Amor escrita por Ana C


Capítulo 3
Ódio


Notas iniciais do capítulo

Do latim "odium", aversão, raiva por alguém.



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Quando meus olhos já haviam se acostumado com a claridade, decidi levantar. Tomei um banho gelado, torcendo para que, junto com a água, meu mal-estar fosse embora. Incrivelmente, ao secar meus cabelos, já me sentia bem melhor. Vesti uma roupa qualquer e desci as escadas, dirigindo-me à cozinha. Meus pais não estavam em casa, mas a mesa do café da manhã estava posta. Bebi um pouco de suco de laranja, comi uma torrada e voltei para o meu quarto.

Pela primeira vez desde que havia voltado, peguei minha câmera fotográfica para ver os retratos que tirei na Alemanha. As primeiras fotos foram ainda no avião, das nuvens, que pareciam feitas de algodão, ao meu lado. Mais adiante, havia fotos de todos os pontos turísticos que visitei. O portão de Brademburgo, o zoológico de Berlim, o Reichstag, a Ilha dos Museus, além dos diversos castelos, jardins, bibliotecas e igrejas. No meio de todas essas fotos, havia uma que foi eleita por mim como a mais bonita de todas: Sebastian e eu, abraçados, com sorrisos espontâneos, na frente da Ópera de Leipzig. Naquele momento, nosso primeiro beijo havia acabado de acontecer e eu estava me sentindo a pessoa mais feliz do mundo. Talvez minha felicidade estivesse transparecendo na foto, por isso, eu a achava tão linda.

E, olhando aquela foto, peguei-me com um sorriso triste no rosto.

– Ah, Sebastian... Eu sinto a sua falta. – murmurei, pensando se ele ainda pensava em mim. Senti algumas lágrimas se formando em meus olhos. – Queria tanto te encontrar mais uma vez, só mais uma vez...

De repente, estava chorando de verdade. Tentei me controlar, mas vi que não valia a pena. É bom chorar de vez em quando, para aliviar o peso que carregamos dentro do peito. Pensei muito na minha vida enquanto chorava e, em meios aos soluços, acabei adormecendo.

Acordei bem mais tarde, com o celular vibrando ao meu lado. Juntando toda a esperança que guardava em mim, fechei os olhos novamente e torci para que fosse uma ligação de Sebastian. No entanto, ao abri-los, constatei que era Antônio.

– Alô? – atendi, com a voz ainda sonolenta.

– Oi, Cecília! Que voz é essa? Estava dormindo até agora, às 5 horas da tarde de um sábado? – indignou-se.

– Não. Acordei de manhã, mas voltei a dormir depois. – expliquei.

– E você está bem? Fiquei preocupado com você ontem. – pude perceber que ele realmente se importava.

– Estou pronta para outra! – debochei.

– Que bom! E quais os seus planos para esse lindo sábado à noite? Aceita ir comer pizza com a galera? – convidou-me.

– Vai ter bebida? – ri, e ele me acompanhou.

– Vai, mas a senhorita vai ficar longe delas. – afirmou, brincando. – Posso ir te buscar às oito e meia?

– Afirmativo, coronel. Até mais! – respondi, desligando o telefone.

Sempre pontual, Antônio apareceu na frente da minha casa exatamente na hora combinada. Parou o carro e buzinou, gritando “Cecília!” em seguida. Todavia, eu ainda não estava nem perto de pronta, como era de se esperar. Pedi para meu pai convidá-lo para entrar, enquanto esperava que eu terminasse de me arrumar. Alguns minutos depois, saí do quarto.

– Vamos? – eu disse, cumprimentando-o.

– Até que enfim... – Antônio reclamou e eu ri.

– Juízo vocês dois, heim?! – meu pai interveio, com um sorriso sugestivo. Revirei os olhos e saímos.

Quando chegamos à pizzaria, todos os nossos amigos já estavam lá. Havia apenas os nossos dois lugares sobrando na mesa. Antônio sentou-se ao lado de Maysa e eu, sem escolha, sentei-me ao lado de Caio. Mas foi bom. Ele demonstrou saber que ouvir é tão importante quanto falar, e o nosso diálogo foi bem interessante.

Depois de comermos, fomos caminhando até a pracinha da cidade. As luzes de Natal ainda não tinham sido retiradas e o local estava bem bonito. Escolhemos um banco em um lugar bem fresco e iluminado para nos acomodarmos. Maysa, sentada, abraçava a cintura de Antônio, que estava em pé ao lado dela, acariciando os longos cabelos negros da moça.

Sentada na grama, eu observava aquela cena. Os carinhos excessivos trocados pelos dois me incomodavam muito. Pareciam namorados, mas Antônio jurava que não sentia nada por Maysa. Entretanto, eu tinha certeza de que ela gostava muito dele. Preparei um comentário ácido sobre aquilo, que soaria como uma indireta, mas guardei para mim.

Deitei-me, para olhar o céu. As estrelas brilhando acima da minha cabeça me passavam uma tranquilidade imensa. Sorri, sem entender muito bem o motivo, pois meu coração estava triste. Fechei os olhos, senti a brisa fresca daquela noite de verão passando pelo meu rosto. Pensei em Sebastian e meu coração respondeu com alguns pulinhos. Abri novamente os olhos e vi uma estrela cadente cruzando o céu. Não costumava acreditar naquele tipo de coisa, mas achei que fazer um pedido não me faria mal. Então, desejei que eu pudesse encontrar alguém para quem meu coração fosse mais precioso que uma jóia e que cuidasse dele muito bem.

– Cecília, vamos embora? – Antônio interrompeu meus sonhos.

Assenti e levantei-me. Caminhamos até o carro em silêncio.

– Você e a Maysa formam um lindo casal. – acabei falando ao entrar no carro.

– Não achei graça. – Antônio foi grosso. – Quantas vezes eu vou ter que dizer que não gosto dela? Você é tão infantil.

– Você não percebe? Só fiz esse comentário porque vocês estavam praticamente atracados lá na praça. Além disso, eu tenho certeza de que ela é doida por você. – defendi-me.

– É, eu também tenho certeza de que ela é doida por mim. E eu devia mesmo dar uma chance para ela. Afinal, todos têm alguém pra namorar, pra ficar, pra beijar, menos eu. – desabafou, arrancando com o carro.

– Ei. Eu também não tenho ninguém, se te serve de consolo. – tentei, como sempre, apaziguar a situação.

– Não tem? E o Sebastian? – questionou, ainda com raiva na voz.

Olhei para Antônio, incrédula. Como ele soube sobre Sebastian? Eu não havia contado para ele e ninguém, além de mim e dos meus amigos alemães, sabia. Pensei em perguntar como ele havia descoberto, mas a voz fugiu de mim.

– Você me contou tudo quando estava bêbada. Contou que ele é primo da sua amiga, é americano, três anos mais novo que você e que namoraram por quase todo o tempo em que você ficou na Alemanha. – ele cuspiu as palavras sobre mim. – Contou também que ele não queria que você voltasse para o Brasil e nem foi se despedir de você no aeroporto. Nessa parte, você até chorou. Você chorou! Isso partiu meu coração. E sabe o que eu senti quando você me disse tudo isso? Ódio! Ódio de você, ódio da sua viagem, ódio desse cara! E eu tentei, Cecília, eu tentei esconder tantos sentimentos negativos. Mas foi impossível depois desse seu comentário!

Ouvir tudo aquilo me deixou chocada. Um balde de água congelada sobre mim. Jamais pensei que Antônio, meu melhor amigo, meu confidente, pudesse se sentir assim em relação a mim. E, sem querer, eu magoei uma das pessoas mais importantes para mim. Deixei que algumas lágrimas escorressem pelo meu rosto, mas não queria que Antônio as visse. Mantive o silêncio. Olhei de relance para ele, cujos olhos não escondiam o tal ódio.

Parou na frente da minha casa. Fiz menção de descer, imaginando que ele diria para eu ficar e, em seguida, pediria desculpas, como costumava fazer sempre. No entanto, ele ficou calado. Desci do carro, deixando-o sozinho com o seu ódio e torcendo para que passasse logo.


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