A garota do apartamento à frente escrita por BomDiaPeeta


Capítulo 4
Morangos com chantilly




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Albert não conseguia esquecer Nicolle nem um minuto. Tentou colocar um filme diferente no DVD, acessou a internet, bisbilhotou suas redes sociais (que ele mal entrara durante todo o ano) e acabou descobrindo uma receita nova e simples para uma sobremesa. Era uma espécie de Chantilly com calda de morango. Pela primeira vez, ele esqueceu Nicolle, porque queria muito comer aquilo. Albert não era nenhum chef de cozinha, mas tinha bons dotes culinários e muita curiosidade em relação à isso.

Quando saiu de casa, reparou em como o frio havia piorado tão rapidamente. Isso porque ele mesmo havia comentado com um colega pela manhã que aquele dia não seria tão rigoroso quanto à temperatura. Bem, parece que ele estava enganado. Foi ao supermercado próximo ao edifício e comprou o que queria. Quando sentiu o vento gelado de novo, lembrou de Nicolle e que ela estaria passando frio num ponto de ônibus àquela hora. Ela não havia ligado, mas ele já conhecia sua vizinha o suficiente para saber que ela não faria aquilo.

Pegou o carro no estacionamento e foi logo para a universidade, atrás de Nicolle. Torcia para que ela não tivesse pego carona com ninguém. Estranhou o pensamento que veio à sua cabeça de que ele desejava que não fosse um homem que tivesse dado carona para ela. Tentou espantar aquelas ideias malucas e focou na rua em que ele havia virado anteriormente para levá-la à faculdade. Assim que chegou lá, pediu informações sobre a que horas as aulas haviam acabado e onde ele poderia encontrar a garota ruiva. Uma mulher que se chamava Alicia ouviu a conversa e disse estudar com Nicolle. Albert pediu para ela levá-lo até a sala, mas ela respondeu que iria buscar Nicolle. O rapaz era teimoso e seguiu Alicia até lá. Encontrou sua vizinha com um olhar distante, encostada à parede. A única coisa que ele sentiu naquele momento foi dó.

Ele a levou para o carro e eles voltaram a conversar, enquanto seguiam de volta para casa.

–É sério. Você não deveria ter saído da sua casa nesse frio. – Ela insistiu.

–Deveria sim. Eu não estava fazendo nada em casa. – Ele respondeu. – E eu me sentiria eternamente culpado se te deixasse pegar um ônibus.

–Eu não ia pegar um ônibus. – Ela respondeu, mas Albert sabia que era mentira. – Eu estava esperando...

–Esperando quem? – Perguntou o rapaz.

–Alguém. – Ela pareceu ficar sem graça. – Está bem, eu queria que alguém me desse carona. Só não queria que fosse você.

–Por que não? Será que eu sou tão ruim assim? – Albert havia ficado um pouco nervoso com o comentário da ruiva.

–Não! – Ela respondeu, imediatamente. – Claro que não, Albert... é só que... você não deveria ter saído da sua casa nesse frio.

–Deveria sim. Eu não estava fazendo nada em... peraí, nós acabamos de ter essa conversa.

Ela deu risada e se aconchegou no banco em que estava sentada. Ela admirava a paisagem como se fosse uma coisa totalmente nova para ela.

–Albert, quantos anos você tem?

–28, por quê? – Ele mentiu, para tentar parecer mais responsável.

–Me diga a verdade primeiro. – Ela pediu. Albert pensou que ela era uma bruxa.

–Tudo bem... eu tenho 25. Agora me diga por que quer saber.

–Ah, por nada. Eu tenho 20. – Ela respondeu. – Eu pareço ter essa idade?

–Parece. – Ele respondeu, com sinceridade.

–Era pra você dizer que eu pareço muito mais jovem do que sou. – Ela repreendeu.

–Você mandaria eu falar a verdade. – Ele rebateu, espertamente.

–Você é um cara estranho, mas um estranho... bem, interessante. – Ela comentou. Ele levou como elogio.

Assim que eles chegaram no Edifício St. John, entraram no tão famoso elevador novamente e foram para o oitavo andar. Logo que as portas se abriram, Albert dirigiu-se para seu apartamento e viu as coisas que havia comprado no balcão da cozinha. Ele pensou em como ele poderia falar mais com Nicolle e logo teve uma ideia, antes que ela abrisse a porta de seu apartamento.

–Ei, Nicolle. – Ele chamou – Quer ser minha cobaia?

–Não. Tchau. – Ela abriu a porta do apartamento dela e olhou para Albert, com um sorriso travesso.

–Espera, envolve... comida. Você gosta de morangos? – Ele perguntou.

–-x--x--x--

Nicolle nunca pensou que teria coragem de entrar na casa de alguém que ela mal conhecia e que comeria qualquer coisa servida por esse alguém. Mas... quando se tratava de Albert, ela sentia que se ele dissesse que ela deveria pular do último andar e tudo ficaria bem, ela pularia e nem se feriria. Ela se sentia uma idiota por pensar assim, mas ela não podia perder a oportunidade de passar um tempo a mais com seu vizinho bonitão e jornalista.

–O que nós vamos comer? – Ela perguntou, curiosa.

–Uma coisa que eu vi na internet. – Albert respondeu. Ele estava colocando uma panela com um pouco de água no fogão. – Deve ser muito bom.

–Você quer que eu coma algo que nem você sabe se é bom? – Ela perguntou, só para confirmar.

–É isso o que as cobaias fazem, Mlle. Rousseau. – Ele respondeu, virando-se para ela com um sorriso brincalhão.

–Acho tão lindo homens que cozinham... – Ela comentou involuntariamente, depois percebeu que havia sido direta demais. Por sorte, Albert reagiu com uma risada baixa.

–É só um hobbie. – Ele respondeu, com algo que Nicolle identificou como modéstia.

–Eu sobrevivo de coisas fritas e das coisas que tem na petisserie em que eu trabalho. Faz tempo que eu não como em um restaurante de verdade ou faço um jantar digno antes de ir para a universidade. – Nicolle contou, se sentando no sofá da sala, sem pedir licença.

–Eu sobrevivo de comer em restaurantes de verdade e faço jantares dignos quando chego do trabalho. Faz tempo que eu não como coisas fritas e alimentos de padaria. – Albert respondeu, parodiando a frase de Nicolle.

–Continue me contando mais sobre isso, pode ter certeza que no ano que vem eu vou aparecer aqui todos os dias pedindo comida feito uma mendiga. – Ela brincou, mas bem que ela queria que fosse verdade. – Ei, sua namorada gosta das comidas que você faz?

Aquele era oficialmente o modo mais eficiente de se descobrir coisas sobre a vida amorosa de alguém. Era um método discreto e usado no mundo todo, em todas as línguas... inclusive francês.

–Não precisa usar esses truques pra descobrir coisas sobre mim. – Ele respondeu. Nicolle ficou indignada. – Eu não namoro, nem nunca namorei. Mas uma vez, uma mulher que trabalhava comigo aqui queria se trancar em um banheiro comigo.

–E você se trancou? – Ela perguntou, querendo saber tudo sobre a vida dele.

–Não. – Ela sabia que ele havia mentido. – Quer dizer... ela era superior a mim e me ameaçou. Foi quase um estupro.

–Ficou traumatizado? – Nicolle não deveria fazer aquelas perguntas, mas ela não estava ligando para os bons costumes.

–Por pouco tempo. Um amigo meu me ajudou e ela acabou sendo demitida. Acho que ela nunca arranjou outro emprego. Já ouvi rumores de que ela havia se matado.

–Que trágico! – Nicolle comentou, mas ainda não estava satisfeita. – E as mulheres ainda dão em cima de você?

–Além de você, acho que mais ninguém. – Albert respondeu, ligando uma batedeira.

Naquele momento, Nicolle ficou rosa, vermelha, azul, roxa e preta de vergonha. Agora ela queria mesmo se jogar do último andar e torcer para morrer bem tragicamente. Ela quase se levantou e foi embora, mas respirou fundo e esperou ele desligar a batedeira. Ela não sabia o que falar enquanto ele arrumava alguns copos sobre o balcão.

–Eu não dou em cima de você. – Foi a frase genial de Nicolle. – Você quem faz isso.

Nicolle repetiu essa última frase em sua mente e estapeou a própria testa num gesto de repreensão por ser tão ridícula.

–Não sei bem se isso pode ser definido como “dar em cima”. – Albert respondeu, tranquilamente. – Porque eu nunca senti essas coisas antes.

–Defina “essas coisas”. – Ela pediu, convicta.

–Não sei... você foi a primeira mulher que conseguiu me afetar de alguma forma, tanto positiva quanto negativamente. Mas não foi pra discussões sobre isso que eu te chamei aqui... foi para provar isso aqui.

Ele saiu da cozinha trazendo dois copos com chantilly rosa, uma calda de morango enfeitando e alguns pedaços de fruta cortados misturados à espuma gordurosa. Dentro, uma colher de prata. Ele entregou um dos copos para Nicolle, que tomou aquilo com deleite. Podia não fazer nem um dia que ela conhecia aquele cara, mas ela não desistiria até conseguir o que queria dele.


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