fiz a escolha errada. E segui em frente. – é impressionante o quanto esta resposta pode ser aplicada a qualquer outra situação, mas parece que foi exatamente assim que aconteceu. Direito nunca tinha sido a minha grande paixão. Tinha escolhido essa carreira devido aos meus pais. É claro que quando desisti disso e segui para a fotografia, eles meio que surtaram.

– E... Você está feliz pela escolha?

Assinto. Espero que estejamos realmente falando do meu trabalho.

– Gosto muito de fotografia. Gosto de ser aquela pessoa que presta atenção nas outras e que nunca é notada.

– Você faz um ótimo trabalho. A foto da matéria ficou incrível.

– Obrigada.

Faz-se outro silêncio. Os nossos pedidos chegam e nos ocupamos em sorver os cafés por um tempo.

– Por que aceitou se casar, Rachel? Eu quero dizer... O que faz as pessoas aceitarem algo assim? Por que isso é tão importante? – dou uma parada na bebida. Quero respostas sobre o presente. Eu realmente preciso delas.

Vejo que a peguei desprevenida. Ela me olha com curiosidade e relutância.

– Por que não se casar? – ela devolve com segurança.

Encaro-a. Não quero ter de responder a isso.

– Por que aceitou se casar? – repito.

– As pessoas se casam. A vida continua. O amor continua.

Por que aceitou se casar?

Ela fica quieta. Eu sei que estou sendo uma verdadeira vaca com ela. Não deveria nem mesmo estar aqui. Não depois do nosso passado.

Rachel abre a boca e depois a fecha. Ela parece sem palavras. Seus olhos se conectam nos meus por vários segundos.

– Eu não sei. – ela diz. – As pessoas aceitam o casamento, porque é algo socialmente natural para qualquer mulher. Você nasceu mulher e tem que se casar. Não sei se é algo importante. Não faz diferença nenhuma, se quer saber.

– Engraçado. Você, de todas as pessoas que já conheci, sempre me pareceu a que mais sabia o que estava fazendo. – comento, soltando uma risadinha amarga. Na verdade, isso me faz sentir melhor. Toda essa sinceridade. É bom poder jogar na cara dela que ela está errada e que não é a dona da verdade.

Rachel fecha a cara.

– Eu sei o que estou fazendo – ela assegura com frieza.

– Não sabe. Acabou de confessar. Entendo que você o ame, mas acho que não é por isso que está com ele.

– Quer parar com isso? – ela me encara com os olhos faiscando. – Você não está na minha mente, não sabe o que sinto e não tem o direito de afirmar o que bem entende.

Eu solto uma risada.

– Você está com medo. De quê?

– Está vendo? Você fica aí afirmando coisas que não são reais!

– São reais, sim. Você apenas não quer aceitar.

Ela balança a cabeça de novo, irritada e inconformada.

– Eu sinto muito se causei tudo isso. – eu tento manter o meu tom suave. Rachel me encara, franzindo a testa. – Sei que você escreveu naquele e-mail que não guarda mágoas, mas... Não é o que parece. Acho que ainda está muito magoada.

– Mais uma vez lá vai você achando que...

– Não estou achando. Estou vendo.

Rachel comprime os lábios, mas parece que acertei. Ela desfaz a cara de quem se sente superior. Seus olhos miram a taça de café.

– E-eu me esforcei muito para não ficar ressentida. – ela diz, muito baixo, sem me encarar. – E sobre o casamento... Estou fazendo o melhor que posso. Não sei se é o certo, mas acho que descobrirei um dia.

Espero que ela descubra isso rápido. De preferência, ainda esta semana.

{...}

Ressentimentos, tenho aos montes. E sempre por causa de mim mesma. Eles apareceram ao longo da minha vida por pura covardia. Eu sei, a gente acha que pode lidar com tudo e dá com a cara no chão. Achamos que a vida é uma linha reta. Oh, não é. A vida é mais como uma montanha russa: quando você acha que não pode ficar pior, lá vem o looping para ferrar de vez com as suas emoções.

Ainda me sinto numa montanha russa.

Entrei nela aos treze anos. Eu tinha beijado um cara. E, apesar de ficar fingindo para todo mundo que tinha sido perfeito, tinha sido apenas uma troca de salivas horrível e nojenta. Mas ainda lembro-me de Rachel toda animada com cada declaração falsa minha. Foi bem aí que tudo mudou. Ela queria tanto se adentrar naquele mundo de gente grande que percebi que, para falar a verdade, eu gostava que ela estivesse fora dele. Éramos melhores amigas e ter mentido para ela poderia ser considerado algo muito idiota a se fazer, mas eu não tinha escapatória. Ou eu inventada lembranças irreais sobre o meu primeiro beijo, ou confessava que estava minimamente interessada em beijar garotos. E a razão era ela. E aquilo pareceu loucura.

Apenas três anos depois algo realmente aconteceu. E foi o primeiro passo para uma mudança irreparável em nossas vidas. Por incrível que pareça, eu tinha entendido tudo antes. Rachel, apesar de ser muito inteligente academicamente, não poderia me superar naquilo: na arte de conhecê-la tão melhor do que ela conhecia a si mesma. Quando ela me confessou que não gostava mais de mim como amiga, eu me senti verdadeiramente aliviada. Entrei no jogo dela, e ela quis saber o porquê.

Falar a verdade se provou ser algo bom e ruim, ao mesmo tempo. Bom, porque era ótimo parar de mentir para ela. E ruim, porque eu sabia que aquilo acarretaria conseqüências. E eu não era (e ainda não sou) muito boa em lidar com elas. Por isso, quando prometi à Rachel que aquele seria o nosso segredo, sabia que terminaria mal. Por mais que, é claro, estivesse me esforçando já há a algum tempo para não ferrar com tudo.

Mas o looping vem e acaba com a gente.

{…}

Rachel diz que vai pegar um táxi e me pergunta onde moro. Sei que ela está instalada no Upper West Side, que fica bem ao lado do Central Park. Não estanho sua curiosidade, sei que apenas quer saber qual rota nós faremos. Digo que estou no SoHo. Meu bairro fica a quase meia hora de onde estamos e me sinto chateada por isso. Seguir “viagem” até lá, solitária num táxi, me deixa vagamente deprimida.

O encontro, no final, se provou benéfico. Conseguimos preencher mais algumas conversas após o nosso breve embate. Ela me contou um pouco do dinamismo da Broadway, do seu melhor amigo Jesse e do papel de Eliza. Achei que seria uma boa hora para confessar que tinha estado presente em Funny Girl. Rachel ficou surpresa. Suas sobrancelhas se elevaram e pude detectar um sorriso em seu rosto. Fiquei sem graça, porque não esperava acometer reação alguma nela. Aos poucos, o dia foi se esvaindo. Caminhamos pelas alamedas, entramos no Zoo, comemos no Sarabeth’s e voltamos a caminhar pelo parque. Pouco tempo depois, o pôr do sol apareceu. Foi bem aí que Rachel decidiu sobre o táxi.

Estamos na 5th Ave aguardando um carro. Quando conseguimos um, Rachel diz seu endereço para o taxista. Eu e ela ficamos em silêncio. O veículo se move quase que tranquilamente para a E 75 th St e, depois, segue o fluxo lento da Madison Ave.

Torço disfarçadamente nos dedos no colo. Rachel está bem ao meu lado, observando o movimento da rua através da janela. Seu perfil está sereno e adoro o modo como seu cabelo escorre pelo seu rosto e por suas costas. Sua franja está bem alinhada acima das sobrancelhas escuras e me pego pensando que ela não mudou tanto assim desde os 16 anos. Não no quesito estilo. Claro, agora ela usa umas roupas mais rebuscadas, mas fico feliz que sua aparência não tenha se distanciado da menina sonhadora que conheci na adolescência.

Ela me pega no pulo. Trocamos um olhar e me sinto como se estivesse no meu primeiro encontro, sem saber o que dizer, ou fazer. Rachel move sua mão para perto da minha e um segundo depois de me dar conta desse seu movimento, sinto-a por sobre a minha. Ela aperta meus dedos de modo suave.

– Obrigada pela tarde – ela está sorrindo de modo agradável – Se não fosse por você, eu teria ido para casa e me contentado com a TV.

Sorrio para ela, sem demonstrar o quanto estou agradecida e mexida por seu toque. Nossas peles juntas gratuitamente, sem que isso seja automático, faz acelerar o meu coração. Mas Rachel logo retira sua mão da minha; não parece, entretanto, constrangida. Parece estar lidando com isso com bastante naturalidade.

– Já esteve em North Fork? – sua pergunta me confunde. Faço que não com a cabeça, curiosa – Escolhemos essa cidade para fazer as fotos do book. É uma área bastante bucólica e praieira, recheada de vinícolas. E fica a, no máximo, duas horas daqui.

Assinto, assimilando as novas informações.

North Fork. Fotos do book. Casamento.

– O teatro quer compensar o público de Mary Poppins no próximo fim de semana, de modo que não haverá apresentações de My Fair Lady. – Rachel continuou.

– Uma folga, então? – comento sorrindo – Merecido, certo?

Rachel sorri também.

– Tudo bem para você? Se já tiver planos...

– Não. Não tenho nada marcado. – me apresso a dizer. Ela sorri aliviada.

O carro, finalmente, entra na E 85 th St, que se transforma na W 86 th St. O trajeto dura uns cinco minutos. Não voltamos a nos pronunciar. O silêncio não é pressuroso, e ele me dá chances de avaliar novamente o rosto de Rachel quando ela não está olhando para mim. Olhá-la assim, desse modo furtivo, quase me faz crer que retrocedemos para a escola. Eu a observava do mesmo modo quando adolescente: desejando e desejando que algo aconteça. Quando reconheço a Columbus Ave, suspiro. Lá se foi o meu tempo para apreciá-la.

Agora, ela volta para o noivo. E eu, volto para um apartamento quase inabitado. Provavelmente, ela fará amor com Finn e vai se convencer de que esta tarde foi ridícula. Que passar um tempo com a ex-amiga/ex-namorada é algo que só os fracassados fazem. E nem posso dizer que ela não esteja certa. A grande motivação da vida é que ela nos impulsiona para algo novo. E é totalmente a nossa culpa se ficamos querendo resgatar lembranças que já ocorreram. Não se cria nada a partir de algo velho. É inútil.

O táxi para na frente de uma casa germinada. É luxuosa como todas as outras residências do bairro.

Eu digo que não precisa se preocupar com o pagamento, porque vou seguir viagem. Rachel fica sem graça, mas aceita.

– Obrigada. Boa noite – ela fala. Fica parada, me olhando com o sorriso plantado no rosto. Eu sei, ela está pensando: abraço-a, ou não?

– Boa noite – desejo a ela.

Fico esperando por algo, como sempre. Mas ela acaba optando por me dar as costas e sair do carro como se não precisasse provar nada a ninguém. Como se ela precisasse.

A porta bate, e eu suspiro.

Penso em North Fork.

Eu, ela e Finn. Sozinhos numa cidade desconhecida.

O desejo me arrebata, implorando para que algo aconteça. Por favor, que aconteça.


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Notas finais do capítulo

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