Além das Dunas Brancas escrita por Shalashaska


Capítulo 10
O Pêndulo e a Agulha


Notas iniciais do capítulo

Oi, galera!!
Venho mais cedo do que pensei para postar este novo capítulo e faço isso para aproveitar a oportunidade de usar a internet do meu trabalho haiehaie Senão eu iria quebrar minha promessa DE NOVO!
Estou orgulhosa desse capítulo, pois ele tem momentos que eu planejei escrever e outros que surgiram espontaneamente, então é um mix de sabores agradáveis e surpreendentes ~~ ao menos para mim hahaha Sempre bate um nervosismo antes de postar, já que sou meio desesperada de nascença e tenho receio de decepcioná-los, mas acho que gostarão deste daqui. Finalmente está chegando o momento que estou esperando há muito tempo para escrever *-* Mal me contenho!!
Ahhh, tem algo que só percebi nesses dias: caí no clichê do trio formado por dois caras e uma garota XD Gente, foi muito sem querer!
Enfim, eu agradeço muito por vocês acompanharem minha história! Fico muito feliz com os comentários que recebo e posso afirmar com toda a certeza: Vocês são os melhores leitores do mundo! ~~~ Vocês t-o-d-o-s, ok? ~~



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– Alethia, - Timidamente Kadar chamou-a pelo nome, ainda sentindo-se estranho por conversar com alguém que não enxergava; com alguém que possuía inimagináveis poderes em suas fibras. Sua razão insistia dizer que era um tolo por falar ao vento, mas aquela curiosa onda de vapor guardava lendas que ele necessitava ouvir. - ...É verdade que sereias existem?

Lá do alto, de uma translúcida nuvem roxa, choveu uma risada fresca cujo o toque ameno renovou as energias dos dois viajantes. Ambos caminhavam na areia de prata pela Lua crescente, pois já era noite e a gênia iniciara seu plano para ajudá-los, embora eles precisassem contribuir para que tudo desse certo. Relutantemente andavam, um passo atrás do outro no solo que queria devorá-los, assim como fizera com tantos homens perdidos no deserto. Puxavam Safir pelas mesmas rédeas com quais Raed ameaçara açoitar sua serva, e por ordens da mesma não mataram o animal. Dizia ela que os amaldiçoaria por gerações caso tirassem uma única gota de sangue do cavalo, no entanto o ladrão não viu grandes consequências nisto, pois segundo suas previsões, morreriam cedo demais para que gerações viessem deles.

– Faz perguntas interessantes, Kadar. – Ele a ouviu dizer e virou o rosto para que seu amigo não visse o ligeiro rubor em sua face, embora já estivesse escuro. Não estava acostumado a receber elogios. – Raed nunca indagou algo do tipo em todos esses anos que o acompanho.

A cabeça dele pendeu para baixo, de imediato exausto enquanto seu amigo tentava não abrir um pequeno sorriso.

– Olha, - Ele encheu o peito de ar, controlando o correr do sangue quente em suas veias. – Já não é a primeira vez que me fazem de tonto, só nesta noite. Apenas responda a maldita pergunta e parem os dois de me amolar.

Um vento nada natural bateu forte no corpo dele, embaralhando suas vestes e tampando a sua cara com o tecido pesado que trajava. Raed praguejou todos os xingamentos que conhecera em suas andanças durante onze anos e mirou furiosamente o céu.

“Se um dia ela tomar forma, a primeira coisa que farei é dar-lhe uma boa lição.” Pensou secamente, apertando a tira de couro em suas mãos. A verdade era que jamais levantara um dedo para ferir uma mulher e a mera imagem de erguer o braço para isso fazia seus ombros formigarem de nervoso.

Não era mercador, assassino e muito menos um covarde... embora a imaginação fosse mais forte de vez em quando. Ele se censurou mais uma vez e voltou ao silêncio.

– Enfim, - Ambos ignoraram o ladrão. – Sereias de fato existem, embora estejamos muito longe delas agora.

Kadar soltou uma exclamação suave de surpresa, um suspiro maravilhado enquanto pensava ouvir o som do mar junto ao canto das criaturas metade peixe, metade humanas. Escutara tantas histórias quando mais novo e guardou-as em um canto especial no coração, a fim de manter acesas as memórias de infância que lhe resgatavam da realidade.

– Lembra-se da lenda que te contei quando éramos crianças?

– Lembro. – Raed respondeu sem retribuir o tom entusiasmado dele, na verdade agradecendo mentalmente por estar escuro o bastante para que seu amigo não visse sua garganta engolir seco. Imagens da Queda de Sundara lhe inundaram os olhos, recordações da concha que jamais vira e do que aconteceu depois.

O aprendiz confundiu isso com puro aborrecimento e então desviou sua atenção de volta para a nuvem fantasmagórica que os acompanhava.

– E como elas são?

– Bem, - Outra brisa soprou, conduzindo sua voz. - Eu nunca tive que descrevê-las para alguém antes... Eu diria que elas são muito mais do que os mortais sabem. Sem querer ofendê-lo.

– Não pode me dizer muito por causa do tal Código que me explicou?

Alethia resumira as regras de conduta de sua raça à alguns pontos mais relevantes ao humano, como a razão de não poder conceder os desejos mais fantasiosos de seu amo quando ele bem entendesse. Se era sua companhia e jurava lealdade, a gênia tinha o dever de auxiliá-lo a alcançar os seus desejos, não fazê-lo por Raed. Indiretamente, a névoa roxa também realizava um ligeiro devaneio seu de conhecer melhor os mortais, pois anos e anos dentro de uma garrafa somente materializando sonhos fúteis lhe deixava deprimida e irritada.

A experiência nova possuía suas desvantagens, mas não era tediosa.

– Sim, em parte. – Ela afirmou, querendo evitar a questão de como conhecera as sereias. Era uma mancha escura e dolorida de sua existência e, embora tornando-se mais e mais distante, jamais apagava-se.

A gênia recordava-se vividamente como sentira-se ao ter sua garrafa lançada ao mar.

– Nossa... Há tanto que desconhecemos. Eu daria minha língua para poder ouvir tudo o que sabe, Alethia.

“Por favor, faça isso. Corte sua língua fora e pare de falar” Pensou Raed, farto pela longa conversa metafísica de ambos.

Enquanto o ladrão forçava suas coxas a moverem-se para frente, reclamando e bufando durante todo o processo, Alethia sentiu-se tentada a violar as leis de seu excêntrico povo. Há tempos não conversava assim com um terceiro e admirava-se a cada pergunta de mortal, o qual colecionava com carinho fragmentos de fábulas e lendas; crônicas dos viajantes que a Corcova Azul sempre encontrava.
Ele sabia que o mundo era um lugar absurdamente vasto e recheado de diversas possibilidades e caminhos, vira isso com seus próprios olhos no Porto Oeste de Sundara. Suas asas apontavam para os céus, mas suas raízes sempre o mantiveram fincado ao chão.
Agora estava livre. Livre e perdido num mar de oportunidades, vivendo sua própria lenda.

Alethia considerava a curiosidade de Kadar um verdadeiro encanto.

Contudo, seu último comentário antes da magia acontecer foi um murmúrio melancólico:

– Não vale a pena. – Mais um sopro, agora trêmulo e frio, levou o sussurro que era a sua voz, refutando a oferta macabra de Kadar. – Não vale a pena...

Raed franziu as sobrancelhas e sentiu um breve arrepio nos ombros. Não gostara do tom usado por ela. Inclinou sua cabeça para cima, direcionando seus olhos cinzentos ao céu, no entanto não achou maiores indícios de que havia algo errado.

Após um período de silêncio, os dois viajantes sentiram seus tímpanos vibrarem devagar, gradualmente aumentando o étereo zumbido que se espalhava pelo ambiente. As moléculas do ar rasgavam-se com o som de estrelas estilhaçando-se no manto da noite e o próprio ar ondulava, iluminando-se com um cálido brilho cobalto.
Safir relinchou e juntou todo o restante de suas forças para escapar, impulsionando seu pescoço para longe das mãos de Raed e Kadar. Os dois o perderam por um breve momento, pois também estavam chocados e com medo, mas a mão direita do ladrão agarrou com firmeza e rapidez as rédeas de couro. Haviam passado por muito para que um cavalo velho e medroso colocasse tudo a perder. Com as veias bombeando adrenalina e a postura controlada, Raed deu mais um passo na areia. Ignorou a dor, ignorou a covardia e respirou daquela atmosfera instável, a qual oscilava entre variados tons azuis e elétricos de relâmpagos.

O caminho está aberto. – Os dois mal conseguiram compreender a voz acompanhada de ecos da gênia, devido a cacofonia dos rasgos da realidade. Com a energia concentrada em suas mãos, a benção de seu amo e o momento propício dos astros, ela foi capaz de encontrar pontos do espaço terreno e desmembrá-los com a força de seus braços imateriais. – Andem. O destino os aguarda.

Os dois irmãos se encararam e sob um silencioso acordo, caminharam por entre o onírico véu de luzes e sons.

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Aziz, idosa e cansada, dormia profundamente no final da tarde. A loja fora fechada mais cedo e os poucos clientes que vieram pela manhã não a incomodaram além dos pedidos usuais e completamente desinteressantes, em contraste às novas questões que seus itens recém adquiridos lhe permitiam buscar. Ainda recuperava-se daquele susto, da visão de Farah e da estranha voz lhes dizendo claramente o nome do sujeito.

Raed.

O que aquele pobre diabo estaria aprontando? Ela reconhecera também aquele sorriso arrogante, o sorriso de lua que exibia um desdém incomum. Por que a Jade Negra lhe deixara ouvir a voz o chamando? Quem o procurava afinal?
Aziz não sabia de uma única informação e não havia pressa em descobrir, de modo que permitira-se reaver suas energias. Descobriria tudo com o tempo, e o tempo caminha num ritmo constante como ela bem sente pesar no seus braços trêmulos.

No centro da loja, onde ela e sua aprendiz realizaram o ritual de adivinhação com desfecho inesperado, Farah colocara uma pequena mesa de madeira escura. Não fazia nada muito complexo ou trabalhoso, pois queria desvendar certos mistérios sozinha e escolhera um momento oportuno para praticar sem a supervisão atenta e severa da velha.
Farah a amava como uma filha amorosa é devota à mãe, pois a mentora mostrara sua fascinante força interior e lhe apresentara à poderes ancestrais que ela jamais conheceria se continuasse só e desamparada como estava. A jovem aprendia o máximo que podia a cada novo amanhecer, embebia-se de livros e mais livros até seus olhos arderem nas órbitas e praticava sempre que podia, na tentativa de se tornar resistente e capaz. Por mais que soubesse que tinha muito mais o que estudar e a sentir com sua aura, Farah não se considerava tão fraca e tola quanto Aziz lhe fazia questão de demonstrar. O potencial dela era largo e profundo, fácil de se aperfeiçoar e desenvolver.

Farah crescia muito mais do que os olhos embaçados de Aziz viam e aquilo era um desperdício amargo, senão um perigo.

Silenciosa e cheia de cuidados, a jovem puxou a a única cadeira da frente da mesa e sentou-se, ajeitando seus cabelos negros para ficar o mais confortável possível e deixar sua visão mais clara. Seus pés descalços apoiaram-se de forma delicada na pequena viga do móvel e suas mãos retiraram da bolsa escura uma pedra lapidada, feita de curioso degradê bordô que intensificava-se como vinho na ponta aguda; uma gota geométrica de sangue. Uma corrente de prata, do comprimento de seu cotovelo até pulso, fazia deste estranho pingente um místico pêndulo, um instrumento usado para diversos fins, dentre eles a divinação.
Em cima da madeira havia um mapa desenhado pela própria aprendiz, também em segredo de sua mestra, embora por motivos mais inocentes: no seu livro pessoal, onde anotava suas experiências, inspirações e truques, gostava também de desenhar suas visões e copiar mapas antigos, e o destino se encarregara de fazer com que ela também possuísse o caminho até as Ruínas das Dunas Brancas, a metade do percurso de uma viagem infestada de enigmas e ameaças. A moça tinha consciência de que aquilo só poderia ser mensagem do Universo, de seres que ela não via, ouvia ou sentia com seu corpo físico, sentia apenas com sua intuição. Com o centro de sua testa formigando, fato que acontecia quando seu terceiro olho insistia em despertar, ela passou os dedos cerimoniosamente pelo pêndulo e o levantou com cuidado, segurando a ponta da corrente com o indicador e o polegar.

Não estava mais nervosa, nem poderia ficar. Meditara suas dúvidas durante horas e estava certa do que fazer, pois somente neutra e decidida assim seria capaz de tirar respostas claras. Respirou fundo e concentrou-se no fluxo colorido de energias que a cercavam, misturando-se e ramificando-se num oceano furta-cor no cômodo.

Farah permitira que o artefato a conduzisse, que o instrumento carregasse sem impedimentos sua intuição para onde ela devesse ir. Sabia que as respostas seriam mais seguras se apenas perguntasse questões de sim ou não, no entanto a situação era misteriosa demais e apresentar perguntas ás cegas era difícil e infrutífero.

O pêndulo parado acima do mapa começou a dançar.

Não era a primeira vez que a aprendiz fazia isso, mas as respostas geralmente vinham aos poucos, em curtas visões de iluminação. Enxergou areia diversas vezes e uma estranha nuvem cor de lavanda. A ponteira então deslizou sobre o ar e vibrou de forma violenta ao apontar ao Sul, na última marcação do mapa: as Ruínas.

Em seguida, a corrente de prata esticou-se como se a pedra rubra fosse um imã atraído a outro e por mais que Farah, agora confusa e temerosa, puxasse de volta, o pêndulo não obedeceu. Ela amaldiçoou-se por todas as razões possíveis e em pânico fazia força para tirar o instrumento de cima do mapa, mas o único fato que alterou-se foi a ponteira, que brilhou incandescente soltando fumaça.

O grito aflito da moça cortou o ar junto ao som do estouro da pedra, e ela sentiu sua pele ser queimada e perfurada por inúmeros fragmentos cor de sangue.

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Alethia avisara que seria desgastante, mas o ladrão não estava preparado para sentir seu espírito ser arrancado do corpo a cada passo que dava na areia, como se sua respiração o esvaísse por dentro. Se seu interior era diferente segundo a gênia, agora estava vazio.

Não acompanhou bem o que acontecera durante o percurso e ele só lembrava-se de breves imagens; de andar ao lado de Kadar, puxando o cavalo. Viu a claridade do largo túnel feito luzes azuis e raios verdes e recordava-se do som ensurdecedor que aquela magia tinha. Após toda a exaustão e a sensação de não existir, Raed percebeu que estava deitado no solo, próximo a outro corpo que deveria ser Kadar.

Seus olhos pesaram e ele não foi capaz de deixar sua cabeça levantada. Tombou novamente na areia, mirando grandes pedras amontoadas, erodidas pelo tempo e pelo vento. Sua última visão foram as Ruínas.

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Em meio a sonhos estranhos e o som de algo estilhaçando-se junto a um grito, o ladrão sentiu seu corpo sacudir. Sua mente estava distante e ele não queria acordar. Inspirava e expirava num ritmo lento, absorvendo bem a fragância seca e cruel do deserto, mesmo que sua cabeça estivesse a quilometros e anos de distância.

– Ei. – Kadar preocupou-se, pois fazia ao menos dez minutos que tentava despertar seu amigo e este não apresentara maiores reações além de franzir a testa e murmurar palavras ininteligíveis. O arrastou até as pedras para fugir do Sol e encostou suas costas para que ficasse sentado.

O ex-comerciante estava melhor, embora meio zonzo e com a cabeça latejando, e pensou que seu irmão recobraria a consciência logo, o que não acontecera até então. Ondas de angústia se debatiam por suas veias, mas ele lutava para manter a calma.

– Ei! – Sacudiu mais o ombro do outro, tentado a pegar o cantil e jogar água nele. Porém, se fizesse isto o feitiço seria quebrado e não teriam mais a comodidade da água infinita.

Felizmente, Raed abriu os olhos e murmurou:

– Me deixa.

Kadar afastou-se rindo e levantou seu próprio corpo cambaleante a fim de observar o horizonte. Ainda era uma paisagem pincelada de douradas corcovas de areia, a maioria baixa, e somente alguns pontos planos e nenhum oásis visível. Exceto a construção antiga e desmantelada, não havia grandes novidades no cenário e se não fosse por estas curiosas ruínas, acharia que não avançaram muito na viagem.
Alguns minutos correram com o vento, cujo o sopro era incessante ali, e ele esperou que o ladrão ficasse de pé para lhe adiantar algumas informações.

Também trôpego, Raed se aproximou.

– Onde está Alethia?

– Dentro da garrafa. – Ele indicou pacientemente o amontoado das bolsas que fizera, todas murchas e quase ocas. Sobre elas repousava o frasco púrpura, com seus arabescos de ouro pulsando um brilho quente. – Disse que precisava descansar.

– Ah! – O caçador de recompensas abriu um sorriso torto e falava com o tom utilizado por adultos quando conversam com crianças e cachorros. – Ela precisa descansar? Coitada!

Kadar não quis rir, mesmo achando graça. Soltou um suspiro e forçou sua atenção para a seriedade que o momento carecia:

– Resumindo, temos comida para apenas duas refeições miseráveis e estamos no meio do nada.

– Hum. – Raed deu de ombros, sem se surpreender ou simpatizar minimamente com o desânimo de seu amigo. – Certo. Cadê o cavalo velho?

Seu amigo hesitou antes de responder.

– Não vi e não andei muito para procurá-lo. Ele mirou as ruínas e sentiu um arrepio funesto lhe atravessar a espinha, igual a todas as vezes que chegara mais perto de seus blocos desconjuntados e colunas destruídas ou pela metade. “Algo não está certo” refletia ele, notando que sua atenção e energia eram sugadas pelo local. Não se atrevera a explorar muito enquanto estivesse sozinho, e nem estava desperto a tanto tempo assim.Usando um tom indignado e temeroso, indagou: – Que lugar é este?

O senhor da gênia não teve vez para responder, pois um som alto rasgou a atmosfera e obrigou os dois viajantes recuarem despreparados: um relincho forte e altivo.

Por detrás das pedras corroídas e galopando em pleno donaire, um cavalo surgiu com músculos fortes e pelo negro brilhante. Sua bela crina balançava com o movimento cheio de nobreza e entusiasmo, aproximando-se sem medo algum dos homens. Encostou de forma alegre o focinho em Raed, como se pedisse um afago, e só parou com a insistência quando este começou a coçar suas orelhas e passar a mão pela sua longa face.

Confuso, Raed notou que conhecia aqueles olhos castanhos, que refletiam força e dignidade.

A boca do ladrão se abriu numa exclamação muda, logo virando seu rosto para encarar o amigo, o qual também exibia uma expressão de choque e incompreensão. O que acontecera com o cavalo velho?

– Fechem os lábios, rapazes. – A voz de Alethia encantou a atmosfera com a sinfonia do deboche. – Senão suas gargantas encherão de areia.

Assim que o assombro passou, o amo foi o primeiro a se manifestar:

– Por que não fez isso antes? – Ele gritou, percebendo quantos conflitos teria evitado se sua gênia tivesse rejuvenescido o animal logo na cidadela, evitando problemas com comida e a Corcova Azul. Não teria encontrado Kadar, porém deste modo não teria o arrastado à esta aventura sem futuro.

– Porque eu não tenho domínio sobre o tempo. – A afirmação foi dita em puro descaso. – Isso foi apenas um efeito colateral aleatório e bem conveniente.

– Espera. – Interviu Kadar, antes que seu irmão explodisse em mais acusações e Alethia desse outras respostas ácidas. Entretanto, isso não quer dizer que estava menos chocado do que Raed. – Aleatório? Quer dizer que isso poderia ter acontecido com qualquer um de nós? Poderíamos ter virado bebês ou adolescentes?

Ela rolou os olhos dentro da garrafa. Estava cansada demais para ser paciente e sabia que aquilo seria complicado de explicar, principalmente se as consequências do transporte fossem tão ruins quanto supôs. Felizmente nada grave acontecera.

– O que eu fiz é chamado de Agulha ou Salto, como preferir. Vocês já devem ter ouvido isso em algum lugar, e confesso que é uma comparação bem apropriada, que a realidade é um véu, um tecido onde os fios que o compõem são o tempo e o espaço. – Eles assentiram, esperando por mais e ela continuou de forma mais branda. - Esses fios são tão entremeados que é difícil passar por um sem relar no outro, portanto precisamos de uma agulha para fazer o trabalho. Certo?

Os dois piscaram, sem entender grande coisa. A tampa do frasco então suspirou e se abriu para um filete de névoa púrpura passar, igual uma fita, que em seguida enrolou-se por alguns segundos sobre a aura de Safir.

Ele era a agulha. – A fumaça pairou acima da própria garrafa, querendo voltar ao sono. – Ele atraiu toda a alteração do tempo e nós atravessamos o espaço ilesos.

Kadar concordou fascinado, devaneando sobre mil e uma possibilidades, mas a única reação de Raed foi questionar ainda mais:

– Então por que foi um “efeito colateral aleatório e bem conveniente”?

Ela voltou depressa para a seu diminuto lar. Não se preparou para esta pergunta completamente apropriada e cheia de razão, pois esperava que ambos estivesse ainda tontos o bastante para aceitarem um esclarecimento qualquer.

– Bem... – Murmurou sem o tom cáustico que tanto usara. – Confesso que não é um método muito seguro.

O vento levou as pragas e xingamentos de Raed à quilômetros de sua boca.


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Notas finais do capítulo

~~ quando escrevi “Salto ou Agulha” eu imaginei um salto agulha e me achei idiota haiahia~~
Finalmente as Ruínas!! Sem mais enrolação!
Gostaram? Espero que sim! Se algo estiver muito confuso, me avisem para eu explicar melhor no próximo capítulo. Ah, também me alertem caso haja algum erro de gramática ou algo assim. Beijos beijos e até a próxima!



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