Anjo da Água escrita por Chris Lima


Capítulo 11
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Então, pessoal, eu para compactar o tamanho da fic, eu juntei os capítulos pequenos em um só, então esse capítulo era os antigos Cap. 12 e 13



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Os olhos da garota imediatamente se arregalaram ao ouvir a ordem do damaso da água.  Timidamente, ela tentou reverter àquela ideia, suas palavras foram selecionadas cuidadosamente.  No entanto, apesar de pensar muito antes de falar, elas saíram de uma forma totalmente diferente das que foram planejadas. 

— Eu não quero fazer isso – Sachiel falou. 

— Ela não precisa fazer isso, Mosheh – contestou Melchior – hoje foi seu primeiro dia, com certeza não conseguirá fazer nada! 

— É por isso que eu quero que ela faça, os damasos devem ser capazes de realizar o impossível! – Mosheh segurou a taça com mais força a ponto de trincá-la. 

— Mas ela ainda não é uma, tecnicamente! A garota ainda está sendo treinada e por questões de status, ela é apenas uma prodígio – Melchior parecia irado, lamentava por não ser o tutor de Sachiel, pois Mosheh parecia não entender muito bem a linha tênue entre a dedicação e o extremismo – Eu não permitirei isso. 

Melchior se posicionou a frente de Sachiel, com certeza ele não sairia de lá até Mosheh desistir daquela ideia insana. Ele se perguntou se estava fazendo o certo. Caberia a ele interferir na forma como Mosheh ensinava a garota? 

O olhar na menina era de desespero, ela pedia ajuda. 

Isso era o certo a se fazer sim! 

Ele continuou ali. 

— Vamos, Melchior, saia do meu caminho, você não é o tutor de nenhum dos dois, eu sei a forma de como devo ensinar os dois. Eles são meus

— Nenhum dos dois é sua propriedade. E você só os levará por cima de meu cadáver. Não vê que ela se machucará muito? 

— É obvio que eu não permitirei isso! 

— Como? – ele o olhou indignado – por acaso você dará vantagens a um dos dois? Irá proteger Sachiel dos golpes de Douglas? Isso não será um duelo, então! 

— Quando um dos dois estiver visivelmente perdendo, eu interromperei. 

— Você está levando a menina apenas para sofrer! 

— Pois bem, serei mais benéfico, será um duelo de duplas. Quem quer formar par com o Douglas? – Sugeriu Mosheh. 

Quase todos os prodígios se ofereceram e por isso Mosheh chamou Yvese para fazer dupla com Douglas, pois eram um dos que mais se destacava durante os treinamento. 

Aquele momento era singular para os prodígios, pois era a primeira vez que iriam participar de um confronto desse tipo supervisionado pelos damasos. A única experiência que possuíam era a de lutas que eles mesmos combinavam, mas sem terem acesso ao local de treinamento, pois faziam às escondidas. 

Por conta disso, embora temerosos, os dois garotos estavam entusiasmados, seus olhos brilhavam de tanta fascinação e o sorriso era evidente nas suas faces. 

Essa felicidade, no entanto, não contagiou Sachiel. Suas mãos tremiam e sua expressão facial estava tensa. Milhares de imagens passavam em sua mente, mas nenhuma nítida o suficiente para lhe dizer o que fazer nesse momento. Seus devaneios foram interrompidos apenas pela voz estrondosa de Melchior. 

— E quem fará dupla com a garota? 

Ninguém se manifestou, pois lutar ao lado da garota serviria apenas para serem ridicularizados entre seus outros amigos. Alec, no entanto, estava distraído, perdido em sua imaginação. Por conta disso, Melchior o escolheu para compor a dupla.  

— Maldição! – Falou o garoto. 

— O que disse, rapaz? – O damaso do fogo o fitou, arqueando uma de suas sobrancelhas. 

— Nada, meu senhor. 

— Estão todos prontos? Vamos ao espaço de treinamento – falou o damaso da água. 

Alec andou o caminho ao lado de Sachiel, mas nada disse. Ele parecia bastante bravo, seus punhos estavam fechados, sua mandíbula contraída e seu rosto estava corado. Em sua mente, ele a maldizia de todos os nomes possíveis, pensava em diversas blasfêmias e se maldizia por nunca ter se vingado da garota. Por que ele sempre foi tão fraco? Sempre incapaz de ser iguais a seus companheiros? Se fosse qualquer outro, eles iriam contestar até escolherem outros. 

Mas ele era covarde, essa é a verdade. 

— Se você estragar tudo, eu não terei mais pena de você. 

— Você já me ameaçou uma vez – ela falou. 

Sachiel olhou para Alec, ele contraia seus olhos verdes e possuía uma expressão extremamente ofensiva. Ela pouco se importou para o que ele achava ou pensava. Na verdade, tudo aquilo pouco lhe importava, pois ela odiava aqueles garotos, odiava aqueles homens, odiava aquelas paredes, portas, tetos, móveis, odiava tudo que relacionava aquela sua nova vida.  

Alec, Yves e Douglas se colocaram em posição de combate, mas Sachiel não fez o mesmo. Ela parou no canto esquerdo da área de treinamentos e não deu mais nenhum passo. Ficou completamente imóvel e alheia àquela situação.  

— Sachiel! – Berrou Mosheh. Sua voz estava agressiva e seu berro foi alto o suficiente para atormentar os ouvidos de todos os garotos daquela sala, inclusive o da garota, mas ela continuou ali, inatingível. 

O damaso estava impaciente, pois ela estava novamente o desobedecendo. E vale ressaltar que se era algo que ele não admitia era insubordinação, principalmente de uma garota. Por conta daquela atitude petulante, ele andou em direção à garota, seus passos eram pesados e ecoavam na sala, ele estava incontrolável e pensava apenas em castigar a garota. Nem mesmo Melchior conseguiu o impedir. 

Assim que ele chegou a uma distância suficiente, o dorso de sua mão atingiu o rosto de Sachiel com foça suficiente para ela cair, mas mesmo assim ela continuou parada, caída naquele chão frio, sem esboçar nenhuma reação. Sua face rapidamente ficou ruborizada por conta do tapa. 

Mosheh olhou novamente para a garota e puxou-a pelos cabelos. Embora contra sua vontade, ela foi obrigada a ir, pois aquele homem certamente não iria ceder. A dor dos puxões em sua cabeça palpitava a cada movimento que o homem fazia propositalmente. Hora ele pressionava o couro cabeludo da menina e hora estendia em um ritmo doloroso e torturante para a garota.  

Os olhos da menina lacrimejavam, ela sentia medo daquele homem. Depois que ele acordou, já lhe bateu duas vezes em menos de um dia e certamente aquilo iria se repetir novamente. O que fazer? 

Então ela se prostrou ao lado de Alec, imediatamente ele ficou em posição de combate de frente a Yves e Douglas. Os olhos dos oponentes de Sachiel exprimiam confiança, desafio e vitória. Eles queriam provar para si mesmos que eram melhores e poderiam acabar aquilo em segundos – e provavelmente conseguiriam. 

— A primeira equipe que tiver um oponente caído perderá! 

O primeiro movimento foi de Douglas. Ele usou a água do riacho para seu primeiro ataque, entretanto, Alec tratou de conceder mais energia àquele elemento, a fim de que ela evaporasse. Paralelamente a isso, Yves elevava o local em que Alec estava para que ele perdesse o equilíbrio diante de tantos tremores. 

Aquilo que ele fez acabou por se tornar uma espécie de monte ultrapassando poucos metros o muro do campo de treinamentos. Após isso, o prodígio da terra criou uma espécie de muro ao redor do local, impedindo que Alec tivesse contato com o duelo. 

Alec gritava de ódio. Estava muito longe e não havia a mínima possibilidade de descer de lá. Ele tentou subir pelas paredes improvisadas, mas falhara. Mesmo sem possuir qualquer contato visual, ele tentou lançar bolas de fogo com um ângulo maior para que quando atingisse o solo encontrasse alguém, ou algo, porém elas eram facilmente evitadas.  

— Deixamos o melhor para o final – Falou Yves. 

Ao perceber que estava sozinha, Sachiel se lembrou de tudo que aprendeu a fazer mesmo que precariamente no últimos tempos e criou uma enorme parede de água entre ela e os dois oponentes. Entretanto, na medida que ela solidificava a água, Douglas a transformava em líquido novamente. 

Ao perceber isso, ela correu para trás da enorme dobradura de terra de Yves e respirou fundo tentando elaborar alguma estratégia. 

Os garotos sorriam ao ver aquela cena e foram andando lentamente em direção ao local que a garota teria se escondido. 

 O canal de água passava em frente ao local em que ela estava, então ela começou a se elevar até ficar a altura do Alec e o ajudou a sair da armadilha em que ele se encontrara. 

Ele estava tentando derreter a parede de terra, mas estava tão desesperado por ter sido pego em uma armadilha tão simples que não conseguia se concentrar o suficiente para derreter. 

Ao vê-la, ele segurou sua mão estendida e subiu para cima da parede. Por pouco não caiu, pois o garoto era muito pesado para os franzinos braços da garota. 

Assim que ele ficou de pé na parede da rocha, viu os dois garotos assistindo aquela cena sorrindo e, com apenas um movimento, Douglas derreteu o enorme apoio de gelo que a garota estava. 

Por reflexo, Alec tentou segurá-la, mas a única coisa que conseguiu foi se desequilibrar e cair com ela sem nenhuma proteção no chão. 

— Vencemos! – Gritaram eufóricos. 

Mosheh ordenou aos dois que levantassem, mas eles estavam sentindo dores demais por conta da queda. Melchior aproximou-se dos dois, Sachiel tinha caído de costas, mal conseguia respirar.  

Já Alec feriu seu rosto, pois caiu de frente. O sangue dos dois marcava o chão do local, mas a quantidade não era muita o suficiente para assustar ou matá-los.  

— Eles sobreviverão – Diesse Mosheh ao damaso do fogo. 

Embora a garota tentasse falar algo, a única coisa que saia eram gemidos de dores. Ela olhou para Alec, o garoto não parecia mais tão agressivo agora e apesar de que ela estivesse sendo estraçalhada internamente com a dor nas costas, a dificuldade de respirar e a tontura, ela viu que ele também sangrou e sentiu uma pitada de satisfação, pois assim como os outros, ele também era algoz. 

☾☾☾

Na enfermaria, a garota tomou algumas poções que a curandeira preparou e estava deitada em decúbito ventral, pois sobre suas costas estava uma pasta verde feita da folha de Ulmeiro com Mangueira para aliviar a dor que a garota estava sentindo.

Por sorte, segundo a curandeira, ela não fraturou qualquer osso e por isso ficaria saudável novamente em pouco tempo. Fato que para ela não era tão bom assim, pois sentia medo daquele tal de Mosheh e assim que ficasse boa, mais episódios iguais aquele iriam se repetir.

Alec estava dormindo em uma cama diametralmente oposta a dela, havia também cortinas extremamente brancas ao redor da cama das duas crianças, impedindo a visão de quem estava em um dos leitos à todo o quarto. Devido a isso, a garota escutava apenas o ronco do garoto.

Depois do duelo, a menina não pensou em sua família, pois sua dor física era tão perturbadora que ela só conseguia gemer e dormir, sono esse que acabava por gerar pesadelos perturbadores de quedas de penhascos.

A neta da curandeira, Adriana, até tentava animar um pouco a garota. Ela contava diversas histórias que tinha vivido com sua bisavó nessas viagens pelo império, visitando doentes e o principal: os curando.

Após alguns dias de longas conversas, Sachiel parecia até que se esquecia da sua dor física e mental enquanto conversava com aquela formosa moça. Quando a menina pensava em se entristecer, Adriana pegava uma mecha de seu cabelo e passava pelo ouvido da garota que sorria por causa das cócegas que fazia.

 Geralmente, elas conversavam durante a madrugada e os diálogos sempre eram leves e animados, até o assunto “família” ser tocado pela pequenina.

— Como é sua mãe? – perguntou a pequenina.

— Sachiel, minha querida, acho melhor nós irmos dormir – disse Adriana.

— Mas eu não estou com sono.

— Mas já é tarde – insistiu.

Os olhos azuis de Sachiel fitaram aquele outro par de olhos azuis. O cabelo negro de Adriana deslizava por sua pele. Parecia um véu, um manto sagrado que tentava esconder desesperadamente sua beleza de toda inveja humana, mas que falhava pelo simples fato de aumentar ainda mais a formosura de seu semblante.

— Por favor – disse Sachiel.

— Tudo bem – Adriana sorriu – você venceu.

— Já pode falar – sorriu.

— Minha mãe se parece muito comigo – disse a jovem – só que diferentemente de mim, ela é a mulher mais bonita de Dilecto. Igual a você, que é a garotinha mais bonita daqui.

Sachiel sorriu timidamente.

— Mamãe me dizia isso também.

— Se sua mãe te dizia, ela era muito inteligente.

— Quando foi a última vez que você viu sua mãe? – perguntou a menina de rabelos rubros.

Adriana parou e pensou.

— Não me lembro ao certo, acho que quando eu era criança.

— E por que faz tanto tempo assim?

—Sachiel, é uma longa história.

— Pois conta, vai que eu durma com essa história – ela sorriu de forma sapeca. Sachiel sabia como ser teimosa e argumentadora.

— Eu conheço outras histórias de ninar melhor.

— Por favor, eu quero essa.

— Tudo bem, garotinha teimosa – ela riu – vamos pensar, minha bisavó não gosta muito de minha mãe por que como ela é muito bonita, tem uma personalidade muito boa e é bastante interessante, muitos homens gostam dela e querem se casar com ela, mas ela não se casa com nenhum.

— É claro que ela não vai se casar com nenhum – Sachiel interrompeu –  ela já é casada com seu pai!

— Não, meu amor, ela não é casada nem com meu pai. Na verdade, eu nem o conheço. Mas não conhecer seu pai ou mãe é muito comum. Aqui no forte, por exemplo, nenhum dos meninos conhecem seus pais, só você. Agora me responde você, quando foi a última vez que você viu seus pais? – Adriana perguntou inocentemente, pois não sabia do passado terrível daquela garotinha.

Os olhos de Sachiel se encheram de lágrimas, todas as feridas se abriram novamente em seu coração. A menina lembrou daquele terrível dia de seu aniversário. O dia mais sombrio de sua vida, pois foi naquele dia que ela parou de ter uma.

— Esse não é um dia bom de se lembrar. O meu tutor falou que minha mãe morreu engasgada com uma espada. Mas eu sei que ela não morreu engasgada, aquele homem mau a matou!

— Desculpe minha querida, não queria te fazer chorar, vamos falar da minha família, tudo bem?

A menina demorou alguns instantes, mas acabou assentindo com a cabeça e Adriana, ao terminar de limpar as lágrimas que escorreriam pelo rosto de Sachiel, continuou.

— Bem, minha mãe há muito tempo teve um namorado. Ele era muito forte e valente. Os dois eram perdidamente apaixonados, passaram um bom tempo juntos e foi quando minha mãe sengravidou de mim. Aí surgiram algumas complicações e meu pai teve de ir embora e nunca mais pode voltar. É por isso que eu não o conheço.

— Então sua mãe está esperando seu pai voltar?

— Acho que não, minha querida.

— E porque você não fica com sua mãe? – Sachiel continuava insistindo no assunto a tal ponto que nem mesmo Adriana entendia o porquê de tamanha curiosidade.

Antes mesmo que ela pronunciasse qualquer palavra para responde-la, sua bisavó apareceu e a chamou.

— Eu já volto – disse Adriana.

Após se despedir da menina, sua vó demasiadamente ríspida e amargurada disse:

— Sobre o que tanto você falou de sua mãe?

O tom de voz daquela senhora estava um tanto agressor, grosseiro a tal ponto de querer estraçalhar a garganta daquela garota que não poderia ter falado tanto.

— Nada demais – ela disse temerosa, por pouco sua voz não saiu e quando as palavras finalmente se desprenderam de seus dentes, ela ainda gaguejou.

— Ora nada demais, estou aqui a pouco tempo e para mim, o que você disse já foi muita coisa!

A mulher praticamente gritava. Seus olhos estavam cheios de ódio, nem parecia que era capaz de curar alguém, pois no momento, a única coisa que transmitia eram energias negativas suficientemente fortes a ponto de derrubar um soldado saudável e leva-lo a estado de putrefação.

— Eu não me lembro, por favor, não fiz por mal.

— Eu não quero que você fale sobre sua mãe nunca mais!

— Por que não? Qual o motivo de tanto ódio? Tenho certeza que ele não é gratuito.

— Porque aquela meretriz não merece ser lembrada.

— Não fale assim de minha mãe! – Gritou Ariana.

Agora as duas estavam agitadas. Nunca aquela cena ocorrera com as duas antes, pois a relação entre Adriana e sua bisavó sempre foi baseada no respeito e na dedicação mútua. No entanto, feridas como essa nunca tiveram sido abertas, o assunto estava enterrado há tempos.

— Não falar dela assim? Minha neta é uma prostituta! Ela te abandonou! Assim como seu pai! E eu, uma velha coitada de mais de oitenta anos, fiquei responsável por uma garota tão imatura!

— Minha mãe tem um nome! Nunca mais repita isso!

— Se Laylla realmente se importasse com seu nome, ela não faria o que faz!

Com a gritaria, um guerreiro à paisana que estavam transitando por perto corre para a fonte do barulho.

— Quem é você para falar de honra? Olho só, se você realmente tivesse um nome a zelar, já teria revelado a identidade de meu pai!

Instintivamente, e domada pela ira, a velha revelou um segredo até então escondido a sete chaves e jamais pronunciado em voz alta:

— Seu pai é o senhor Melchior!

 

 

 


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