DEZ ANOS DEPOIS

Estranho dizer que quando a verdade está diante de nossos olhos é quando demoramos mais para compreendê-la. Foi o que aconteceu com Neo e as notas enigmáticas do Oraculo.

Não que semanas depois ele já não soubesse sobre o que era a profecia. Muito pelo contrário. Porém, aceitar a verdade, quando ela se apresenta nua e crua e não é nada parecida com o que acreditávamos, é muito perturbador. Neo sentiu que se traíra totalmente acreditando em suas próprias mentiras.

De qualquer forma, sua Luna sempre soube que a recompensa por um ato bom nunca chega no mesmo instante. E que talvez, a única recompensa que busquemos seja a consciência plena de que fizemos o possível e não o reconhecimento alheio. Lily aprendeu a lição também.

O ruim é pensar que quando fazemos algo negativo, as consequências chegam mais rápido. Talvez seja porque o mundo esteja saturado de negatividade e precise acreditar que há coisas belas no mundo que eles nem percebem. Acreditam no mal, então o mundo se torna mal.

Como Voldemort.

Lily virou moça e se casou com Tiago. Estava grávida de um garotinho chamado Harry. Inevitavelmente sua irmã Luna não compareceu ao casamento.

Neo e Trinity compreenderam que sua filha, fruto de seu amor, era uma peça importante contra o antivírus e não devia habitar Zion. Devia habitar Matrix. Pouco depois, enquanto Neo e The Kid trabalharam na melhora de Hogwarts, também trabalharam em um procedimento que chamaram de Inserção.

Uma moradora de Zion ganhou conectores e viveria para sempre em Matrix. Luna esqueceu o passado e a realidade verdadeira. Luna foi viver sua escolha.

Para isso, no entanto, foi congelada e pouco a pouco preparada para viver na ilusão. Ela própria escolheu seu pai em Matrix e sua história.

Teria um sobrenome agora e se chamaria Luna Lovegood. Ninguém em Zion possuía sobrenome.

Luna estava em uma câmara especial em Zion. Seus pais gostavam de ficar ao lado de sua capsula de congelamento fazendo preces e contando histórias. Ela estava presa à infância de onze anos e só cresceria em Hogwarts.

Sua irmã, mais tarde, fez a mesma escolha. Mas Lily não iria para Hogwarts. Lily mandaria seu primogênito Harry como o percursor do combate contra Voldemort. Como sua irmã Luna, ela estava disposta a fazer o sacrifício. Como seu pai Neo e sua mãe Trinity também.

A história de Hogwarts começaria quando o bebê Harry nascesse de Lily e Tiago hologramas na atualização.

A atualização Hogwarts foi melhorada para dar suporte aos novos heróis contra Voldemort. Na verdade, agora, quem morresse em sua luta contra ele, seriam os que escolheram a vida em Zion porque já tinham terminado sua missão em Matrix. Crianças, adultos e velhos acordariam em Zion por se opor ao antivírus.

Neo decidiu que era hora de deixar viver e não aprisionar. Não escolher pelos outros. Pode ser que a vida em Matrix se alongasse por dez mil anos e nem nesse período todas as pessoas acordassem. Neo estaria morto. Mas ele sabia, também, que sempre existiriam pessoas lutando pelas outras – pelas suas escolhas e pela sua liberdade de crença (fosse em Zion e fosse em Matrix).

Fosse como fosse, ele jazeria em paz quando chegasse a hora de sua morte.

***

A câmara tinha paredes de terra como numa caverna. Havia fios ligados a uma capsula que guardava uma menina brilhando no centro, única fonte de luz. Ela dormia serenamente. Tinha cabelos loiros e compridos.

Para todos os lados podiam-se reconhecer botões, algumas aparelhagens parecidas com a de um hospital em Matrix que verificava a vida em uma pessoa internada. Luna tinha um buraco em sua nuca.

Uma Lily mais velha de cabelos acaju e olhos verdes carregava um bebê recém-nascido. Harry possuía seus olhos verdes. Ela sentou em uma cadeira ao lado da capsula.

Mais além havia outra capsula bem menor do que Luna repousava – do tamanho exato do bebê Harry. Lily deu um suspiro quando a avistou e uma lágrima solitária deslizou por seu rosto.

– Ele vai com você, Luna. – sussurrou Lily. – Cuida bem dele. Ele vai antes.

O bebe se mexeu e Lily soube.

Os maiores sacrifícios que podemos fazer por aqueles que amamos é apoiar sua escolhas e sofrer no lugar deles.